quarta-feira, 15 de agosto de 2012

MERCOSUL, O EIXO DO PODER LATINO NA AMÉRICA!



Martinho Júnior, Luanda

1 – O poder do império alicerçado pela capacidade anglo-saxónica desde os alvores da Revolução Industrial, já não é comparável ao domínio que antes exercia em relação à América Latina, conforme foi desde as independências de bandeira e particularmente ao longo do século passado.

Hoje para o império, na América Latina é muito mais difícil “dividir para reinar”, é muito mais difícil manipular os povos e as nações, muito mais difícil até de enquadrar as oligarquias locais nos projectos da hegemonia (“Venezuela no Mercosul: dura derrota para os EUA, afirma Atílio Borón” – http://pt.cubadebate.cu/noticias/2012/08/01/venezuela-no-mercosul-dura-derrota-para-os-eua-afirma-atilio-boron/).

De facto, uma parte importante das próprias oligarquias latino americanas, estão mais apostadas nos projectos estruturantes de integração, nos projectos propiciados pelas emergências económico-financeiras e têm vantagens em enquadrar os processos sócio-políticos que ganharam consistência a partir de poderosos movimentos sociais surgidos do húmus da opressão dos últimos 200 anos.

O comportamento de algumas multinacionais latino americanas são já disso exemplo (“El ocaso del império” – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=145903).

Agora o Mercosul estende-se da Terra do Fogo às Caraíbas!

2 – Um dos factores geo estratégicos que beneficiam as alterações é a preponderância conseguida pelos interesses nacionais latino americanos no sector crítico do petróleo e do gás, à custa da redução do peso específico das multinacionais norte americanas e europeias sobretudo.

Com a criação de organizações de tendência emergente, integradora e multipolar, os movimentos sociais e as iniciativas produtivas instalam-se na democracia, tornando-a mais popular, mais participativa, mais emancipadora, mais abrangente, beneficiando a cidadania e catapultando um autêntico renascimento com base nas culturas latinas e autóctones

De entre as Instituições com tendência a uma maior integração e influência destaca-se o Mercosul, que antes integrava o Brasil, a Argentina, o Uruguai e o Paraguai e agora se viu reforçado com a entrada da Venezuela (“Mercosul Integração e desenvolvimento” – http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20664&editoria_id=6).

O Mercosul é apontado por muitos como a instituição integradora mais poderosa surgida na América Latina, capaz de se abrir a muitos mais estados quer na América do Sul, quer na América Central, quer nas Caraíbas, incluindo mais a Norte o próprio México (“O Mercosul e o xadrez geopolítico das Américas” – http://ponto.outraspalavras.net/2012/07/19/paraguai-xadrez-geopolitico-das-americas/).

3 – Desde já a entrada da Venezuela é um reforço do poder latino americano em relação às riquezas naturais do continente, acima de tudo em relação ao petróleo e ao gás, num momento em que a Venezuela anuncia deter as maiores reservas do mundo.

O processo político dessa entrada teve uma aceleração surpreendente: o golpe de estado executado pela ultra conservadora oligarquia do Paraguai, tradicionalmente dependente do império norte americano, contra o governo legítimo progressista sob a Presidência de Fernando Lugo, colocou o Paraguai em cheque no Mercosul, congelando a sua representatividade geo política, incapacitando o seu Parlamento de tomar posição em relação à aceitação da entrada da Venezuela e propiciando o seu culminar, já que todos os outros componentes originais o haviam já admitido (“Um continente dividido pela democracia” – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/07/um-continente-dividido-pela-democracia.html).

Os estados com petróleo e gás, como a Venezuela, o Brasil e a Argentina, são agora dominantes no Mercosul e isso estimula novos ingressos a partir de outras organizações latino americanas, entre elas a própria ALBA (“Mercado Comum do Sul” – http://pt.wikipedia.org/wiki/Mercado_Comum_do_Sul).

