sábado, 5 de dezembro de 2015

Portugal. ALMOFADA, VÍRGULA



Domingos de Andrade – Jornal de Notícias, opinião

Esta é a história de uma almofada. Criada com amor ao longo de um ano. Invocada com zelo. Protegida com carinho. Era uma almofada emprestada. E a cobrar juros. Era uma almofada, agora com vírgula. Porque não é mais. Mas já lá vamos.

Comecemos pelo início da história. Embora já saibamos como tudo isto começa. E como termina. A invocar necessidades orçamentais, para apertar o garrote de quem paga impostos. Porque há esqueletos verdadeiros a saltar. No meio dos inventados.

Neste novo ciclo, o arremedo à herança começou cedo. Primeiro, a alegada não inscrição do primeiro-ministro António Costa para discursar na Cimeira do Clima, que decorre em Paris. Notícia veiculada por fontes do PS, desvalorizada pelo Governo, desmentida pelo PSD.

Segundo, o Orçamento do Estado, cujas bases básicas (a redundância é propositada, todas as redundâncias deste texto o são), como as despesas de funcionamento dos ministérios, não teriam sequer sido inscritas pelo anterior Executivo. Notícia veiculada por fontes do PS, desvalorizada pelo Governo, desmentida pelo PSD.

Até aqui, tudo bem. Serve o entretenimento mediático para tornar uns bons em maus e uns maus em bons. Ganha-se graça assim, com outros a cair em desgraça.
Venham, então, os esqueletos verdadeiros. Um já está cá fora. E é sério. Sobre a tal almofada, vírgula. Porque não foi veiculado pelas fontes do PS, não pode ser ignorado pelo Governo, nem desmentido pelo PSD.

As contas são da independente Unidade Técnica de Apoio Orçamental. Andaram confortáveis as finanças do país até outubro. Mas fizeram-se mal as contas. De repente, gastou-se mais em salários e poupou-se menos com rescisões amigáveis no Estado. Soma-se a isso uma derrapagem na despesa com a aquisição de bens e serviços. E lá se foi a tal almofada para ajudar o défice a ficar abaixo dos 3%. Aqui, não leva vírgula.

O que não se percebe é como é que um Governo que faz dos números rigor (muito se defendeu nestas linhas esse caminho) tenha previsto tão mal o desenrolar da execução orçamental. Como não é crível que o mesmo Governo acreditasse com segurança que uma percentagem considerável da sobretaxa fosse devolvida.

Ainda há de haver mais esqueletos. Verdadeiros e inventados. Mas agora passaremos a acreditar em todos. Porque este é pesado.

É sempre assim. Governo, sim; Governo, sim senhor. E depois queixam-se do descrédito da política. Do descrédito dos políticos. Da falta de participação cívica. Da abstenção. E da conversa de café, vertida em letra de Imprensa.

Conversa, vírgula.

*Diretor-Executivo

Portugal. Ela hesita, ele tem certezas. Sampaio da Nóvoa votará em Maria de Belém



Candidato socialista estranha a “hesitação” de Maria de Belém e admite que é nela que votará caso não chegue à segunda volta das eleições presidenciais.

Se um hesita na hora de desvendar o seu voto caso não passe à segunda volta nas eleições presidenciais, ao outro restam poucas dúvidas.

Depois de ontem Maria de Belém ter dito, numa entrevista à Antena 1, que “provavelmente” votará em Sampaio da Nóvoa nas eleições presidenciais (no caso de ser derrotada na primeira volta), foi a vez de o antigo reitor da Universidade de Lisboa retribuir.

O candidato socialista fê-lo, contudo, com maior afinco. Ao Público, Sampaio da Nóvoa admitiu: “Estou absolutamente convencido de que vou passar à segunda volta”. Se tal não acontecer, votará “sempre, e em todas as circunstâncias, no candidato alternativo a Marcelo Rebelo de Sousa”.

O candidato disse mesmo estranhar a hesitação da socialista. “Foi dada uma ideia de hesitação, de ‘provavelmente’. Para mim não é uma probabilidade, é uma surpresa. Surpreende-me muito que a dra. Maria de Belém não exclua a possibilidade de votar em Marcelo, mais a mais numa semana em que este se prepara para receber o apoio formal de Passos Coelho e Paulo Portas”, afirmou.

Notícias ao Minuto

Portugal. EM DOIS MESES, TRÊS FRAUDES ELEITORAIS DA DIREITA “CAÍRAM”



A porta-voz do BE, Catarina Martins, afirmou sexta-feira, que em dois meses "caíram" três "fraudes eleitoras" da direita: a devolução da sobretaxa, a trajetória de crescimento e "agora" a teoria dos "cofres cheios".

Segundo dados da Unidade Técnica de Apoio Orçamental, a que a Lusa teve queinta-feira acesso, o anterior Governo gastou em novembro pelo menos 278,3 milhões de euros da almofada financeira de 945,4 milhões de euros prevista no Orçamento do Estado para 2015 (OE2015), o equivalente a 30% daquele montante.

"Há a expressão de o último a sair que feche a luz, neste caso, o Governo a sair tentou levar a lâmpada", considerou Catarina Martins.

Para a porta-voz do Bloco, depois das eleições de 04 de outubro, os números da economia portuguesa estão a desmentir as bandeiras eleitorais da coligação PSD/CDS-PP.

"A sobretaxa que ia ser devolvida em 35%, afinal é zero. Depois, era a economia que ia crescer e eis que não quando vieram os dados do 3.º trimestre, que embora algumas pessoas do PSD e CDS não saibam, é antes de outubro ficamos a saber que a economia em Portugal estava estagnada porque o investimento caiu, continuou a cair e não foi pouco", referiu.

E depois, "eis que não quando, vêm os cofres cheios. Dizia Maria Luís Albuquerque que estavam lá 700 mil milhões de euros para proteger o país do que pudesse acontecer com a dívida, com os juros. E afinal nem 70. São 60", apontou em último.

"Em menos de dois meses, três fraudes eleitorais da direita a cair, a sobretaxa não é devolvida, a economia não está acrescer e os cofres estão vazios", resumiu.
Lusa, em Notícias ao Minuto

Portugal. Contrato 'escondido' pode obrigar portugueses a pagar mais portagens



A Infraestruturas de Portugal (IP) nasceu da fusão da REFER com a Estradas de Portugal, em junho deste ano.

