terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Cabo Verde. CAPITAL ESTRANGEIRO PRECISA-SE



Expresso das Ilhas, editorial

O Primeiro-ministro José Maria Neves anunciou que vai a Luxemburgo nos próximos dias à procura de fundos para investir em vários projectos para as ilhas do Norte. Promete que depois no âmbito de um Afroverde 2 será a vez de projectos nas ilhas do Sul. Pena que esteja a organizar essas ofensivas de atracção de investimento estrangeiro para Cabo Verde no fim dos seus 15 anos de governação. Pena ainda que esteja a disponibilizar-se para isso quando já ficou evidente que está-se a inverter o sentido da movimentação de capitais ao nível mundial. No fim da semana passada o chamado banco central dos bancos centrais, o BIS, deixou entender que se iniciava um novo ciclo em que o volume de capitais vindos dos países emergentes em direcção aos países desenvolvidos era superior em muitos bilhões de dólares ao que se dirigia em sentido contrário.

Quando, em vésperas de eleições legislativas, Cabo Verde parece acordar para a necessidade de conseguir capitais estrangeiros para financiar a sua economia, é precisamente o momento em que o mundo dá a impressão de estar mais uma vez à beira de uma recessão. Vários acontecimentos como, por exemplo, a brusca travagem no crescimento da China, a queda dos preços de petróleo, as dificuldades crescentes dos países emergentes designadamente dos BRICS com excepção da Índia, o aumento da taxa de juros nos Estados Unidos e as persistentes dificuldades da União Europeia com o euro e o problema das migrações não auguram nada de bom para a economia mundial. Economistas de renome falam de crises da dívida soberana em países que recentemente se endividaram no processo de investimento em infraestruturas e capacidade produtiva para responder à então demanda global e agora se vêem em dificuldades em servir a dívida numa conjuntura de alta do dólar e de diminuição brusca da procura de diferentes commodities.

Cabo Verde desperta agora para atrair capitais externos depois que de um sono em que se auto- induziu fazendo acreditar e acreditando desde a crise financeira de 2008 que o capital estrangeiro tinha desaparecido. A realidade é que só desapareceu o capital especulativo na imobiliária turística. Muito outro capital ficou disponível, mas naturalmente ou se dirigia para os países com matérias-primas e outros produtos em grande procura ao nível global ou então investia em países com uma excelente competitividade externa e com um bom ambiente de negócios. É evidente que Cabo verde pela sua pobreza em recursos naturais não pertence ao primeiro grupo. Mas também por não ser competitivo nem ter um bom ambiente de negócios dificilmente podia constituir um porto seguro e lucrativo para o investimento directo estrangeiro.

De qualquer forma o governo não estava para aí virado. Durante anos manteve a sua linha de governação conseguindo crédito e investindo em infraestruturas de valor e utilidade duvidosos e em que a relação custo/benefício não trazia qualquer conforto. Mesmo quando se tornou claro que a economia não arrancava apesar dos milhões investidos, o crowding in de investimento nacional e estrangeiro não acontecia e que o desemprego não caía como desejado e prometido continuou a insistir que a culpa estava na crise financeira internacional. Lá fora a liquidez dos mercados financeiros era enorme com as políticas dos banco centrais de injecção de dinheiro na  economia. Pouco ou nada chegava a Cabo verde porque nas condições existentes do país não se via onde e porquê investir cá.

Culpabilizar o outro pelo mal ou as dificuldades da vida é um jogo que já vem custando caro a Cabo Verde a todos os níveis. A perda de perspectiva da realidade é uma das suas principais consequências. Nas proximidades de mais um pleito eleitoral é crucial colocar na devida perspectivas as promessas eleitorais postas em cima da mesa. Há quem fale agora em priorizar o emprego numa perspectiva linear como se o desenvolvimento se fizesse em etapas pré-estabelecidas e tivessem momentos certos para acontecer. O desenvolvimento porém é muito concreto. As pessoas precisam ter um rendimento digno, ter possibilidade de escolha na organização da sua vida e encontrar o ambiente certo para dar vazas à sua imaginação, exercitar a sua iniciativa e saciar as suas ambições. 

Coarta-se tudo isso quando os agentes do Estado se colocam em posição de serem arrecadores/distribuidores de tudo e não de facilitadores/reguladores do progresso social e económico. A população é tornada submissa e passiva. Num ambiente desses ninguém vê necessidade para atrair capital estrangeiro. Exportações de bens e serviços não são vistas como prioridades. Confunde-se deliberadamente meios com produção, produção com vendas, produtos que não são transaccionáveis com os transaccionáveis. Enquanto durar a ajuda externa tem-se a ilusão do desenvolvimento. Quando a realidade muda, vêem-se as consequências: o rendimento decresce, aumentam os riscos macroeconómicos, a perspectiva de emprego perde-se  e cada vez fica mais difícil libertar-se da modorra que contamina a todos.

Uma outra atitude voltada para o mundo precisa-se. O país que escolhe um novo governo para os próximos cinco anos a 20 Março tem a oportunidade de se reconduzir para o caminho da realidade. Através do confronto democrático de ideias e projectos certamente vai encontrar o caminho para garantir liberdade, felicidade e progresso para todos.

Guiné-Bissau. PRS “responsabilizará criminalmente” quem impedir aos seus deputados acesso à ANP



O Porta-Voz do Partido da Renovação Social (PRS), Victor Pereira advertiu esta terça-feira, 16 de Fevereiro, que o seu partido “responsabilizará criminalmente” quem impedir o acesso dos deputados dos renovadores às instalações da Assembleia Nacional Popular (ANP).

Falando a’O Democrata numa conferência de imprensa realizada na sua sede em Bissau, Victor Pereira acusou que a sessão inicialmente marcada para o dia 15 de corrente mês e adiada para dia 25 do mesmo,  é outra “manobra de uma clara tentativa de dar tempo para que haja uma nova restrição judicial formatada aos interesses do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC)”.

O porta-voz da segunda maior força política guineense considera ainda de “desrespeito” as ausências do PAIGC nas reuniões negociais promovidas pelo Presidente da República e acusa o partido no poder de“tentar implantar a lógica constitucional de Partido-Estado, o regresso retrógrado de centralismo democrático, subvertendo desta forma as conquistas democráticas”.

Para Pereira, o PAIGC é o responsável por sucessivos atropelos à lei, motivados por capricho partidário que não permitiram um normal e regular funcionamento do Parlamento.

“De uma vez por todas, esclareça-se que o que move o Partido da Renovação Social é fundamentalmente a sua agenda, e não poderá permitir impávido e sereno a promoção da subversão dos pilares de um Estado democrático. Lutaremos dentro dos limites da lei para que a verdade democrática seja reposta, para que os 15 deputados da nação não sejam retirados nenhum direito que lhes é assistido pela lei e pela Constituição da Republica”, esclareceu.

