Baptista-Bastos
– Diário de Notícias, opinião
As
coisas parecem indicar que, no próximo dia 23, a CPLP (Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa), na cimeira de Timor, vai ter o seu requiem.
Cabisbaixos e servis, os governos dos países que constituíam aquela vasta
sociedade abandonaram os princípios, as normas e os valores morais dos
fundadores e cederam aos grandes interesses dos negócios. As manobras de
bastidores estavam, há anos, em movimento, e o que era uma ideia límpida e um
conceito nítido de colaboração entre países de fala igual foi tripudiada
friamente. A entrada da Guiné Equatorial, antiga colónia espanhola, cujos
costumes, cultura, ideologia, política e comportamento são contrários, e até
opostos, aos da comunidade, não é só absurda: possui as características de uma
usurpação. Nem o facto de quem manda no país ser antidemocrático, ou
ademocrático, como queiram, impediu o resto da comunidade de se opor ou sequer
recalcitrar.
O
capitalismo desconhece a história, as características, os padrões específicos
das nações, nem isso está nos seus objectivos, mas tem de existir um
contrapoder que permita a existência, simultânea, da soberania e do
desenvolvimento económico, cultural e social. O que está em causa, com a
inserção da Guiné Equatorial na CPLP é a imposição do axioma neoliberal, e dos
abusos mais sintomáticos de uma violência sem paralelo nos nossos dias.
É
lamentável que os países instituidores da comunidade não se tenham oposto a
este enredo, que nada tem que ver com princípios de solidariedade e muito menos
com relações de língua. De um modo mais simples, digamos que o capitalismo
também neste caso sai vencedor, pela rendição, pela subserviência e pela nova
categoria de negligência dos governos. Tem-se visto, um pouco por todo o mundo,
a que conduz esta indiferença gelada, e às ameaças reais que pesam em todos. Parafraseando
Sophia , nós sabemos, temos informações, assistimos ao caos, e
não queremos assumir as responsabilidades de uma decisão.
Os
tentáculos da ganância, a ausência de um ideal progressista que se lhe obste,
continuam a desembocar em múltiplas incertezas. O espectro da guerra paira como
endemia. A selvajaria dos conflitos locais só o é porque descuidamos da
natureza do que oculta. O abatimento do avião da Malaysia Airlines não é,
somente, uma ignomínia pavorosa: indica que o mundo actual não conhece limites,
e está associado à assunção de um novo paradigma, que temos de combater com
energia, porque a nossa sobrevivência ética está em questão. Como se lê
n"Os Irmãos Karamazov, de Dostoievki, "se Deus não existe, tudo é
permitido". Deus como acto moral, Deus como espessura e dignidade humanas.
Não é abusivo estabelecer relações entre as coisas: todas elas estão ligadas e
obedecem a leis muito próprias.
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