terça-feira, 26 de abril de 2016

QUEM NÃO OFFSHORA NÃO MAMA



Mariana Mortágua – Jornal de Notícias, opinião

O mundo offshore é um sistema paralelo que tem, ao longo dos anos, funcionado com a complacência e cumplicidade do resto do Mundo.

O sigilo bancário, os benefícios fiscais e a benevolência regulatória favorecem os negócios e as transações mais variadas: do planeamento fiscal agressivo à evasão fiscal, da contabilidade criativa à fraude contabilística, tudo é mais fácil, e tudo se confunde. No limite, o sigilo que protege o verdadeiro beneficiário de um negócio de compra e venda de ações é o mesmo que permite o branqueamento de capitais do tráfico de droga, ou que financia o terrorismo.

A possibilidade de fuga e fraude fiscal é, provavelmente, um dos maiores fatores de atração destes territórios. E para isso não é preciso sequer recorrer aos offshore do tipo mais "agressivo". A Amazon UK, por exemplo, manteve a sua sede no Luxemburgo, por onde passavam todas as vendas de forma a minimizar a fatura de impostos. Em 2011, a Google transferiu 4/5 do seu lucro para uma subsidiária nas Bermudas, reduzindo assim o imposto médio a pagar para metade. Em 2012, o presidente da empresa referiu-se a esta operação nos seguintes termos: "Estamos muito orgulhosos na estrutura que que montámos... chama-se capitalismo". É também conhecido o caso da Apple, que transferiu 74 biliões de dólares para subsidiárias constituídas para o efeito na Irlanda, onde pagou 2% de impostos.

A receita que se perde por esta via prejudica todos os países, que perdem recursos essenciais para o seu desenvolvimento, mas, além disso, agrava as desigualdades. Quem não foge porque não quer, ou não pode, tem não só de sustentar o Orçamento do Estado, como suportar os cortes e a austeridade que poderiam ser pagas por quem utiliza estes esquemas para fugir.

Não tapamos o sol com a peneira: o fim das offshore só será possível com um inaudito esforço supranacional. No entanto, sabendo que essa coordenação é praticamente impossível no atual contexto, cabe a cada Estado fazer os possíveis para impor garantias de transparência e de limitação de acesso a estas jurisdições. É com este objetivo que o Bloco apresentará na Assembleia da República várias propostas legislativas.

As offshore são um privilégio de poucos contra uma imensa maioria, e os tempos não podem estar para privilégios.

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