Marcolino
Moco* – Folha 8, 18 outubro 2014
Pede-me
o Jornal Folha 8 para me pronunciar sobre a enésima manifestação, de jovens
angolanos bem identificados e ordeiros, mais uma vez reprimida com a maior
brutalidade possível, numa altura que continua a não haver qualquer acto a
suspender os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Confesso
que de tantas vezes que me pronunciei sobre situações idênticas, escasseia-me
o fôlego, para agora ter de repetir as mesmas palavras. Depois, o grande
problema é que calam-se todas as vozes internas e internacionais relevantes.
Alguns porque não se querem meter em política, porque certamente a política não
tem que se ocupar da vida e da dignidade humana, a não ser que o carrasco seja
o colonialista branco europeu, como aconteceu até 1975.
Esta
indirecta é para os combatentes contra o colonialismo, ainda vivos, incluído o
próprio Presidente dos Santos, que olham para isso como uma normalidade, quando
fundaram as suas carreiras combatendo pelo fim da tortura colonial contra a
reivindicação do direito à independência, que devia ser a mãe de todos os
outros direitos. Não têm condições policiais para defender manifestações pacíficas
mas têm-nas em excesso para reprimir jovens manifestantes pacíficos, contra a
usurpação do poder legislativo ou pelo menos a sua banalização completa.
Com
toda a comunicação social angolana e portuguesa dominada pela família Eduardo
dos Santos, toda a reacção político partidária é, no mínimo vulgarizada, com
porta-vozes do MPLA no poder, num quadro de reconciliação nacional, a voltar a
falar dos crimes unilaterais da UNITA, e no favor que fizeram ao actual
presidente da CASA-CE, por ainda estar vivo. A divisão tribal escamoteada com
sorrisos falsos dentro da poderosa Igreja Católica imobiliza-a profundamente,
perante crimes e desmoralização tão grave da sociedade angolana, enquanto
igrejas evangélicas, ontem conotadas com Jonas Savimbi e a UNITA, preferem
verberar a oposição do que defender ao menos os seus fiéis contra tanta
barbaridade e manipulação política, como se a reconciliação nunca tivesse sido
abordada e Deus se tivesse passado para o Templo do Poder e das Posses.
E
como se nunca tivesse havido qualquer mudança, desde os incendiários dias de
1974 e 1975, em plena guerra fria que se pensava estar na base de todas as
contendas, este texto voltará a ser apodado de ser da autoria de um frustrado
que está a cuspir “no prato onde comeu” e deveria continuar a comer,
arrastando-se para a mesa dos privilegiados. E alguns jovens adestrados já no
meio desta terrível “educação” informal, continuarão a perfeiçoar a arte de
conviver “real-politicamente” com esse tipo de regime que acham o único
possível de existir na Angola da megalomania petrolífera. Até um dia quando o
seu sucesso, assente sobre alicerces de barro ruir completamente com os seus
sonhos gaiatos; como aliás tem estado a acontecer quase todos os dias com
muitos mais velhos e mais novos, mas a imprensa não comenta.
Falando
com franqueza e numa tentativa de colocar um pouco de humor nisso, a única
coisa, talvez, que irei dizer de novo e de interessante (mesmo assim
repetindo), é que, por enquanto só a acção heróica dos auto-intitulados “jovens
revolucionários” faz sentido; e só não me junto a eles porque já não tenho
idade para correr e ver meus braços e cabeça partidos, como aconteceu ao meu
contemporâneo (mesmo assim mais novo do que eu) o Dr. Filomeno Vieira Dias do
BD. De resto a bola continua com o Presidente Santos e com o MPLA que o
deveria persuadir que não se joga dessa maneira perigosa. Contudo, Deus
indicar-nos-á a saída. Não desesperemos.
*Marcolino
José Carlos Moco (Chitue, Ekunha, 19 de julho de 1953) é um político angolano. Foi primeiro-ministro de Angola de 2 de dezembro de 1992 a 3 de junho de 1996 e
secretário-executivo da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP) de 1996
a 20001 (Wikipédia)
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