domingo, 19 de abril de 2015

Portugal. O PODER DA ORAÇÃO



Domingos de Andrade – Jornal de Notícias, opinião

Há programas de Governo suportados pela fé. Andamos assim há quatro anos. E assim continuaremos nos próximos. Sofrer agora para obter a redenção amanhã. É a repetição dos movimentos. O mantra do terço. Tem de ser desta forma? Talvez, mas podia ser mais assumido.

A via-sacra. Vamos andar no país sem orçamento até ao princípio do próximo ano. A viver das práticas passadas. Há eleições entre setembro e outubro. Os consensos vão encalhar. E dificilmente teremos Governo até ao fim do ano. Há milagres, claro. A fé atesta-o. E todos os santos ajudam. É com isso que conta a coligação PSD/CDS, que não há de desfazer o casamento. Nem pode contar com mais nada. Carregarão a cruz.

O Documento de Estratégia Orçamental que Portugal vai levar a Bruxelas, como todos os estados-membros, é esse auto de fé. Quase sério. E é um programa de Governo. Espera crescimento, muito, taxa de desemprego ao menos igual, juros baixos, estabilidade dos mercados internacionais.

Para o bom, na escada do tempo, há alívio de impostos. Tudo gradual. Reposição dos salários da Função Pública. Redução da sobretaxa do IRS. Mais redução do IRC. E não se fala mais na Taxa Social Única. Essa hipótese, que esta semana esteve falada e quase acertada. Mas só na Imprensa. A conferir.

Para o mau, as pedras estão no caminho, mas não se veem. As contas de cima valem perdas de receitas. Entre 550 e 600 milhões. As de baixo compensam. E dão ganho. Poupanças de 600 milhões nas pensões (o quase do sério dos parágrafos anteriores está aqui), mas não se sabe como. Ou se morre ou se corta nalgum lado. Mais o pré-anúncio de uma quantidade de gorduras que valem outros tantos milhões no emagrecimento do Estado. Ou se morre ou se despede. Ou se desorçamenta, mas os custos estão lá na mesma. Ou se reforma a sério.

A oração. A ministra que vê o país todo reza. Sem dizer tudo, diz que há de recuperar o quadro previsto no ano passado para avançar com algumas medidas. E que o Tribunal Constitucional chumbou. Reza e chama o PS. Tem este, insiste, um contributo demasiado vago para ter utilidade. E insiste outra vez. Ao menos com este Governo os portugueses sabem com o que contam.

Do outro lado, só sabemos que não se quer insistir. A política fracassou, já chega de austeridade. E dizem ainda que o Governo quebrou o contrato de confiança com os portugueses.

É verdade. Mas não há mais ninguém com quem negociar.

P.S: Morreu Mariano Gago. Ele foi o ministro socialista que reconciliou o país com a Ciência. E isso é toda uma obra.

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