Aline Frazão – Rede Angola, opinião
Na
sua última crónica, José Eduardo Agualusa fez uma observação interessante: “em
privado não conheço uma única pessoa que defenda o actual regime, nem sequer os
próprios governantes. Em privado, em Angola, todo o mundo é da oposição”, dizia
o escritor. Não posso afirmar que não conheça quem defenda com unhas e dentes A
Prosa da Situação. Mas é verdade que a maior parte das pessoas que conheço em
Angola são, em privado, contestatárias em relação à governação política do
país. O que faz desta maré de oposição uma maré invisível é, infelizmente, a
sua natureza privada. Confrontar publicamente a classe política do país ainda
nos causa medo. Sim, o medo é a grande maré.
E
não é de admirar. As consequências para quem levanta a voz existem, embora não
em doses iguais para toda a gente. O que é certo é que, enquanto a banda sonora
do quotidiano for o “Velha Chica”, de Waldemar Bastos, e continuarmos a não
querer incomodar a quem de direito, essa maré, por mais potencial de mudança
que contenha, continuará invisível e silenciosa, a ver a banda passar.
Até
quando?
A
contenção explode, de vez em quando, nas redes sociais, e o cansaço aumenta dia
após dia. Um desabafo aqui, uma metáfora ali, rodeios e jogos de palavras,
ziguezagues ideológicos, meias-verdades. Somos ricos em recursos estilísticos;
pobres na clareza da linguagem. A dualidade nos caracteriza e não sei bem o
tamanho da nossa culpa. A ruptura não é fácil mas poderia ser mais fácil.
Temos
muitos muros por derrubar. O primeiro ainda é para nós aquele que nos separa da
total liberdade de expressão. O segundo é o da desconfiança que sentimos uns
dos outros e que nos impede de avançar. Desconfiamos da água que bebemos, até
do chão que pisamos. Desconfiamos da nossa própria fotografia. Não há ninguém
que seja suficientemente idóneo, suficientemente íntegro. É como se Angola
fosse um intrincado labirinto de moradias com telhados de vidro.
A
integridade não é dos valores mais apreciados no nosso país. Não queremos ser
íntegros. Queremos ter sucesso pessoal, vencer na vida. Não existe um entorno
inspirador, verdade seja dita. Mas talvez nos penduremos demasiado nessa
carência de referências para desculparmos os nossos próprios pecados.
Talvez
devamos começar a pensar em andar pelos próprios pés e não ficar à espera de um
salvador da pátria. Não precisamos de ser salvos. Precisamos assumir o papel
que nos toca, vestir a nossa responsabilidade como cidadãos de Angola, em 2015.
Ninguém vai derrubar muros por nós.
Se
insistem em dizer que Angola é um país democrático, terão de nos ouvir gritar
que estamos cansados de não ver os nossos direitos respeitados. Estamos
cansados da falta de transparência, do afilhadismo, das consequências, da
corrupção, da impunidade, da falta de compromisso. Enfim, estamos cansados do
medo.
O
rio acumula caudal. As marés vão e voltam. Por vezes, é preciso escolher em que
margem da História queremos erguer o nosso castelo.
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