sábado, 3 de fevereiro de 2018

A PERSISTÊNCIA DA BARBÁRIE


Martinho Júnior | Luanda

1- Numa época em que a globalização é irreversível, nos processos intestinos que lhe são contraditórios persistem os sinais de barbárie, num esgotamento contínuo em dívida para com a humanidade e em completa irresponsabilidade em relação ao respeito que nos merece a Mãe Terra!

Se com os Estados Unidos a hegemonia unipolar só por via dum avassalador domínio, pela força e pela guerra psicológica em reforço de seu “soft power” pode subsistir, sem hipótese para qualquer cosmética, o arrufo do proteccionismo é mais que um passo atrás no sentido da barbárie e ainda com menos hipóteses para a cosmética: o isolamento é desde logo assumido quando se pretende continuar um “the americans first” que desde a IIª Guerra Mundial não tem feito outra coisa senão semear tensões, divisionismo, desagregação, caos, terrorismo, conflitos e guerras para impor esse domínio, agregando todos os “simpáticos” negócios que estejam de acordo com essa bárbara agenda!...

Essa “involução” está a obrigar os Estados Unidos não só a perder relacionamentos em função de suas concepções execráveis e incomportáveis para com os outros, mas a cultivar relacionamentos com aqueles estados que perfilham trilhas similares, em particular o estado sionista de Israel e as monarquias árabes que apesar do verniz, mantêm um carácter feudal e fundamentalista por via dos seus preconceitos religiosos.

Os vassalos, em nome duma democracia cosmética, aninham-se como pintos debaixo do corpo quente do império!

2- Algumas votações na Assembleia Geral da ONU resultantes de acesos debates, entre outros exemplos, são amostras comprovativas desse fenómeno contemporâneo!

A Assembleia Geral da ONU tem sido aliás palco da diplomacia da guerra psicológica do dominador para com os dominados e raros são aqueles que denunciam “o cheiro a enxofre” que exalam!

Em relação ao bloqueio contínuo e sistemático para com Cuba, só Israel e um ou dois microestados mercenários insulares estão com os Estados Unidos!

O mesmo sinal de ruptura aconteceu recentemente quando foi discutida a nefasta decisão da transferência da embaixada dos Estados Unidos para Jerusalém!

Para cúmulo, a linguagem presidencial estado unidense, não se coíbe e torna-se transparente nas definições do “the americans first”: há que estancar qualquer tipo de veleidade de migração proveniente dos “shithole countries” (Salvador, Haiti, países africanos…), justifica Trump, fazendo uso da mais injustificável linguagem!

É evidente que em Davos isso não pesou no encontro com o presidente Paul Kagame, actual presidente duma União Africana formatada pela hegemonia unipolar, tal o estado de fraqueza do continente!

O encontro parece preparar África para a nova onda de “reaganismo” que para alguns mais atentos está em fase de preparação (Donald Trump será, nesse sentido, um veículo da transição)!

3- Em nada nos surpreende os meandros artificiosos do império no seu exercício global mais retrógrado e degradante de hegemonia unipolar, conforme o tão esclarecedor “the americans first”, próprio da contínua guerra psicológica de que os Estados Unidos não se podem furtar desde as suas origens e dada a natureza de sua expansão!

O que é surpreendente é que os alvos, que são uma esmagadora maioria, assumam posições que sendo quantas vezes parte integrante das cosméticas, estão muito longe de encontrar respostas para resolver as questões que se prendem aos relacionamentos internacionais na profundidade da sua fermentação mais ambígua e fraccionante!

No preciso momento em que o presidente Trump se referiu aos “shithole counstries”, a USNavy (por via do destroyer USS Ross) e a Marinha de Guerra Real de Marrocos, realizavam exercícios navais conjuntos ao largo de Agadir, o que passava despercebido à maioria, africanos incluídos!

Os africanos estavam todos divertidos, a seguir pelas televisões mais anestesiantes as peripécias das selecções nacionais de futebol do CHAN, pois diversão e alienação fossem parte dos mecanismos de que os processos dominantes se servem para injectar o ópio da persuasão em regime de “soft power”, dando corpo à contínua guerra psicológica de que desde suas origens fazem “profissão de fé”!…

É evidente que o relacionamento bilateral entre os Estados Unidos e o Reino de Marrocos, têm muitos pontos de confluência, por exemplo:

- Marrocos é uma monarquia árabe que se aproveita da esteira de relacionamentos que os Estados Unidos mantêm com as monarquias arábicas;

- Marrocos é o país colonizador do Sahara, tal como os Estados Unidos é em relação a Porto Rico e Israel em relação ao espaço palestino;

- Marrocos é um inveterado construtor de muros (com a Argélia e com o Sahara), precisamente numa altura em que o presidente Trump procura a toda o transe realizar a sua promessa eleitoral de construir um muro com o México e o sionismo israelita expande muros em relação a Gaza e à Palestina;

- Marrocos é uma potência média e intermediária, que explora as riquezas minerais e piscatórias do Sahara ocupado e colonizado, algo similar aos apetites mantidos pelos Estados Unidos em relação praticamente a toda a África, em particular no que ao petróleo diz respeito, mesmo que os africanos (como Angola), defendam os interesses das multinacionais estado unidenses do petróleo ainda que não existisse reconhecimento diplomático!

- Marrocos passa submissamente uma esponja em relação ao facto de, tendo assaltado a Líbia e assassinado Kadafi, os Estados Unidos e alguns europeus vassalos (Grã-Bretanha, França e Itália), serem os corresponsáveis não reconhecidos pela espiral de caos e terrorismo que devassa o Sahel até ao Lago Chade, bem como pelas condições de migração humana selvagem oriunda de todos os componentes dessa imensa região, condicionando por completo e desde logo a África do Oeste, como ainda corresponsáveis para a eclosão de condições na Líbia para o reactivar da escravatura em pleno século XXI!

4- Que fazem os africanos perante esse estado de coisas e relativamente aos Estados Unidos?

Por um lado emitem tímidas declarações contra os pronunciamentos do presidente Trump quaisquer que eles sejam, inclusive os mais ofensivos à dignidade humana, por outro, assobiam para o lado em relação à presença militar do Comando África do Pentágono e de vassalos da NATO como a França, não só em Marrocos como no Sahara, mas também na transversal do Sahel dum paralelo que vai do Senegal à Somália, continuam docilmente servis face ao “diktat” do domínio avassalador!

A transição em curso nos Estados Unidos prepara o poder para um regresso republicano às suas doutrinas mais retrógradas de que fazem parte “mccartismo” e “reaganomics”, ou seja uma escalada que fará inveja aos procedimentos da “guerra fria”!