Aguinaldo Ampa – O Democrata

POLÍCIA ANGOLANA DETÉM EM LUANDA ATIVISTA EMILIANO KATUMBELA



O ativista cívico angolano Emiliano Katumbela foi detido, segunda-feira (15), por elementos do Serviço de Investigação Criminal (SIC) perto da sua residência, nos arredores de Mirú, município de Viana, em Luanda.

Luanda - O ativista cívico angolano Emiliano Katumbela foi detido, segunda-feira (15), por elementos do Serviço de Investigação Criminal (SIC) perto da sua residência, nos arredores de Mirú, município de Viana, em Luanda, informa a rádio VoA.

Katumbela foi levado por agentes do SIC no final da tarde quando tentava saber por que tinham invadido a casa da mãe momentos antes.

Além de não ter obtido nenhuma resposta, o activista foi levado e espancado pelos agentes da SIC, de acordo com fontes próximas de Katumbela.

A comandante da polícia em Viana Francisco Notícia, contatado pela rádio VoA, não quis comentar a ocorrido.

Emiliano Katumbela esteve preso em 2013 na Prisão de Viana devido à sua participação numa manifestação contra o Governo.

Katumbela pertence ao autodenominado Movimento Revolucionário Angolano e é reconhecido como activista pela organização internacional de defesa dos direitos humanos Frontline Defenders.

África 21

Angola. Fernando Heitor: “A crise surgiu por causa do laxismo do Executivo” - entrevista



Economista e deputado à Assembleia Nacional, Fernando Heitor é um dos mais destacados parlamentares da UNITA. Nesta conversa a O PAIS, realça que o Governo reagiu mal à crise económica e financeira que Angola vive, assim como à adopção da desdolarização. O que se vive hoje no país, em termos económicos e sociais, e resultado das daquilo que foi adoptado pelo Governo, que , segundo Fernando Heitor, reagiu com medo aos problemas que o país enfrenta actualmente.

O que achas desta crise que o país atravessa?

Deixa-me primeiro agradecer a sua amabilidade e do vosso jornal, O PAÍS que de resto é o melhor jornal que a gente tem na nossa terra. De facto, o país não está mesmo bom em três dimensões. Na dimensão financeira por causa da crise causada pela queda brusca do preço do petróleo, que arrastou consigo a crise económica e a crise sócio-política.

E a crise financeira surge mais por causa do laxismo do nosso do Exeutivo, que quando o país conheceu o boom depois dos primeiros anos do período de paz, os lucros e os excedentes, as receitas avultadas que nós conseguimos porque apanhamos uma boa maré do mercado internacional, no que concerne ao petróleo.

Está-se a referir ao período em que o petróleo esteve acima dos 100 dólares?

Exactamente. O petróleo esteve acima dos 100 dólares e a produção interna aumentou. Portanto, há dois factores: um é a quantidade produzida e o outro é o preço. Tivemos a sorte de neste período ter um mercado internacional favorável ao petróleo, com o preço alto, e também o mercado interno de produção também bastante favorável porque não havia muitos constrangimentos na produção petrolífera.

Isto provocou-nos o arrecadar de valores avultados em cambiais, dólares dos Estados Unidos da América, o que nos fez criar reservas que espantaram muitos países do mundo, principalmente os países do G-7. Chegamos a atingir como nunca aconteceu antes reservas internacionais líquidas que nos permitiam fazer importações acima dos oito meses.

Em termos comparativos, estes rankings são importantes, porque um país que tem reservas internacionais líquidas que lhe permitem importar à vontade durante seis ou mais meses, isto é óptimo. A tal ponto que nós também nos demos ao luxo de criar vários fundos, um dos quais Fundo Soberano. Só com muito dinheiro você avança para a criação destes fundos.

Nesta altura, perdoe-me a imodéstia, já eu falava e insistia muito nisso, inclusive em conferências que dei lá fora em Portugal e Inglaterra, na necessidade de apostar noutros sectores que são privilegiados. Deus abençoou-nos, deu a Angola um potencial imenso num conjunto de áreas. Não só na área dos recursos minerais, mas também na agricultura, na pecuária, na silvicultura. Não precisamos de apostar em todos, mas era preciso procurar a diversificação da economia como se diz hoje. E não era preciso que naquela altura fosse no todo, porque na agricultura havia um handicap.

A desminagem?

Sim. Grande parte da terra arável estava minada. Mas podia-se apostar noutros sectores.

Quais deveriam ser as prioridades a nível da diversificação?

Uma das apostas bem feitas –porque também temos que ter a honestidade intelectual para o dizer, embora estejamos na oposição – foi a reconstrução das infraestruturas rodoviárias. Durante a guerra o país estava dividido em duas ou quatro partes e as pessoas não podiam transitar para outras.

Portanto, era necessário ligar o país de Cabinda ao Cunene e do mar ao Leste. Isso foi feito. Só que foi feito de forma não totalmente boa. A reabilitação das estradas não foi feita em qualidade, mas sim em quantidade. A preocupação maior foi de quilómetros quadrados de asfalto.

Descurou-se a qualidade no seu ponto de vista?

Descurou-se a qualidade de tal modo que você tem visto todos os anos que as estradas nacionais e provinciais ficam esburacadas. Mas isso é um outro aspecto. Se se tivesse tomado medidas preventivas e de visão de futuro, não um futuro de longo prazo, mas sim de médio prazo, considerando que o petróleo entra ciclicamente em crise desde os anos 60, 70, 80….

Inclusive nos anos 2000. Sim. O petróleo não é uma comodite estável no mercado internacional. Tem uma volatilidade no seu preço que é de bradar os céus. E qualquer governante deve saber que apostar só no petróleo não é prudente.

Tem riscos, estamos agora a sentir e já os sentimos em 1980 e agora com maior acutilância. É evidente que um país que depende tanto dos cambiais resultantes da venda do petróleo, que é o único produto de exportação que nos garante cambiais, porque os diamantes que nos poderiam também garantir alguns cambiais não garantem. Há aí algum acordo qualquer com os generais e uma evasão fiscal no sector diamantífero que é impressionante. Nem dá para acreditar. Portanto, Angola depende quase que exclusivamente de cambiais do petróleo. Baixou de produção, sabe que a nossa meta ideal é a produção de dois milhões de barris por dia e nunca lá chegamos.

