Paula
Santos – Expresso, opinião
Esta
é uma das conclusões que podemos retirar da leitura do Inquérito à Fecundidade
2013. Do conjunto de informações que constam deste estudo, destaca-se:
-
o índice sintético de natalidade de 2013 é de 1,28;
-
a fecundidade final esperada é de 1,78;
-
a fecundidade desejada é de 2,31;
-
só 8% dos residentes em Portugal afirma que não pretende ter filhos.
As
famílias portuguesas pretendem ter mais filhos, desejam ter mais filhos. Mas
esse desejo tem vindo a ser adiado e não se concretiza porque existem
condicionalismos que as impedem de tomar essa decisão.
Portanto,
a segunda conclusão é que a responsabilidade do baixo número de nascimento de
crianças no país é de sucessivos governos e não das famílias, que não asseguram
as condições para as famílias decidirem sem constrangimentos, o momento e o
número de filhos.
O
Inquérito à Fecundidade 2013 referia mesmo que hoje "ter filhos não é um
direito, é um privilégio".
E
que condicionalismos são esses que impedem as famílias de tomar a decisão de
ter filhos? O Inquérito à Fecundidade levanta três questões principais: a
precariedade laboral, os baixos rendimentos e os elevados custos com as
creches.
Creio
que os fatores que condicionam a natalidade são múltiplos: as condições de
trabalho e o desrespeito pelos direitos, em especial do direito de maternidade
e paternidade; o desemprego e a emigração, os baixos rendimentos; a redução dos
apoios sociais; a inexistência de uma rede pública de creches e as crescentes
dificuldades no acesso a direitos fundamentais, como a saúde, a educação ou a
habitação condigna.
Muito
tem sido dito e escrito a propósito da baixa natalidade. Mas perante as
preocupações que vão sendo expressas, nomeadamente pelos membros do Governo e
pelo PSD e CDS-PP, como é que isso se traduz em soluções concretas que
efetivamente eliminem os obstáculos que condicionam a natalidade e se adotam
medidas efetivas de incentivo à natalidade?
É
que os que manifestam preocupações quanto à baixa natalidade são os mesmos que
durante os últimos quatro anos que degradaram ainda mais as condições de vida
das famílias com os cortes nos salários e nas prestações sociais, o aumento da
carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho, o aumento do horário de
trabalho, a destruição de milhares de postos de trabalho incluindo na
Administração Pública ou as constantes violações dos direitos de maternidade e
paternidade. O resultado foi a redução de 1/5 do número de nascimentos,
passando de cerca de 100 mil nascimentos para cerca de 80 mil nascimentos.
Por
detrás destas pretensas preocupações persiste uma conceção retrógrada sobre a
maternidade e os direitos da mulher. É que para além de procurarem
responsabilizar as mulheres e as famílias pela redução da natalidade,
constata-se o regresso de uma conceção que deve permanecer no passado quanto ao
papel da mulher na família, no mundo do trabalho e na sociedade e que rejeita a
maternidade e a paternidade livre, consciente e responsável.
A
manter-se esta política como pretendem PSD e CDS-PP (veremos as medidas que
constam do programa de estabilidade) o problema da baixa natalidade
permanecerá. Só é possível inverter a baixa natalidade com a rutura com este
caminho e com a implementação de uma política alternativa que:
-
crie empregos com direitos e seguros, que ponha fim à precariedade e à
instabilidade nas relações laborais;
-
valorize os salários e a reponha os salários cortados;
-
organize o tempo de trabalho para que permita uma verdadeira articulação entre
a vida profissional e a vida pessoal e familiar, através da redução do horário
de trabalho e do fim da desregulamentação do horário de trabalho e do banco de
horas;
-
reforce os direitos de maternidade e paternidade e que garanta o seu
cumprimento;
-
alargue os critérios de atribuição das prestações sociais, em especial do abono
de família repondo a sua universalidade;
-
desonere a enorme carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho;
-
crie uma rede pública de equipamentos de apoio à infância;
-
garanta a educação de qualidade para todos, até aos mais elevados níveis de
ensino;
-
assegure o direito à saúde, designadamente a efetivação dos direitos sexuais e
reprodutivos, o planeamento familiar, a saúde materno-infantil e o aumento dos
tratamentos de infertilidade;
-
garanta o acesso à habitação condigna a custos acessíveis.
Só
com uma política que valorize e reconheça a função social da maternidade,
enquanto elemento essencial para o futuro das gerações é possível aumentar a
natalidade.
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