quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Angola: A CRISE SÓ ESTÁ A COMEÇAR



Luísa Rogério – Rede Angola, opinião

O petróleo baixou. As taxas de câmbio dispararam. Os bancos comerciais decretaram restrições para o levantamento de divisas. Os cartões de débito e de crédito ganharam estatuto de tesouro. E os dólares desapareceram do mercado. As kinguilas, ex-rainhas do câmbio, gradualmente aposentadas, regressaram em força. Viajar para o exterior passou a significar dores de cabeça a mais. Ter ou não dinheiro deixou de ser a questão. O grande desafio é poder converte-lo em moeda estrangeira. São sinais da anunciada crise que só está a começar.

Diante da situação, seria legítimo perguntar pelo paradeiro das reservas cambiais do país que se congratulava por ter uma das mais altas taxas de crescimento do mundo. Por enquanto, essa conversa de grande porte fica, como tantas outras, adiada. Ao que tudo indica, até melhor explicação, o tão propalado crescimento era consequência directa da alta do petróleo no mercado internacional. Dizem os especialistas que as mais sólidas economias do mundo já foram abaladas por crises. No nosso caso, ė necessário, antes de mais, explicar a origem e a dimensão que a crise pode atingir.

As “conversas difíceis” precisam de ser devidamente descodificadas para o entendimento comum. Por enquanto vale tentar compreender a realidade e encara-la. A leitura imediata indica que, em tempo de crise a palavra de ordem é poupar. Poupar sempre. Se estivéssemos noutro período, lá no “glorioso” tempo do partido único, poupar passaria a ser, inquestionavelmente, um dever revolucionário. Mas estamos em tempo de crise numa economia de mercado que alguns preferem chamar capitalismo selvagem.

A corrida ao redor dos bancos na semana finda foi freada pelo pertinente, embora tardio, comunicado do BNA. O défice de informação oficial e o nível de especulação em torno das medidas para lidar com os efeitos da crise trouxeram uma evidência. Deveria haver outra maneira de lidar com a dita. A escassez ou ineficácia de planos de comunicação geraram nervos e reações a mais. Multiplicam-se os comunicados. Depois dos bancos, a companhia aérea portuguesa teria anunciado restrições para a venda de bilhetes de passagem a partir de Angola. Em condições normais a concorrência deveria estar já a fazer contas, mas como estamos em crise, vamos esperar por novos desenvolvimentos.

Haverá algures um gabinete de gestão de crises? Os comentadores e economistas de plantão, os tais que nos fizeram acreditar que a solidez da nossa economia em crescimento jamais seria abalada, desapareceram. Este é o momento ideal para virem a público aquietar almas inquietas, quanto mais não seja para venderem ilusões que sempre terão o mérito de evitar sofrimentos antecipados. Em tempo de austeridade grandes ideias são susceptíveis de gerar altos rendimentos.

A nossa condição de petróleo-dependentes terá dado vazão a diversas teorias de conspiração. Uma das mais sugestivas dá conta que forças do mal oriundas do grande império, aquele que antigamente chamávamos imperialismo sem receio, mancomunado com o seu fiel aliado no mundo árabe, o finado rei da Arábia Saudita, teria engendrado quase tudo com a finalidade de enfraquecer a Rússia e o Irão, estremecer a Venezuela de Maduro e claro, atingir-nos! Porque não gostamos de lamber botas. Do grande capital só queremos mesmo as folhas verdes, como um amigo namibiano denomina as verbas norte-americanas.

Alguém se terá esquecido que da falta de informação ao caos vai um passo curtíssimo. Urge implementar estratégias e planos comunicacionais. Crise é a palavra do momento. Uma crise económica com a incontornável componente social. Prevê-se o fecho de dezenas de empresas públicas e privadas. Como consequência, cerca de sete mil cidadãos poderão aumentar a legião de desempregados. Reformas compulsivas, arrepio aos direitos trabalhistas e demais constrangimentos podem abalar gravemente o movimento sindical nacional este ano.

No meio das incertezas mil que rodeiam o futuro imediato dos angolanos, um dado é tão certo quanto a recessão económica. Nos próximos tempos os angolanos comuns vão aprender, por experiência própria, a decifrar o significado do termo economia. Nada mais do que a arte de gerir a escassez. O ganho, sabemos todos, está no poupar. Assim, devido a queda do petróleo no mercado internacional, começo por poupar o precioso tempo que, tal como o petróleo, um dia também vai acabar.

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