O preço caiu de forma drástica em mais de 50 por cento. Em termos de cambiais para um país como o nosso, que tudo ou quase tudo, acima de 75 por cento do seu consumo em bens e serviços vem do exterior, tem que ser pago em dólares, o sector económico ficou em crise também. Portanto, a crise actual é uma crise financeira e económica.

Começou do dinheiro, das finanças, dos cambiais e agora é económica e sócio-política, porque o desemprego aumentou, os salários estão congelados. Não obstante, todos os outros preços de que o ser humano precisa para reproduzir a sua força de trabalho e não só sobem, mas sobem em espiral.

Temos uma taxa de inflação que já vai nos 14 por cento, que são dois dígitos. Temos uma taxa de câmbio infernal. Portanto, o senhor jornalista e eu que dependemos em mais de 75 por cento do mercado externo precisamos de dólares, porque o arroz que você consome, a carne, a manteiga e outros produtos são importados.

Nós indirectamente pagamos também em dólares, estamos quase a chegar ao sufoco. Nós , os da classe média, porque a classe mais desfavorecida já está no sufoco. Depois a medidas que se tomam, não sei se me vais perguntar mais tarde, porque estou a responder muito extensivamente a esta pergunta.

Havia alternativas face à alteração do orçamental do Executivo tendo em conta a queda brusca do preço do petróleo? Há sempre alternativas. O Governo depois reage de uma forma desesperada qual criança apanhada a comer os bolinhos que a mamã escondeu.

Pode explicar melhor?

O Governo reage de uma forma tão nervosa, amedrontada que enerva o mercado. Se se lembra dos discursos do Chefe do Executivo e dos outros ministros quando começou-se a sentir que o preço do petróleo estava baixar. Isso enervou tremendamente o mercado, concretamente o sector bancário. De tal forma que o sector bancário, que de facto são empresas, começou-se a escudar do dólar.

Muito dos dólares que o Governo e o Banco Central depois veio à ribalta dizer que ‘continuamos a injectar dólares no mercado’, a quantidade de dólares no mercado continua a ser mais ou menos a mesma. Começaram a sumir. Você mesmo com conta bancária com dólares ou euros nos bancos não pode levantar, há restrições no levantamento. Hoje então há quase uma restrição total.

O que está a dizer é que tudo foi causado pela forma como o Executivo está a lidar com a crise?

Exactamente. Os empresários começaram a se refugiar no dólar, principalmente no sector bancário. É a única forma para eles terem lucros. O nosso sector financeiro deixou de ocupar o seu papel principal de intermediação financeira.

Há dias, o governador do Banco Nacional de Angola, José Pedro de Morais, disse que a falta de dólares no mercado deve ser imputado aos bancos comerciais. Então é verdade?

É isso o que estou a dizer. E esta postura dos bancos, que é uma postura defensiva, começou-se a notar já a partir do ano passado. Por que quando há crise é a altura em que devemos ter serenidade, que os líderes devem ser os mais serenos. Nem sequer precisamos de ir à Biblía. Jesus Cristo, quando os seus discípulos estavam no barco, o mar bravo e eles a chamarem: ‘mestre, mestre’, ele disse: ‘tenham calma’.

Portanto, o líder não pode mostrar que está mais assustado que os seus discípulos. É claro que a economia tem variáveis objectivas e subjectivas. Os dirigentes esquecem-se da componente subjectiva que é muito forte. A componente subjectiva é provocada pelas pessoas. As pessoas têm reacções várias e múltiplas. Procuram defender-se, ninguém quer morrer à fome, à sede ou às escuras. As pessoas buscam alternativas. Os políticos muitas vezes só se lembram das pessoas quando é para conquistar votos.

É no nosso?

É no nosso caso sim, mas também nos outros países. Por isso é que os tecnocratas são necessários. O problema é que no nosso país os tecnocratas que estão lá ao serviço do governo são um tanto quanto cobardes, desonestos do ponto de vista intelectual e têm medo de perder os seus lugares.

A economia é um exercício de verdade, não se esconde. Os factos económicos não se escondem, não se fintam, resolvem-se. Quando você vai esconder isso porque o dirigente político não quer receber más notícias, só vais transmitir aquilo que os chefes políticos querem ouvir, mais tarde a bolha rebenta e você está tramado como tecnocrata. Um tecnocrata – e você sabe que também sou embora ao serviço dos políticos – deve ser o mais rigoroso a fazer leituras e a transmiti-las ao Chefe. E dar vários cenários: o bom, óptimo e o razoável.

Quando tivemos a crise do petróleo em 2007-2008, muitos tecnocratas diziam que Angola não seria abalada e depois vimos o contrário. Não será receio sobretudo numa fase tão complicada como a que estamos a viver?

O técnico tem que fazer leituras prudentes e rigorosas. A realidade é a realidade e transmiti-las e apresentar sinais de soluções. Portanto, nem oito nem 80. Na altura, atrasaram-se a anunciar a crise e disseram que Angola estava imune.

Há algum país do mundo que está imune da crise. Nem a Coreia do Norte que anda lá isolada no seu cantinho, mas ainda assim sofre das sanções. Não há nenhum país do mundo que se pode sentir completamente autosuficiente. Nem que tenha reservas internacionais líquidas como a China, que é o país com mais reservas do mundo.

Os países relacionam-se do ponto de vista político, comercial e financeiro. Agora, também quando há crise, você como Chefe de Estado, líder ou político não pode vir mais assustado do que toda a gente. Você provoca com isso um nervosismo tremendo no mercado. E os empresários são astutos, sobretudo os que estão bem posicionados. Ninguém quer perder dinheiro.

No inicio desta conversa disse que Angola tinha reservas líquidas que até surpreendeu alguns países do G-7. Neste momento, o país está em condições de garantir seis meses de importação de produtos?

Eles dizem que anda por aí.

Mas eu pergunto ao deputado Fernando Heitor?

Eu acho que não. Acho que a estratégia de visibilidade internacional que tem sido levada a cabo pelo Executivo é muito onerosa e está-se a apostar por aí. Continua a ser mantida, de tal forma que as reservas internacionais que são quase consideradas sagradas diminuíram e teve que se tirar algum dinheiro. Mas ainda estão a um nível razoável.

Fala-se em 25 mil milhões de dólares. Sabe disso?

Dava para importar seis meses, mas antigamente dava para mais. Agora dá para importar por aí cinco ou seis meses, mas com importações mais baixas. Antes, as importações estavam livres, você fartou-se de ver o dólar a caminhar. Você ia comprar bombó com ginguba e pagava em dólares se não tinha Kwanzas. Eu na altura também já tinha alertado que a economia estava dolarizada de uma forma estúpida.

Mas houve um processo de desdolarização da economia. Não surtiu efeitos?