O relacionamento de Marrocos com os Estados Unidos é, em função do carácter do poder nos dois países, relativamente ambíguo: se Marrocos é tido como um aliado no combate ao terrorismo, mas além de retardar a descolonização do Sahara, foi contra a transferência da embaixada dos Estados Unidos para Jerusalém…enquanto em muitos aspectos há semelhanças entre as políticas dos poderes instalados, noutros há um espaço contraditório bastante sensível!

A docilidade, quantas vezes sinónimo de impotência, acompanha o compasso cínico dos vassalos dos Estados Unidos no âmbito da“civilização judaico-cristã ocidental”, como se o caos e o terrorismo não tivessem suas profundas razões causais, tal como os restos de colonialismo e o neocolonialismo que se vai estendendo por toda a África, quantas vezes utilizando o rótulo sugestivo da globalização!

5- Que fazem os estados africanos perante esse estado de coisas e relativamente a Marrocos?

- Colocam num segundo plano, esvaído e cada vez mais silenciado, a ocupação e a colonização do Sahara e, em relação aos muros, tudo fica num sepulcro de areias!

- Atraem Marrocos à Unidade Africana como um parceiro digno, leal e interessado na solução das questões económicas e financeiras de todo o continente, quando Marrocos se apresta à inequívoca função duma “correia de transmissão” do domínio das economias ocidentais, particularmente algumas europeias (Alemanha, Grã-Bretanha, França e Espanha) para dentro do continente!

- Promovem a luta contra a corrupção, que é uma questão sociológica transversal com influência no carácter dos seus próprios poderes, mas são incapazes de fazer sequer uma crítica contra a corrupção que anima os poderes dos Estados Unidos e do Reino de Marrocos (os poderosos “lobbies” que engendram o próprio poder, no caso de Marrocos facilitado pelo simples facto de ser monarquia), muito menos da atracção ao seu modelo de domínio por parte das elites africanas, que é algo que marca as causas profundas da própria corrupção em África (o dólar sendo moeda reitora, serve adequadamente a esse tipo de enredos artificiosos que chegam a partir do exterior)!

6- Ao não abordar muitas questões que se prendem com as razões causais dos fenómenos contemporâneos profundamente injustos, desagregadores e causadores de profundas crises, feridas e fracturas, enquanto os estados africanos preenchem um papel ultraperiférico na economia global, são os próprios africanos que se arrastam nas ambiguidades para fazer face a fenómenos como a expansão do caos e do terrorismo, ou ainda os que semeiam artificiosas rebeliões assentes em questões étnicas ou religiosas!

Os factores da desertificação do continente e a redução do espaço vital rico em terras aráveis, florestas com biodiversidade e água interior, que sob os pontos de vista físico-geográfico-ambiental estão na profundidade das razões da migração humana e reflectem também factores de corrupção, raramente são abordadas, o que diminui a argumentação dos que, como Angola, procuram que o renascimento duma África em paz encontre caminhos de viabilidade vital!

Face à guerra psicológica de quem domina, África revela por inteiro sua ambiguidade submissa, sua ignorância e sua impotência, pelo que quem domina nos termos da hegemonia unipolar recebe inequívocos sinais para ocupar o imenso espaço vazio, que será traduzido em ainda mais opressão e submissão, a corrupção maior em relação à qual todos evitam argumentar!

Martinho Júnior - Luanda, 31 de Janeiro de 2018

Imagens:
Encontro dos presidentes Donald Trump e Paul Kagame, em Davos – na esteira do que vem detrás;
Encontro do presidente Paul kagame e do Rei Mohanned VI em Adis Abeba (28ª Reunião da UA);
O USS Ross esteve em recentes manobras com navios da Marinha real de Marrocos, ao largo de Agadir;
Mapa dos muros de areia entre Marrocos e a argélia e no Sahara ocupado;
Mapa do muro em construção, entre os Estados Unidos e o México.

A consultar de Martinho Júnior:
Pistas e traumas do longo choque neoliberal – I – http://paginaglobal.blogspot.pt/2017/07/pistas-e-traumas-do-longo-choque.html
Pistas e traumas do longo choque neoliberal – II – http://paginaglobal.blogspot.pt/2017/07/pistas-e-traumas-do-longo-choque_29.html
Pistas e traumas do longo choque neoliberal – III – http://paginaglobal.blogspot.pt/2017/08/pistas-e-traumas-do-longo-choque.html
Recolonizar África, evocando um plano Marshall com África – http://paginaglobal.blogspot.pt/2017/06/recolonizar-africa-evocando-um-plano.html

A consultar:
Trump racista chama Haiti e nações africanas de países de merda – http://www.esquerdadiario.com.br/Trump-racista-chama-Haiti-e-nacoes-africanas-de-paises-de-merda
Why Donald Trump Said ‘Shithole Countries’ – https://www.thenation.com/article/why-donald-trump-said-shithole-countries
África expresa su indignación y amargura por insultos de Trump – http://www.hispantv.com/noticias/africa/365387/trump-inmigrantes-eeuu-racismo-insulto
Sahara Ocidental sob ocupação militar | Marrocos expulsa eurodeputados por medo da verdade –  http://paginaglobal.blogspot.pt/2017/10/sahara-ocidental-sob-ocupacao-militar.html
Discurso do Presidente da RASD e SG da Polisario na 41ª Conferência Europeia de Apoio e Solidariedade com o Povo Saharaui (EUCOCO) –https://porunsaharalibre.org/pt/2016/11/discurso-del-presidente-la-rasd-sg-del-polisario-ante-la-41-conferencia-europea-apoyo-solidaridad-pueblo-saharaui-eucoco/
Trump kisses up to Rwanda’s Kagame after ‘sh*thole’ comments – http://www.thezimbabwemail.com/world-news/trump-kisses-rwandas-kagame-shthole-comments/
Donald Trump, Rwanda’s Paul Kagame Meet, Ignore ‘Shithole’ Comments – http://thepearltimes.com/video-donald-trump-rwandas-paul-kagame-meet-ignore-shithole-comments/  

ANGOLA | Cabinda: Continuam ameaças e perseguições a ativistas


Membro da Associação para o Desenvolvimento da Cultura dos Direitos Humanos em Cabinda dá conta de ameaças constantes por parte do regime angolano e aponta o dedo ao Governo de João Lourenço.

Em dezembro passado, 28 ativistas pertencentes à Associação para o Desenvolvimento da Cultura dos Direitos Humanos (ADCDH) em Cabinda foram detidos quando se preparavam para participar numa manifestação pacífica contra a violação dos direitos humanos no enclave. Na altura, à conversa com a DW África, o ativista Aarão Bula Tempo denunciou a violência da polícia contra os manifestantes. E, num comunicado divulgado pela associação, a polícia nacional foi acusada de torturar dois dos vários ativistas detidos – e libertados horas depois.

