sábado, 25 de outubro de 2014

Angola: DEUS INDICAR-NOS-Á A SAÍDA. NÃO DESESPEREMOS



Marcolino Moco* – Folha 8, 18 outubro 2014

Pede-me o Jornal Folha 8 para me pronun­ciar sobre a enésima manifestação, de jo­vens angolanos bem identificados e ordei­ros, mais uma vez reprimida com a maior brutalidade possível, numa altura que con­tinua a não haver qualquer acto a suspender os direi­tos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Confesso que de tantas vezes que me pronunciei so­bre situações idênticas, escasseia-me o fôlego, para agora ter de repetir as mesmas palavras. Depois, o grande problema é que calam-se todas as vozes internas e internacionais rele­vantes. Alguns porque não se querem meter em política, porque certamente a política não tem que se ocupar da vida e da dignidade humana, a não ser que o carrasco seja o colonialista branco europeu, como aconteceu até 1975.

Esta indirecta é para os combatentes contra o colonialismo, ainda vivos, incluído o próprio Presidente dos Santos, que olham para isso como uma normalidade, quando fundaram as suas carreiras combatendo pelo fim da tortura colonial con­tra a reivindicação do direito à independência, que devia ser a mãe de todos os outros direitos. Não têm condições policiais para defender manifestações pacífi­cas mas têm-nas em excesso para reprimir jovens manifestantes pacíficos, contra a usurpação do poder legislativo ou pelo menos a sua banalização completa.

Com toda a comunicação social angolana e portuguesa dominada pela família Eduardo dos Santos, toda a reacção político partidária é, no mínimo vulgarizada, com porta-vozes do MPLA no poder, num quadro de reconciliação nacional, a voltar a falar dos crimes unilaterais da UNITA, e no favor que fizeram ao actual presidente da CASA-CE, por ainda estar vivo. A divisão tribal escamoteada com sorrisos falsos dentro da poderosa Igreja Católica imobiliza-a profundamente, pe­rante crimes e desmoralização tão grave da sociedade angolana, enquanto igrejas evangélicas, ontem conotadas com Jonas Savimbi e a UNITA, preferem verberar a oposição do que defender ao menos os seus fiéis contra tanta barbaridade e ma­nipulação política, como se a reconciliação nunca tivesse sido abordada e Deus se tivesse passado para o Templo do Poder e das Posses.

E como se nunca tivesse havido qualquer mudança, desde os incendiá­rios dias de 1974 e 1975, em plena guerra fria que se pensava estar na base de todas as contendas, este texto voltará a ser apodado de ser da autoria de um frustrado que está a cuspir “no prato onde comeu” e de­veria continuar a comer, arrastando-se para a mesa dos privilegiados. E alguns jovens adestrados já no meio desta terrível “educação” informal, continuarão a perfeiçoar a arte de conviver “real-politicamente” com esse tipo de regime que acham o único possível de existir na Angola da megalomania petrolífera. Até um dia quando o seu sucesso, assente sobre alicerces de barro ruir completamente com os seus sonhos gaia­tos; como aliás tem estado a acontecer quase todos os dias com muitos mais velhos e mais novos, mas a imprensa não comenta.

Falando com franqueza e numa tentativa de colocar um pouco de hu­mor nisso, a única coisa, talvez, que irei dizer de novo e de interessante (mesmo assim repetindo), é que, por enquanto só a acção heróica dos auto-intitulados “jovens revolucionários” faz sentido; e só não me junto a eles porque já não tenho idade para correr e ver meus braços e cabeça partidos, como aconteceu ao meu contemporâneo (mesmo assim mais novo do que eu) o Dr. Filomeno Vieira Dias do BD. De resto a bola con­tinua com o Presidente Santos e com o MPLA que o deveria persuadir que não se joga dessa maneira perigosa. Contudo, Deus indicar-nos-á a saída. Não desesperemos.

*Marcolino José Carlos Moco (ChitueEkunha19 de julho de 1953) é um político angolano. Foi primeiro-ministro de Angola de 2 de dezembro de 1992 a 3 de junho de 1996 e secretário-executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) de 1996 a 20001 (Wikipédia)


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