Os portugueses poderão ter de vir a pagar mais portagens ou, como alternativa, poderá ser o Orçamento do Estado a assumir mais despesa com autoestradas.

A informação é revelada pela TVI, que teve acesso a um novo contrato de concessão preparado pela Infraestruturas de Portugal e do qual o Executivo de Passos Coelho teria conhecimento.

O contrato em causa prevê novas formas de financiamento, que podem passar pela introdução de portagens em vias com perfil de autoestrada. Os troços da A3 e da A4, no Porto, por exemplo, estarão incluídos neste leque de vias que podem ser portajadas.

No caso de não haver lugar a portagens, o contrato refere que quilómetros seriam cobrados diretamente ao Orçamento do Estado, mantendo-se assim um princípio de outras Parcerias Público Privadas (PPP).

O mesmo documento aponta para que, os custos operacionais entre 2020 e 2099, seriam da responsabilidade do Estado. Já as receitas estariam garantidas à empresa até ao final do século.

À TVI, a Infraestruturas de Portugal diz que “não comenta documentos de caráter interno”, realçando que “a definição da política de portagens não é da competência da IP.

Recorde-se que a Infraestruturas de Portugal foi criada através da fusão da REFER com a Estradas de Portugal. Na altura, o então secretário de Estado Sérgio Monteiro, que voltou a ser notícia recentemente pelo alegado ordenado de 30 mil euros com o objetivo de vender o Novo Banco, defendeu que o objetivo seria tornar a Infraestruturas de Portugal sustentável, para se poder privatizar no futuro.

Notícias ao Minuto

CABOVERDIANO 47 DIAS PERDIDO NO MAR FOI ENCONTRADO NA COSTA DO BRASIL - com fotos



Depois de 47 dias perdido no mar, Juvenal só quer regressar a casa

Fernanda Barbosa, da agência Lusa

São Paulo, 04 dez (Lusa) -- Depois de ter andado à deriva no mar durante 47 dias e de ter sido resgatado em Santos, Brasil, o pescador cabo-verdiano Juvenal Ferreira Mendes, só pensa no regresso à casa que pensava já não voltar a ver.

"O que eu quero é chegar ao pé dos meus familiares todos, meu bebé está com quase três anos, estou com saudade delas", disse o pescador, de 52 anos, que tem 12 filhos.

Em entrevista à Lusa, no Consulado Honorário de Cabo Verde em São Paulo, recorda os dias em que viveu somente do pescava à espera de alguém que reparasse no seu pequeno barco.

"A parte mais difícil foi quando vi o navio passar, fiz sinal, [mas] não me vê, nem me salva. Fiquei assim, mais ou menos desanimado", afirmou, sobre as cerca de 15 embarcações que passaram por ele no caminho.

Juvenal Ferreira Mendes, nascido em São Tomé e Príncipe, mora na ilha de Santiago, mas pescava na Boa Vista quando se perdeu, há sete semanas.

O vento rasgou a vela e o vento empurrou a embarcação para o mar alto. Quando tentava regressar, o motor ficou sem combustível e ficou à deriva no meio do Atlântico.

Na última terça-feira, foi resgatado pelo navio Ouro do Brasil, de bandeira libanesa, a cerca de 300 quilómetros da costa brasileira, entre os Estados do Amapá e Pará, no norte do país. Na sexta-feira à noite, dirigiu-se ao aeroporto de São Paulo para apanhar o voo de volta para casa, com escala em Fortaleza, no nordeste brasileiro e deve regressar à Praia, em Cabo Verde, na noite de hoje.

Para comer, cozeu peixes na água do mar e bebia água da chuva. No entanto, nunca desistiu: "Tinha fé que ia ser salvo", disse.

A volta de Ferreira Mendes a Cabo Verde foi financiada pela empresa brasileira representante do navio que o resgatou e atracou na cidade de Santos, litoral do Estado de São Paulo, na quarta-feira.

O pescador afirmou à Lusa que não sabia que estava no caminho do Brasil e nem contou os dias que ficou a um mar onde quer regressar em breve.

"Vou voltar a pescar, é minha profissão desde 14 anos de idade. Pesquei até agora e vou continuar a pescar", justificou.

O cônsul honorário de Cabo Verde em São Paulo, Emannuel Rocha, afirmou que este não é caso único, já que as correntes fortes empurram as embarcações cabo-verdianas com facilidade.

O último caso, disse, ocorreu em 2004, com quatro pescadores (um não sobreviveu).

"Uma das lendas ou histórias de pescadores diz que Pedro Álvares Cabral estava a Caminho das Índias quando foi apanhado por essa corrente marítima, e acabou no Brasil", disse Rocha.

O cônsul realçou que os pescadores experientes, que sabem que não devem tomar água do mar, apenas da chuva, e que conseguem se alimentar dos peixes no caminho, sobrevivem à travessia até o Brasil, que dura entre um e dois meses.

FYB // PJA - Lusa

CABO VERDE TEM CERCA DE 20 MIL IMIGRANTES LEGAIS - Governo



Cabo Verde tem neste momento com cerca de 20 mil imigrantes legalizados, avançou hoje à Lusa a diretora-geral da Imigração cabo-verdiana, indicando que serão criadas condições para registar os cerca de 10 mil imigrantes ainda ilegais.

Em declarações à Lusa no âmbito da sexta reunião do Conselho Nacional de Imigração (CNI), Carmen Barros indicou que até 2014 os dados do Instituto Nacional de Estatísticas (INE) apontavam para cerca de 18 mil imigrantes, mas o processo de regularização extraordinária, que foi de janeiro a abril últimos, abrangeu mais 1.058 estrangeiros.

A responsável salientou, entretanto, que a nova lei abre espaço para a regularização contínua de imigrantes, que neste momento representam quase 4% da população residente em Cabo Verde.

"As pessoas que não foram contempladas é porque não conseguiram entregar os documentos a tempo. Por isso, o nosso desafio é desenvolver outras formas para regularizar os imigrantes", disse a diretora-geral, indicando que os problemas dos imigrantes em Cabo Verde continuam a ser a regularização e a documentação.

Carmen Barros disse que o Governo tomou medidas, a nível técnico, político e administrativo, para uma melhor integração dos imigrantes, como a realização de um estudo no ano passado que concluiu que 80% dos imigrantes inquiridos tem um nível de "satisfação elevado" no país.