Mais de um mês após o sucedido, a situação está longe de estar resolvida. Ouvido pela DW África, Silvio Sumbo, dá conta que muitos dos ativistas pertencentes a esta associação têm estado a ser vigiados e ameaçados constantemente. Dois deles, afirma, foram mesmo "obrigados a fugir para os países vizinhos”.

"Eu e a minha esposa temos estado a ser constantemente ameaçados. Eles obrigaram a minha empresa a despedir-me e, neste momento, estou desempregado. Pessoas telefonam-nos e dizem que estão a acompanhar todos os nossos passos e que nos vamos arrepender. Dizem que estamos armados em revolucionários e ativistas e que vamos sentir na pele  o que é opor-se contra eles. Tememos pelas nossas vidas”, conta o ativista cabinda.

Sem expectativas para JLo

Para Silvio Sumbo, a chegada de João Lourenço ao poder não traz qualquer esperança a Cabinda. Até pelo contrário. No seu entender, o Governo do novo Presidente acaba até por ser mais "perigoso” do que o de José Eduardo dos Santos. "A diferença que existe entre o regime atual e o regime cessante é que o regime do ex-Presidente dos Santos fazia mal à vista este faz no silêncio, como se nada se tivesse a passar. É um regime altamente ditatorial”, acusa.

O mesmo ativista nota que se quisesse mostrar uma governação diferente, João Lourenço, "que compactuou muito tempo com a má governação do MPLA - Movimento Popular para a Libertação de Angola -”, podia tê-lo feito aquando da repressão, quer desta manifestação em dezembro, quer do recente protesto organizado por estudantes em Luanda que foi também reprimido. "Tenho certeza absoluta que ele se apercebeu da repressão forte que houve na manifestação em Cabinda”, afirmou o ativista, acrescentando que se o novo Governo tivesse intenção de "optar por um novo paradigma de governação” devia ter agido. E não o fez. Ainda por cima mandou mais militares para intimidar a população”, constatou.

O mesmo se passa com as exonerações. Se "há vontade de mudar”, afirma o ativista, então João Lourenço devia "responsabilizar” os que exonerou pois são pessoas que "cometeram atos de corrupção fora do normal” e que continuam "a desfrutar do dinheiro”.

Silvio Sumbo aponta ainda o dedo ao chefe de Estado no que toca ao caso Manuel Vicente: "Pôr em causa o interesse de um país em detrimento de uma pessoa que, durante o tempo que esteve no ativo como membro da administração pública cometeu erros graves a ponto de desviar tanto dinheiro? Dá para ver que ele [João Lourenço] não é sério e que vai seguir o mesmo pensamento de governação do seu antecessor”, dá conta.

"Temos que ficar calados?”

Fazendo notar que Cabinda "nunca está nos planos do regime do MPLA para grandes melhorias”, o ativista conclui afirmando que a solução para esta província angolana passa também por não ficar em silêncio. "90% da população está desempregada, a juventude vai perdendo a esperança e nós temos que ficar calados? Não pode. São eles que nos incutem na cabeça de que Cabinda não é Angola porque eu estou em crer de que se Cabinda fosse Angola, com os recursos que ostenta, pelo menos seria uma referência grande em Angola, mas não é porque não lhes interessa construir nada em Cabinda”.

São objetivos da Associação para o Desenvolvimento da Cultura dos Direitos Humanos chamar a atenção para várias realidades de Cabinda. Entre as mais preocupantes estão a "presença excessiva de militares nas ruas de Cabinda que "intimidam a população”, assassinatos constantes de pessoas que se opõem ao regime angolano o elevado desemprego e a degradação” da província. A ADCDH tem lutado ainda para que o regime reconheça a associação.

Raquel Loureiro | Deutsche Welle

Imagem: Manifestação da Associação para o Desenvolvimento da Cultura dos Direitos Humanos (ADCDH), a 16 de dezembro em Cabinda

Situação política na Guiné-Bissau é "crítica"


Avaliação é feita pela chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, numa altura em que a comissão permanente do Parlamento avisa que poderá ser impossível realizar eleições legislativas.

A chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Federica Mogherini, considerou esta sexta-feira (02.02) que a situação política é "crítica" na Guiné-Bissau, acrescentando estar em risco a ordem democrática e institucional no pais.

"A situação política crítica na Guiné-Bissau está a pôr em risco a ordem institucional e democrática no país, com sérias implicações para a estabilidade na região", disse Mogherini, num comunicado divulgado pelo Serviço de Ação Externa da UE, que dirige.

A UE, realçou, continua comprometida com a promoção de uma solução pacífica para o país, em "coordenação estreita com os outros membros do grupo P5", incluindo as Nações Unidas, a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).

A chefe da diplomacia da UE salientou ainda, no comunicado, que os 28 estão preocupados com a situação de desrespeito pelos direitos humanos, especialmente os políticos. A UE apelou ainda às forças de segurança na Guiné-Bissau para que mantenham a sua posição de não-intervenção na crise política.

Eleições em risco?

A comissão permanente do Parlamento da Guiné-Bissau alertou entretanto para o perigo de aquela instituição ficar bloqueada ao ponto de impedir a escolha da nova equipa que irá organizar as próximas eleições legislativas.

A comissão permanente, órgão que exerce as competências do parlamento na ausência das sessões plenárias, reuniu-se esta sexta-feira para analisar a situação política no país, tendo deliberado que a nomeação de Artur Silva como primeiro-ministro, por decisão do Presidente José Mário Vaz, não vai ajudar a desbloquear o ambiente político.

"A atitude do Presidente da República está a bloquear a realização das eleições legislativas", diz a deliberação da comissão permanente, constituída por nove deputados do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e seis do Partido da Renovação Social (PRS), sendo que estes deixaram de comparecer às reuniões deste órgão há mais de dois anos.

Diz a comissão permanente que a nomeação do novo primeiro-ministro, fora do quadro constitucional e do Acordo de Conacri, não irá permitir que o plenário do parlamento se reúna para eleger a nova direção da Comissão Nacional de Eleições (CNE).

À luz da Constituição guineense, cabe ao PAIGC, na qualidade de vencedor das últimas eleições legislativas, indicar o nome do presidente da CNE.

"Situação incontrolável"

A comissão permanente do Parlamento estranha, por outro lado, que o Procurador-geral da República, Bacari Biai, ainda não tenha aberto inquérito ao alegado incitamento à violência feito por alguns dirigentes políticos. Exige ainda um posicionamento do poder judicial sobre a "situação de caos reinante no setor", fruto de tomadas de posições dos tribunais perante as disputas políticas.

A comissão permanente do parlamento guineense considera que "há uma intenção perigosa" de os membros do Governo demitido pelo chefe do Estado no dia 16 de janeiro último "conduzirem o país para uma situação potencialmente incontrolável".
O órgão congratula-se pelo facto de a comunidade internacional ter ameaçado aplicar sanções aos políticos guineenses que estejam a impedir o entendimento no país.

