O
ministro do Interior de Angola, Ângelo Veiga Tavares, foi a Moçambique
descobrir a pólvora, se bem que a patente pertença a José Eduardo dos Santos.
Ao melhor estilo do embaixador itinerante Luvualu de Carvalho, o ministro disse
hoje, em Maputo, que o caso dos 15+2 activistas reflecte uma tentativa externa
de colocar “governos dóceis” no poder.
Orlando
Castro – Folha 8
Ogovernante
angolano falava aos jornalistas à saída da audiência concedida pelo Presidente
moçambicano, Filipe Nyusi, no âmbito da visita que está a realizar ao país,
para – segundo a agenda oficial – reforço da cooperação no domínio da segurança
e ordem pública.
“Há
tentativas de ter no poder governos dóceis e, nalguns casos, são utilizadas
algumas pessoas, sobretudo jovens, na tentativa de verem implementado em Angola
aquilo que se vê nos outros países”, apontou Ângelo Veiga Tavares, mostrando
mais uma vez a sua capacidade de repetição em série dos recados encomendados
pelo “querido líder” de um governo nada dócil… para com os fracos.
Ângelo
Veiga Tavares aludia ao processo que envolve 15 angolanos em prisão
domiciliária em Luanda, além de duas jovens em liberdade, acusados de actos
preparatórios para uma rebelião e um atentado contra o Presidente angolano, no
poder há quase 37 anos sem nunca ter sido nominalmente eleito.
“Nós
temos estado atentos e quando a lei é violada as pessoas que o fazem devem
sentir o peso da lei e das autoridades. Este processo destes jovens é um
processo normal, teve o seu curso normal de ponto de vista da sua instrução, e
agora está na fase judicial”, disse ainda aos jornalistas o ministro com a
tutela das polícias angolanas.
Recorde-se,
neste contexto, que a NATO afirmou que nunca discutiu qualquer acção militar em
Angola, desmentido as teses do Luvualu de Carvalho, camarada de Ângelo Veiga
Tavares, que andou a correr os areópagos afectos ao regime para garantir que a
actividade “conspirativa” dos jovens visava uma intervenção em Angola da
Aliança Atlântica.
Crê-se
que Luvualu de Carvalho, tal como Ângelo Veiga Tavares, descobriu que os jovens
queriam provocar era uma intervenção do Pacto de Varsóvia. E apostavam tudo
nessa versão. Acontece, contudo, que alguém os alertou que essa organização
militar comunista tinha acabado em Junho de 1991. Estes dois peritos do regime
corrigiram o tiro e substituíram Pacto de Varsóvia por NATO.
Tudo
isto começou quando, socorrendo-se das afirmações feitas em Luanda exactamente
pelo ministro do Interior do regime, Ângelo Veiga Tavares, o embaixador
itinerante repetiu que os activistas pretendiam realizar uma marcha até ao
Palácio Presidencial, “levando com que fossem quebradas as regras de segurança
(…) para que a guarda presidencial ou a polícia presente reagisse, matasse
crianças, matasse senhoras e matasse idosos para provocar a comoção
internacional e justificar então uma intervenção vergonhosa”.
“É
isto que se procurava. Que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO)
ou alguns países que dela fazem parte fizessem um ataque a Angola, para que se
verifique o horror que se verifica agora na Líbia ou se verificou e verifica na
Tunísia”, acentuou o diplomata itinerante fabricado à medida e por medida por
José Eduardo dos Santos.
Os
15 activistas detidos em Luanda, considerados presos de consciência pela
Amnistia Internacional, mais duas mulheres que estão a aguardar o julgamento em
Liberdade, vão começar a ser julgados na capital angolana a 16 de Novembro,
acusados de rebelião e de tentativa de assassínio do chefe de Estado, José
Eduardo dos Santos.
O
julgamento (que virou, como esperado, uma farsa) destes activistas – 15
estiveram em prisão preventiva entre Junho e Dezembro, passando nessa altura à
situação de prisão domiciliária – arrasta-se desde Novembro na 14ª Secção do
Tribunal Provincial de Luanda e hoje voltou a ser suspenso, até 23 de
Fevereiro, pela ausência de declarantes, certamente todos – parafraseando com a
devida vénia o ministro Ângelo Veiga Tavares – vendidos aos que querem em
Luanda um “governo dócil”.
“Os
dados são públicos, as afirmações e as contestações estão ser tratadas no
quadro judicial e esperamos que o tribunal faça o seu trabalho”, disse ainda
Ângelo Veiga Tavares. Desconhece-se se o ministro sabe qual é a diferença entre
um Tribunal num Estado de Direito Democrático e um, como o de Luanda, que não
passa de um palco circense.
“Isso
[forças externas interessadas em desestabilizar a Angola], em certa medida,
nunca deixou de existir desde as nossas independências”, apontou o ministro,
certamente referindo-se à África do Sul mas pensando (e não é certo, reconhecemos,
que Ângelo Veiga Tavares… pense) em Cuba e na União Soviética.
Quem
não é dos nossos…
O ministro
do Interior de Angola, Ângelo Veiga Tavares, entende desde o início deste caso
dos activistas como “prudente” a detenção dos jovens para, diz, não permitir o
desenvolvimento de planos apoiados por forças estrangeiras para a
desestabilização do país, que previam “mortes”.