A reunião do CNI acontece uma altura em que acontecem fluxos migratórios e uma vaga de refugiados na Europa, tendo Carmen Barros adiantando que Cabo Verde está a se preparar para que a gestão da imigração seja "bem feita", para "evitar a exclusão" e para que o Estado tenha controlo do seu território em matéria de permanência de imigrantes.

A responsável disse à Lusa que a tomada de medidas e a criação de condições diminui os riscos de situações como as dos refugiados e que o país deve ter uma "coerência" de imigração, tanto dentro como para as comunidades lá fora.

Durante o CNI, foi apresentado os resultados de três anos do projeto de integração social dos imigrantes, um dos pontos da Estratégia Nacional de Imigração, implementada desde 2012, que contempla formação, empoderamento e financiamento das associações de imigrantes.

Em declarações à Lusa no âmbito da reunião, o presidente da Plataforma das Comunidades Africanas, Tony Parker, disse que Cabo Verde está em "bom caminho" no que diz respeito à integração dos imigrantes após a implementação das políticas para o setor.
"Em termos de políticas de imigração, Cabo Verde está à frente na nossa sub-região", avaliou Tony Parker, para quem, além da falta de condições, um dos problemas que atrasa a legalização dos imigrantes é a obtenção dos documentos do país de origem.

RYPE // VM - Lusa

PGR da Guiné-Bissau ordena suspensão de programa de debate na rádio estatal



O Procurador-Geral da República da Guiné-Bissau, António Sedja Mam, ordenou a suspensão de um programa de debate da Rádio Difusão Nacional (RDN), devido à "situação político-social" no país, anunciou em ofício.

"É temporariamente suspendido o programa do debate que é realizado aos sábados na RDN sob moderação do senhor Ricardo Semedo", refere o documento a que a Lusa teve acesso, assinado pelo PGR e dirigido na sexta-feira ao diretor da RDN, Muniro Conté.

Sedja Mam justifica a medida com "a situação político-social que se vive no país", sem especificar, e com a necessidade de "salvaguardar" o que classifica como "valores éticos superiores" da "ordem, paz, estabilidade" e "segurança institucional", tanto do "ponto de vista interno" como "externo".

O documento acabou por ser divulgado no programa "Cartas na Mesa", que se manteve no ar.

O espaço debate temas da atualidade, com destaque para a política, em que diferentes comentadores exprimem as suas opiniões sobre os acontecimentos da semana.

Contactado pela Lusa, o PGR escusou-se a adiantar mais detalhes e remeteu explicações para terça-feira, dia em que deverá manter um encontro com a direção da RDN.

O diretor da rádio escusou-se também a fazer comentários à Lusa, encaminhando as questões para a tutela, o Ministério da Comunicação Social.

Agnelo Regala, titular da pasta no Governo, referiu que a matéria está a ser analisada e prometeu uma posição para mais tarde.

Segundo as informações da RDN, o painel fixo de comentadores inclui Suleimane Cassamá e Jamel Handem, ambos economistas, tendo deixado o programa há poucas semanas um terceiro comentador, Seco Cassamá, engenheiro ambiental, nomeado pelo Governo para um cargo público.

O PGR, António Sedja Mam, foi nomeado para o cargo há duas semanas pelo Presidente da República, José Mário Vaz.

Em agosto, o chefe de Estado destituiu o Governo eleito em 2014 e escolheu um novo primeiro-ministro que, entre as primeiras medidas, decidiu mudar a direção da rádio e televisão nacionais.

Mas esse Governo acabaria por ser considerado inconstitucional e os diretores, entre os quais Muniro Conté, voltaram aos seus lugares.

LFO // SMA

Timor-Leste. EUA DEVIAM PEDIR DESCULPA PELA INVASÃO INDONÉSIA – Lopes da Cruz



Os Estados Unidos deviam pedir desculpa pela invasão de Timor-Leste em 1975, porque pressionaram o então Presidente indonésio, Suharto, a fazê-lo, disse o antigo vice-governador do território Francisco Lopes da Cruz.

"A Indonésia invadiu Timor por causa da ideologia comunista que queriam implementar lá, sobretudo naquele tempo em que em Portugal, o governo era totalmente comunista", disse, questionado sobre se a Indonésia deveria pedir desculpas aos timorenses.

A saída de Portugal, que enfrentava um atribulado processo de descolonização, abriu espaço a uma guerra civil entre a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) e a União Democrática Timorense (UDT), que levou à proclamação unilateral da independência a 28 de novembro pela Fretilin, de tendência marxista.

Dois dias depois, a UDT assinou a "Declaração de Balibó" defendendo a integração do território na Indonésia e solicitando "medidas imediatas no sentido de proteger as vidas das pessoas que ora se consideram elas próprias como parte do povo indonésio vivendo sob o terror e práticas fascistas da Fretilin consentidas pelo governo de Portugal".

Francisco Lopes da Cruz frisou que a Indonésia, um arquipélago de 17.000 ilhas, não tinha ambições sobre Timor-Leste, que ocupa apenas metade de uma ilha, e nem o petróleo na região justificaria a invasão, dado que o gigante asiático nem sequer está a explorar todas as suas jazidas.

"A Indonésia entrou em Timor em 07 de dezembro e dois dias antes estiveram de visita oficial à Indonésia o Presidente [Gerald] Ford e o secretário de Estado, Henry Kissinger", recordou Lopes da Cruz, antigo presidente da UDT.

Os Estados Unidos, continuou, tinham acabado de perder a guerra contra o Vietname e, em plena guerra fria, não queriam mais um foco de comunismo na região.

"A Indonésia não podia ofender os Estados Unidos que ajudaram na sua independência (...) A própria Indonésia em (19)65 sofreu uma hecatombe grande aqui com a revolução comunista. Com isto tudo, a Indonésia forcou-se a ir a Timor", acrescentou.

O governo indonésio tem sido igualmente pressionado a abordar o assassinato de entre 500 mil a um milhão de indonésios durante a luta anticomunista dos anos 1960, um massacre para o qual os Estados Unidos contribuíram ao fornecerem listas dos líderes comunistas aos indonésios envolvidos nas purgas.

Na visão do antigo conselheiro dos últimos cinco presidentes indonésios, se os EUA pedissem desculpas pela ocupação de Timor-Leste, seriam um país "com mais valor", porque mostraria que "sabem reconhecer também as suas fraquezas".

