terça-feira, 4 de agosto de 2015

Portugal. O PRIMEIRO-MINISTRO PREOCUPA-ME



Mariana Mortágua – Jornal de Notícias, opinião

Fez ontem um ano que o BES foi intervencionado de urgência, depois dos prejuízos do banco terem sido anunciados com estrondo no dia 30 de julho de 2014. Nunca, a esse respeito, ouvimos uma palavra de preocupação do primeiro-ministro. Muito pelo contrário, quinze dias antes da falência do BES, Passos Coelho garantia: "0s depositantes têm razões para ter toda a confiança quanto à segurança que o Banco Espírito Santo oferece às suas poupanças". É hoje relativamente claro que o valor de venda do Novo Banco não compensará o montante injetado pelo Estado, ou melhor, emprestado pelo Estado ao Fundo de Resolução, ou seja, aos bancos. E também já sabemos, porque os próprios o disseram, que, caso a coisa corra mal, os bancos não vão pagar a sua dívida ao Estado, pelo menos não sem uma reestruturação. Mas nunca, a este respeito, ouvimos uma palavra de preocupação do primeiro-ministro.

Em abono da verdade, sobre as liberalidades recebidas por Ricardo Salgado, sobre os milhões de origem desconhecida repatriados nos sucessivos RERT (amnistias fiscais), sobre o rasgar da garantia soberana do Estado angolano ao BESA, sobre nada disto ouvimos uma palavra de preocupação do primeiro-ministro.

Em abono da verdade, um primeiro-ministro que não se preocupa com o que deve é motivo de preocupação, ainda mais quando se diz preocupado com alguma coisa. E por isso digo, o primeiro-ministro preocupa-me. Era suposto que Passos soubesse que o Estado é acionista único da Caixa Geral de Depósitos, e que, por isso, mandar "recadinhos" pela Comunicação Social sobre a situação financeira do banco público é errado, e irresponsável. Mas será que não sabe?

Passos deve saber que o prazo para a devolução do montante injetado na Caixa sempre foi 2017, e que nunca houve previsão de um pagamento antecipado. Nada de novo, portanto. Também deve saber que a Caixa foi um importantíssimo amortecedor da economia e do sistema financeiro português durante os últimos anos e que, apesar disso, apresentou lucros de 47 milhões de euros no semestre, e teria sido mais se não tivesse vendido a Fidelidade. Por falar em preocupação, valeria a pena ver o que aconteceu à antiga seguradora pública, usada para financiar a sua própria compra pelo fundo Chinês Fosun.

O primeiro-ministro preocupa-me, não porque não saiba tudo isto, mas porque há muito que sabemos do seu plano para vender a Caixa. Enfraquecê-la é uma estratégia. E isso não podemos aceitar.

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