Expresso
das Ilhas (cv), editorial
Em
mais um Dia da África, o 25 de Maio, o foco da atenção do mundo recai sobre o
futuro do continente. As tragédias dos naufrágios no Mar Mediterrâneo com
perdas de milhares de vidas vieram lembrar os problemas terríveis com que se
debatem as populações. É facto que em várias regiões do continente, a falta de
autoridade do estado, junta-se aos extremismos religiosos, à violência étnica e
a desastres naturais para empurrar milhares para migração clandestina para
Europa. Mas, apesar da crise humanitária que se seguiu, não se nota o regresso
ao afro-pessimismo dos anos passados. A África é hoje visto como um continente
do futuro. A prestigiada revista britânica Economist já não se refere à África
como o continente sem esperança (hopeless) mas sim como o continente promissor (hopeful).
Declarado
em vários círculos do capital internacional como “a última fronteira”, a África
tem merecido recentemente de países como a China, Índia e o Japão um interesse
redobrado. Interesse que não fica pela exploração dos minérios e do petróleo,
mas vai mais além para outros sectores da manufactura, energia e serviços
diversos em particular nas áreas de informação e comunicação. Os potenciais
parceiros económicos já não são somente as antigas potências coloniais e a
América. Em tempos de globalização, a possibilidade de desenvolver múltiplas e
complexas ligações económicas com todos os outros continentes são muito maiores
e as potencialidades são imensas. O crescimento em média de 5 % nos últimos
anos deve-se à maior capacidade de atracção do investimento directo estrangeiro
e ao aumento das exportações para o qual tem contribuído grandemente a dinâmica
das economias dos países emergentes, os BRICS.
Várias
razões concorrem para justificar porque os países africanos ficaram atrás quando
comparados com os países asiáticos. Nos princípios da década de sessenta não
havia muita diferença entre o rendimentoper capita da Coreia do Sul, da
Singapura e de Taiwan e o do Gana, Nigéria ou Costa do Marfim. Girava tudo à
volta dos 200, 300 dólares anuais. Porquê, então, hoje só se pode falar de
tigres asiáticos e não de leões africanos. Um factor de peso que contribuiu
para que o resultado fosse diferente num caso e noutro foi certamente a
natureza e qualidade da liderança.
As
opções de política económica no caso de vários países asiáticos permitiram-lhes
criar uma capacidade endógena de criação de riqueza. Na África, pelo contrário,
houve países que se contentaram em viver dos recursos naturais como
minérios e petróleo. Outros que não tinham tais recursos desenvolveram a
capacidade de explorar o filão da ajuda internacional. Também na Ásia apostaram
no sector privado e nas exportações e as consequências viram-se: ganharam em
competitividade, aumentaram a produtividade, criaram uma classe média alargada
e retiraram milhões de pessoas da pobreza. Enquanto isso, na África faziam-se
experiências do socialismo africano, enveredava-se pelo caminho da crescente
estatização da economia, não se promovia o sector privado nacional e
incentiva-se a economia informal. É evidente que daí só podia vir pobreza das
populações e crescente vulnerabilidade do país em relação aos choques naturais
ou de outra natureza. Interessante notar que mesmo quando, num caso e noutro,
africano ou asiático, os regimes não eram democráticos mas sim autoritários as
lideranças primaram por fazer opções abismalmente diferentes.
Os
“libertadores” em vários países africanos sempre quiseram perpetuar o poder que
receberam no momento da independência. Para renovar a legitimidade histórica tiveram
que, por um lado, alimentar o sentimento de vítima do colonialismo e a memória
dos seus horrores como a escravatura e, por outro, impedir efectivamente que as
pessoas e a sociedade ganhassem autonomia a ponto de exigir responsabilidade à
governação do país e renovação dos governantes via métodos eleitorais
democráticos. Em nome do Poder sem controlo sacrificaram os seus países com a
perda de múltiplas oportunidades de se industrializarem, deixaram milhões na
miséria e promoveram uma postura de assistencialismo e dependência que a prazo
se tornou num dos maiores obstáculos ao desenvolvimento. Na Asia foi diferente.
Os governos mesmo autoritários de Coreia do Sul, de Singapura ou mesmo da China
procuraram relegitimar-se fazendo os seus países crescer a taxas elevadíssimas
durante décadas seguidas.
Felizmente
que nesta segunda década do século 20 há fortes sinais que em muitos países
africanos se quer ultrapassar os constrangimentos do passado e a partir daí
construir um futuro integrado no mundo numa perspectiva em que o que realmente
conta são os factores de competitividade, produtividade e inovação. O volume
crescente de investimento directo estrangeiro em direcção à África é um sinal
forte de que se está no bom caminho. Mas como disse Mo Ibrahim numa entrevista
à revista Foreign Affairs o fundamental para o futuro da África é o Estado
de direito democrático e a afirmação do primado da lei. A actividade privada e
o empreendedorismo dependem disso. E o futuro também.
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