"Todos nós temos culpas no cartório. Portugal teve culpa porque não encaminhou como deve ser o processo de descolonização e deixou a ilha de Timor (...) A Indonésia porque invadiu Timor sem primeiro estudar as suas consequências (...) Os próprios timorenses também têm de pedir desculpas uns aos outros", acrescentou.

Mais do que pedir desculpas "como uma formalidade, que não vem do coração", aquilo que Portugal tem feito ajudando o pequeno território "é uma atitude muito boa", respondeu, quando questionado se Portugal também deve um pedido de desculpas aos timorenses.

Contudo, considerou o homem que perdeu "dois irmãos antes da entrada da Indonésia, mortos pelos nossos timorenses" e que tentou "fazer uma espécie de reconciliação entre todos" enquanto ocupou o cargo de vice-governador pouco depois da invasão, é preciso "esquecer o passado e andar para a frente".

Lopes da Cruz entende que se a Indonésia tivesse optado por "uma solução sem ser a invasão, seria muito melhor", podendo hoje ter "um nome muito melhor no mundo".

"Talvez eles quisessem seguir os passos da Índia, com Goa, Damão e Diu", que foram retiradas a Portugal numa intervenção militar, "mas o tiro saiu pela culatra", referiu.

A Indonésia é hoje o principal parceiro comercial de Timor-Leste e os dois países têm relações bilaterais amigáveis com Jacarta a apoiar a antiga colónia portuguesa em diferentes áreas, embora nunca tenha chegado a Díli um pedido formal de desculpas.

ANYN // EL - Lusa

Timor-Leste. Lopes da Cruz, o pró-integracionista que ajudou a consolidar a independência



Francisco Lopes da Cruz foi um dos fundadores da União Democrática Timorense (UDT), um dos partidos subscritores da "Declaração de Balibó" -- pró-integração na Indonésia, mas agora sente-se parte da construção do Timor-Leste livre que traz no coração.

Em entrevista à Lusa, Lopes da Cruz conta que depois de ter estudado para padre e de ter recebido formação militar em Moçambique, integrado no exército português, não queria envolver-se na política, mas considera que foi "quase obrigado a ser o presidente da UDT".

As memórias do "ano turbulento" de 1975 são recordadas ao pormenor, desde a coligação da UDT com a pró-independentista Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), que, recorda, foi "formidável", mas "mal interpretada".

Enquanto a UDT desejava uma independência a longo prazo e sedimentada com a ajuda de Portugal, a Fretilin lutava por uma independência imediata.

Por pressão dos partidários da UDT, a coligação termina e a 11 de agosto o partido lançou um golpe armado para se apoderar do poder, que Lopes da Cruz descreve não como um "golpe de Estado", mas como um "movimento revolucionário anticomunista", que "não correu bem" e que, assegura, não foi liderado por si.

A 30 de novembro, dois dias depois de a Fretilin ter declarado unilateralmente a independência, elementos da UDT assinaram em Bali a "Declaração de Balibó", que pedia a integração na Indonésia.

"Eu por acaso não fiz parte do grupo, porque o grupo antecipou-se. Como presidente da UDT naquela altura, limitei-me simplesmente a escrever o meu nome na referida declaração em vez de assiná-la", recordou, em declarações à agência Lusa.

Lopes da Cruz tem bem vivos na memória os momentos de angústia que viveu naquela altura em que permaneceu junto à fronteira, como a noite que passou a rezar pelo futuro de Timor-Leste e os momentos em que viu a sua mulher a "chorar porque os pais estavam em Díli".

Após a invasão indonésia em dezembro, Lopes da Cruz tornou-se vice-governador de Timor-Leste e, durante sete anos, tentou enviar "o maior número possível" de jovens timorenses para estudar nas universidades indonésias, até porque em 1975 havia "não mais de dez formados" no território.

Mais tarde, criou a fundação Rebentos de Esperança de Timor-Leste e continuou esse trabalho.

O homem que chegou também a ser embaixador indonésio em Lisboa estima que ofereceu "bolsas de estudo a cerca de 250 timorenses", incluindo a "80% dos timorenses que estão a governar em Timor".

Por isso, Lopes da Cruz respondeu que se sente parte da construção do país que Timor-Leste é hoje, embora não goste de "fazer alarido" disso.

"Não sou nenhum herói de Timor, não sou nada, mas diante de Deus, para quem não há heróis desconhecidos, eu dei também a minha contribuição para um Timor mais humano e para um Timor de que todos se podem orgulhar", vincou.

O antigo conselheiro dos últimos cinco presidentes indonésios relatou ainda que no início dos anos 80, na altura no cargo de vice-governador, foi alvo de um "estratagema" para o responsabilizarem por um "ataque a Díli em que morreram quatro polícias".

Em causa, entende, estava o facto de ter um programa de rádio com canções portuguesas, porque "a alma timorense é a cultura portuguesa", do qual "muitos não gostavam", afirmando que o programa servia para "contactar com os do mato e que aquelas canções mostravam que estava orientado para Portugal".

Hoje, Lopes da Cruz encara a opção da "integração como uma tábua de salvação" numa altura conturbada e diz que "se apoiasse a integração até ao fim não votaria no referendo de 30 de agosto de 1999 que levou Timor à independência".

Sem revelar se votou a favor da autonomia especial ou da independência, porque "o voto é secreto", contou ainda que, mais tarde, agradeceu ao Presidente indonésio da altura, Habibie, por ter permitido a realização do referendo que ditou a independência.

Lopes da Cruz vive em Jacarta da sua pensão mínima, mas aguarda há dez anos pela reforma que ele, a sua mulher e "mais uns mil timorenses" têm direito por terem trabalhado para Portugal.

Apesar dos convites para regressar à sua terra, Lopes da Cruz prefere ficar em Jacarta "a fazer lóbi para a Indonésia poder dar um apoio substancial a Timor", mas remata: "Estou a viver em Timor dentro do meu coração (...) Para mim, Timor é tudo".

ANYN // EL - Lusa

Moçambique. Analistas pouco impressionados com as medidas de contenção da crise económica



"(..) a entrada do dinheiro da cooperação está a reduzir-se... e o governo também tem culpas nisso"

Ramos Miguel – Voz da América

Esta semana, o governo moçambicano adoptou um pacote de medidas de incentivo à produção de bens alimentares e de controlo cambial, face à desvalorização do metical e à escassez de divisas.

