segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Angola. O MEU GOVERNO DE SALVAÇÃO NACIONAL



José Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião

Luaty Beirão e respectivos companheiros estão presos há mais de dois meses. O tempo passa, e muitos de nós vão-se habituando à injustiça, aceitando-a como algo inevitável, uma componente natural da vida, em toda a parte e em particular no nosso país. A verdade, contudo, é que uma arbitrariedade que se prolonga no tempo não se torna por isso menos arbitrária – pelo contrário, torna-se mais grave a cada dia.

Seria muito triste se o movimento de solidariedade que se criou ao longo destes meses viesse a esmorecer. O regime espera isso, ao mesmo tempo que se esforça por castigar todos aqueles que se insurgiram contra a injustiça. Paulo Flores, que deu a cara no primeiro vídeo de solidariedade para com os jovens presos políticos, terá sido uma das primeiras vítimas desta atitude. A ser verdade a notícia segundo a qual o regime “desconvidou” o cantor das comemorações dos 40 anos da independência, e que se está a movimentar para impedir outros contratos, isto não é só grave, de um ponto de vista moral e ético, como é também incrivelmente estúpido, de um ponto de vista estratégico. Paulo Flores tem uma carreira que fala por si. É um dos cantores e compositores mais populares de Angola. Ao censurar Paulo Flores por delito de opinião o regime de José Eduardo dos Santos comete um atentado contra a cultura e ofende certamente muitas dezenas de milhares de angolanos. Se houvesse democracia em Angola eu diria que com um gesto destes o MPLA estaria a perder um número impressionante de eleitores. Perder eleitores, porém, não é uma preocupação do MPLA. O MPLA, como todos sabemos, não precisa de eleitores para ganhar eleições. Aperfeiçou a sua versão de “democracia especial” de forma a prescindir dos eleitores. Os eleitores são um aborrecimento próprio das democracias burguesas – nunca se sabe em quem irão votar.

Sem surpresa, a “mãenifestação” da passada sexta-feira foi dispersa à força pela polícia política. Sem surpresa, o regime encheu as ruas com alguns milhares de “manifestantes profissionais”, pagos para festejarem o aniversário de José Eduardo dos Santos, e apagarem os descontentes.

Enquanto José Eduardo dos  Santos e a sua família festejam, o preço do barril de petróleo continua a cair. Centenas de empresas estão à beira da falência. A inflação sobe, e em breve estará incontrolável. Os médicos, nos hospitais públicos, já se confrontam com carências básicas. A agitação social deixou de ser uma possibilidade académica.

Quando a tempestade chegar José Eduardo dos Santos compreenderá que está mais prisioneiro no seu palácio, do que Luaty Beirão na sua cela. Nessa altura talvez pense em como seria bom ter um governo de unidade nacional, formado por algumas das pessoas que estavam na famosa lista apreendida aos jovens democratas: Justino Pinto de Andrade, Alexandra Simeão, Rafael Marques, Filomeno Vieira Lopes e tantos outras pessoas honestas, competentes e credíveis que este país tem vindo a desperdiçar. Para ele será tarde demais. Para nós, talvez não.

1 comentário:

Moz Indignado disse...

Entristece-me pensar que os "libertadores" em Angola e Mocambique, afinal nao passam de auto libertadoes. Nestes Paises, hoje, digo que vale o colono portugues (estrangeiro) que os actuais colonos autotones, insensiveis ao sofrimento dos outros compatriotas.
Me doi mas eles merecem os povos que (des)governam ou dominam.

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