Mas o processo de desdolarização começou tarde. Você habitou o angolano, depois da paz, a usar e a abusar do dólar. De tal forma que o cidadão estrangeiro que estava cá ficava perplexo como é que é possível? Estes tipos ou são muito ricos e têm muitos dólares, mais que muitos países do mundo, ou são tolos? Escrevi crónicas sobre isso, alertei em vários debates na Assembleia Nacional.

Você ia a qualquer país africano, Namíbia, Zâmbia, África e o dólar não pode circular ou andar no bolso das pessoas para comprar chupa-chupa! O dólar é cambiado no banco e tem circuitos próprios, porque o dólar é uma moeda de reserva por excelência e que todos os países do mundo aceitam. Você quer comprar bens e serviços em qualquer país do mundo tem que utilizar o dólar. Ou outra moeda convertível como o Euro, a libra, o franco suíço.

E o yuan?

Yuan? O yuan não é aceite em qualquer lado. Então, o dólar é uma moeda que você não pode permitir que o povo utilize para transações minúsculas e locais. As transações nacionais têm que ser feitas na moeda nacional. O Executivo levou tempo a entender isto. Muita gente enriqueceu a utilizar o dólar no mercado paralelo.

Até as mulheres camponesas punham os seus bancos aÍ na rua, começavam a agitar as notas e você ia lá cambiar. Quer dizer que o dólar tinha circulação livre e no mercado informal. É um comportamento de lesa-pátria, uma atitude criminosa do ponto de vista económico. Foram sempre cometidos estas atoardas económicas, asneiras, erros de palmatória e a economia não perdoa. Quantos milhares de dólares o país perdeu por esta via?

Quantas centenas de milhões de dólares foram desbaratados por esta via? O acordo monetário entre Angola e a China tem razão de ser ou é um escape à escassez de dólares?

Não tem razão de ser coisa nenhuma. É muito cedo. Vai ser uma relação desigual. A China é um portentado, é a segunda maior economia do mundo. Produz e exporta quase tudo. Estamos a falar de bens transformados e não a produção de matérias-primas. O que é que nós produzimos e exportamos de bens transformados? Que indústria é que nós temos? Como é que você vai permitir que a moeda chinesa entre cá e o Kwanza possa entrar lá? Quem é a que beneficia?

A relação de força como é que fica? A China trás os yuans e compra aqui tudo o que quiser. E depois? O que é que vamos vender lá? É uma relação de troca desigual. Depois os yuans vão ter que ser devolvidos em dólares e os Kwanzas também, se calhar. Onde é que vão sair os dólares? É evidente que os chineses podem comprar tudo o que existe aqui. Essa via rápida, a partir de Viana até lá em baixo, todas aquelas empresas são quase todas chinesas. Pode ser que por trás haja um ou dois angolanitos, mas a maior percentagem do capital é chinês. Há inclusive o China Town.

Parecem existir já duas China Towns ou não?

Há duas? Haverão mais em Angola. Se permitirmos que o Yuan entre aqui, os chineses como têm biliões e biliões compram o que quiserem. Se permites a entrada livre da moeda deles, então acabou tudo. E o chinês não tem problemas de acomodação. O chinês adapta-se melhor do que o português fazia no tempo colonial. Eles podem ter só um senão em termos de reprodução.

Do ponto de vista político e ideológico sou de centro-esquerda.

Ainda não viu alguns sino-angolanos?

Está bem, mas o português veio com uma força incrível. Também há problemas culturais aqui, as nossas mulheres aceitam menos os chineses. Agora já devem estar a aceitar por causa da crise. Depois vamos ver os Yuans a serem vendidos nas ruas como foram vendidos os dólares e a dependência mantem-se. O ciclo vicioso da dependência poderá deixar de ser o dólar e passará a ser do Yuan.

As soluções imediatistas não resolvem. Quando há crises é preciso que o sábios se sentem, analisem e definam qual é o melhor caminho, pesando bem os prós e os contras, custos e benefícios. Não é com medidas destas de inspiração instantânea, como se tivesse dormido ontem, pegou o sono e acordou hoje. Somos 24 ou 25 milhões de pessoas aqui, através de estatísticas um bocado mal feitas, mas somos mais. É preciso ter muito cuidado.

Em 2015, o preço do barril do petróleo esteve acima das metas orçamentais, mas agora estamos um pouco acima dos 30 dólares. É necessário um orçamento retificativo?

Para lhe ser franco, sim e não.

Sim e não? Por quê?

Se nos próximos dois meses, a oscilação do preço do petróleo não ultrapassar os 35 ou 36 dólares por barril, e não se aproximar dos 40, que é não é o valor orçamental, então é preciso rever o orçamento. Os próximos dois meses seriam Março e Abril. Mas ou menos a meio do ano se não houver tendência a de o preço chegar chegar a 40 ou passar um bocadinho, então convém alterar o orçamento. Se a tendência for de chegar perto dos 40 dólares, então não vale a pena mexer.

A Moddys diz que o preço poderá estar cifrado a nível dos 29 dólares. O que acha disso?

Não nos vamos precipitar. Mexer num orçamento por causa de uma diferença de 10 ou de cinco paus também tem custos. Não só a fazer o orçamento, mas também as expectativas que se goram. É preciso ter cuidado. Mas se o preço do petróleo continuar a não passar dos 35, ter tendência decrescente até Maio ou Junho, é preciso depois no segundo semestre fazer a revisão do orçamento.

Concordará comigo que é preciso manter o Estado social no país?

É óbvio.

Onde é que o Executivo poderá buscar receitas para manter os projectos socais que conhecemos?

Você fez uma pergunta inicial no sentido afirmativo e concordo consigo. O Estado, na minha opinião porque sou de centro esquerda, sou um discípulo económico do keynesianismo. Não sou dos Adam Smith ou da Escola de Chicago. Do ponto de vista político e ideológico sou do centro-esquerda. Não sou nem comunista nem das direitas, etc.

Para mim, o Estado tem que manter o seu papel fundamental na defesa das classes mais desfavorecidas. O Estado social é importante. Um Estado que procura a solidariedade, algum equilíbrio na base e a partir daí há uns que estudaram mais, mais fiéis, mais empreendedores ou criativos que avançam. Tornam-se ricos ou muito ricos.

Há uns mais chico-espertos que vão roubando por aí, desviando o erário público ou fazendo as suas confusões. Mas tem que haver uma base em que o cidadão possa viver com dignidade. O Estado social ao fim e ao cabo é isso. Não pode haver extremamente pobres e extremamente ricos.

Mas onde é que o Estado vai buscar as receitas para manter o Estado social?