O Paraguai, país do interior com recursos menores, poucas hipóteses terá de manter um governo que tem aliás os seus dias contados pela Constituição do país: dentro em breve haverão novas eleições e os autores do golpe terão de ceder perante as evidências que se vão acumulando e as pressões regionais que são decisivas (“O círculo se fecha” – http://tudoparaminhacuba.wordpress.com/2012/08/09/paraguai-o-circulo-se-fecha/comment-page-1/#comment-1324).

4 – Na periferia do Mercosul estão outros países produtores de petróleo e gás, como a Colômbia, o Equador e o México, mas com a manutenção da tendência para o optimismo latino americano, a sua hora poderá um dia chegar para a integração efectiva enquanto estados membros, mais cedo do que mais tarde.

De todos eles o mais problemático poderá ser a Colômbia, onde a oligarquia nacional demonstra não poder contar com as mesmas capacidades de manobra sócio-política-militar que antes, face à progressão quer do movimento social, quer da própria guerrilha das FARC e o ocaso lento da influência do império e de suas iniciativas (“A situação na Colômbia e o projecto das FARC-EP” – Miguel Urbano Rodrigues – http://resistir.info/mur/colombia_09ago12.html).

Os Estados Unidos estão atolados em várias situações que constituem um intrincado beco sem saída, desde a sua própria crise financeira interna, à crise sincronizada do dólar, da libra e do euro, até à situação de pântano em que caiu, que se vai arrastando sobretudo no Mediterrâneo Oriental e no imenso continente Euro-Asiático, onde a emergência conjugada da Rússia, da China e da Índia vão ganhando espaços, por vezes à custa de conflitos, tensões e guerras que colocam riscos acrescidos para a humanidade e o planeta (“A ascendência duma elite financeira criminosa” – James Petras – http://resistir.info/petras/petras_05ago12.html).

Mantendo a Oceânia sob sua influência (Austrália e Nova Zelândia), os Estados Unidos têm em África a possibilidade maior de fazer prevalecer sua hegemonia em estreita interligação com os seus aliados europeus, em especial as antigas potências coloniais, até por que a África do Sul é o elo mais fraco entre os emergentes de primeira grandeza que compõem os BRICS.

Na América, o poder latino expande-se para dentro dos próprios Estados Unidos, sendo sintomáticas as vagas de migrantes que sem parar e sem possibilidades de obstáculo, vão chegando e pouco a pouco, vão alterando o seu quadro sócio político e institucional, a ponto de começar a haver influência cada vez maior a favor dos seus interesses até nas tendências eleitorais.

Promotor de choque de civilizações o espaço cultural eminentemente anglo-saxónico começa a sentir e a colher os efeitos “boomerang” duma hegemonia global em nome dum punhado de ricos e de poderosos.

Até aí, nas filosofias, nos conteúdos e no carácter do seu renascimento o poder latino americano assume o contraste, inspirado em grande medida pela resistência histórica de Cuba, por via da integração, da solidariedade e dum exercício tão equilibrado quanto o possível de poder, em nome da humanidade e do planeta!

5 – É neste ambiente que Cuba se está a lançar na prospecção de petróleo e gás no “offshore” sob sua jurisdição, o que coincide com a possível expansão do Mercosul até às Caraíbas, onde a Venezuela garante por via do PetroCaribe a salvaguarda de muitos interesses nacionais dos micro-estados insulares e dos componentes da ALBA (“PetroCaribe, integracion solidaria” – http://www.alianzabolivariana.org/pdf/folletopetrocaribecooperacion.pdf).

O PetroCaribe é uma iniciativa que o Presidente Hugo Chavez qualifica como “instrumentos en la lucha contra la exclusión, miseria, pobreza y para elevar el nivel de vida de nuestros pueblos”, todavia em função por exemplo da evolução da situação nas Honduras, onde houve um golpe de estado favorável às oligarquias ultra conservadoras do país, urge melhor definir os seus padrões de actuação (“PetroCaribe… Para los pueblos o los verdugos?” – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=143180).

