José
Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião
A
semana que passou talvez fique na História de Angola como o início do fim do
longo reinado de José Eduardo dos Santos. Nas redes sociais, centenas de
angolanos manifestaram-se contra a prisão dos jovens democratas. Artistas e
intelectuais que até à data têm evitado manifestar a sua opinião, ou que sempre
se posicionaram a favor do partido da situação, vieram a público dar conta da
sua surpresa e da sua repulsa.
O
discurso de José Eduardo dos Santos, afirmando que os jovens presos estariam a
preparar um Golpe de Estado, e comparando o mesmo aos trágicos acontecimentos
de 27 de Maio de 1977, veio dar força à ala mais reaccionária do MPLA, abrindo
espaço para uma vaga repressiva e para um ciclo infindável de violência
política. É um passo que não tem recuo. José Eduardo dos Santos teria de provar
a tese do golpe de forma convincente, o que, como todos sabemos, não é
possível. Ninguém em Angola acredita num tal disparate. Se os jovens forem
libertados por ausência de provas, é o próprio presidente quem agora passará
por aldrabão – além de ditador. Se não forem libertados irá dar-se início a um
ciclo de protestos, prisões, mais e mais protestos, mais prisões e ainda mais
protestos.
À
instabilidade política criada pela irracionalidade do discurso presidencial soma-se
a degradação da economia, e o consequente aprofundar do fosso social. Estamos,
portanto, a caminho da tempestade perfeita.
A
prisão dos jovens, e o discurso presidencial, constituem um verdadeiro
separador de águas. A partir de agora já não se justifica o silêncio. Ou se
está a favor da ditadura, ou se está do lado da paz, da democracia, da
estabilidade e da justiça social.
Volto
a ouvir o discurso do Presidente da República. Ouço depois as justificativas
esfarrapadas e intelectualmente miseráveis de quem ainda o apoia, como o
deputado João Pinto. Diz João Pinto que o facto dos jovens terem em sua posse
uma lista de um futuro governo de unidade nacional é prova de que pretendiam
derrubar o actual executivo. Há mais de trinta anos que me entretenho a imaginar
a composição de eventuais governos democráticos. Eu e muitos amigos meus.
Juntos e separados. Se fosse possível substituir governos dessa maneira, ou
seja, imaginando governos melhores, José Eduardo dos Santos não teria sequer
chegado à Presidência da República. João Pinto, coitado, nunca teria chegado a
deputado. Infelizmente não é possível derrubar ditaduras por telepatia ou
através de um esforço de imaginação, individual ou colectivo. Numa das minhas
próximas crónicas apresentarei o meu governo de unidade nacional. Por ora quero
apenas lançar um derradeiro apelo àqueles que, no interior do partido no poder,
têm ainda um resto de dignidade, de amor a Angola, de inteligência e de senso
do real: juntem-se e encontrem uma alternativa a José Eduardo dos Santos. José
Eduardo dos Santos acabou. Chegou ao fim.
Devolvam-nos
Angola!
Se
for para continuar assim vão ter de prender muita gente. Um destes dias terão
de me prender também a mim. Cometi todos os crimes de que Luaty e os seus
companheiros são acusados. Cometi esses crimes ao lado deles. Quero uma Angola
democrática, quero um governo preocupado em resolver as grandes injustiças
sociais. Quero um governo preocupado em pacificar e não em dividir e criar o
ódio.
Prendam-me!
Eu também penso, logo, resisto!
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