segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

PORTUGAL | Lá vêm eles outra vez com a conversa de reformar a segurança social


João Galamba | Expresso | opinião

Vá-se lá saber porquê, Fernando Negrão considera que é prioritário “reformar” a Segurança Social. Presumo que Rui Rio concorde, uma vez que parece ter incluído o tema na conversa que teve com António Costa.

Mais ou menos liberal, mais ou menos radical, parece que todas as lideranças do PSD convergem na ideia de que o nosso sistema de pensões está falido. Andam nisto há anos, pelo menos desde a liderança de Durão Barroso. E a história tem sido sempre a mesma: a demografia torna o sistema inviável e não garante pensões futuras, o que torna necessário avançar para um modelo de capitalização, isto é, avançar para a privatização parcial do sistema. Não sei se é isto que será defendido por Rui Rio, mas não vejo qualquer alternativa. Ou melhor, há uma alternativa, mas é a alternativa defendida pelo Governo e pelo PS.

Ninguém ignora os desafios demográficos e a pressão que estes colocam sobre o atual sistema. Mas há uma diferença entre responder aos desafios da demografia, reformando o sistema tendo em vista a sua sustentabilidade, e usar esse mesmo desafio para decretar a falência desse sistema, desmantelando-o, mesmo que parcialmente, como tem sido o caso nas sucessivas propostas de "plafonamento" que o PSD ciclicamente propõe.

O PS sempre não só rejeita a ideia de falência do sistema, como acredita que qualquer alternativa é bastante pior do que sistema de repartição que temos. O modelo de capitalização, em que os descontos de um trabalhador no ativo vão para uma conta de capitalização individual, ao invés de servirem para pagar as pensões dos atuais pensionistas e para reforçarem o fundo de estabilização financeira, para além de exporem as pensões futuras ao risco do mercado de capitais, não são imunes aos problemas demográficos, porque a demografia é, acima de tudo, um problema económico que afeta todos os sistemas de pensões, qualquer que seja a sua natureza. Com ou sem capitalização, a realidade presente terá sempre garantir a existência de recursos suficientes para que seja sustentável pagar pensões. Tal será tanto mais um desafio quanto maior o peso dos pensionistas no total da população.

Evoluir para um sistema de capitalização, para além de não resolver verdadeiramente nada em matéria de sustentabilidade de longo prazo, criaria um enorme buraco na receita do atual sistema, porque as contribuições que passariam a ir para fundos de pensões para pagar as pensões futuras deixariam de pagar as pensões dos atuais pensionistas.

No passado, o PSD propôs financiar os custos de transição do sistema com emissão de dívida pública. Se essa opção já era pouco credível quando foi apresentada, há mais de 10 anos, hoje é totalmente irrealista. Para além de não responder a nenhum dos desafios da sustentabilidade, a capitalização individual como alternativa ao atual modelo de repartição também tornaria o sistema menos redistributivo, o que iria penalizar as pensões médias e baixas, que hoje são beneficiadas face às pensões mais elevadas.

Ao invés de desmantelar o atual sistema, importa investir na sua continuidade e sustentabilidade futura. Incluir toda a carreira contributiva, e não apenas os últimos anos, no cálculo do valor da pensão e indexar a idade de reforma à esperança média de vida foram reformas essenciais feitas por governos do PS para que o nosso sistema de pensões, em 2007, deixasse de ser considerado insustentável pela OCDE, Comissão Europeia e demais instituições internacionais. Mas a sustentabilidade do sistema de pensões também depende da existência de carreiras contributivas estáveis, do crescimento do volume e da qualidade do emprego e do crescimento dos salários. E porque o peso do trabalho na geração de riqueza tem caído e tenderá a cair mais, uma vez que as empresas tendem a ser menos intensivas em trabalho e mais intensivas em capital, é importante diversificar as fontes de financiamento do sistema de pensões, reduzindo a sua dependência exclusiva de contribuições sobre os salários pagas pelo trabalhador e pelo empregador.

Estas foram e têm sido as apostas do PS. No final de 2015, o sistema (contributivo) de pensões tinha um défice. Hoje, com quase 300 mil empregos criados e com os salários a aumentar, o sistema tem um saldo positivo e deixou de precisar de dinheiro do Orçamento do Estado para pagar pensões. E a partir deste ano, o Fundo de Estabilidade Financeira da Segurança Social passará a receber parte da receita do IRC, o que traduz um importante esforço na diversificação das fontes de financiamento do nosso sistema de pensões.

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