A Guiné-Bissau vive uma crise política desde agosto de 2015 quando o Presidente, José Mário Vaz, demitiu o Governo do PAIGC liderado por Domingos Simões Pereira. Desde 2012, o país já teve seis primeiros-ministros, tendo o último, Artur Silva, sido nomeado esta semana, embora não seja um nome de consenso, tal como está previsto no Acordo de Conacri, promovido pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que já impôs sanções aos responsáveis políticos que estão a impedir a resolução da crise política.

Agência Lusa, mjp | em Deutsche Welle

GUINÉ-BISSAU | "Começa a ganhar forma uma ditadura centrada no Presidente"


À DW África, o sociólogo Dautarin da Costa dá conta que, na situação atual da Guiné-Bissau, as eleições não serão livres. O guineense prevê um agravamento da crise política com o não cumprimento do Acordo de Conacri.

Os últimos dias têm sido agitados na Guiné-Bissau. Na madrugada de segunda-feira (29.01) a Polícia de Intervenção Rápida bloqueou o acesso à sede do Partido Africano para a Independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde (PAIGC) que se preparava para realizar o seu congresso. Na terça-feira (30.01), o secretário nacional do PAIGC, Aly Hijazi, acusou a polícia de ter arrombado e expulsado os militantes que se encontravam na sede do partido.

Esta quarta-feira (31.01) era o prazo limite dado pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) ao Presidente José Mário Vaz para que este nomeasse um novo primeiro-ministro, depois da demissão de Umaro Sissoco. À última hora, o Presidente empossou Artur Silva como primeiro-ministro, o sexto a ocupar o cargo no espaço de três anos. À semelhança do que já tem vindo a suceder no país, a escolha de José Mário Vaz para primeiro-ministro não é consensual - uma das condições para que se cumpra o Acordo de Conacri.

Em entrevista à DW África, o sociólogo guineense Dautarin da Costa afirma que o chefe de Estado deu mais um passo para "a constituição de uma ditadura" na Guiné-Bissau.  Questionado sobre José Mário Vaz ter afirmado ser uma prioridade a realização de eleições antecipadas no país, o sociólogo frisou o facto de não existir, atualmente, "uma base de confiança" que permita acreditar que "de facto vá haver uma renovação do contrato social com o povo". Dautarin da Costa prevê agora "um novo capítulo de agravamento" da crise na Guiné-Bissau.

DW África: O Presidente da Guiné-Bissau nomeou um novo primeiro-ministro. Como vê esta nomeação?

Dautarin da Costa (DC): Esta nomeação é o coroar da arbitrariedade, no sentido em que não só não cumpre a Constituição da República como também não se cumpre o Acordo de Conacri. E ao não cumprir nem uma coisa nem outra, e considerando a crise atual do país, começa a ganhar forma uma ditadura centrada no Presidente da República. O Presidente da República elevou-se acima de todas as instituições e chamou a si o poder de delegar quem deverá ser o primeiro-ministro. Isto não tem a ver com a figura que é nomeada, tem a ver com o processo, com procedimentos e instituições. Quando vivemos num país onde as instituições são frágeis, entramos num quadro em que tudo é possível e, neste caso, o Presidente da República colocou o país numa situação em que tudo é possível acontecer. O que nós podemos destacar deste processo é uma ambição concreta e clara de capturar o poder e de implantar aqui um regime absolutista e ditatorial centrado na figura do Presidente da República. E se associarmos este não cumprimento do Acordo de Conacri aos incidentes que têm acontecido na sede do PAIGC percebemos claramente que o que está aqui em curso é um processo de capturar o país. É importante que os guineenses tenham a noção de que as ditaduras não se constroem num só dia e que temos vindo a assistir a um processo que agora está a ganhar forma mais consistente. Se continuar, teremos de facto a institucionalização de um regime ditatorial que nos complicará e muito o futuro, porque será uma amputação abusiva daquilo que foi a a conquista da democracia por este povo.

DW África: É chegada a hora da CEDEAO tomar uma posição?

DC: O que está aqui em causa é a credibilidade de uma organização regional que assume posições nos seus comunicados e que tem agora de ser muito decisiva e assertiva [nas suas ações], porque se não toma a posição que está no comunicado, nomeadamente, de que vai haver sanções se não houver cumprimento do Acordo de Conacri, põe em causa a sua própria credibilidade e perde a possibilidade de mediar outros conflitos que possam surgir. A tomada de posição da CEDEAO não só é importante para a Guiné-Bissau, porque é um reforço e uma proteção da democracia, como também é importante para a própria organização que tem que mostrar uma estrutura consistente sob pena de se esvaziar na superficialidade dos comunicados.

DW África:  Na tomada de posse do novo primeiro-ministro, José Mário Vaz afirmou que a sua principal missão será a realização de eleições antecipadas. Será esta uma possível solução para a situação do país?

DC: Colocar o povo na posição de escolher os seus representantes e mandatar novas figuras é importante em termos daquilo que deve ser a renovação do contrato social com o povo, mas não há, na minha perspectiva, uma base de confiança de que de facto vá haver uma renovação do contrato social com o povo. Isto parece-me que é mais uma reinterpretação daquilo que são as regras do jogo para simular a implantação de um regime centrado no Presidente, porque as eleições realizadas nestas circunstâncias dificilmente serão justas, transparentes e livres. Não tenhamos ilusões. Isto deve ser analisado de uma forma mais aprofundada, porque não se trata só de realizar eleições, trata-se de realizar eleições numa determinada circunstância que é completamente adversa àquilo que são os preceitos democráticos e à lógica de salvaguardar que a escolha do povo é realmente a escolha do povo.

DW África: Qual poderá ser, a seu ver, a solução para o país?

DC: Neste momento, o Presidente da República perdeu uma oportunidade soberana de cumprir um Acordo que iria convergir as forças políticas. Perdeu também a oportunidade soberana e, em alternativa ao Acordo, de colocar em funcionamento a nossa lei fundamental - a Constituição da República. Ao perder estas oportunidades tornou o cenário muito complexo. As soluções que poderão surgir poderão não ser efetivamente soluções sustentáveis. Vamos entrar agora num novo capítulo de agravamento da crise, que provavelmente acabará por mobilizar novas negociações e novos formatos em termos de intervenção para tentar reverter esta situação que se vai criar e que terá efeitos imprevisíveis no país.

Raquel Loureiro | Deutsche Welle

Reestruturação de empresas públicas aumenta dívida cabo-verdiana


Mesmo com o maior crescimento dos últimos cinco anos, Cabo Verde deverá registar um aumento da dívida pública em 2018. Crise financeira em empresas estatais, como a TACV, reduz efeitos positivos na economia.

