sábado, 18 de agosto de 2012

Portugal: UM GOVERNO ENCALHADO




Pedro Bacelar de Vasconcelos – Jornal de Notícias, opinião

O discurso do Primeiro-Ministro no parque aquático do Pontal revela um governo encalhado que não navega nem se afunda.

Foi uma pesada deceção para quem esperasse desafios mobilizadores e novos motivos de esperança, apesar da bonomia estival exibida pelo chefe do Governo. Indiferente às mudanças que entretanto ocorreram pela Europa, não encontrou melhor para desafiar a Oposição do que a relíquia arqueológica da "regra de ouro" da limitação constitucional do défice. Aos sinais de naufrágio da atividade económica e do desemprego galopante, respondeu com o elogio da resignação e condenou o "regabofe" que alegadamente nos teria conduzido às desgraças do presente. Em resumo: nem sombra de estratégia europeia - quadro incontornável do nosso destino coletivo - nem fumo de uma política económica que trace um rumo para contrariar a recessão. Da avassaladora maré das promessas de reforma do estado, emergem, periclitantes, a reforma das autarquias, confiada a um ministro moribundo, e um mapa judiciário também concebido à margem das populações locais. A privatização da RTP reduziu-se ao 2º canal e foi extinta, para já, uma única fundação de entre as larguíssimas centenas que se dizia parasitarem as finanças públicas. Se eram estas as reformas estruturais prometidas, então "a montanha pariu um rato". A denúncia do estado clientelar, assumida no passado com tanto vigor, em nada perturbou a continuidade das nomeações sem concurso público. Anuncia-se o propósito piedoso de acabar com "os privilégios de uma elite financeira", sem mais especificação, mas as dívidas do Estado às pequenas e médias empresas continuam a agravar as dificuldades de financiamento que estrangulam a nossa economia. Por último, o ministro da Defesa, confrontado com o teor de um recente despacho do "Departamento Central de Investigação e Ação Penal", respondeu que ignora o desaparecimento de importantes documentos do seu ministério mas que é à Procuradoria- -Geral da República que compete "investigar o que houver para investigar e tirar conclusões", como se pode ler na edição de terça-feira deste jornal.

É extraordinário que passados mais de oito anos sobre a polémica compra de dois submarinos a um consórcio alemão, o assunto ainda suscite parangonas nos jornais, reações de governantes e iniciativas do responsável máximo pela investigação criminal - o Procurador-Geral da República. Entretanto, houve eleições ganhas e perdidas, mudaram os governos, alternaram os partidos, sucederam-se os ministros e correram processos na justiça. Contudo, o primeiro responsável pela guarda dos documentos de um ministério é o seu titular. E sendo certo que foram muitos os titulares da pasta da Defesa, em governos sucessivos de diferentes partidos, antes e depois de se ter verificado o seu desaparecimento, nenhum deles pode descartar as suas responsabilidades próprias e remete-las impunemente para o foro da justiça criminal. Porque os ministérios têm uma estrutura hierárquica e instrumentos disciplinares para apurar anomalias, corrigir erros e sancionar os infratores, e por tudo isso cabe ao ministro um dever de zelo e de prestação de contas pelo qual só ele é politicamente responsável. Por tudo isso, parecem deslocados e displicentes os trocadilhos do antigo ministro da Defesa e atual ministro dos negócios estrangeiros - "Há oito anos que, de vez em quando, notícias dos submarinos emergem e submergem". Porque, além do mais, se é verdade que os submarinos alemães ficaram piores que os submarinos franceses depois "da redução de capacidades imposta por Paulo Portas", como refere o JN de quarta-feira, então o contrato assinado em 2005 está ferido de invalidade por graves irregularidades cometidas num concurso internacional! Estranha-se, enfim, que perante factos conhecidos há tanto tempo, todos eles admitam que ainda possam ter algum esclarecimento útil a prestar...

Não surpreende, portanto, que até hoje, só os alemães tenham conseguido apurar subornos, identificar os culpados e ordenar condenações. Mas fica a pergunta: quem os subornou?

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