segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Justiça na Guiné Equatorial "fabricou acusações" a `cartoonista`


O julgamento de um `cartoonista` sobre quem pendem acusações dúbias, aparentemente em retaliação à publicação de `cartoons` críticos ao Governo, serão um teste à independência da Justiça e à liberdade de expressão na Guiné Equatorial, consideram hoje organizações internacionais.

Num comunicado, sete organizações não-governamentais e de defesa dos direitos humanos, entre elas a Human Rights Watch (HRW), lembram que o julgamento de Nsé Ramón Esono Ebalé começa na terça-feira em Malabo, onde se encontra detido desde que foi preso, a 16 de setembro de 2017.

Esono Ebalé, que tinha vivido fora do país desde 2010, é um "cartoonista" que utiliza o desenho para caricaturar altos funcionários do Governo equato-guineense.

Numa das caricaturas, desenhou o retrato do Presidente Teodoro Obiang Nguema, bem como de outras altas personalidades do regime a roubarem dinheiros públicos para financiarem vidas luxuosas sem se preocuparem com a pobreza dominante no país.

"Ramón não fez nada mais do que perguntar o que o resto do país tem medo de perguntar e a resposta que obteve foi uma cela na prisão. Devia ser feito algo mais para desafiar essas instituições, esses interesses e esses indivíduos que não permitem ao Governo da Guiné Equatorial operar sem ser fora dos limites da lei", disse Robert Russel, diretor executivo da Rede Internacional dos Direitos dos Cartoonistas (CRNI).

Além da CRNI e da HRW, integram também o grupo o Comité para Proteção de Jornalistas (CPT), EG Justice, Federação Internacional para os Direitos Humanos (IFHR), Índice sobre Censura e PEN International.

Esono Ebalé foi preso quando regressou à Guiné Equatorial para renovar o passaporte, acompanhado por dois cidadãos espanhóis.

Os três foram inicialmente interrogados em conjunto na sede da Polícia em Malabo, mas os dois espanhóis acabaram por ser libertados, pouco depois.

Um deles indicou que o interrogatório se focou unicamente no trabalho de Esono Ebalé como artista e que a polícia referiu que apenas membros de partidos políticos legalizados podem criticar o Governo.

Três dias após a detenção, a televisão estatal noticiou que Esono Ebalé fora preso por contrafação e tentativa de lavagem de dinheiro, mais concretamente no valor de 1.800 dólares em moeda local encontrados no carro que conduzia.

Na notícia, é indicado também que a polícia tinha seguido os passos do cartoonista nas suas múltiplas viagens ao país desde 2014, apesar de ter sido visto a destruir o passaporte equato-guineense num vídeo colocado no Youtube em 2012.

Esono Ebalé acabou por ser acusado apenas 82 dias depois da detenção, período em que o juiz de instrução não respondeu a três recursos submetidos pelos advogados do `cartoonista`, o que, escrevem as sete ONG, "põe em causa a credibilidade da prova".

Por outro lado, acrescentam, "viola a lei" do país, uma vez que o suspeito tem de ser libertado até 72 horas depois da detenção se não houver acusação.

"Ramón tem estado sentado na prisão há mais de cinco meses e a acusação ainda não apresentou provas concretas, o que deixa antever que esta situação vergonhosa constitui uma retaliação pelos `cartoons` mordazes" de Esono Ebalé, disse, por seu lado, Mausi Segun, diretor da HRW para África.

O caso de Ebono Ebalé ganhou projeção internacional, sobretudo por parte de outros `cartoonistas`, que se têm mobilizado para o apoiar.

A 02 deste mês, a Comissão Africana para os Direitos Humanos enviou uma carta de apelo ao Governo da Guiné Equatorial em que manifesta preocupação pelo facto de a detenção do `cartoonista` equato-guineense constituir uma "violação ao direito de liberdade de expressão".

Lusa | em RTP

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