Enquanto
os generais no activo, violando a própria Constituição de Angola, dão apoio
público ao MPLA, os ex-militares voltam a dar um ultimato ao regime. E assim
vai o reino de José Eduardo dos Santos.
Orlando
Castro
Assim,
o presidente nunca nominalmente eleito e no poder desde 1979, continua sem
responder às reivindicações dos ex-militares que, durante uma vida, andaram a
matar-se uns aos outros na defesa de causas diferentes.
No
início de Agosto de 2012, importa recordar, o ultimato foi dado pelo coordenador
da Comissão de Ex-Militares Angolanos (COEMA), general na reforma Silva Mateus.
“Até
hoje mantivemos uma atitude de espera. A partir deste momento, até ao dia 15
deste mês, nós aqui e agora acendemos um intermitente de luz laranja. Do dia 15
para cima entraremos na linha vermelha e não haverá mais conversa”, frisou na
altura o general.
“Não
haverá mais conversa e nós iremos decidir o que fazer. Sairemos à rua a
qualquer momento se o comandante-em-chefe, presidente da República e chefe do
Executivo não for sensível em atender a nossa preocupação”, acrescentou o
general, mostrando que em tempo de paz a luta continua, embora a vitória não
seja certa.
Em
causa estavam na altura os pagamentos em atraso, nalguns casos desde 1992, a
ex-militares. Por outras palavras, os ex-militares percebem agora que, ao
contrário do que dizia Agostinha Neto, o importante não é resolver os problemas
do Povo. Aliás, o regime nem sequer sabe que existe Povo.
Segundo
Silva Mateus eram cerca de 60 mil os ex-militares nestas condições, abarcando
cinco mil soldados, sargentos e oficiais que desde 1992 deixaram de receber os
vencimentos estabelecidos, e também os que foram desmobilizados depois daquele
ano, e que receberam as guias da Caixa Social das Forças Armadas mas que, quando
vão receber, são informados que não há dinheiro.
Mas
há mais. Também lá estão os que não tendo sido desmobilizados continuam a ser
militares e não recebem, mais os 250 efectivos do processo “27 de Maio”, que
aguardavam o pagamento da pensão de reforma, os 402 do Batalhão Comando
Ex-Tigres, que lutaram na vizinha República Democrática do Congo, que têm
direito a subsídios desde 2007 e que só receberam o correspondente a 2012.
Segundo
Silva Mateus, faziam também parte daquele total de 60 mil, os 32.600 antigos
militares dos antigos braços armados da UNITA (FALA) e da FNLA (ELNA), ainda 18
mil oficiais que passaram à reforma e os que integraram a chamada Defesa Civil,
então tutelados pelo Ministério da Defesa Nacional e integrados nos governos
provinciais na última guerra civil (1998/2002) e, finalmente, os que estavam
integrados na Segurança do Estado, nas chamadas Tropas Territoriais, na
Organização de Defesa Popular e nas Brigadas Populares de Vigilância.
A
exigência da COEMA consistia na criação por parte do Estado de uma comissão
conjunta bilateral que avalie todas estas situações.
“Os
actuais dirigentes, tanto a nível do Ministério da Defesa Nacional como da
Chefia do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas não conhecem, não
têm percepção da dimensão deste dossiê”, acusou Silva Mateus.
“Será
que estas entidades não têm conhecimento da existência deste dossiê e desta
demanda dos militares ao Estado, e, se têm, porque não reagem? Estão à espera
de quê? Que os militares percam a paciência e saiam à rua para serem apelidados
de arruaceiros”, questionou.
Silva
Mateus assegurou que “não serão meia dúzia de generais de barriga cheia” que
impedirão os ex-militares de sair à rua, caso estes continuem sem receber um
sinal de disponibilidade para o diálogo.
“Se
os dirigentes, nomeadamente o presidente da República, continuarem a fingir que
não nos ouvem, ele será o responsável de tudo o que vai acontecer”, concluiu o
general.
Vamos
agora ver o que dirá o dono disto tudo. Eventualmente poderá dizer que os militares
são, como os civis não afectos ao MPLA, culpados até prova em contrário. Poderá
também dizer que pertencem a uma qualquer seita religiosa, que estão a ser
instrumentalizados pela Oposição ou que preparam um golpe de Estado.
Numa
altura em que o regime prepara a implementação de uma das suas especialidades,
purga, tudo poderá acontecer a qualquer altura, eventualmente para celebrar o
27 de Maio… de 1977.
Por
alguma razão o núcleo duro de José Eduardo dos Santos põe em dúvida a
fidelidade, que querem canina, dos militares oriundos da UNITA. E não é caso
para menos. Será que Geraldo Sachipengo Nunda, Chefe do Estado-Maior das Forças
Armadas, se esqueceu da Angola profunda, daquela onde o povo, o seu povo, é
gerado com fome, nasce com fome e morre pouco depois com fome?
Será
que Geraldo Sachipengo Nunda se esqueceu que o seu tão querido e idolatrado
presidente (Eduardo dos Santos), a sua Constituição, o seu regime, considera um
crime contra o Estado ter opiniões diferentes das oficiais?
Não
será altura de Geraldo Sachipengo Nunda também se interrogar das razões que
levam a que Angola uns poucos tenham muitos milhões, e muitos milhões não
tenham nada?
Não
se sabe ao certo, mas é curial pensar-se que Geraldo Sachipengo Nunda tenha
manifestado a sua satisfação pela morte de Savimbi apenas para que o MPLA não
se arrependesse das mordomias que lhe dera, que lhe dá e continuará a dar
enquanto for… útil.
Geraldo
Sachipengo Nunda continuará sempre debaixo da mira dos ortodoxos do regime. E
ele sabe disso. Sabe mesmo que, por enquanto, prefira (ao contrário dos
ensinamentos de Jonas Savimbi) ser escravo de barriga cheia do que livre com
ela vazia.
Folha
8 (ao)
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