quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Portugal. O GOVERNO DA ESQUERDA



Pedro Bacelar de Vasconcelos – Jornal de Notícias, opinião

Faltava apenas este pequeno passo. Um passo pequeno para o Presidente da República, que finalmente dá posse ao novo Governo! Um passo de gigante para António Costa, porque recai sobre os seus ombros a responsabilidade de concretizar a promessa por que se bateram todas as forças políticas da Esquerda que apoiam o Governo do PS: o compromisso de inverter o rumo de destruição económica, social, cultural e cívica que a Direita pretendia perpetuar, contra uma vontade democrática exuberantemente atestada pelo resultado das eleições para a Assembleia da República do passado dia 4 de outubro.

Foram precisos 40 anos para que a Esquerda se reencontrasse. Tratou-se, na verdade, de reatar uma comum tradição de rebeldia que alimentou a resistência contra a ditadura de Oliveira Salazar e Marcelo Caetano, contra as guerras de África - injustas e inúteis - contra a subserviência e o medo, contra a resignação à fatalidade da pobreza e da ignorância. Um reencontro que se inspirou nos valores partilhados da liberdade e da igualdade, gravados a fogo na Constituição de abril.

O Governo que hoje inicia funções é um governo de combate, destinado ao cumprimento de uma missão de "alto risco" - acudir, de imediato, à urgente "recuperação das condições de vida" miseráveis que o Governo da Direita infligiu à generalidade da população portuguesa, conforme sublinhava o Presidente do Grupo Parlamentar do PS, Carlos César, na passada terça-feira.

É uma equipa coesa e empenhada, em sintonia com o seu programa de Governo, envolvida na sua conceção e na construção dos indispensáveis consensos com os partidos políticos que vão garantir, no Parlamento, a maioria necessária para conduzir a bom porto o projeto político em que se traduz esta viragem histórica. Uma tarefa, enfim, que terá de ser cumprida e inteligentemente articulada em duas frentes distintas: na prática governativa e no trabalho parlamentar.

Os desafios são muitos e a sua complexidade é elevada. No plano interno, há danos irreparáveis e outros de difícil ou morosa solução, condicionada por múltiplas interdependências no quadro da economia global e das instituições europeias de que fazemos parte. O projeto da construção europeia confronta-se com uma perversa descrença na generosidade dos seus propósitos fundadores, nos valores da solidariedade e do respeito pela dignidade humana, nas promessas de paz e de prosperidade que lhe valeram o prestígio e o reconhecimento dos outros povos. Esmoreceu a esperança que os povos vizinhos depositavam nos europeus, flagelados por guerras que os obrigam a abandonar os seus territórios e desprezados por uma Europa desconfiada e mesquinha que resiste a dar-lhes acolhimento.

Os recentes atentados terroristas vieram incendiar velhos medos e preconceitos que ameaçam as grandes aquisições civilizacionais arduamente conquistadas após a Segunda Guerra Mundial. É missão indeclinável do Governo da Esquerda enfrentar as terríveis ameaças que impendem sobre nós e os nossos vizinhos, que colocam em sério perigo as nossas instituições, alteram os nossos modos de vida e degradam o próprio regime democrático. É a hora!

*Deputado e professor de direito constitucional

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