terça-feira, 3 de julho de 2018

A História não se repete?


Paula Ferreira* | Jornal de Notícias | opinião

A crise migratória em curso é apenas a ponta do icebergue do que se está a passar na Europa. É a face visível de algo a emergir (ou a renascer), que a maioria de nós acreditava nunca defrontar. A recusa em prestar apoio humanitário a homens, mulheres e crianças, fugidos da guerra, fugidos da fome, à procura de uma vida digna, devia fazer corar de vergonha as velhas e novas democracias europeias. Além disso, a recusa de acolhimento contradiz a necessidade de rejuvenescimento de uma Europa envelhecida, sem vontade de contribuir para o aumento da natalidade.

Quando vemos os barcos de socorro das ONG a serem retidos pelas autoridades de Malta, ou a chanceler Merkel a ser chantageada pelo seu ministro do Interior, para não falar já da lei agora aprovada pelo regime húngaro, que condena a prisão quem auxiliar imigrantes ilegais, devemos perguntar: o que está afinal a acontecer nesta Europa construída a pensar no bem comum, seguindo a matriz dos Direitos do Homem, da igualdade, da fraternidade.

Em Itália, o impensável aconteceu. Movimentos populistas e de extrema-direita tomam o poder. E querem lançar raízes, chegar a outras geografias. São eles que estão a condicionar a política europeia, a sua força levou Bruxelas, para salvar a honra, após longas horas de negociação no último Conselho Europeu, a propor a criação de campos de imigrantes em Marrocos.

Matteo Salvini, o ministro do Interior italiano, o mesmo que impediu o acolhimento do navio Aquarius com centenas de imigrantes a bordo, lança agora as sementes para a criação de uma rede europeia de partidos nacionalistas. Basta vento de feição e o fogo propaga. E quando acordarmos, poderá ser tarde para uma reação eficaz contra a barbárie. Dizem, a História é longa e nunca se repete. Pelos sinais que nos chegam, é melhor duvidar da sentença. Talvez seja o momento de se criar uma nova divisa: não deixes que a História se repita.

*Editora-executiva-adjunta

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