A
candidata à reeleição fala de seus planos e confronta a oposição
André
Barrocal, Mino Carta e Sergio Lirio – CartaCapital
Para
quem atravessou a semana espremida entre uma nova leva de vazamentos das
denúncias contra a Petrobras e a consolidação de uma inédita coalização
partidária contra o PT em torno da candidatura de Aécio Neves, a presidenta
Dilma Rousseff exibia excelente humor, embora estivessem à vista os sinais de
cansaço da extenuante campanha eleitoral. Por cerca de uma hora e meia, ela
recebeu CartaCapital na biblioteca do Palácio da Alvorada, logo após
retornar de um compromisso em
São Paulo. A candidata à reeleição criticou o que considera
uma interferência do Judiciário na disputa presidencial, o cinismo da oposição,
acostumada a “engavetar” os casos de corrupção quando estava no governo, e a
aposta contra o Brasil em 2014. Na comparação entre as administrações petistas
e tucanas, disparou: “O PSDB só sabe fazer programas piloto, para 2% da
população. Nós incluímos os pobres no Orçamento”.
CartaCapital: A senhora defendeu a divulgação “ampla, geral e irrestrita” das investigações da Operação Lava Jato, que envolvem a Petrobras. Por quê?
CartaCapital: A senhora defendeu a divulgação “ampla, geral e irrestrita” das investigações da Operação Lava Jato, que envolvem a Petrobras. Por quê?
Dilma Rousseff: Para obter as provas, a Justiça e o Ministério Público valeram-se da delação premiada, um método legítimo, previsto
CC: A
senhora acha que eles mentem?
DR: Só acho estranho aparecerem essas histórias neste momento. Por que no início do segundo turno das eleições? Por que desta maneira selecionada? Tem muita coisa no ar além dos aviões de carreira. Esses vazamentos não servem ao interesse central dessa investigação, se o propósito for esse mesmo, de desvendar os atos de corrupção.
CC: Presidenta,
o escândalo atinge a maior, a mais importante empresa do Brasil. Como não foi
possível evitá-lo e de que forma a senhora pode garantir que esse tipo de coisa
não voltará a acontecer caso seja reeleita?
DR: Não será preciso esperar um segundo mandato. Tomamos todas as medidas necessárias para coibir qualquer tipo de abuso ou malfeito na Petrobras e nas outras empresas e áreas do governo. Já, hoje. Obviamente e infelizmente, nunca se consegue em uma instituição acabar com todos os processos de corrupção, isso não é mérito, ou melhor, demérito dos países em desenvolvimento ou da América Latina. A União Europeia reconhece uma perda de cerca de 1% do Produto Interno Bruto no conjunto das nações do bloco decorrente da corrupção. Como tenho dito, não se pode apostar apenas na virtude dos homens e mulheres. Quem precisa ser virtuosa é a instituição. Ela necessita dos elementos e contrapesos para impedir o processo de corrupção. É fundamental, antes de mais nada, acabar com a impunidade. Por onde anda o bicheiro Carlinhos Cachoeira? Está solto. E o ex-senador Demóstenes Torres? Solto. E tantos outros acusados de corrupção nas últimas décadas? Fora o pessoal do PT, não tem ninguém na cadeia. A impunidade sanciona o ato de corrupção. E é preciso ser completamente ingênuo para achar que a escandalização da política pela mídia resolve os problemas.
CC: E
como se resolve?
DR: O corrupto e o corruptor precisam ter a sensação de que seus atos terão consequências. No Brasil, caixa 2 é mero crime eleitoral. Por isso proponho algumas medidas, mantido o direito de defesa em todo processo, sem condenar previamente ninguém, para fechar o cerco à corrupção. No nosso país é comum “condenar” suspeitos por meio de denúncias estampadas na mídia, mas na hora de puni-los de verdade, ao fim da ação judicial, nada acontece. Condena-se tão somente na opinião pública. Proponho transformar o caixa 2 em crime, não só eleitoral. Essa mudança está ligada a uma reforma política. Se continuar a existir financiamento privado de campanha, não teremos uma ação eficaz contra a corrupção. Vamos além: o servidor público que não for capaz de comprovar a origem de um bem será enquadrado em um crime e, entre outras medidas, perderá esse bem. Não vai adiantar mais fazer um termo de ajustamento com a Receita Federal e pagar os impostos devidos. Defendo ainda uma instância mais ágil nos tribunais superiores para julgar os casos de foro privilegiado. Queria lembrar, aliás, que o foro privilegiado foi criado no governo Fernando Henrique Cardoso, na administração dos nossos opositores nesta campanha. Sem essas medidas que proponho em meu programa, e algumas outras, não se combate de fato a impunidade. E não pode haver vazamentos indevidos. Os vazamentos anulam as provas.
CC: O
escândalo da Petrobras virou uma arma eleitoral da oposição e reforça em uma
parte do eleitorado a ligação entre o PT e a corrupção, não?