O Estado vai buscar as receitas no combate acérrimo, tolerância zero à corrupção. Aí já consegue algum dinheiro. A Tolerância Zero que o próprio Presidente da República já declarou há vastos anos. Depois tens mais: o combate ao despesismo, aos gastos sumptuosos, as obras ostentatórias. As pirâmides, tipo que estamos no Egipto no tempo dos Faraós.

Temos que ir aí nas obras descartáveis, fiscalizar melhor as obras públicas. As obras públicas são um bebedouro de dinheiro que é uma coisa incrível. Torram dinheiro que é uma coisa incrível. Estas estradas ou pontes mal feitas depois voltam ao mesmo empreiteiro para fazer de novo. E de novo a mesma rua do Cazenga, Viana, Maculusso ou Rangel, é um sorvedouro de dinheiro. É a mesma coisa sempre e sempre.

Quando é que a tua rua foi intervencionada pela última vez. Passei pelo vosso portão e vi que cavaram recentemente?

A minha rua é nova, mas estão sempre a cavar. Ora porque se esqueceram do cabo eléctrico ou tubo de água. Já tínhamos água aqui, mas agora porque estão a abrir para meter mais um tubo de água. A nós nunca nos faltou água há cinco anos. Você toma banho nos chuveiros nos anexos, para não falar da casa grande. Os chuveiros agora não têm um pouco de água. Pensávamos que era para colocar estes cabos de internet. Se calhar o administrador anterior não anunciou ao novo que nesta zona toda há cinco ou seis anos que nunca faltou água.

Onde é que o Governo deve cortar as despesas?

Se cortarem as viagens, nas embaixadas consulares vai-se buscar algum dinheiro. Angola é dos países em África com mais representações internacionais, mais do que a África do Sul. Está certo isto? Mais do que a Nigéria, está certo isto? Tens embaixadas em países em que o Presidente deles nem sequer sabe onde é que fica Angola. As nossas embaixadas lá fora funcionam em instituições que tem que se ter cuidado, em palácios. As residências dos nossos embaixadores, não estou contra isso, acho que têm que ter condições de habitação e de trabalho. É preciso tanta gente em tantos países do mundo a gastar do erário público? Você acha que é preciso uma província ter dois vice-governadores ou três? Para fazer o quê agora que estamos em crise?

Acha que o Governo deveria emagrecer?

Claro. O Executivo tem uma gordura incrível. O Executivo angolano é obeso. É de uma obesidade que dá pena, por isso é tão lento a reagir perante as situações periclitantes ou alarmantes. Depois tem um Presidente que centraliza o poder real. Ele é o titular do poder Executivo e os outros são auxiliares dele.

Quer dizer que qualquer um dos nossos ministros é auxiliar do titular do poder executivo. E eles dizem mesmo isso sempre cedo para gente não se esquecer. Quer dizer que o poder está todo centralizado. Qual é a coragem que um governador do Huambo, Cunene ou de qualquer outra província tem para tomar sem informar os donos do poder? Ele fica com medo. Tem que mandar primeiro o email para o Presidente, mas não sei se o Presidente recebe email ou não?

Até a carta chegar o problema já rebentou e a solução já está atrasada. Já tem que se arranjar uma outra. A forma como está estruturado o Executivo e a quantidade de pessoas que nele funcionam complica a resolução dos problemas.

Torna morosa. É muita burocracia. E você sabe que a burocracia é um dos principais inimigos da eficiência e da eficácia. Há problemas que exigem solução rápida. Eu, sinceramente, com o devido respeito que todos eles me merecem, especialmente os governadores e também os ministros, não estou a ver nenhum ministro ousado, capaz de lá longe na província tomar uma decisão e depois informar ao Presidente que ‘o problema é este e já decidi’. Mentira, primeiro informam o Presidente e depois o Presidente e os seus colaboradores gizam a solução e dizem faz assim ou assado!

A retirada dos subsídios dos combustíveis e a cobrança do Imposto Predial Urbano (IPU) são medidas acertadas?

Vamos por parte: como você sabe, os subsídios estavam com um preço subsidiado. Obrigavam o Estado a fazer um esforço financeiro enormíssimo em que estavam em causa biliões de dólares, se quiser. O que quer dizer triliões de Kwanzas ou mil milhões de Kwanzas.

Também é preciso que se diga que estávamos a pagar o preço dos combustíveis muito baixo, mesmo sendo produtores de petróleo. A classe menos favorecida, a maioria da população, não estava a ser favorecida. Nós mesmo da classe média é que estávamos a beneficiar mais, temos carros topo de gama V8, V 6 e funcionais.

Os comerciantes que enchiam os bidões, contrabandistas, iam vender nas fronteiras. Os combustíveis que você mete nos bidões são subsidiados e vais vender nas fronteiras. Mas era necessário fazer a actualização ou subida dos preços, mas o problema não está na intenção de subir. O problema está na forma como se faz a subida. Você olha para um doente e diagnostica uma doença: uma malária.

Entrevista de Dani Costa – O País - fotos de Daniel Miguel

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Angola. ERRADICAÇÃO DO ANALFABETISMO



Jornal de Angola, editorial

A alfabetização em todo o país tem sido uma experiência exemplar ao longo de mais de três décadas e, num momento em que enfrentamos desafios que tornam a literacia  um importante aliado da saúde, vale a pena a aposta.

Em Benguela, a Organização da Mulher Angolana (OMA) encara o repto da alfabetização como uma prioridade no apoio aos esforços do Executivo para a aceleração escolar de cidadãos iletrados. A responsável da OMA naquela província, Leonor Fundanga, assegurou que a estrutura que dirige, com o envolvimento de todas as suas filiadas, pretende empenhar-se na luta contra um dos flagelos que emperram o desenvolvimento do país.

Na verdade, o analfabetismo constitui um grande empecilho  à realização pessoal, inclusive a partir das coisas elementares da vida e com forte peso na gestão da saúde,  relações familiares e na comunidade.  Apesar do crescente índice de literacia, cerca de um terço da população angolana é ainda iletrada, razão pela qual urge alterar o presente quadro com processos massivos de alfabetização em todo o país. O exemplo de Benguela deve ser seguido por outras províncias do país para que sejamos capazes de enfrentar os numerosos desafios com sucesso.

Um adulto iletrado constitui um fardo para si mesmo, para a família, para a comunidade e para o Estado por várias razões. Dominados pelas amarras do analfabetismo, milhares de angolanos enfrentam muitas barreiras para levar uma vida digna numa altura em que os desafios ao nível da saúde, educação, higiene e segurança dependem da condição literária. Quando o Estado se mobiliza para fazer frente a desafios provocados por doenças e tudo que lhe esteja associado, é fundamental que as populações dominem determinadas orientações e passos, não raras vezes  escritos e carecendo da sua leitura.

