terça-feira, 20 de novembro de 2012

DILMA DEFENDE MOBILIZAÇÃO MUNDIAL PARA EUROPA SAIR DA CRISE

 


Em visita à Espanha, presidente do Brasil diz que esforço internacional feito em 2008 e 2009 após a quebra do Lehman Brothers deve ser repetido, avalia que situação das contas públicas dos Estados Unidos também é uma ameaça e reitera a necessidade de unir crescimento econômico a políticas de austeridade. A reportagem é de Naira Hofmeister e Guilherme Kolling, direto de Madri.
 
Naira Hofmeister e Guilherme Kolling – Madri – Carta Maior
 
Madri - A presidente Dilma Rousseff defendeu em três discursos distintos nesta segunda-feira, em Madri, um esforço mundial para ajudar a União Europeia (UE) a sair da crise econômica. A chefe de Estado brasileira comparou a iniciativa à mobilização internacional de 2008 e 2009 para minimizar os efeitos da quebra do banco Lehman Brothers, que desencadeou a crise do mercado financeiro.

“Uma das grandes obras dos homens e das mulheres foi a construção da UE a partir das cinzas da Segunda Guera Mundial. Não podemos deixar que se rompa esse paradigma político e econômico. É preciso combater a especulação do euro, não se pode deixá-lo apenas nas mãos do mercado”, sustentou Dilma nas reuniões que manteve com o presidente do governo da Espanha, Mariano Rajoy, o rei Juan Carlos e empresários do país. “Precisamos fazer um pacto que impeça a desesperança gerada pela falta de empregos e oportunidades”, conclamou.

A chefe do Executivo brasileiro ainda manifestou preocupação com a situação das contas públicas nos Estados Unidos, exposta após a reeleição de Barack Obama. A necessidade de um ajuste fiscal para combater o déficit público poderia frear a incipiente recuperação da economia norte-americana, o que levaria a uma recessão com efeitos globais.

“Todos os países precisam contribuir, porque não é só uma ameaça à UE. Tem o problema fiscal dos Estados Unidos, que esperamos que não ocorra. E se de fato acontecer, atinge a todos, porque ninguém é uma ilha”, alertou.

Assim como havia feito na Cúpula Ibero-americana de Cádis – encerrada no sábado, 17 de novembro –, Dilma avaliou que o remédio para a crise não pode ser só a austeridade. E que há um falso dilema opondo políticas de estímulo ao crescimento com ajuste fiscal. “As principais lideranças políticas da Europa ainda não encontraram esse equilíbrio. O corte radical de gastos e a retirada de direitos não podem ser único caminho”, criticou.

Diplomaticamente, entretanto, rechaçou as insinuações dos jornalistas de que havia aconselhado Rajoy sobre o tema. “Não tenho receita para a Espanha. O que sei é a experiência e os erros do meu país, que passou por duas décadas de ajuste fiscal sem resultados. Só quando o combinamos com crescimento, combate à inflação com distribuição de renda, exportações com incentivo ao mercado interno é que conseguimos sair da crise”, ensinou, sugerindo que sejam as nações superavitárias as que desencadeiem medidas anticíclicas de combate à recessão.

Avaliou, porém, que a Europa tem mais recursos para superar suas dificuldades do que a América Latina durante o anos 80 e 90, e que o Fundo Monetário Internacional (FMI) evoluiu – fazendo uma referência à declaração recente da diretora da instituição, Christine Lagarde, de que chega um ponto em que as políticas de austeridade deixam de dar resultados. “Espero que os países do mundo ibérico tenham a oportunidade de flexibilização (das metas impostas) para crescer e construir o ajuste sem tantos prejuízos à população”.

Ressaltou ainda que teme o desmantelamento do estado de bem estar social europeu, “uma inspiração para os governos latino-americanos”, e o questionamento do sistema democrático, causado pela falta de perspectivas e pelo alto desemprego juvenil que já estão levando – em países como a Grécia – a uma revitalização de grupos de extrema direita e xenófobos.

Discursos escancaram diferenças políticas entre Dilma e Rajoy


Apesar do clima harmonioso do encontro bilateral e da mútua comemoração das parcerias comerciais estabelecidas, a coletiva de imprensa dos executivos brasileiro e espanhol escancarou as diferenças políticas entre Dilma Rousseff e Mariano Rajoy.

Confrontado com a posição de sua homóloga brasileira, Rajoy se mostrou convicto nas ações de sua gestão. “Somos conscientes de que a redução do déficit é necessária, não (tomamos essas medidas) apenas porque essa seja uma norma da União Europeia. O que estamos fazendo será bom no médio e longo prazo”, defendeu, para, na resposta seguinte, reconhecer que “é verdade que (os ajustes) causam danos a muita gente”.

O presidente do governo espanhol acredita que, apesar do aumento do desemprego e da manutenção da desconfiança dos mercados após um ano de governo (ele foi eleito em novembro de 2011), está no caminho certo e que seu país crescerá a partir de 2014, com um sistema bancário consolidado, que poderá dar crédito para que a sociedade espanhola invista.

Recepção reforça importância do Brasil para Espanha

Mais que os números dos investimentos espanhóis no Brasil, talvez seja a deferência destinada à comitiva da presidente Dilma Rousseff que demonstre o grau de interesse do país ibérico no gigante latino-americano.

A chefe do Executivo brasileiro foi a única governante a ser recebida em 2012 pelos reis da Espanha no Palácio Real de Madri, o mais luxuoso patrimônio da família real na capital. Para servir o almoço no qual o rei fez um brinde ao Brasil, as portas do Palácio estiveram fechadas e os centenas de turistas que esperavam para conhecer suas instalações não puderam entrar. Dilma foi ainda condecorada com a ordem de Isabel a Católica pelo monarca.

Juan Carlos também fez questão de ler dois parágrafos de seu discurso em português, assim como fez o ministro da Educação, José Ignacio Wert, antes de assinar a renovação de acordos bilaterais na área diante da presidente brasileira.

Wert foi mais longe: provocado pelo diretor do jornal El País, que promoveu um dos eventos no qual a comitiva brasileira participou, garantiu que a Espanha incentivará o ensino do português como segundo idioma nas escolas e universidades públicas, “não somente pela proximidade com a nossa nação-irmã, Portugal, mas fundamentalmente pela importância da relação com o Brasil”.

O encontro entre Dilma e seu homólogo espanhol teve um formato incomum, que combinou a reunião dos chefes do executivo de ambos países com encontros paralelos entre os ministros das distintas áreas. “A Espanha aposta mais do que nunca no Brasil, uma potência do presente”, observou Rajoy, para que não restassem dúvidas sobre a expectativa dos ibéricos com a visita.

Dilma agradeceu muito o tratamento que recebeu na Espanha e afirmou que o país pode contar com o Brasil como um parceiro para enfrentar a crise. “Mas não da forma oportunista como fomos tratados nós durante nossa crise. Queremos estabelecer um programa que leve a um desenvolvimento conjunto”, concluiu.
 
Fotos: Pool Moncloa


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