Cuba também beneficia do PetroCaribe, retribuindo com capacidades próprias ao nível dos sectores da investigação, da saúde e da educação, mas a partir do momento da chegada da plataforma Scarabeo 9, as questões energéticas passam a situar-se num outro patamar (“Cuba encontrou petróleo na sua plataforma” – http://tudoparaminhacuba.wordpress.com/2012/08/07/cuba-encontrou-petroleo-na-sua-plataforma/).

O discurso de 26 de Julho do General de Exército Raul de Castro em Guantánamo, é assumido já nesse outro patamar (“Nosso povo tem uma vocação pacífica, mas saberá defender-se” – http://www.granma.cu/portugues/cuba-p/31jul-raul.html).

Nos Estados Unidos, respondendo a interesses que só podem estar indexados às multinacionais do petróleo e do gás, bem como aos seus suportes financeiros, há análises em relação às potencialidades de Cuba, conforme se pode verificar em “20 perguntas para explorar el petroleo cubano” – http://cafefuerte.com/cuba/noticias-de-cuba/economia-y-negocios/1504-la-semana-del-petroleo-cubano-preguntas-a-fondo).

É evidente que as explorações de petróleo em todo o Caribe influenciarão em todo o tipo de relacionamentos, havendo demasiadas incógnitas para lá das 20 respostas que acima referimos, entre elas o que farão as multinacionais norte americanas, das quais a Noble Energy faz parte, tendo em conta o que já tive a oportunidade de referir em relação ao Mediterrâneo Oriental e Golfo da Guiné “Pirataria no Golfo da Guiné” – http://paginaglobal.blogspot.pt/2012/08/pirataria-no-golfo-da-guine.html).

A construção dum Mercosul a partir da América do Sul, um Mercosul reforçado com a Venezuela, vem em socorro de Cuba nas suas pretensões de exploração petrolífera, como em socorro de outras entidades, entre elas o Haiti.

Neste momento pode-se confirmar apenas que crescem as expectativas:

- Até que ponto a ALBA tirará partido da entrada da Venezuela no Mercosul?
- Até que ponto o Mercosul conseguirá estender-se em direcção à América Central e Caraíbas?
- Quando o México poderá tornar-se membro de pleno direito do Mercosul?
- Até que ponto o Mercosul poderá influenciar a evolução da situação no Golfo do México?
- Até que ponto as multinacionais anglo-saxónicas do petróleo se vão adaptar sob o ponto de vista geo estratégico ao Golfo do México sob impacto do Mercosul?
- Até que ponto estão os Estados Unidos e suas multinacionais preparados para uma Cuba produtora de petróleo e gás?
- Até que ponto uma reeleição de Barack Husseim Obama poderá influenciar quer no fim do bloqueio, quer no estabelecimento de relações em pé de igualdade para com Cuba?
- Até que ponto a IVª Frota, ressuscitada no momento em que o Brasil anunciava a descoberta do seu pré-sal, será reforçada tendo em conta a proliferação de interesses sobre o petróleo e o gás no Golfo do México?
- Acaso as multinacionais norte americanas se lembrarão um dia que foram angolanos e cubanos que defenderam seus interesses em Angola, na década de 80, perante a ameaça das acções coligadas do regime sul africano e da UNITA, conforme o episódio do grupo do RECC 4 chefiado pelo então Capitão Winnand Johannes Petrus du Toit em Malembo?

Mapa: O Mercosul – A azul escuro os estados membros, a azul claro os estados associados e a azul vivo, os estados observadores (México e Nova Zelândia).

Ler ainda:
- Noam Chomsky – La decadencia de EE. UU. En perspectiva, (Parte I), “perdiendo” el mundo – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=144942
- Noam Chomsky – La decadencia de EE. UU. En perspectiva, (Parte II), el camino imperial – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=144943

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