Acreditamos que um adulto alfabetizado lida melhor com as exigências ligadas à preservação da saúde e prevenção contra as doenças que uma pessoa iletrada. A simples leitura de um receituário médico pode ser vital durante a medicação ou na hora de se evitar determinadas enfermidades. As advertências de segurança em determinados lugares só podem ser acatadas por pessoas letradas e livres do obscurantismo provocado pelo analfabetismo.

São vários os exemplos das vantagens completamente incomparáveis resultantes da alfabetização, factos que deviam servir como razões mais do que suficientes para o ingresso em massa às aulas de alfabetização. É bom saber que a OMA abraçou um projecto, em parceria com Governo Provincial de Benguela e a Direcção da Educação, que visa erradicar o analfabetismo sobretudo nas comunidades rurais.

Trata-se de uma iniciativa que deve contar com apoio das instituições públicas e privadas porque o aumento da literacia acaba por contribuir para maior participação na vida social, económica e cultural. Quanto maior for o grau de instrução através do  Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar (PAAE), melhor servida fica toda a sociedade, a começar pelas famílias, as comunidades e os empregadores.

Com 1.701 salas de aulas para o Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar, acreditamos que Benguela está na vanguarda da campanha de alfabetização, um acto que, no quadro do Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar,  dá equivalência da sexta classe após três anos de frequência  às aulas de alfabetização. E os números espelham bem o interesse pelo ingresso das populações, sobretudo no meio rural, numa altura em que não faltam incentivos. Segundo dados avançados pela OMA, das 101.743 pessoas, das quais 79.062 mulheres, enquadradas na alfabetização, entre 2011 e 2015, obtiveram aproveitamento positivo. Afinal, o ingresso é gratuito e as pessoas adultas, na condição de iletradas, precisam de vencer o estigma e ingressar às aulas de alfabetização para bem de si mesmas, da família e da comunidade.

É fundamental que um pouco por todo o país, continuem a ser realizados campanhas de sensibilização, palestras e iniciativas semelhantes para que as famílias encarem a alfabetização como um elemento fundamental para a construção de um país mais equilibrado, mais fraterno, mais justo, mais democrático e mais solidário. Fazemos votos de que as estruturas ligadas ao processo em curso em todo o país, que visa dar corpo à iniciativa do Executivo conhecida por Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar, sejam acompanhadas de formação e capacitação dos alfabetizadores.

E para o sucesso das acções em prol da erradicação do analfabetismo é  igualmente importante que fique assegurada a remuneração condigna dos alfabetizadores e a criação de condições para o surgimento de mais salas de aulas. Não há dúvida de que nesta obra o Executivo conta com todos, inclusive com a  colaboração das igrejas, das associações profissionais e outras organizações da sociedade civil, tornando possível a erradicação do analfabetismo.

Moçambique. HOMENS ARMADOS MATAM SECRETÁRIO DE BAIRRO EM SOFALA



Maputo, 16 Fev (AIM) - Homens armados, supostamente da Renamo, balearam mortalmente, na madrugada de segunda-feira, o secretário da localidade de Chirassicua, posto administrativo de Tica, distrito de Nhamatanda, na província central de Sofala.

Segundo anuncia o
Diário de Moçambique, a vítima, de nome Manecas da Silva, exercia também as funções de também exercia as funções juiz comunitário de Chirassicua e foi assassinada na sua residência.

O administrador do distrito de Nhamatanda, Boavida Manuel, confirmou o sucedido, detalhando que os bandidos também alvejaram, Dorca Benjamim, a esposa do finado, atingindo-a na coxa esquerda.

Manecas da Silva morreu no local dos acontecimentos enquanto Dorca Benjamim foi socorrida para Hospital Distrital de Nhamatanda de onde viria a ser transferida para o Hospital Central da Beira.

Segundo o administrador, a situação que se vive é de autêntico terror protagonizado pelos homens armados.

Acredito que durante o dia pode parecer normal. Mas quando anoitece o medo reina nas pessoas. Apelamos para que os homens armados parem com o terror para que as crianças e adultos fiquem a vontade, disse.

Em Janeiro ultimo, na província de Sofala, homens armados supostamente da Renamo balearam mortalmente, na sua residência, Paulo Tomo José, chefe de um povoado, no posto administrativo de Vunduzi, distrito de Gorongosa.

O assassinato de Paulo José foi protagonizado cerca de 01h00 da madrugada e ameaçaram a esposa, Rudia Candeeiro, e os quatro filhos, facto que criou pânico na família.


(AIM) - MAD/DT

Moçambique. Drama de falta de água: Uma realidade na cidade e periferia em Maputo



Recipientes vazios, torneiras se­cas. Este é o cenário que se repete em muitas residências da cidade e periferia de Maputo, há sete dias. O cenário agrava-se pelo facto de estarem a registar-se altas tempe­raturas na capital, uma situação que exige maior uso de água, quer seja para beber, quer seja para a higiene individual e colectiva.

Lurdes Monteiro é idosa e en­contrámo-la a fazer biscoitos para vender. À nossa reportagem, disse que a situação no seu bairro está a provocar muitos prejuízos. Con­tou que devido a falhas no forne­cimento de água, até por volta das 16h00, ainda não havia consegui­do tomar banho.

“Acordei às 02h00 e a água não saiu. Accionei o despertador para 03h00 e 04h00, mas nem uma gota. Até este momento, ainda não tomei banho. Hoje (ontem), para fazer os biscoitos, foi muito difícil, tive que pedir água em casa da minha sobrinha. Até a mi­nha casa de banho está imunda, não lavámos a louça, não sabemos quando é que este sofrimento irá acabar”, disse visivelmente triste.

O País

PR timorense questiona "instrumentalização política" da decisão de exonerar líder militar



Díli, 16 fev (Lusa) - O Presidente timorense "está surpreendido" com o que diz ser a "instrumentalização política" da sua decisão "natural e consequente" de exonerar o chefe das forças armadas, disse à Lusa fonte da Presidência.

Uma posição que Taur Matan Ruak vincou numa carta remetida ao primeiro-ministro, Rui Maria de Araújo, em que insiste que sempre tentou com o Governo procurar uma "solução concertada" para o caso que nos últimos dias tem causado grande tensão política no país.

Em causa está a decisão do chefe de Estado em exonerar o Chefe do Estado-Maior General das Forças armadas (CEMGFA), o major-general Lere Anan Timur, e nomear como seu sucessor o brigadeiro-general Filomeno da Paixão de Jesus.

Taur Matan Ruak não seguiu a proposta do Governo, que defendia a renovação do mandato de Lere Anan Timur.

