Os
comentaristas de serviço dedicam-se a prever que governo sairá de um parlamento
no qual a coligação vencedora obteve apenas uma maioria relativa, 104
deputados. O Presidente da Republica, que se comportou como um aliado do
governo, vai agora incumbir Passos Coelho de formar governo. Mas que governo?
Como escreveu o director executivo do semanário de direita Expresso, a vitória
do PSD-CDS «só chega para um governo provisório».
A
aliança PSD-CDS foi a força mais votada nas eleições legislativas, mas teve uma
quebra de quase 750 mil votos em relação a 2011, perdendo a maioria absoluta.
A
campanha da coligação reacionária intitulada «Portugal à Frente», apoiada
ostensivamente pela maioria dos órgãos de comunicação social, excedeu em
demagogia, hipocrisia e mentiras as anteriores de Passos & Portas. Chocante
foi também a cobertura oferecida aos micro-partidos dos quais apenas o PAN
elegeu um deputado.
As
televisões, as rádios e os jornais ditos de referência subscreveram a tese
oficial de que não havia alternativa para a austeridade. Não negaram que
Portugal está mais endividado e empobrecido, que os objetivos da parceria
PSD-CDS não foram atingidos, que o deficit em 2014 (com o rombo do adiamento da
venda do Novo Banco) era afinal o mesmo de 2011, mas evitaram responsabilizar o
governo. De modo geral, a situação catastrófica do Pais foi falsamente
atribuída ao funcionamento de leis da economia e da finança que atingiram
também outros povos.
Passos,
Portas e os seus candidatos enalteceram com despudor a sua obra devastadora.
Citaram tantas vezes a Irlanda e a Grécia que as citações massacraram os
eleitores quase como um refrão.
Coincidiram
nos insultos ao povo grego, mas abstiveram-se de reconhecer que a Irlanda
reduziu com êxito as exigências de Bruxelas enquanto aqui o governo foi mais
longe do que lhe era pedido no sinistro memorando.
Não
ousaram confessar o óbvio, a determinação de prosseguir a política que arruinou
o país. Abstiveram-se falar do seu programa de governo e da estratégia que
anunciaram à União Europeia.
A
ministra das Finanças, candidata por Setúbal, chamou a atenção pelo seu estilo
melífluo. Ela, que não costuma sorrir, abriu-se desta vez em sorrisos. Terá
estabelecido um recorde de mentiras com o discurso tecnocrático em que virou do
avesso a realidade, negando fraudes de que foi cúmplice, falsificando números,
e apresentando como grandes vitórias e sábias decisões os atos governativos que
conduziram o Pais à ruína.
Passos
falou como um cônsul romano em vésperas de ser aclamado pelo Senado. O seu
triunfalismo arrogante apresenta já matizes patológicos.
Portas, hoje descredibilizado mesmo no seio da família coligada, passeou ombro
a ombro com Passos, de Norte a Sul, com ou sem chapéu, distribuindo promessas e
fugindo a vaias.
A
CDU – cujo núcleo fulcral é o PCP - fez uma grande campanha. Os seus comícios e
arruadas atraíram multidões. O entusiasmo que envolveu o candidato comunista de
Norte a Sul do Pais foi transparente. Mas a eleição de 17 deputados - mais um
do que na anterior legislatura - ficou aquém da expectativa.
O
Bloco de Esquerda - mérito de Catarina Martins, inteligente e simpática -
elegeu 19, um resultado que meses atrás era imprevisível. Partido sem ideologia
definida, o BE beneficiou do voto de socialistas frustrados e de eleitores
potenciais da CDU.
O
QUE VAI ACONTECER
Os
comentaristas de serviço dedicam-se agora a prever que governo sairá de um
parlamento no qual a coligação vencedora obteve apenas uma maioria relativa,
104 deputados. Dos 9 439 651 eleitores inscritos votaram nela somente 2 071 376
(a abstenção foi levemente superior a 43%).
O
Presidente da Republica, que se comportou como um aliado do governo, vai agora
incumbir Passos Coelho de formar governo.
Mas
que governo? Como escreveu o diretor executivo do semanário de direita
Expresso, a vitória do PSD-CDS «só chega para um governo provisório».
O povo português pronunciou-se nas urnas contra a política da coligação
reacionária. Os três partidos da oposição elegeram 121 deputados e a aliança
PSD-CDS apenas 104 (falta apurar os 4 da emigração).
Existe
portanto agora no Parlamento uma maioria que teria força suficiente para
viabilizar uma mudança no rumo da sociedade portuguesa. No entanto, ela não ocorrerá
porque o PS não a deseja e prefere negociar com o PSD-CDS.
Passos
revelou temor do futuro. Apressou-se aliás a lançar um apelo à cooperação do
PS, sublinhando que sem ela as suas «reformas» não serão possíveis.
No momento é imprevisível o que vai acontecer nas próximas semanas.
Mas
o discurso de António Costa, ontem, foi ambíguo. Se respeitasse compromissos
assumidos durante a campanha, o PS não deixaria passar no Parlamento um governo
PSD-CDS.
Mas
o próprio emprego contraditório que na sua fala fez do verbo «inviabilizar» não
justifica a esperança de uma política de firmeza perante as forças lideradas
por Passos & Portas.
LIÇÕES
DAS ELEIÇÕES
Que
ensinamentos extrair destas eleições?
Em
primeiro lugar cabe perguntar por que não castigou o eleitorado severamente nas
urnas os partidos responsáveis pela ruina do Pais? Como explicar que quatro
décadas apos o 25 de Abril mais de dois milhões de portugueses tenham concedido
uma maioria parlamentar relativa a uma aliança de direita que assume posições
ideológicas aparentadas com o fascismo?
A
resposta a essas perguntas conduz a uma conclusão dolorosa.
As
novas gerações de portugueses têm muito pouco de comum com aquela que tornou
possível Abril e soube depois defender com firmeza as suas grandes conquistas
sociais.
Hoje
o nível de consciência de classe e de consciência política da maioria dos
portugueses é muito baixo. A sociedade mudou profundamente. A ideologia do
capitalismo, sob o bombardeamento esmagador da classe dominante, sobretudo após
a entrada de Portugal na União Europeia, fez estragos devastadores.
Não estamos perante um caso único. A História apresenta-nos situações
similares. Na Rússia, por exemplo.
A
grande geração da Revolução de Outubro, que a defendeu com heroísmo, e a
seguinte, que resistiu vitoriosamente à agressão do Reich nazi e fez da União
Soviética a segunda potência mundial, não tiveram continuidade. Os filhos e
netos dos revolucionários de Outubro acompanharam passivamente a ofensiva
contrarrevolucionaria de Gorbatchov e Ieltsin e do imperialismo que destruiu a
URSS, reimplantando na Rússia o capitalismo.
Como
comunista sou e continuarei a ser otimista. O sistema capitalista não é
reformável por desumano e está condenado a desaparecer.
O
resultado das eleições foi insatisfatório. Estavam reunidas condições
objectivas para se infligir uma derrota esmagadora às forças que ocupam o
poder. Faltavam porém as subjectivas.
Mas,
como afirmou odiario.info na sua NOTA DOS EDITORES, é na força criadora das
massas populares que o povo português encontrará a saída para o desfecho das
eleições.
*O
Diário.info