terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Aceitar a Guiné-Equatorial na CPLP é pôr finanças à frente dos direitos humanos, diz BE


  Obiang, o ditador sanguinário da Guiné Equatorial, que a CPLP diz aceitar como membro

PÚBLICO - LUSA - ontem
 
O Bloco de Esquerda defendeu hoje que Portugal está a pôr os interesses financeiros à frente dos direitos humanos, branqueando o regime da Guiné Equatorial, ao apoiar a entrada do país como membro efectivo na comunidade lusófona.

“Portugal coloca em primeiro lugar os valores monetários e deixa para depois os valores dos direitos humanos, da democracia e da defesa das liberdades. É disso que estamos a falar, de colocar o petróleo à frente das pessoas, o negócio à frente dos direitos humanos”, disse à agência Lusa o deputado Pedro Filipe Soares.

Os oito países lusófonos aceitaram em Julho de 2010 um pedido de adesão da Guiné Equatorial como membro de pleno direito da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), tendo condicionado a decisão ao cumprimento de um processo de reformas no país, onde o Presidente Teodoro Obiang governa há mais de 30 anos. Nas últimas semanas, multiplicaram-se declarações no sentido de a adesão da antiga colónia espanhola, onde não se fala português, se concretizar na próxima cimeira da comunidade lusófona, agendada para 2012 em Maputo.

Na sua recente visita a Luanda, Pedro Passos Coelho, mostrou-se aberto a discutir e a analisar a situação da Guiné Equatorial, que, segundo o primeiro-ministro português, no espaço regional, tem uma importância muito relevante para a língua portuguesa. E ainda hoje o ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, defendeu em Maputo que a CPLP deve estar “aberta a todos". Temos todas as condições e todos nós temos que valorizar mais a CPLP do que aquilo que fizemos”, afirmou, lembrando que é preciso pôr os instrumentos disponíveis “ao serviço dos nossos povos, da nossa economia e cultura”. “A questão cultural tem que estar sempre presente, pois, é o que nos une”, disse.

A admissão da Guiné Equatorial, que já detém o estatuto de observador associado da CPLP desde 2006, foi contestada por vários círculos na última cimeira da organização, em 2010 em Luanda. Na ocasião, 13 personalidades dos oito países lusófonos assinaram uma carta aberta em que se manifestaram contra a entrada da Guiné Equatorial na CPLP, por considerarem que a admissão deste país africano, dirigido mais de 30 anos por Teodoro Obiang, será um “precedente inaceitável” e levaria à “grave descredibilização” da organização.

Para o parlamentar bloquista, “a evolução da posição” portuguesa relativamente à entrada da Guiné Equatorial como membro efectivo da CPLP “vai no sentido errado”. Todo o processo de adesão “visa branquear” a actuação do regime da Guiné Equatorial onde, segundo Pedro Filipe Soares, os dois “princípios basilares” da CPLP não são cumpridos.

“Apesar de formalmente a Guiné Equatorial prever que o português seja a terceira língua oficial do país, na prática, não há disseminação da língua [...]. Por outro lado, a entrada [do país] coloca em causa os estatutos da CPLP [...] porque a Guiné Equatorial é um regime que oprime o povo, os direitos humanos e os direitos da democracia e onde a liberdade, particularmente a de imprensa, não existe”, disse.

Os bloquistas apresentaram no Parlamento um projecto de resolução, que querem discutir e, se possível, aprovar até Fevereiro, onde propõem que o pedido da Guiné Equatorial seja rejeitado. “Não podemos deixar para segundo plano aquilo que foi um dos factores fundamentais para a criação da CPLP: o primado da paz, da democracia e dos direitos humanos. Tudo isto não pode ser apagado, secundarizado por interesses pelo petróleo e gás natural das águas da Guiné Equatorial. E percebe-se que é essa a grande motivação para a aproximação de Portugal às posições da Guiné Equatorial”, sublinhou Pedro Filipe Soares.

Para os bloquistas, o objectivo do projecto passa por “demonstrar claramente” que não há unanimidade sobre esta matéria. “Tentaram que este debate ficasse arredado dos holofotes mediáticos. Nós queremos que seja público”, disse, mostrando-se esperançado que haja, nos diferentes grupos parlamentares, “uma defesa dos verdadeiros interesses de Portugal e da CPLP”.

“A entrada da Guiné Equatorial na CPLP irá desvirtuar toda a construção que permitiu em diversos países uma evolução positiva no respeito pelos direitos humanos e no cumprimento dos processos democráticos." O deputado antecipa, contudo, que possa haver “um visto prévio das bancadas parlamentares da maioria” que leve à rejeição do projecto. “Esperamos que haja dentro dessas bancadas parlamentares um número suficiente de deputados com bom senso e que defendam estes valores [...] para que se possa criar um factor de pressão sobre o Governo contra esta abertura à entrada da Guine Equatorial”, sublinhou.

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