quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Portugal: DEPENDENTES DE UMA MÃO ESTENDIDA



Inês Cardoso – Jornal de Notícias, opinião

Iniciam-se as férias, mas em dezenas de concelhos as cantinas escolares mantêm-se abertas, chegando a acolher, além dos alunos, familiares diretos. Medidas que começaram por ser de exceção, para evitar que crianças ficassem sem refeições quentes nas pausas escolares, ameaçam tornar-se uma regra.

Soube-se também, ontem, que nos próximos anos Portugal vai receber 176,9 milhões de euros de fundos comunitários para fornecer produtos alimentares e outros artigos básicos às franjas mais pobres da população. Verbas que, declarou a comissária europeia para o Emprego, Assuntos Sociais, Competências e Mobilidade Laboral, ajudarão o país "a enfrentar a sua elevada taxa de privação material grave".

Dos números da pobreza ou da percentagem da população em risco de passar fome, nem vale a pena falar. De desemprego, perda de rendimentos, crise e recuperação ou falta dela, também não. Mas o longo nome da pasta da referida comissária europeia, que encerra em si toda uma promessa de políticas ativas com vista à plena integração e qualificação para o emprego, não pode deixar de suscitar perguntas sobre as dificuldades em transitarmos de um assistencialismo preocupante para uma efetiva transformação social.

O apoio de urgência a quem mais precisa não é dispensável, nem deve ser menorizado - por mais legítimo que seja o debate quanto à sua eficácia -, enquanto não se muda a realidade. Mas o problema de fundo é que a mudança não se vislumbra. Sem o envolvimento das pessoas, sem a sua capacitação, sem a garantia de que o assistencialismo seja transitório, perpetuam-se ciclos de dependência. E não é de dependência alimentar que se trata: é de défice de participação cívica, de ineficácia na integração social e de falta de empreendedorismo. A mão que se estende deve servir para levantar o outro do chão - e é este movimento que fica, demasiadas vezes, por fazer.

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