domingo, 28 de outubro de 2018

Bolsonaro/Fake News | Brasil: o maior crime eleitoral de sempre


Nas redes sociais as chamadas “fake news” vão desde a montagem de fotografias, à publicação de pseudo-estatíticas, passando por truncagem de vídeos ou criação de sites aparentemente noticiosos

Brasil está a viver o maior crime eleitoral de sempre via redes sociais. Só agora é que se começa a perceber a verdeira dimensão da “bolha” criada nos últimos três anos pela militância pró-Bolsonaro”, afirma João Nuno Martins, coordenador de uma equipa que monitoriza os grupos pró-bolsonaro no WhatsApp com o objetivo de os denunciar à justiça.

“É uma forma de ativismo e de acção política, no fundo é exercer cidadania”, explica o produtor artístico que divide o seu tempo entre Lisboa e o Rio de Janeiro. Salienta que o grupo que coordena “não tem qualquer ligação a partidos políticos”. Depois da produção musical em Portugal, João Nuno Martins alargou o seu campo de acção na área de produção artística e capitalizou a experiência com colaborações com o colectivo brasileiro MidiaNinja, entre outros. Um “abrir de horizontes” que o levou a criar o FrontFiles.com, um plataforma global de apoio ao jornalismo independente, com material editorial de imagens, vídeo e ilustração.

“É apenas a ponta do icebergue o caso de empresários a financiarem ilegalmente campanhas no WhatsApp pró-Bolsonaro revelado pelo Folha de São Paulo na semana passadam acrescenta. O ativista lembra os contactos entre Flávio Bolsonaro – filho do candidato - e Steve Bannon, o estratega da campanha ou a entrada da Cambridge Analytica no Brasil, com um dos diretores a dizer que era possível eleger deputados quase a 100% com recurso às redes sociais.

Nas redes sociais as chamadas “fake news” vão desde a montagem de fotografias, à publicação de pseudo-estatíticas, passando por truncagem de vídeos ou criação de sites aparentemente noticiosos, por exemplo. (ver exemplos aqui) https://www.tercalivre.com.br/quadrilha-detida-sacando-68-milhoes-para-haddad/
https://cesarweis.com/incrivel-gleisi-hoffmann-preve-um-atentado-contra-haddad-e-ja-sabe-o-culpado-bolsonaro/?fbclid=IwAR3X3IWxrUsvjLm-1tvDF41RGdImd_LQgDxPxlfsP-AyCrL1NJlS7OF6hxg

Para João Nuno Martins, dentro das redes sociais, o WhatsApp é a ferramenta mais poderosa. “Criam-se grupos privados onde só se entra por convite, com o que se geram bolhas pró-Bolsonaro que se mantiveram desconhecidas até agora. Uma espécie de realidade alternativa”, explica. As redes sociais são alimentadas por máquinas e por um “exército de voluntários” que revela grandes conhecimentos tecnológicos e de produção de conteúdos.

“Identicamos os 'bot' (robots que difundem informações falsas sem intervenção humana) e os números associados a contas reais com 'fake news. Arquivamos o histórico de chat, imprimimos as conversas, e compilamos as notícias falsas”, afirma.

“O material recolhido é depois encaminhado por advogados para a Procuradoria Geral da República, para juízes do Tribunal Superior Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal para os induzir a abrir investigações”, acrescenta.

A disseminação de notícias falsas e a difamação são considerados crime pela legislação brasileira. O financiamento empresarial de campanhas eleitorais nas redes sociais é igualmente crime pois está proibido desde 2015, data a partir da qual candidatos e partidos apenas podem contar com fundos públicos para as suas campanhas eleitorais.

CÉLULA E INFILTRADOS

“O nosso grupo é composto por pessoas que não se conhecem umas à outras. Somos uma espécie de “célula”. Nasceu espontaneamente através de grupos de esquerda, ganhou dimensão e começámos a planear estratégias”, afirma. A equipa cooordenada pelo produtor artístico tem atualmente 48 pessoas que monitorizam a atividade de mais de 500 grupos de apoiantes do candidato de extrema-direita.

Ao infiltrarem-se num grupo pró-Bolosnaro, os ativistas assumem várias identidades. Com base na cartilha pregada por Jair Bolsonaro, assumem a pele de militantes de ultra-direita, defendendo a esterilização dos pobres, o fim das regalias das empregadas domésticas ou apelando para a liberalização do uso de armas, por exemplo. Outros, assumem-se como eleitores indecisos que querem consolidar a sua escolha nas urnas. “O objetivo é o de estimular o debate e, se possível, tentar alterar a percepção das pessoas face ao radicalismo do candidato e virar votos. Por vezes o debate aquece de tal forma, que as pessoas assustam-se e saem do grupo”.

João Nuno Martins exemplifica com experiências pessoais como ter-se passado por empresário num grupo de camionistas e “o único patrão presente tornou-se logo sindicalista", chegando a pedir ao ativista no “chat" privado para “moderar o discurso para não afastar as pessoas”.

João Nuno Martins sabe da existência de pelo menos duas dezenas de grupos a funcionarem com objetivos iguais aos do seus. “Existem também uma multidão de “solitários” empenhado na descoberta de notícias falsas”, acrescenta.

REDES SOCIAIS FERVEM NO BRASIL

“Empresários bancam campanha contra o PT” foi o título da manchete de sexta-feira passada do Folha de São Paulo, com pacotes de mensagens a serem comprados a 12 milhões de reais (cerca de 2,8 milhões de euros). O caso revelado pelo Folha levou a Procuradora-geral da República, Raquel Dodge a pedir à Polícia Federal para investigar as empresas.

O candidato do Partido dos Trabalhadores (PT), Fernando Haddad em conjunto com os partidos que o apoiam entraram também com ações junto da justiça eleitoral e do próprio Supremo Tribunal Federal a pedir a impugnação da candidatura de Jair Bolsonaro. Pouco satisfeito com a situação, o candidato de extrema-direita ameaçou esta semana que irá cortar o financiamento federal ao jornal se for eleito e são conhecidas ameaças a vários jornalistas.

O WhatsApp anunciou entretanto que fechou centenas de milhares de contas falsas no Brasil, mas que não é exequível aplicar mais filtros tecnológicos a menos de uma semana das eleições.

Já o Facebook, proprietário do WhatsApp, anunciou a criação de uma “sala de guerra” para combater a disseminação de notícias falsas no Brasil e anunciou ter fechado mais de 500 perfis e páginas falsas. Antes da reportagem do Folha sobre o WhatsApp, a imprensa brasileira tinha revelado que o crescimento do apoio a Jair Bolsonaro na primeira volta coincidiu com o roubo dos dados de mais de 43 milhões de utilizadores do Facebook.

Hélder C. Martins | Expresso

Sem comentários:

Mais lidas da semana