O endividamento de Cabo Verde deve chegar a 132% em 2018, pouco mais de dois pontos percentuais comparando com o final de 2016, segundo o Grupo de Apoio Orçamental (GAO), que terminou nesta sexta-feira (01.02) uma visita ao país.

O ministro das Finanças cabo-verdiano, Olavo Correia, justificou o aumento do endividamento do país com a passagem para o Estado das dívidas das empresas públicas em reestruturação.

"A dívida aumenta não pela via do défice orçamental, mas porque temos empresas públicas em situação de falência técnica. Tudo isto são dívidas que estão no perímetro dessas empresas e, quando as reestruturamos, vêm para o perímetro da dívida pública do Estado", disse Olavo Correia.

No final da segunda missão anual do GAO a Cabo Verde, os parceiros, entre eles o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), a União Europeia (UE), Luxemburgo, Portugal e Banco Mundial (BM), voltaram a alertar para os riscos do "alto nível de sobre-endividamento" do país.

Crescimento não reduziu a dívida

Na declaração final da missão, o GAO assinalou que o país registou em 2016 o maior crescimento económico em cinco anos (3,8%), tendo conseguido melhorar o défice das contas públicas (3,5%) em 1.1 pontos percentuais relativamente ao ano anterior.

"A melhoria nas contas fiscais não se traduziu na redução do 'stock' da dívida pública, que se aproximou dos 130% do PIB [Produto Interno Bruto] no final de 2016 e coloca o país num elevado nível de sobre-endividamento, limitando assim a sua capacidade de resposta a choques", apontou GAO, ressaltando que para 2018 as estimativas da proposta de Orçamento de Estado apontam para a subida do endividamento público para os 132% do PIB.

"O que está previsto aumentar em 2018 tem a ver essencialmente com as dívidas da TACV (companhia de aviação) e IFH (imobiliária) que passam para o perímetro da dívida pública. Não é dívida gerada pelo aumento do défice orçamental", disse.

"Essa dívida já existia, mas agora está mais transparente", acrescentou o GAO, que contribui para o Orçamento do Estado de Cabo Verde através de donativos e empréstimos com vista a apoiar as principais políticas governamentais.

O Governo, por sua vez, garantiu à missão que tem uma estratégia de redução da dívida a médio prazo, que deverá começar a produzir efeitos a partir de 2019. A meta é colocar o endividamento público abaixo dos 120% do PIB num prazo de quatro anos.

Retomada de apoio do Banco Mundial

Após a divulgação da situação financeira da companhia pública de aviação de Cabo Verde (TACV), o Banco Mundial suspendeu o apoio a Cabo Verde, condicionando a sua retoma à solução da situação financeira da empresa aérea pública.

A TACV acumula mais de 100 milhões de euros de passivo, mas, em agosto, o Executivo começou a implementar um plano de reestruturação, que inclui passar parte da gestão da companhia para a empresa privada Binger CV.

O ministro das Finanças, Olavo Correia, mostrou-se confiante quanto à retoma do apoio do Banco Mundial em 2018. "Entendemos a posição do Banco Mundial em relação ao ano passado, mas o tempo que tínhamos era muito curto. Não é possível privatizar uma empresa como a TACV em três ou seis meses e, portanto, não era compaginável com as condições que Banco Mundial colocava”, disse Correia. "Construímos soluções alternativas e estamos em condições de no próximo ano ter ajuda orçamental" do Banco Mundial, acrescentou.

Agência Lusa, tms| em Deutsche Welle

PORTUGAL | O protagonismo dos homens de mão da D. Joana e por onde andará Paulo Portas?

1. Noticiário da SIC a respeito da tomada de posse do novo Conselho de Administração da TAP. Sobre Miguel Frasquilho e a polémica sobre o que comprovadamente recebeu do saco azul do BES nada se diz. Sobre outros administradores empossados, igualmente nada. Mas lá surge a insidiosa alfinetada a propósito de Diogo Lacerda de Machado, referenciado como «amigo do primeiro-ministro».

Que importa ser ele um dos consultores com maior conhecimento sobre o mundo da aeronáutica civil, só por si razão mais do que bastante para a nomeação? Ser amigo de António Costa constitui um estigma, que justifica a crapulosa insinuação de constituir um tratamento de favor. Só falta a D. Joana mandar um procurador investigar se não se tratará de algo, se não enquadrável na lei, pelo menos com substância bastante para alimentar mais umas manchetes do «Correio da Manhã». Mesmo que depois se esboroe na sua absoluta nulidade.

2. A propósito da patifaria congeminada por um dos subordinados da D. Joana para manchar a honorabilidade de Mário Centeno sob a suspeita da solicitação de bilhetes para um jogo de futebol e que prontamente justificou um ataque do PPE com a abordagem do assunto no Parlamento Europeu, Paulo Rangel quis-se armar em santo beatificado dizendo-se em desacordo com a decisão dos pares. Mas alguém no seu juízo pode acreditar que o grupo parlamentar a que pertence avança com tal iniciativa  sem o assentimento de um dos seus principais vice-presidentes?

Para as direitas lusas entrincheiradas no Ministério Público não existem limites à sua velhacaria, mesmo pondo em causa a posição do ministro português enquanto recém-eleito Presidente do Eurogrupo. Haverá maior demonstração do seu rasteiro antipatriotismo? Mas o deputado europeu do PSD julga que nos toma a todos por tolos ao querer passar-se por aquilo que não é...

3. Alguém no facebook coloca uma questão pertinente, que seria adequada para se pôr publicamente à D. Joana: o que terá tido mais custos para o Estado, os livros e revistas que José Magalhães e Conde Rodrigues terão adquirido com o cartão de crédito de governantes, e provavelmente indispensáveis ao seu cargo de então, ou as 60 mil cópias confessadamente fotocopiadas por Paulo Portas para as levar consigo, quando saiu do governo de Santana Lopes? Muito embora o caso já seja matéria prescrita, seria bom que a ainda procuradora-geral da República respondesse, mesmo que numa base académica, se também mandaria investigar e julgar o ai-jesus da sua amiga Cristas.

4. Mas, se essa possa ser matéria prescrita - menos dispendiosa para os meus bolsos de contribuinte do que as comissões relacionadas com os submarinos ou a origem dos donativos de Jacinto Leite Capelo Rego - porque será que o nome de Portas como consultor da plutocracia angolana não aparece na Operação Fizz tendo em conta a relevância de Álvaro Sobrinho - eminente testa de ferro de tal seita! -  como um dos principais suspeitos dos atos agora em investigação? E, porque será que, a respeito de Rangel, os noticiários relevem as suas decisões casuais sobre a Operação Marquês em vez de incidirem sobretudo sobre as matérias de facto, que afetam outros arguidos no processo. Nomeadamente esse mesmo conhecido acionista do Sporting que comprou alguns dos nossos principais jornais especificamente para neles imprimir um cunho acentuadamente direitista na sua linha editorial?