O pacote de medidas adoptado pelo governo inclui uma maior agressividade na busca de divisas no exterior para minimizar o impacto da crise.

Economistas ouvidos pela VOA disseram que estas medidas só poderão surtir efeito se forem acompanhadas de políticas económicas ligadas ao mercado e a sectores produtivos que façam com que as empresas possam corresponder aos incentivos que o executivo irá estabelecer.

O economista Francisco Cumba diz ser necessário esperar para ver o impacto imediato destas medidas.

Cumba sublinha que a economia moçambicana precisa de uma injecção financeira, sobretudo através das exportações e do investimento directo estrangeiro, entre outras acções.

O economista João Mosca considera que as medidas anunciadas pelo Governo fazem parte de "um discurso recorrente, nos últimos 40 anos, e que aparece mais forte quando surgem situações de crise".

O governo diz que toda a economia mundial está em crise, mas em Moçambique, há quem associe a situação que se vive no país à tensão política.

João Mosca disse que "o problema de instabilidade política não está resolvido, o problema das empresas públicas mantém-se grave, o investimento externo em muitos sectores está comprometido, a entrada do dinheiro da cooperação está a reduzir-se... e o governo também tem culpas nisso".

MOÇAMBIQUE CRIA GRUPO DE REFERÊNCIA PARA COMBATE AO TRÁFICO HUMANO



Francisco Júnior – Voz da América

Moçambique criou esta semana um  Grupo de Referência Nacional para prevenir e combater eficazmente o tráfico de pessoas.

O Grupo multidisciplinar, que será coordenado pela Procuradoria-Geral da República, integra representantes de instituições estatais, organizações não-governamentais e comunicação social.

Trata-se de instituições que directa ou indirectamente intervêm na área do tráfico de pessoas, no âmbito legal,  protecção e reintegração das vítimas.

A ideia da criação deste grupo é também defendida por uma magistrada brasileira.

Maria Hilda Pinto, Sub-Procuradora-Geral Adjunta do Brasil, é de opinião que, se Moçambique quiser prevenir e combater mais eficazmente o tráfico humano deve não só ter uma equipa forte, mas apostar em campanhas de educação cívica robustas.

Além disso, aconselha Pinto, Moçambique deverá cooperar com outros países e organizações internacionais que lutam contra esse tipo de crime.

Pinto disse que do lado da instituição que representa, as portas estarão sempre abertas para cooperar com Moçambique.

Recentemente, Pinto foi uma das especialistas contratadas para formar os magistrados judiciais e do Ministério Público da cidade e província de Maputo em matéria de tráfico humano.

Julgamento de ativistas angolanos segue para quarta semana com oito réus por ouvir



O tribunal de Luanda que está julgar 17 ativistas acusados de prepararem uma rebelião em Angola agendou hoje mais uma semana de audiências, que a defesa espera ser suficiente para concluir a audição dos oito restantes réus.

"É possível concluir essas audições na próxima semana, para depois passarmos a ouvir os peritos [da investigação], que têm questões para nos responderem. Por exemplo, os vídeos que estão a ser exibidos [alegadamente recolhidos com câmara escondida nas reuniões destes ativistas], nunca nos foi dito de onde é que foram retirados. Documentos apresentados que têm de dizer onde e como encontraram", disse à Lusa o advogado de defesa David Mendes.

Ainda assim, critica a morosidade que diz continuar a ser introduzida pelo Ministério Público neste processo.

Lusa

PR angolano pede à China para ajudar a resolver "problemas básicos" de África



O Presidente angolano afirmou hoje, em Joanesburgo, que a China é um "parceiro imprescindível" para o desenvolvimento de África, colaboração que ainda pode ser incrementada para resolver "problemas básicos das populações", do ensino e do combate à fome.

José Eduardo dos Santos discursava na segunda cimeira dos chefes de Estado e de Governo do Fórum de Cooperação China África (FOCAC), que está a decorrer na África do Sul desde sexta-feira, durante o qual José Eduardo dos Santos já se reuniu com o homólogo chinês, Xi Jinping.

O estadista angolano defendeu hoje que a China é atualmente "um parceiro imprescindível para o desenvolvimento" africano, em função do crescimento do investimento chinês no continente.

Na base das "relações bilaterais e multilaterais", do "diálogo permanente e da cooperação", o líder angolano afirmou que "não há dúvida que a África e a China vão realizar os objetivos fixados na estratégia conjunta".

Contudo, apontou igualmente a necessidade de "estruturar a cooperação" em três níveis e estabelecer os respetivos instrumentos de ação: Ao nível continental através da Comissão Executiva da União Africana, ao nível de cada uma das cinco sub-regiões africanas e ao nível dos Estados-membros da União Africana através dos seus Governos.

José Eduardo dos Santos defendeu que a China ainda "poderia dar maior ajuda a todos os níveis para a resolução dos problemas básicos das populações e dos jovens", como no combate à erradicação da fome e da pobreza ou "apoiando a agricultura familiar e a comercialização da produção conseguida".

O apoio chinês, disse, pode igualmente passar por programas para a instalação de sistemas de produção de água potável no meio rural e na periferia das cidades, na criação de centros de formação profissional, "garantindo-se o financiamento previsível de longo prazo dos planos nacionais de educação" ou na promoção de projetos de investimentos públicos e privados, "que criem empregos e evitem a emigração dos africanos para outros continentes, ou a fuga para outros países africanos com mais oportunidades".

"Outro domínio importante é o da produção de alimentos e da agricultura e da agroindústria, para se garantir a segurança alimentar e o da construção de infraestruturas, como estradas, pontes, energia elétrica, água, telecomunicações, saúde e formação de recursos humanos que são todos elementos essenciais para a industrialização dos nossos países", sublinhou o estadista angolano.

Combater a desertificação e proteger o continente das mudanças climáticas, alargar as florestas, "bem como transformar, em vez de queimar, o gás obtido da produção de petróleo" são igualmente áreas em que, para Angola, a colaboração entre África e a China pode ser reforçada.

O Presidente chinês, Xi Jinping, anunciou sexta-feira, em Joanesburgo, que a China vai conceder 60 mil milhões de dólares (55 mil milhões de euros) em assistência e empréstimos aos países africanos.