Quando
Ângelo Veiga Tavares leu o improviso do “escolhido de Deus” na conferência de
imprensa sobre o plano das comemorações dos 40 anos da independência de Angola,
ficou a saber-se que a cartilha era a de sempre, a do partido único.
Nessa
altura apontou, a título de exemplo, que o Governo convidou em 2014 uma cidadã
europeia (italiana) a abandonar o país, porque esta se reuniria com aquele grupo,
supostamente dando indicações para que nas manifestações de contestação ao
regime deveriam ser provocados confrontos com a polícia, gerando entre 20 a 25
mortos.
“Por
isso é que em alguns casos, a polícia prefere não permitir que tais
manifestações atinjam um nível de confronto para atingir esse fim. Portanto,
essa cidadã europeia foi convidada a abandonar o país”, frisou.
Segundo
o ministro, também em alguns círculos diplomáticos, alguns cidadãos com esse
estatuto instigavam esses jovens “e coincidentemente sempre na mesma
perspectiva”.
“Haver
confrontos para permitir – era o termo que utilizavam – a intervenção do
ocidente e, por caricato que pareça, a cifra era sempre a mesma, entre 20 e 25
mortos”, acrescentou.
“Portanto,
o que se estava a passar não era aquela habitual tentativa de simples
manifestação, era coisa bem diferente, era coisa bastante ousada. Ou seja, no
meu entendimento, havia sim alguém por trás a arregimentar e a aproveitar o
estado de alma desses jovens para fins diferentes daqueles que estão mais
desenvolvidos do ponto de vista democrático”, acusou o ministro.
Ainda
sobre as investigações, Ângelo Veiga Tavares disse que em finais de 2013
transmitiu à UNITA, o maior partido da oposição, que alguns núcleos daquela
força política estavam, naquela altura, a procurar localizar a casa dos
ministros da Defesa e do Interior, do chefe do Serviço de Inteligência, do
Comandante Geral da Polícia Nacional e do Chefe de Estado-Maior General das
Forças Armadas.
O
titular da pasta do Interior frisou ainda que havia também informações sobre a
preparação de alguma desordem na capital angolana, com a ocupação de novas
centralidades habitacionais, a destruição de viaturas e de multibancos.
“Nós,
confrontados com esses dados que tínhamos do passado, com essa ingerência de
fora, que perspectivava que se criasse condições de confronto e mortes para que
houvesse intervenção do ocidente, achamos prudente ter algumas atitudes que
permitissem cortar e não permitir o desenvolvimento de acções dessa natureza”,
afirmou o ministro.
O
ministro sublinhou que as autoridades angolanas não têm “o prazer de prender
quem quer que seja”, realçando que o processo de paz em Angola ainda “não está
totalmente consolidado”, por isso há necessidade de algumas cautelas na
abordagem de certos assuntos.
Novamente
sobre a ingerência externa nos assuntos de Angola, e sem concretizar (acusar
sem provar está no ADN do regime), Ângelo Veiga Tavares frisou a necessidade de
os angolanos preservarem “um ganho muito importante”, que foi terem conseguido
alcançar a paz “metendo de fora os estrangeiros”.
“Hoje,
há a tentativa e o agrado do estrangeiro, porque estamos a abrir outra vez uma
brecha para que esses estrangeiros venham determinar e voltar ao passado de
desentendimento”, realçou.
Admitindo
“problemas por resolver” no país, sublinhou que o tempo é dos políticos
resolverem internamente.
“Porque
há uma tendência muito grande de dar espaços muito bem desejados por alguns
estrangeiros, para desvirtuarem e criarem situações de muitas dificuldades, que
podem ser muito graves e trazer-nos consequências muito perigosas”, concluiu.
Ângelo
Veiga Tavares foi, apesar de tudo, modesto no enquadramento. Esqueceu-se de
dizer que foi descoberto em poder dos jovens diverso material bélico, altamente
letal, a saber: 12 esferográficas BIC (azuis), um lápis de carvão (vermelho),
três blocos de papel (brancos) e um livro sobre como derrubar de forma pacífica
as ditaduras.
Sabe-se,
igualmente, que a Polícia Nacional do regime descobriu que os jovens activistas
tinham mísseis escondidos nas lapiseiras, Kalashnikovs camufladas nos
telemóveis e outro armamento pesado e letal disfarçado nos blocos de
apontamentos. São, reconheça-se, provas mais do que suficientes para provar que
estavam a preparar um golpe de Estado.
Os
jovens estavam (era isso, não era senhor ministro Ângelo Veiga Tavares?) no seu
quartel-general, por sinal uma residência em Luanda, numa reunião dos seus
estrategas militares que planeavam o golpe a partir da leitura do livro “Da
ditadura à democracia — Uma estrutura conceptual para a libertação”, do
norte-americano Gene Sharp.
No
quintal, debaixo de uma mangueira, o exército mobilizado por esses jovens
(talvez uns milhões de guerrilheiros) afinava os códigos para lançamento dos
mísseis e, talvez, até de ogivas nucleares contra a residência de Eduardo dos
Santos…
Perante
este manancial de provas, o Ministério Público do regime provou que os jovens
activistas estavam envolvidos numa conspiração para a “destituição do
Presidente da República e de outros órgãos de soberania”, plano que estava a
ser congeminado há muito, muito tempo. Cerca de três meses.
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