PORTUGAL | Onde se arquiva a vergonha?

Paulo Baldaia | Diário de Notícias | opinião

O Ministério Público (MP) descobriu que o ministro das Finanças pediu dois convites ao Benfica para ver um jogo de futebol. Por coincidência, descobriu igualmente que o filho do presidente do Benfica tinha pedido ajuda ao pai para acelerar a concretização de uma isenção de um imposto municipal, a que por lei tinha direito. O processo avançou e o filho agradeceu ao pai. Como se tratava de um imposto e os impostos têm que ver com as Finanças, alguém no MP chegou à rápida conclusão de que aqui havia marosca. A conclusão foi demasiado rápida e o mal estava feito.

Na velha lógica de que onde há fumo há fogo foi aberto um inquérito criminal e ordenada uma busca às instalações do Ministério das Finanças. Rápida correu a sentença a condenar Mário Centeno, porque se o crime parecia pequeno, a vergonha apresentava-se grande. Nas redes sociais, mas também na pena de muitos comentadores e jornalistas, Centeno estava metido num grave sarilho. Se fosse constituído arguido tinha de se demitir. Logo em Bruxelas descobriram que em Portugal se discutia a conduta pouco ética, quem sabe criminosa, do presidente do Eurogrupo. A conclusão voltava a ser demasiado rápida e o mal continuava a ser feito.

Como todo este caso era demasiado estúpido, era inevitável que tivesse o destino que acabou por ter: o "arquivamento por inexistência de crime". E como é que o MP chegou a esta conclusão? Recolhendo "a prova documental e pessoal necessária ao apuramento dos factos". O MP explicou-nos ainda que a instauração de um processo-crime foi determinada por notícias na comunicação social. São muito ciosos da sua autonomia em relação ao poder eleito, mas andam a toque de caixa no circo mediático, à boleia de suposições de alguém que escreve na comunicação social. Colocaram o Parlamento Europeu a admitir uma discussão sobre o assunto apenas porque, segundo o MP, o jogo da bola e a isenção do imposto ocorreram, "segundo tais notícias, no mesmo período temporal". Só falta saber onde se arquiva a vergonha que nos fizeram passar!

DEMOCRACIA? | Índice de Democracia. Portugal atrás de Cabo Verde

Relatório do The Econimist aponta Cabo Verde, Portugal, Timor-Leste e Brasil como "democracias com falhas".

Cabo Verde manteve este ano a liderança dos países lusófonos no Índice de Democracia elaborado anualmente pelo The Economist, ocupando o 23.º lugar entre os 167 Estados analisados, três posições à frente de Portugal e 26 do Brasil.

Num índice em que não figura São Tomé e Príncipe, o The Economist Intelligence Unit, subordinado ao tema "Liberdade de Expressão Sob Ataque", considera Cabo Verde, Portugal, Timor-Leste e Brasil "democracias com falhas", enquanto Moçambique se situa no limiar inferior dos "regimes híbridos" e Angola, Guiné-Bissau e Guiné Equatorial surgem como "autoritários".

O índice tem em conta cinco principais indicadores -- processo eleitoral e pluralismo, funcionamento do Governo, participação politica, cultura política e liberdades civis.

Num máximo de 10 pontos, que nenhum dos Estados analisados conseguiu obter -- Noruega (9,87), Islândia (9,58) e Suécia (9,39) são os três mais bem classificados -, Cabo Verde foi creditado com 7,88 pontos (23.º lugar global), Portugal com 7,84 (26.º), Timor-Leste com 7,19 (43.º) e Brasil com 6,86 (49.º).

Moçambique surge com 4,02 pontos (115.º posição) e é o último dos considerados "regimes híbridos" (acima dos 4,00), à frente dos "autoritários" Angola (3,62 pontos -- 125.º lugar), Guiné-Bissau (1,98 -- 157.º) e Guiné Equatorial (1,81 -- 161.º).

Atrás da Guiné Equatorial, e até ao fim do índice, só figuram outros seis Estados -- Turquemenistão (1,72 pontos), República Democrática do Congo (1,61), República Centro Africana (1,52), Chade (1,50), Síria (1,43) e Coreia do Norte (1,08).

Entre os países lusófonos, e dividindo por indicadores, Cabo Verde têm índices que variam entre os 9,17 pontos (processo eleitoral e pluralismo) e os 6,67 (participação política).

Portugal tem como melhor índice 9,58 pontos (processo eleitoral e pluralismo) e 6,11 (participação política), Timor-Leste entre 9,08 (processo eleitoral e pluralismo) e 5,56 (participação política) e Brasil entre 9,58 (participação eleitoral e pluralismo) e 5,00 (cultura política).

Moçambique, por seu lado, tem como melhores resultados os 5,00 pontos, quer na participação política, quer na cultura política, e 2,14 no item funcionamento do Governo.

Angola varia entre os 5,56 pontos na participação política e 1,75 no processo eleitoral e pluralismo, enquanto a Guiné-Bissau tem como máximo 3,13 na cultura política e 0,00 atribuídos no funcionamento do Governo.

A Guiné Equatorial também teve um 0,00, mas no processo eleitoral e pluralismo, tendo o valor mais elevado sido 4,38, a nível de cultura política.

Diário de Notícias

CANDIDATURAS ABERTAS | Prémio Literário UCCLA “Novos Talentos, Novas Obras em Língua Portuguesa”


A UCCLA (União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa) solicita a divulgação da seguinte informação:

3.ª edição do Prémio Literário UCCLA “Novos Talentos, Novas Obras em Língua Portuguesa” - Prazo de candidaturas alargado

As candidaturas à terceira edição do Prémio Literário UCCLA “Novos Talentos, Novas Obras em Língua Portuguesa” foram alargadas até ao dia 28 de fevereiro de 2018.

O Prémio Literário UCCLA - Novos Talentos, Novas Obras em Língua Portuguesa tem como objetivo estimular a produção de obras literárias, nos domínios da prosa de ficção (romance, novela e conto) e da poesia, em língua portuguesa, por novos talentos escritores.

Trata-se de uma iniciativa conjunta da UCCLA, Editora A Bela e o Monstro e Movimento 2014, que conta com o apoio da Câmara Municipal de Lisboa.

A participação na presente edição deverá ser feita até às 24:00h do dia 28/02/2018, por correio eletrónico, para o endereço premioucclaterceiraedicao@gmail.com
  
Constituição do Júri: 
António Carlos Secchin, Brasil
Germano de Almeida, Cabo Verde
Inocência Mata, São Tomé e Príncipe 
Isabel Pires de Lima, Portugal
José Luís Mendonça, Angola
José Pires Laranjeira, Portugal
Marta de Senna, presidente da Fundação e Biblioteca Casa Rui Barbosa, Brasil
Rui Lourido, representante da UCCLA
João Pinto de Sousa, representante da Editora A Bela e o Monstro


Anabela Carvalho
Assessora de Comunicação | anabela.carvalho@uccla.pt 
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BRASIL | Para onde vamos?