"A China decidiu providenciar um total de 60 mil milhões de dólares em fundos de apoio, que inclui cinco mil milhões em empréstimos isentos de juros e 35 mil milhões para empréstimos concessionais e crédito à exportação, com condições preferenciais", disse Xi, no arranque da segunda cimeira do FOCAC), que termina hoje.

Sobre este novo plano de ação para a colaboração entre os países africanos e o gigante asiático, o presidente angolano afirmou que vai dar "um novo impulso à materialização dos consensos alcançados, abrindo o caminho para a entrada numa nova era de cooperação e progresso".

PVJ// ATR

A PRESSÃO NEOCOLONIAL AO NÍVEL DA GESTÃO EMPRESARIAL EM ÁFRICA



Rui Peralta, Luanda

Qualquer um que adquira 49% de uma empresa em algumas economias africanas mais periféricas e mais sujeitas aos processos culturais, políticos e económicos neocoloniais, sabe que para a reconstruir e gerir necessitará de uma série de quadros africanos experientes. Surgem muitos candidatos, quase todos, aparentemente, bem qualificados pela sua categoria e posição, mas depressa nos aperceberemos que apenas três ou quatro revelaram ter a experiencia e as aptidões necessárias.

As empresas de muitas economias africanas caracterizam-se por terem o dobro dos gestores e quadros das suas congéneres europeias, americanas ou asiáticas, mas existe, efectivamente, uma extrema escassez de qualificações e de experiencia de gestão. É certo que alguns gestores receberam uma excelente formação, mas em muitos casos passam a sua vida profissional como manuseadores de documentos, ou como escribas de relatórios sem fim. Outros, talvez por serem mais activos e não quererem passar o resto da vida a apanhar papéis, correm atrás de encomendas, a conseguirem matéria-prima e divisas para comprar equipamentos e máquinas no exterior.

Pessoas com experiencia e qualificações profissionais de gestão são em escasso número e esta escassez é um problema grave, embora superável com o tempo (Cronos é o melhor remédio para tudo na vida). Muito mais difícil será a revolução na cultura de gestão nas economias africanas neocolonizadas e ultraperiféricas. Isto porque esta revolução nos mercados africanos implicará o desfazer de muitas décadas de valores profissionais errados, de práticas profissionais erradas e de políticas erradas, para além da desfiguração a que o colonialismo sujeitou estas economias. São, também desde o início da colonização até hoje, centenas de anos sem dizer a verdade e sem ninguém ter a permissão para relatar a verdade. A verdade não serve para progredir numa carreira, isso é coisa da mentira nestas economias. Um mercado actuante é baseado em informação fiável e em relatórios de confiança, não em quadros dispostos a mentir e a tolerar mentiras. Nestas economias fica com o trabalho aquele que ao perguntarem-lhe quanto são dois mais dois responde: “Quanto precisa que sejam, camarada (ou irmão, ou mano, ou excelentíssimo senhor) director”?

Outro factor importante é o facto de nada mais assustar estes quadros do que tomarem uma decisão. Realizam-se reuniões intermináveis, pedem-se estudos, mas não se tomam decisões, acabando esta por ser delegada á posição mais elevada. Ora a decisão é um factor básico em qualquer mercado, implica autonomia. É ao vendedor que compete decidir acerca de uma acção a exercer sobre o cliente, a medir a receptividade dessa decisão junto ao cliente, ou ao supervisor que compete decidir sobre a paragem de uma linha de produção para corrigir uma anomalia. Mas isto torna-se inconcebível nestes mercados.

África necessita desesperadamente de empresas de pequena e média dimensão, pois as maiores oportunidades de negócio estão nos sectores tecnológicos, nos serviços e nos bens de consumo. É nestas áreas que florescem as empresas de pequena e média dimensão, localmente geridas e geradoras de trabalho. As gigantescas (e dantescas) empresas governamentais (empresas “públicas” geridas pelo Estado) encontram-se em situação de falência e apenas podem ser salvas através da sua divisão em unidades mais pequenas e com uma gestão mais autonomizada e com menos custos administrativos. Se estes “elefantes brancos” forem privatizados apenas tornam-se granes empresas privadas não produtivas, não havendo recuperação económica, apenas estagnação.

Mas existe, ainda, um problema de cultura de gestão maior do que qualquer outro que tenha sido descrito até agora: a falta de entendimento do que é a livre iniciativa e as relações no mercado. Aqui o mercado competitivo é definido com aquele em que os preços são altos para que cada concorrente obtenha lucro. Nada mais errado! No mercado a empresa tem de conquistar o lucro! Não existe apenas “lucro” mas “lucro e perdas”, não há apenas “recompensa”, mas sim “risco e recompensa”.

É que a liberdade não é apenas ausência de restrições. É, também, autodisciplina, responsabilidade e…autonomia de decisão.

Brasil. Dilma Rousseff sofre ameaça de destituição pouco mais de um ano após reeleição



Pouco mais de um ano após a reeleição, a Presidente brasileira Dilma Rousseff é a primeira governante brasileira a sofrer a ameaça da impugnação do mandato desde 1992, quando Fernando Collor de Mello foi destituído.

Ex-combatente de esquerda contra a ditadura militar brasileira (1964-1985), Dilma foi ministra de Minas e Energia e da Casa Civil do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, acabando por lhe suceder.

Dilma assumiu a Presidência pela primeira vez em janeiro de 2011 e, no primeiro mandato, enfrentou uma crise económica, que tentou barrar com medidas anticíclicas (diminuição de impostos de empresas e redução de juros) para incentivar o consumo, e uma crise política, devido à dificuldade em obter apoio dos partidos da coligação no Congresso, além de uma onda de manifestações, em 2013, que se iniciaram com críticas às taxas municipais e estaduais do transporte público.

No segundo mandato, para o qual foi eleita em outubro de 2014, tanto a crise económica como a política agravaram-se, colocando em causa a credibilidade do Governo, um processo influenciado pelas investigações de corrupção na companhia Petrobras, que levaram à prisão de vários políticos, alguns do Partido dos Trabalhadores (PT, de Rousseff).

Na economia, a eficácia dos incentivos ao consumo tinha diminuído. No segundo mandato, Dilma nomeou como ministro da Fazenda Joaquim Levy, ex-diretor do banco Bradesco, que preparou um pacote de ajuste fiscal, que inclui a redução de benefícios e o aumento de impostos.

