segunda-feira, 18 de maio de 2015

Portugal. A BODA DE GUIMARÃES



Afonso Camões – Jornal de Notícias, opinião

Juntemos dois ou três canídeos e observemos. Rodopiam sobre si próprios, cada qual cheirando o traseiro do outro. Na minha terra, chamamos cheira-cus a este impulso irracional que é também tão comum no condomínio privado em que se transformou a política caseira, comentadores e politólogos incluídos.

Isto, a propósito da fumaça gerada pelo lançamento da biografia de Pedro Passos Coelho e do episódio da revelação de que Paulo Portas (que o próprio desmentiu e Passos confirmou) se demitira "irrevogavelmente" por mensagem de telemóvel, no início daquele verão de 2013.

Andou-se nisto dias a fio. E questionou-se a sinceridade da troca de alianças entre os líderes do PSD e do CDS, anunciada a 25 de abril. Ora, com a mesma frieza e calculismo com que geriu a crise de há dois anos, amarrando Portas ao compromisso de governo, Passos veio esclarecer, de vez, que é verdade o que a sua biografia autorizada revela em discurso direto, e que não é um episódio desses que ameaça o fito eleitoral da coligação.

"Passámos por uma crise verdadeira, não foi uma crise falsificada", disse Passos em entrevista. "E superámos esse momento porque tivemos a maturidade suficiente para evitar um desentendimento".

Ou seja, disse o que quis dizer, para dizer que não esquece. E Portas não tem outro remédio senão encaixar. Porque é calando agora a divergência que paga a sobrevivência política.

Como, aliás, se viu ontem à noite, em Guimarães, onde ambos partilharam o primeiro comício da mais longa campanha eleitoral da nossa história democrática. Vieram dizer que a coligação está firme e que desejam, merecem e acreditam na vitória. Ninguém esperaria que dissessem o contrário.

Passos e Portas podem até detestar-se, e há dirigentes de ambos os partidos a garantir que quase não se falam. Mas estão reféns um do outro. Eles sabem, tal como o PCP, que o sistema eleitoral português favorece as coligações. Esta é uma escolha de conveniência, que acontece por necessidade. Não resulta de uma estratégia, mas de um impulso defensivo. Nem Passos nem Portas, eles sabem-no bem, sobrevivem politicamente a uma derrota eleitoral.

E do outro lado está António Costa e o PS, para já, à frente na corrida.

Passos e Costa concordaram esta semana em afastar o cenário de um mirífico bloco central ou de um qualquer entendimento entre socialistas e a coligação PSD-CDS. É, até ver, vinagre de campanha. É que, pelo menos um dos três não celebrará a próxima consoada como líder partidário. Quem sabe se não serão dois.

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