Plinio Arruda Sampaio Jr. [*]

Após inúmeros debates presenciais e milhares de interações virtuais, a Plataforma Vamos , organizada pela Frente Povo Sem Medo , submete ao crivo da crítica os resultados preliminares de sua proposta para a construção de um programa de esquerda para enfrentar a crise nacional. É uma iniciativa auspiciosa. No ambiente claustrofóbico em que estamos vivendo, toda contribuição ao debate público é bem-vinda. 

Para os militantes do PSOL o conhecimento das propostas da Vamos e de suas consequências práticas é particularmente importante, uma vez que elas foram aprovadas pelo VI Congresso Nacional, às escuras, sem nenhuma discussão com a militância, como base do programa do partido nas eleições presidenciais de 2018.

Logo em sua apresentação, a Vamos anuncia a intenção de não esperar nenhuma solução caída do céu e fazer a história com as próprias mãos – uma ideia que conclama todos ao exercício cívico da política. Sem nenhuma preocupação em apresentar uma contextualização do momento histórico, o documento apresenta os seis eixos que compõem suas propostas para resolver os problemas do povo brasileiro — Economia; Poder; Comunicações e Cultura; Territórios e Meio Ambiente; Saúde e Educação; Negro, Feminista e LGBT.

As medidas são justapostas umas às outras. Não há o cuidado de definir a relação de causa e efeito entre diagnóstico e receituário, especificar os sujeitos coletivos das ações, qualificar os vínculos entre intenções, ações e mediações e estabelecer os nexos entre as partes e o todo. A Vamos simplesmente diz o que tem de ser feito e não perde tempo com o que considera picuinhas.

Negação da história

O principal problema das diretrizes da Vamos é ignorar a célebre advertência de Marx na introdução de "O 18 de Brumário", segundo a qual os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem, arbitrariamente, mas em condições que são historicamente determinadas. Sem a definição das bases objetivas e subjetivas que determinam a luta de classes, o campo de oportunidades vislumbrável pelo pensamento e alcançável pela ação torna-se indeterminado. Se o sentido do movimento histórico é ignorado e as tendências efetivas da luta de classes permanecem indefinidas, então, bem à moda pós-moderna, tudo é possível e tudo é impossível.

Na concepção abstrata e aleatória de temporalidade contida no programa Vamos, a humanidade marcha como cabra-cega. Não há contradições que condicionem as necessidades históricas e que delimitem as possibilidades de sua solução. A única referência histórica concreta mencionada no programa Vamos é a descontinuidade econômica e política provocada pela ascensão do governo golpista de Michel Temer — um verdadeiro divisor de águas entre um período de desenvolvimento, combate às desigualdades e democracia e outro de crise econômica, aumento das desigualdades sociais e regressão política. A utopia do projeto Vamos é reconstruir o passado, destituído de suas insuficiências, a partir da somatória da vontade de indivíduos decididos a enfrentar a crise a partir de "consensos pactuados".

A ausência de uma perspectiva de classe impede a caracterização do padrão de luta de classes como uma guerra sem trégua entre o capital e o trabalho.

O desconhecimento da especificidade histórica do Brasil, uma formação histórica presa nas teias do capitalismo dependente, bloqueia a possibilidade de definir as estruturas responsáveis pelas mazelas do povo.

A falta de uma interpretação sobre a natureza do capitalismo contemporâneo e seus impactos sobre as regiões periféricas inviabiliza a percepção do sentido das transformações históricas que condicionam a luta de classes no Brasil — uma formação social em irreversível processo de reversão neocolonial que combina de maneira inusitada riqueza e pobreza, negócio e barbárie, desenvolvimento das forças produtivas e depredação do meio ambiente.

A inexistência de qualquer consideração sobre a crise econômica mundial — o elemento determinante da conjuntura — implica abstração da extrema violência da destruição criadora que caracteriza as transformações provocadas pela crise capitalista. A carência de uma interpretação das novas tendências da divisão internacional do trabalho e seus efeitos devastadores sobre a economia brasileira oblitera qualquer possibilidade de compreender as forças tectônicas que condicionam o processo de reversão neocolonial que rebaixa progressivamente o patamar mínimo de civilidade alcançado a duras penas pela sociedade brasileira. Na ausência de uma visão sobre os determinantes estruturais da crise terminal da industrialização, as dificuldades que geraram a maior crise de desemprego da história brasileira ficam reduzidas a problemas conjunturais provocados pela adoção de uma política econômica ortodoxa.

Abordada muito lateralmente, a crise política é reduzida a um problema de caráter institucional, provocado pela presença de um governo ilegítimo. Não há uma palavra sobre os motivos que levaram a juventude a tomar as ruas nas Jornadas de Junho de 2013. Não há um senão em relação à desastrosa passagem de Lula e Dilma pelo governo federal, cuja principal evidência é sua calamitosa herança — uma crise econômica e política sem precedentes e a ascensão da República dos Delinquentes. Não há um posicionamento sobre os condicionantes sistêmicos do mar de lama da política nacional. A crise terminal da Nova República e suas consequências práticas não são objetos da reflexão da Vamos.

A inexistência de uma avaliação das profundas contradições que determinam a luta de classes impede o reconhecimento de que o acirramento das contradições entre o capital e o trabalho leva a burguesia a organizar sua dominação como uma contrarrevolução permanente. No Brasil, uma sociedade cindida entre ricos e pobres, a ofensiva reacionária assume a forma de uma verdadeira guerra civil contra os trabalhadores, cuja manifestação mais gritante é a sistemática criminalização da luta política, o cerco militar que coloca as periferias sob verdadeiro toque de recolher e, sua consequência inevitável, o genocídio indiscriminado da juventude pobre.

Negação da crítica

Embora a Plataforma Vamos reivindique um protagonismo de esquerda, não há nela nenhuma remissão às tradições do materialismo histórico nem à rica tradição do pensamento crítico latino-americano. Exploração, luta de classes, proletariado, burguesia, aparelhos ideológicos do Estado, dominação, colonialismo, imperialismo, subdesenvolvimento, dependência, segregação social, Estado de Exceção, Estado penal, reforma e revolução são conceitos alheios ao documento da Vamos. Não é que eles não sejam mencionados tais e quais, o que poderia ser uma estratégia retórica. O problema é que tais noções não fazem parte da filosofia que organiza as propostas apresentadas. Marx, Engels, Lenin, Trotsky, Rosa Luxemburgo, Gramsci, José Martí, Mariátegui, Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e tantos outros não foram convocados para compor o arsenal teórico e ideológico da Vamos.