Com a austeridade, a Presidente perdeu parte do apoio de movimentos sociais e sindicatos à esquerda do Governo, num contexto em que já era rejeitada por setores conservadores, à direita.

A crise política, que dificultou a aprovação das medidas do ajuste no Congresso, aprofundou-se logo após a eleição da Presidente para o segundo mandato, que ocorreu com uma margem pequena de vantagem (51,6%), na segunda volta. Com o ambiente político polarizado, houve manifestações que reuniram milhares de pessoas contra a Presidente, que pediam seu "impeachment", ainda sem uma justificativa jurídica.

A taxa de aprovação da Presidente caiu para 7%, segundo sondagens. As chamadas "pedaladas fiscais" (empréstimos de bancos públicos para arcar com custos de Governo, o que é proibido no Brasil), levaram as contas da Presidente de 2014 a serem reprovadas pelo Tribunal de Contas da União, um órgão assessor do Congresso.

No entanto, para justificar um pedido de impugnação, era necessário um feito do atual mandato.

Os três juristas que escreveram o texto aceite pelo Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, afirmam que as "pedaladas", usadas, segundo eles, em 2014 para camuflar a situação e beneficiar Dilma nas eleições, foram repetidas neste ano.

O pedido também acusa Dilma de crime de responsabilidade, por esconder o défice do país e aprovar decretos de gastos suplementares, sem numeração, mesmo sem ter excedente orçamental.

Na segunda-feira, a Câmara dos Deputados do Brasil vai escolher os 65 membros da comissão especial que irá decidir se o parlamento acolhe ou não o pedido de impugnação da Presidente Dilma Rousseff.

FYB // PJA  - Lusa

Brasil. Um desqualificado eticamente manda a julgamento uma mulher íntegra e ética



Eduardo Cunha mente tão perfeitamente que não parece mentira as mentiras que repete sempre.

Leonardo Boff – Carta Maior, opinião

O Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é acusado de graves atos delituosos: de beneficiário da Lava-Jato, de contas não declaradas na Suiça, de mentiras deslavadas como a última numa entrevista coletiva ao declarar que o Deputado André Moura fora levado pelo Chefe da Casa Civil Jacques Wagner a falar com a Presidenta Dilma Rousseff para barganhar a aprovação da CPMF em troca da rejeição da admissibilidade de um processo contra ele no Conselho de Ética. Repetidamente afirmou que a Presidenta em seu pronunciamento mentiu à nação ao afirmar que jamais se submeteria à alguma barganha política.

Quem mentiu não foi a Presidenta, mas o deputado Eduardo Cunha. Seu incondicional aliado, o deputado André Moura, não esteve barganhando com a Presidenta Dilma, como o testemunhou o ministro Jacques Wagner. Vale enfatizar: quem mentiu ao público brasileiro foi Eduardo Cunha. Imitando Fernando Pessoa diria: Ele, mentiroso, mente tão perfeitamente que não parece mentira as mentiras que repete sempre.

É mentira que seu julgamento foi estritamente técnico. Pode ser técnico em seu texto, mas é mentiroso em seu contexto. O técnico nunca existe isolado, sem estar ligado a um tempo e a um interesse. É o que nos ensinam os filósofos críticos. Ele deslanchou o processo de impeachment contra a Presidenta exatamente no momento em que, apesar de todas as pressões e chantagens sobre o Conselho de Ética, soube que na votação perderia pois os três representantes do PT acolheriam a aceitação de um processo contra ele, o que poderia, depois, significar a sua condenação.

O que fez, foi um ato de vindita reles de quem perdeu a noção da gravidade e das consequências de seu ato rancoroso.

É vergonhoso que a Câmara seja presidida por uma pessoa sem qualquer vinculação com a verdade e com o que é reto e decente. Manipula, pressiona deputados, cria obstáculos para o Conselho de Ética. Mais vergonhoso ainda é ele, cinicamente, presidir uma sessão na qual se decide a aceitação do impedimento de uma pessoa corretíssima e irreprochável como é a Presidenta Dilma Rousseff.

Se Kant ensinava que a boa vontade é o único valor sem nenhum defeito, porque se tivesse um defeito, a boa vontade não seria boa, então Eduardo Cunha encarna o contrário, a má vontade, como o pior dos vícios porque contamina todos os demais atos, arquitetados para tirar vantagens pessoais ou prejudicar os outros.

Seu ato irresponsável pode lançar a nação em um grave retrocesso, abalando a jovem democracia, que, com vítimas e sangue, foi duramente conquistada. Não podemos aceitar que um delinquente político, destituído de sentido democrático e de apreço ao povo brasileiro, nos imponha mais este sacrifício.

Faço um apelo explícito ao Procurador Geral da República, ao Dr. Rodrigo Janot e a todo o Supremo Tribunal Federal:  pesem, sotopesem e considerem as muitas acusações pendentes contra Eduardo Cunha nas áreas da Justiça. Estimo que há suficientes razões para afastá-lo da Presidência da Câmara e que venha a responder judicialmente por seus atos.

A missão desta mais alta instância da República, assim estimo, não se restringe à salvaguarda da constituição e à correta interpretação de seus artigos, mas junto a isso, zelar pela moralidade pública, quando esta, gravemente ferida, pode constituir uma ameaça à ordem democrática e, eventualmente, levar o país a um golpe contra a democracia.

Mais que outros cidadãos, são suas excelências, os principais cuidadores da sanidade da política e da salvaguarda da ordem democrática num Estado de direito, sem a qual mergulharíamos num caos com consequências políticas imprevisíveis. O Brasil clama pela atuação corajosa e decidida de vossas excelências, como ultimamente, tem demostrando exemplarmente.

*Leonardo Boff, ex-professor de ética da UERJ - Créditos da foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

O ATAQUE NEOLIBERAL À VIDA DOS NEGROS



Os efeitos da globalização capitalista resultaram no deslocamento maciço de populações negras; aumento da pobreza e violência estatal.

Ajamu Baraka – Carta Maior*

Danelly Estupiñan, uma grande ativista de direitos humanos afro-colombiana e minha amiga pessoal, hoje enfrenta uma ameaça mortal de criminosos fanáticos alinhados com os interesses econômicos dos poderosos, que se empenham em manter a subjugação da população negra na cidade portuária de Buenaventura e em toda a Colômbia.