DR: Há uma diferença entre nós e a oposição. Ela não investiga e nunca investigou nada. Os governos do PSDB não são muito chegados a uma apuração de denúncias. Há uma extensa lista de casos que foram simplesmente engavetados. O procurador-geral da República da época do FHC foi apelidado de engavetador-geral. Não fomos nós que o apelidamos assim. Tudo ia para a gaveta, tudo abafado. São duas políticas completamente distintas. No governo Lula, a Controladoria-Geral da União ganhou status de ministério, teve sua estrutura reforçada. Criamos o Portal da Transparência. Um gasto autorizado estará, no mais tardar, em 24 horas exposto na internet. Nenhum estado, nenhum outro Poder no Brasil tem algo parecido, com a mesma agilidade. Só a União. Abolimos critérios, digamos, convenientes para o governo na escolha do procurador-geral da República. Respeitamos a lista tríplice indicada pelos próprios procuradores e promotores e isso aumentou a autonomia do Ministério Público. O mesmo acontece na Polícia Federal. O diretor da PF não integra os quadros do PT, veio da estrutura de funcionários da autarquia. O último diretor da PF no governo FHC era filiado ao PSDB e foi candidato duas vezes a deputado pelo partido. Não vetamos a Lei da Ficha Limpa. Aprovamos a legislação contra o nepotismo, aquela de acesso à informação, que garante ao cidadão a obtenção de dados que não afetem a soberania do País. Antes, a Justiça punia os corruptos e não os corruptores. Aprovamos uma lei que alcança também os corruptores. É outra estrutura, outro Estado, muito mais equipado para combater esse tipo de mazela. E faremos mais.
CC: O
candidato Aécio Neves anunciou Arminio Fraga no Ministério da Fazenda caso se
eleja. E a senhora informou que Guido Mantega não continua em um segundo
mandato. Há quem defenda que, a exemplo de seu adversário, a senhora deveria
anunciar o futuro ministro da Fazenda. Por que não fazê-lo?
DR: Não acho necessário ou conveniente fazer esse anúncio no meio de uma eleição. Trata-se de uma absoluta prerrogativa do presidente eleito anunciar o ministério. Por que o senhor Arminio Fraga foi “empossado” antecipadamente? O que significa? O PSDB diz: com a mesma receita e o mesmo cozinheiro farei o mesmo prato. Essa é a mensagem, embora eles neguem a intenção de preparar o mesmo prato oferecido durante os quatro anos em que o senhor Arminio presidiu o Banco Central. E não podemos esquecer. Segundo ele, ao assumir o BC, o Brasil atravessava uma crise gravíssima. Havia, sim, uma crise, mas vamos comparar. Era a crise dos Tigres Asiáticos, da Rússia, do México. Em meados dos anos 1990, os países emergentes não tinham a força que têm hoje e aquela crise se concentrou nessas nações. É completamente diferente e bem menos avassaladora quanto esta de agora, que feriu o sistema capitalista em seu cerne, nas economias centrais. Seis anos depois do estouro da bolha que levou à quebra do Lehmann Brothers, um dos maiores bancos de investimento do mundo, a Europa continua mergulhada em crise profunda...
CC: ...Em
um debate recente com Mantega, Fraga afirmou que a crise acabou há cinco
anos...
DR: Talvez por considerar que uma crise acaba quando cessam os problemas dos grandes bancos dos Estados Unidos. O que são 100 milhões de desempregados ao redor do planeta, não é mesmo? Desde 2011, quando assumi a Presidência, só se discute a crise nas reuniões do G-20, o grupo das 20 maiores economias do mundo. Em 2011 e
CC: A
despeito da crise internacional, o governo não errou em algumas medidas? O que
a senhora teria feito de maneira diferente caso pudesse voltar ao início de seu
mandato?
DR: Vamos analisar. Fizemos a desoneração tributária da folha de pagamento de vários setores. A outra opção era seguir o caminho da União Europeia. O resultado está aí: desemprego, redução dos direitos trabalhistas, cidadãos sem perspectivas. Preferimos desonerar para manter os empregos. A arrecadação caiu? Sim, mas foi a forma de manter a competitividade do trabalho. Deveríamos parar de investir em infraestrutura como os tucanos fizeram quando estavam no governo? Nunca. Aprimoramos os marcos regulatórios das concessões. No tempo de FHC, nos contratos de 1997 e 1998, estradas foram concedidas à iniciativa privada, com pedágios altos, e o único compromisso era fazer a manutenção. A duplicação era feita por fora, em outros contratos. Mudamos o padrão de investimento. É sempre possível melhorar, anunciei várias ideias novas para o segundo mandato, mas pergunto: o que poderia ter sido diferente?
CC: O governo não represou os preços dos combustíveis?
DR: Adoro discutir esse assunto. Durante o meu governo, concedi reajustes de 31,5% para os combustíveis, acima do IPCA, o índice oficial de preços, que subiu perto de 26%. Do que reclamam então? Querem que eu iguale os preços da Petrobras ao valor do barril de petróleo brent. Pergunto: o que os Estados Unidos fazem?
CC: E
o que os EUA fazem?
DR: Quanto é o preço do gás no mercado interno dos Estados Unidos? É de 3,96 dólares por milhão de BTU, uma medida térmica. E quanto custa no mercado internacional? Varia, ao gosto do freguês, de
(continua)
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