O caso assumiu contornos políticos com as forças parlamentares a estudarem um eventual processo contra o Presidente da República por violação das suas obrigações constitucionais que, caso avance, poderia levar à destituição de Taur Matan Ruak.

Documentos e correspondência a que a Lusa teve acesso mostram a intransigência dos dois lados, com o primeiro-ministro, numa carta enviada ao chefe de Estado a 12 de fevereiro a manifestar "preocupação" pela decisão e a referir-se à "convicção de reservas de legalidade e constitucionalidade" da opção tomada.

Rui Maria de Araújo vai ainda mais longe sugerindo que a decisão pode "ser interpretada como diminuição de apoio ao normal funcionamento das instituições", pelo que, como disse ter sido acordado numa reunião que manteve com Taur Matan Ruak a 11 de fevereiro, a publicação do decreto da presidência "mantém-se suspensa a aguardar uma solução concertada entre o Presidente e o Governo".

Em resposta no mesmo dia, Taur Matan Ruak expôs as motivações da sua decisão e garante ter diligenciado "aturadamente" para que a sua posição "fosse considerada no processo de concertação" da decisão, sem que o Governo alterasse a posição.

Nesse caso, e por não haver acordo, "é dever do Presidente da República exercer as suas competências constitucionais" para evitar que a situação de interinidade no comando das F-FDTL se mantivesse eternamente.

O Presidente, escreveu Taur Matan Ruak, "não se limita a oficializar as propostas dos demais órgãos de soberania", pelo que a proposta do Governo não vincula o chefe de Estado.

"O Presidente não é um notário. É o comandante supremo das forças. E a interpretação das competências não pode transformar uma proposta do Governo numa decisão", sublinhou fonte da Presidência.

Lere Anan Timur sucedeu a Taur Matan Ruak, quando este decidiu regressar à vida civil, a 06 de outubro de 2011, pelo que o seu mandato de quatro anos terminou formalmente na mesma data do ano passado.

Na mesma situação, com mandatos a terminar nessa data, estão o vice-CEMGFA (brigadeiro-general Filomeno da Paixão de Jesus) e o chefe de Estado maior das forças armadas (CEMFA), sendo que este último, o coronel Falur Rate Laek, já cumpriu dois mandatos consecutivos de dois anos cada, o máximo permitido por lei.

"Desde essa altura todos (na chefia das F-FDTL) estão em situação de interinidade", recordou a fonte da Presidência, relembrando que o novo estatuto dos militares das F-FDTL, de março do ano passado, determina a passagem à reserva aos 60 anos.

A Presidência recordou ainda que o próprio Lere manifestou vontade no início de 2015 de abandonar o comando, aspetos que, segundo a fonte ouvida pela Lusa "não foram considerados pelo Governo".

A proposta do executivo (datada de 16 de outubro) chega a Taur Matan Ruak a 26 de outubro - "sem que o Presidente tenha sido ouvido", explicou fonte da presidência - que a devolve a 05 de novembro.

Segundo a mesma fonte, o Governo não enviou nova proposta, tendo Taur Matan Ruak retomado o assunto no início do ano, procurando nova proposta do executivo numa reunião do Conselho Superior de Defesa e Segurança a 04 de fevereiro.

O executivo manteve a sua proposta, pelo que Taur Matan Ruak "foi forçado" a "considerar as suas opções", decidindo que não nomear o novo CEMGFA poderia constituir uma violação das suas competências.

"Perante propostas irreconciliáveis, o PR foi colocado numa armadilha, quase a dizer que tinha que seguir a proposta do Governo. Isso é transformar uma proposta numa decisão", referiu a fonte.

ASP // VM

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Partidos timorenses estudam acionar processo constitucional contra PR - parlamentares



Díli, 16 fev (Lusa) - Os partidos timorenses com assento parlamentar estão a estudar um eventual processo contra o Presidente da República por violação das suas obrigações constitucionais ao exonerar o chefe das forças de defesa, disseram hoje fontes parlamentares.

Caso avance para o Tribunal de Recurso - a mais alta instância judicial do país - esse processo poderia levar à destituição de Taur Matan Ruak.

Fontes de três das quatro bancadas com assento parlamentar confirmaram hoje à Lusa que essa possibilidade tem sido debatida em várias reuniões políticas mantidas nos últimos dias, incluindo um encontro com os líderes das bancadas mantido no fim-de-semana passado.

"Estamos a debater a situação. Consideramos que foi uma decisão complicada do Presidente Taur", disse à Lusa fonte do Congresso Nacional para a Reconstrução de Timor-Leste (CNRT), partido que hoje fez uma declaração política, apoiada pelas restantes bancadas, a questionar a decisão do chefe de Estado.

"É uma situação muito complicada. Todos concordamos que o chefe de Estado não cumpriu as suas competências constitucionais adequadamente", frisou fonte da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), enquanto fonte do Partido Democrático (PD) referiu que se vive um momento "de grande complexidade".

O assunto assumiu contornos políticos há uma semana quando o chefe de Estado decidiu exonerar o chefe de Estado-Maior das Forças Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), o major-general Lere Anan Timur, promovendo como seu sucessor o brigadeiro-general Filomeno da Paixão de Jesus.

Taur Matan Ruak explicou ter optado "pela sucessão nas F-FDTL, dando continuidade ao processo iniciado em 2011 com a sua própria sucessão na liderança das F-FDTL".

A polémica surgiu, porém, pelo facto de a decisão de Taur Matan Ruak não seguir a proposta do Governo, aprovada na reunião do Conselho de Ministros de 12 de outubro do ano passado, que defendia a renovação do mandato de Lere Anan Timur.

Em causa está a interpretação sobre a forma como o artigo 86 da Constituição timorense, relativo às competências do Presidente da República, se aplica no caso de nomeação do chefe das forças de defesa.

O chefe de Estado, explica o artigo, tem competência de "nomear e exonerar, sob proposta do Governo", o Chefe do Estado-maior das Forças Armadas.

A Presidência da República insiste na interpretação de que o artigo não obriga o chefe de Estado a seguir a recomendação do Governo e que a decisão final lhe cabe exclusivamente a si, ou seja de que não tem que respeitar a proposta do Governo.

O executivo e os partidos parlamentares defendem o contrário, afirmando que esta é uma competência equivalente à da nomeação dos membros do Governo, neste caso, sob proposta do primeiro-ministro, pelo que Taur Matan Ruak deveria ter seguido a recomendação do executivo.

Este tema marcou as duas sessões plenárias do parlamento desta semana, com as bancadas a adiarem, na segunda-feira, uma votação da autorização para que o PR visite o Japão em março e a usarem o período antes da ordem do dia para criticar a decisão do chefe de Estado.