Ativista e membro do Processo das Comunidades Negras (PCN), Danelly faz parte de uma longa lista de mulheres, trabalhadores e jovens ativistas que estão enfrentando a morte ou foram assassinados por se atrever a organizar afro-colombianos em defesa de sua dignidade.

Às 17:30 de 23 de novembro, Danelly recebeu uma ameaça de morte que dizia: "Danelly, você está perto do seu fim". Menos de cinco horas depois, ela recebeu um telefonema de um amigo, que foi interposto por uma voz distorcida dizendo "nós sabemos onde você está, nós sabemos onde você está".

O escritório do Processo das Comunidades Negras (PCN) em Buenaventura atua há décadas em defesa dos direitos e da dignidade da população negra que vive na área de Bajamar da Ilha de Cascajal, em Buenaventura. Os afrodescendentes que vivem nesta área, muitos dos quais foram deslocados juntamente com seus filhos, fugiram de conflitos e de abusos nas comunidades ribeirinhas próximas. Eles agora vivem em condições sub-humanas decorrentes do abandono por parte do Estado. Não só têm de enfrentar uma extrema marginalização, pobreza, falta de serviços básicos e pouco acesso a oportunidades de emprego, mas agora a área em que vivem teve seu valor aumentado como resultado do "acordo de livre comércio" entre a Colômbia e os EUA, o que os tornou alvo de grupos armados que procuram forçá-los a abandonar suas terras.

Eu conheço esta comunidade. Eu andei por suas ruas e comi do mesmo pão que seus habitantes. O governo quer que essa e outras comunidades negras simplesmente desapareçam, porque pretende expandir o porto e construir um novo calçadão na cidade, de modo a atrair investimentos privados e dólares de turistas. Seu único obstáculo são as pessoas que vivem naquela terra valiosa. Danelly e o PCN representam uma resistência organizada a esses planos e, portanto, tornaram-se alvo dos grupos paramilitares que protegem e fazem valer os interesses da elite colombiana.

A pobreza, a repressão e a luta de vida e morte das comunidades negras em Buenaventura, Colômbia, não pode ser compreendida se ignorarmos a estrutura e a lógica da globalização capitalista neoliberal - uma perspectiva que relaciona as condições de Buenaventura com as condições de outra cidade portuária - Baltimore.

Em ambos os casos, os efeitos da globalização capitalista resultaram no deslocamento maciço de populações negras; aumento da pobreza; marginalização econômica do trabalho negro e violência estatal ou privada. A erupção da resistência popular em uma das comunidades mais pobres de Baltimore durante anos de negligência estatal e policiamento militarizado é consequência direta das condições sócio-econômicas devastadoras geradas pelos milhares de empregos perdidos quando os EUA transnacionalizaram grande parte das atividades industriais e portuárias da cidade, resultado de uma globalização neoliberal. Em contexto de pauperização da classe trabalhadora negra em Baltimore, os administradores negros de classe média que ocupavam as instituições governamentais locais apoiaram planos de desenvolvimento, como o complexo Inner Harbor, que deslocou milhares de famílias da classe trabalhadora negra.

Em Baltimore, a relativa fraqueza da resistência negra ao significativo deslocamento em massa fez com que não fossem necessários esquadrões da morte para exterminar líderes comunitários, diferente do que vemos na Colômbia. O domínio eminente e um policiamento militarizado neofascista, com impunidade de crimes cometidos contra os negros e pobres concentrados nas comunidades arruinadas, tem sido arma eficaz para controle e contenção das pessoas. E quando houve erupções de oposição, como durante a última rebelião em Baltimore em resposta ao assassinato policial de Freddie Gray, vimos como o Estado, a nível local e nacional, não hesitou em trazer todo o peso de sua jurisprudência opressora sobre quem se atrevia a resistir.

O que deve ser claramente entendido e articulado em linguagem inequívoca é que essa guerra travada contra corpos negros não significa contenção de "maçãs podres" pelas forças policiais, não é uma falta de revisão eficaz das práticas policiais ou, no caso da Colômbia, não é simplesmente a ausência de um governo que intervenha de forma mais agressiva para desmantelar os grupos paramilitares. A guerra que está sendo travada contra negros pobres e contra a classe trabalhadora é precisamente a manifestação de uma guerra mais ampla, engendrada por uma supremacia branca assassina e voraz, uma classe dominante global, colonial, capitalista e patriarcal que visa manter e expandir a sua hegemonia mundial.

Esta é a base e o objetivo da Parceria TransPacífico (PTP), do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (APT), da Organização Mundial do Comércio (OMC), do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial (BM), da OTAN, da guerra na Síria e do apoio contínuo ao forte do imperialismo ocidental no Oriente Médio, conhecido como Israel.

Não se confunda com o papel dos estados vassalos, como Turquia, Arábia Saudita, França, Reino Unido ou mesmo com os estados que parecem independentes dessa dominação, como China e Rússia - as fundações da dominação capitalista global, através de força, ainda se situam no Ocidente e representam uma continuação do velho projeto colonial e capitalista pan-europeu, agora com 523 anos. Esta é principal contradição que os diferentes povos do mundo enfrentam.

Em 9 de novembro, os paramilitares assassinaram o jovem ativista Jhon Jairo Ramirez Olaya em Buenaventura. Hoje, Danelly Estupiñan, cuja vida e luta são símbolo para todos aqueles que lutam contra opressões, está enfrentando a morte pela audácia de se organizar e resistir a globalização capitalista.

Nós devemos nos juntar ao povo da Colômbia. Temos de nos certificar de que as vidas dos negros de Buenaventura importam e de que a nossa querida irmã estará protegida. Mas também devemos reconhecer que, para que a vida negra realmente importe, a vida de todos aqueles que sofrem e são explorados pelo capitalismo neoliberal e pela ideologia desumanizadora da supremacia branca devem também importar. A valorização de nossas vidas só pode acontecer quando nós, os oprimidos, lutarmos pelo poder de transformar nossas condições e de imaginar e lutar por um novo mundo.

Ajamu Baraka é um ativista de direitos humanos, organizador e analista geopolítico. Baraka é membro associado do Institute for Policy Studies (IPS) , em Washington DC, e editor e colunista do Black Agenda Report.. Ele é contribui pro  “Killing Trayvons: An Anthology of American Violence” (CounterPunch Books, 2014). E pode ser contatado em www.AjamuBaraka.com

*Tradução por Allan Brum - Créditos da foto: reprodução

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