Carvalho
da Silva – Jornal de Notícias, opinião
Há
diversos tipos de ordens de despejo, nomeadamente as que afetam pessoas comuns,
que por diversas situações deixaram de poder pagar hipotecas ou arrendamentos;
as que os cidadãos emitem em eleições, e que originam despejos como o
recentemente sofrido pelo Governo da direita espanhola. A coligação PSD-CDS
pressente que vai receber, no início do outono, uma ordem de despejo
semelhante.
Passos
Coelho e seus pares desenvolveram políticas ofensivas e claramente direcionadas
a retirar o maior efeito possível da dinâmica neoliberal de retrocesso social e
civilizacional que varre a Europa, para fazerem em Portugal, em nome da
inevitabilidade e da não existência de alternativa, um acerto de contas com o
regime democrático construído a partir de Abril de 1974. A direita tem
aproveitado a oportunidade para destruir as bases de compromisso político que
nos permitiram ganhar dignidade no trabalho e direitos universais nas políticas
sociais fundamentais. Ao mesmo tempo tem colocado meios e instrumentos
económicos que ainda pertenciam ao Estado ao serviço do grande capital nacional
e internacional.
O
Governo, com frieza e ancorado na proteção do presidente da República, pôs em
marcha uma autêntica lavagem ao cérebro dos portugueses: procurou inculcar a
ideia de que andamos a viver acima das nossas possibilidades, criou mensagens
antissolidárias, colocando-nos uns contra os outros - no emprego e no
desemprego, nas relações entre gerações e na família, no acesso a direitos
sociais -, isolou cada um de nós, e em particular os mais desprotegidos, na
responsabilização pelos problemas com que nos deparamos, denegriu a
responsabilidade pública que emerge dos compromissos coletivos. A sociedade
portuguesa foi anestesiada e submetida nos últimos anos. Mas há sempre
possibilidade de renascer a esperança e de o povo mudar o rumo das coisas. E há
cada vez mais portugueses que não se deixam amedrontar.
O
Governo sente que o seu fim está próximo. Como um inquilino desesperado e sem
princípios aproveita o tempo que lhe resta para destruir a casa que habita e
governa. Nos meses próximos irão recrudescer atos de governação atentatórios
dos interesses e património dos portugueses. Na saga das privatizações
repetem-se os atos sôfregos contra o interesse nacional. Fala-se, muito
provavelmente com conhecimento de causa, que a intenção do Governo vai no
sentido de privatizar toda a TAP, exceto as suas dívidas. Ora, é sabido que
todos os problemas da TAP resultaram das dívidas e dos respetivos juros. Sem
dívidas e sem juros a TAP, como diz o povo, é bife do lombo. Se vier a ser
concretizado esse plano, ficam garantidos lucros chorudos para os amigos e as
dívidas entregues à responsabilidade do Estado, o que significará mais uma
fatura para o povo pagar.
Algo
parecido parece preparar-se no Novo Banco. O plano em curso visa limpar o Banco
para quem ficar com ele: o imbróglio jurídico e as diversas indemnizações, que
em última instância a justiça determinará, ficam para nós, contribuintes.
Entretanto, já está reconduzido o governador do Banco de Portugal - cujas
falhas no controlo e supervisão do BES/GES nos ficou cara - para que o processo
seja "bem concluído".
Na
Segurança Social o ataque é brutal e o Partido Socialista já entrou demasiado
no jogo; aliás, no grupo dos seus técnicos há quem também alinhe na equipa do
inimigo. O Governo, a direita e representantes de grandes interesses económicos
pintam-nos um quadro negro e "sem alternativa" e reclamam cortes nas
pensões. Estes pulhas políticos sabem muito bem que o desequilíbrio da
Segurança Social é, em primeiro lugar, o resultado da perda de 620 mil
empregos, da redução dos salários, da destruição da contratação coletiva, da
proliferação da precariedade, do insuficiente combate à fraude e à evasão.
Inverter estas políticas e buscar novas fontes de financiamento que tragam
riqueza produzida pelo trabalho para a solidariedade do sistema não lhes
interessa: o que querem é, desde já, assegurar a transferência definitiva de
rendimentos que pertencem ao trabalho para o capital. É hora de acordar. É hora
de assegurar o despejo deste Governo e destas políticas.
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