O assunto foi hoje novamente debatido com a bancada do CNRT a ler uma declaração em que ameaça o chefe de Estado de que se este não recuar na decisão pode avançar com um processo, num texto apoiado pelas bancadas da Fretilin e da Frente Mudança.

O CNRT refere que a competência de Taur Matan Ruak neste caso é "condicionada" e que se discordasse da proposta do Governo deveria ter falado com o executivo para procurar uma "solução concertada".

Apesar da decisão de Taur Matan Ruak ter sido comunicada pelo seu gabinete a 09 de fevereiro, oficialmente o decreto com a exoneração de Lere Anan Timur ainda não foi publicado no Jornal da República.

Fonte da Presidência confirmou à Lusa terem sido dadas instruções para suspender a publicação "mas apenas porque ainda não está marcada a cerimónia de tomada de posse que teria que ocorrer assim que o decreto fosse publicado".

Apesar disso, garantiu, "a decisão política do Presidente está tomada, mantém-se e não se vai alterar".

A iniciativa de um processo contra o Presidente do República por "violação clara e grave das suas obrigações constitucionais" está determinada no artigo 79 da Constituição.

Para avançar, o processo tem que ser proposto por pelo menos um quinto dos 65 deputados e a deliberação aprovada por maioria de dois terços.

O acórdão é proferido pelo plenário do Tribunal de Recurso no prazo máximo de 30 dias e "a condenação implica a destituição do cargo e a impossibilidade de reeleição".

ASP // VM

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A PERSISTÊNCIA DO ÓDIO NA SOCIEDADE BRASILEIRA



No Brasil a raiva e o rancor histórico foi acrescido depois das eleições de 2014, houve quem não aceitou a  derrota

Leonardo Boff – do Rio de Janeiro – Correio do Brasil, opinião

É fato inegável: há muito ódio, raiva, rancor, discriminação e repulsa na sociedade brasileira. Ela sempre existiu de alguma forma. Ou alguém acha que os milhões de escravos humilhados e feitos “peças” e as mulheres à disposição da volúpia sexual dos patrões e de seus filhos, não provocava surdo rancor e profundo ódio? É o que explica os centenas e centenas de quilombos por todas as partes no  Brasil. E o ódio dos patrões que com o chibata castigavam seus escravos desobedientes no pelourinho?

O ódio pertence à zona do de mistério. A própria Bíblia não sabe explica-lo e o vê já presente desde o começo, no jardim do Éden; o primeiro crime ocorreu com Caim que por inveja, que produz ódio, matou a seu irmão Abel. O mandamento era claro: ”Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo”(Levítico 19,18; Mateus 5,43). O ódio é inimigo dos homens e de Deus e ele semeia a cizânia na terra (Mt 13,19).

Mas eis que vem Jesus e reverte a lógica do ódio: ”Amai vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem”(Mt 5, 44). Ele mesmo sucumbiu ao ódio de seus inimigos mas, aceitando livremente a morte, “venceu  a morte pela morte” e assim derrubou “o muro da inimizade que dividia a humanidade”(Ef 2,14-16). Prega e vive o amor incondicional para amigos e inimigos. Inaugurou assim uma nova etapa de nossa  humanização.

Mas esse ideal nunca se transformou em cultura nos países cristianizados. Estamos ainda no Velho Testamento do “olho por olho, dente por dente”.

No Brasil a raiva e o rancor histórico foi acrescido depois das eleições de 2014. Houve quem não aceitou a  derrota e deslanchou um torrente de raiva  e de ódio que contaminou não apenas o partido vencedor, mas toda a sociedade. Inegavelmente criou-se um consenso ideológico-político de alguns meios de comunicação que, com total desfaçatez, difundem esse sentimento. O  que leva um radialista da Rádio Atlântica FM, ligada à RBS gaúcha, conclamar a população a “cuspir na cara do ex-Presidente Lula” senão um ódio explícito e incontido? A verdadeira perseguição judicial que Lula  está sofrendo, tentando enquadrá-lo em algum crime, é movida não tanto pela fome e sede de justiça, mas pela  vontade de punir, de desfigurar seu carisma e liquidar sua liderança. Grassa um maniqueísmo  avassalador que amargura toda a vida social. Bem dizia Bernard Shaw:”o ódio  é a vingança dos covardes”.

Mas tentando ir um pouco mais a fundo na questão do ódio, precisamos reconhecer que ele se enraíza em nossa própria condição humana, um feixe de contradições. Somos, por natureza, e não por desvio de construção, seres contraditórios, compostos de ódios e de amores, de abraços e de rejeições. É a escolha que fizermos que irá dar rumo à nossa vida: ou a benquerença ou  a aversão.  Mesmo escolhendo o amor, o ódio nos acompanha como uma sombra sinistra. Se não cuidamos dele, ele invade nossa consciência e produz sua obra nefasta.

Esse realismo o encontramos na Bíblia. Mas também num pensador como Bertrand Russel que observou com acerto: ”o coração humano tal como a civilização moderna o modelou, está mais inclinado para o ódio do que pra a fraternidade”. Lógico, se ela colocou como eixo estruturador a concorrência e não a colaboração e a luta de todos contra todos em vista da acumulação privada, entende-se que predomine a tensão, a raiva, a inveja a ponto de o lema de Wall Street ser :”greed is good”: a cobiça é boa.

Mas há  um ponto que precisa ser referido, observado já por F. Engels quando escreveu uma introdução ao livro de Marx sobre “A luta de classes na França”: ”Se houver alguma possibilidade de as massas trabalhadoras chegarem ao poder, a burguesia não admitirá a democracia sendo até capaz de golpeá-la”. Ora, através de Lula, o PT e seus aliados, vindo das massas trabalhadoras, chegaram ao poder. Isso é inadmissível pelos “donos do poder”(R. Faoro).  Estes procuram inviabilizar o governo de cunho popular, desconsiderando o bem comum.

Aqui valem as palavras sábias do velho do Restelo de Camões: “Ó glória de mandar, o vã cobiça/Desta vaidade a quem chamamos fama./Ó fraudulento gosto, que se atiça/Com uma aura popular que honra se chama” (Cântico IV, versos 94- 95). Por detrás da busca ”da glória de mandar” e do poder, revestido de raiva e de  ódio, se esconde, atualmente, a vontade  daqueles que sempre o detiveram e que agora o perderam e fazem de tudo para recuperá-lo por todos os meios possíveis.

Leonardo Boff, é articulista do JB on line e escreveu:Virtudes por um outro mundo possível(3 vol.),Vozes 2005.

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