Diga-me com quem andas e te direi quem és. O método e o discurso da Vamos têm outras inspirações. As propostas econômicas alinham-se claramente com as ilusões neokeynesianas de um capitalismo domesticado e a convicção neo-schumpeteriana da força da concorrência intercapitalista como dínamo do desenvolvimento capitalista. As políticas sociais combinam programas assistencialistas idealizados pelo Banco Mundial com propostas de economia solidária de inspiração no socialismo utópico.

As diretrizes que dizem respeito às pautas de opressões, questões institucionais e meio ambiente seguem os princípios de um pós-modernismo temperado pelo resgate de fórmulas dos programas compensatórios dos governos de Lula e Dilma. Modelo de desenvolvimento, inovação, regulação dos mercados, sustentabilidade, governabilidade, elites, diversidade, orçamento participativo, economia solidária, bolsa família, minha casa minha vida são noções que alinhavam as propostas do Vamos. O que se ganha quando negamos nossas origens e incorporamos em nossos discursos a linguagem de nossos inimigos de classe?

A negação da transformação social 


A ausência de uma perspectiva crítica não permite nenhuma proposta que vá além do senso comum. A incapacidade de conceber as mudanças qualitativas inscritas no movimento histórico limita as mudanças propostas aos parâmetros do status quo. Sem a pretensão de mudar o Estado, o novo viria através de um lento processo de evolução institucional. A política fica, assim, condenada ao horizonte do cretinismo parlamentar.

A preocupação em apresentar medidas tangíveis, que sejam palpáveis dentro da correlação de forças, implica necessariamente encontrar saídas por dentro da ordem. A possibilidade de que a ordem não tenha solução para os problemas do povo — como de fato não tem — não é nem remotamente cogitada.

Sem colocar no horizonte a necessidade e a possibilidade de transformações de grande envergadura não há por que fazer aliança com os partidos políticos contra a ordem. Não surpreende que o chamado à unidade da esquerda não incorpore os acúmulos programáticos realizados pelas setoriais do PSOL e ignore olimpicamente as importantes contribuições do PCB e do PSTU. A unidade proposta é a unidade das forças que representam a esquerda da ordem. O Vamos mira em direção ao PT.

O programa apresentado pela Frente Povo Sem Medo está a léguas de um plano de lutas que oriente a práxis dos trabalhadores em busca de uma saída civilizada para o impasse civilizatório em que se encontra a sociedade brasileira. Circunscrita à miséria do possível, passa ao largo dos problemas reais dos trabalhadores brasileiros — o avanço da barbárie em todas as dimensões da vida. As questões que provocam uma reação mais virulenta do status quo permanecem na penumbra.

Como conquistar a autonomia nacional sem romper com o imperialismo? Como melhorar o nível tradicional de vida dos trabalhadores sem dar empregos bem remunerados à grande massa da força de trabalho que permanece no subemprego? Como superar a pobreza sem eliminar a riqueza? Como combater a desigualdade social sem questionar o padrão de acumulação baseado na cópia dos estilos de vida e padrões de consumo das economias centrais? Como interromper a catástrofe ambiental sem colocar em questão o automóvel, a mineração, o agronegócio? Como modificar a orientação da política econômica sem colocar em questão o papel estratégico da Dívida Pública como centro nervoso da política econômica? A lista das omissões seria interminável. A Vamos fica na superfície da realidade. Ao ocultar os determinantes estruturais da miséria brasileira, a Vamos se atém a administrar a barbárie.

O resultado prático das diretrizes apresentadas é desastroso. O desejo de resolver as mazelas do povo sem enfrentar suas causas é uma quadratura do círculo. Ao negar as contradições como móvel da luta de classes e a crítica como base para a constituição da classe trabalhadora como sujeito político, a Vamos renuncia a qualquer possibilidade de transformação da ordem econômica e social. Os problemas que tornam infernal a vida dos trabalhadores são atribuídos a fatores alheios às estruturas da sociedade que poderiam ser corrigidos com mudanças institucionais e políticas econômicas e sociais.

As propostas 

a) No que toca à Economia, as medidas propostas para recuperar o crescimento e voltar a economia para o mercado interno são insuficientes para romper o bloqueio institucional que submete a política econômica à lógica do grande capital — internacional e nacional. A intenção de formular um "projeto econômico" compatível com o combate às desigualdades esbarra na falta de qualquer medida para combater as causas do subdesenvolvimento e da dependência — a segregação social, o controle do capital internacional sobre a economia brasileira, a modernização baseada na cópia dos estilos de vida das economias centrais;

b) Em relação às questões agrupadas em Poder, a Vamos ignora a questão central – a crise terminal da Nova República e a necessidade de organizar a resposta dos trabalhadores à ofensiva da contrarrevolução burguesa;

c) Em Comunicações e Cultura, as propostas não questionam o colonialismo cultural e os mecanismos perversos de controle da opinião pública pelas grandes corporações que controlam os meios de comunicação e a indústria cultural;

d) No tópico sobre Territórios e Meio Ambiente, o "novo modelo de desenvolvimento" não passa de um baú de velhas novidades, pois a falta de política para combater o agronegócio, a especulação imobiliária e a catástrofe ambiental bloqueia qualquer possibilidade de uma efetiva reforma agrária e urbana, bem como a interrupção da catástrofe ambiental;

e) As medidas propostas em Educação e Saúde pecam pela inexistência de qualquer crítica à crônica penúria de recursos para as políticas sociais, a segregação social, o colonialismo cultural, a indústria da educação e o grande negócio em que se transformou a saúde no Brasil; e, por fim,

f) As propostas que defendem a diversidade cultural contidas em Negros, Feministas e LGBT destacam-se pelo absoluto desconhecimento da relação umbilical entre opressões e exploração.

Ao longo das próximas semanas teremos a oportunidade de fundamentar mais detalhadamente cada uma das críticas aqui esboçadas.

Numa conjuntura histórica em que não existe a menor possibilidade de melhorar as condições de vida dos trabalhadores sem transformações de grande envergadura que apontem para o socialismo, a ilusão de soluções dentro da ordem só alimenta a frustração com a democracia e o desalento dos trabalhadores com a política.

Com pânico de despertar a fúria da contrarrevolução (que já está nas ruas), acaba-se na mais completa e desmoralizante capitulação ideológica e política. À avassaladora ofensiva do capital contra o trabalho, a Vamos responde com uma versão recauchutada do "melhorismo" lulista. O que ontem resultou numa tragédia, hoje começa com farsa. Desse jeito, vamos de mal a pior. É preciso olhar para o futuro e organizar a esperança de uma sociedade baseada na igualdade substantiva. 

31/Janeiro/2018

[*] Economista, autor do livro Crítica à Economia Política de Lula e Dilma.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

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