segunda-feira, 14 de maio de 2018

Caso Manuel Vicente será "teste" à Justiça angolana


O processo judicial, no âmbito da Operação Fizz, que envolve o ex-vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, vai ser enviado para Angola. Analista diz que está agora nas mãos do país mostrar a neutralidade da sua Justiça.

A decisão do Tribunal da Relação de Lisboa de enviar o processo de Manuel Vicente para Angola é "impecável do ponto de vista legal", avalia o jurista português Rui Verde, ouvido pela DW África.

"Podemos discordar dessa deferência, mas trata-se de uma tradição jurídica legal portuguesa", diz o autor de um novo livro sobre Angola e o Futuro a lançar brevemente.

A decisão foi tomada esta quinta-feira (10.05), depois da Justiça portuguesa ter acordado, há cerca de quatro meses, separar a matéria criminal respeitante ao ex-presidente da petrolífera angolana, Sonangol, acusado de crimes de corrupção e branqueamento de capitais.

No entanto, se do ponto de vista jurídico a decisão tem substância legal que não surpreende, é preciso pensar no alcance que ela vai ter: "Obviamente levanta problemas acerca da impunidade destas pessoas que eventualmente são acusadas de ter cometido crimes em Portugal e depois se furtam a ser julgadas no território nacional", afirma Rui Verde.

Sinal de pressão

Para o analista, a decisão é mais um sinal de que a Justiça portuguesa não é independente face a pressões externas.

"Neste momento, em que tantos processos importantes estão a ser julgados em Portugal, este ponto é fulcral. Quanto a Manuel Vicente, vamos ver agora o que acontece em Angola: se efetivamente a Lei da Amnistia lhe é aplicada ou se existe alguma interpretação jurídica que permite ultrapassar essa Lei da Amnistia e que ele seja julgado em Angola", comenta.

A DW África contactou o escritório do advogado de Manuel Vicente para obter um comentário à decisão, sem sucesso. Rui Patrício está indisponível pois está em julgamento, em defesa de Armindo Pires, um dos três arguidos ouvidos no âmbito da Operação Fizz. De acordo com a agência de notícias Lusa, os advogados do ex-presidente da Sonangol mostraram-se satisfeitos com o facto de o juiz desembargador Cláudio Ximenes dar razão ao recurso da defesa de Manuel Vicente.

Agora, caso está "nas mãos de Angola"

Em reação à notícia, o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, disse que tomou "muito boa nota" da decisão.

"Esta decisão, encerrando um 'irritante', permite que a relação entre Portugal e Angola passe para o nível mais alto possível do relacionamento", afirmou Santos Silva à Lusa.

O jurista Rui Verde também sustenta que a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa "é um contributo para o desanuviamento do clima de tensão nas relações político-diplomáticas entre Portugal e Angola".

"Neste momento já não haverá razão nenhuma para o Presidente angolano, João Lourenço, manter a espécie de boicote diplomático que tinha em relação a Portugal", diz.

O ministro da Defesa de Portugal, José Azeredo Lopes, deverá visitar Angola na próxima semana.

Na opinião de Rui Verde, "o futuro de Manuel Vicente passa agora a estar nas próprias mãos de Angola".

O analista entende que a transferência do processo vai ser um teste à Justiça angolana e às declarações que o Presidente João Lourenço fez sobre o combate à corrupção: "Está nas mãos de Angola mostrar o nível, a competência, a imparcialidade e a neutralidade da sua Justiça", conclui.

João Carlos (Lisboa) | Deutsche Welle




Principal partido da oposição são-tomense suspende seis membros


Todos os suspensos são deputados, três deles apoiaram a exoneração de juízes do STJ. Também o presidende do MLSTP-PSD foi suspenso. Irmãos Monteiro, da Cervejeira Rosema, pediram afastamento e atuam como independentes.

O Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe - Partido Social-Democrata (MLSTP-PSD) suspendeu seis dos seus membros, incluindo o seu presidente, Aurélio Martins, indica um comunicado divulgado este sábado (12.05).

Os seis membros do principal partido da oposição são todos deputados da Assembleia Nacional e a suspensão foi ratificada por decisão do Conselho Nacional do partido que esteve reunido este sábado.

"O Conselho Nacional decidiu ratificar a decisão da Comissão Política que deliberou a suspensão dos referidos camaradas", refere o comunicado. 

Entre os seis membros, figuram os três que subscreveram uma carta à Assembleia Nacional para a exoneração e reforma compulsiva dos três juízes do Supremo Tribunal de Justiça, designadamente Aurélio Martins, presidente do partido, Jorge Amado, líder da bancada, e Vasco Guiva, presidente da terceira comissão especializada, bem como os irmãos Domingos (Nino) e António Monteiro, gestores da Cervejeira Rosema.

Estão acusados, entre outros motivos, de "traição aos desígnios do partido", estando a decorrer um processo disciplinar, com a recomendação de que "se procurasse salvaguardar o legítimo direito de defesa dos acusados e se proceder com a maior celeridade possível à conclusão dos processos".

Os irmãos Monteiro, pediram o afastamento como deputados do partido, passando a independentes no Parlamento - o que reduz o número de deputados do MLSTP-PSD de 16 para 14, quando faltam cerca de cinco meses para as eleições legislativas.

Os irmãos Monteiro alegam como motivo de afastamento da bancada parlamentar do MLSTP-PSD a "falta de solidariedade" do partido em relação ao contencioso judicial que os opôs ao empresário angolano Mello Xavier sobre a posse da Cervejeira Rosema.

Disputa político-judicial pela Rosema

Em 21 de abril, um acórdão do STJ decidiu sobre a "restituição imediata da gestão da Cervejeira Rosema e todos os bens penhorados e apreendidos na presente execução e outros bens móveis ou imóveis, incluindo todas as ações da Ridux pertencentes à Cervejeira Rosema, a acionista maioritária daquela firma, à sociedade angolana Ridux, na pessoa do seu administrador [o empresário angolano] Mário Silva Mello Xavier".

O Parlamento são-tomense aprovou, cerca de duas semanas depois, com 31 votos a favor e seis contra, um projeto de resolução que "exonera e aposenta compulsivamente" três juízes do presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), incluindo o presidente - todos os que decidiram no acórdão sobre a devolução da Rosema.

A 7 de maio, o juiz do Tribunal da Primeira Instância do distrito de Lembá, António Bonfim Gentil Dias, emitiu uma sentença, numa providência cautelar interposta pela advogada Celiza de Deus Lima, em que anula o efeito do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça(STJ) de 21 de abril – que devolve a Cervejeira Rosema ao empresário angolano Mello Xavier - e restitui a fábrica "imediatamente" à Sociedade Irmãos Monteiro.

Agência Lusa, cvt | Deutsche Welle

Imagem: Aurélio Martins, presidente do MLSTP-PSD

Genocídio: Debate aceso na Namíbia, silêncio na Alemanha


Negociações sobre genocídio dos povos herero e nama no tempo colonial duram há quase três anos. Tema passa despercebido na Alemanha, mas na Namíbia cresce a revolta. País continua à espera de pedido de desculpas oficial.

"As negociações secretas bilaterais não são transparentes, são praticamente uma farsa", critica Helin Evrin Sommer, do partido alemão A Esquerda (Die Linke). Ao que tudo indica, nem os próprios membros do Bundestag, o Parlamento Federal alemão, sabem exatamente em que pé estão as conversações entre a Alemanha e a Namíbia.

Depois de um debate difícil, tanto no país como no estrangeiro, políticos dos principais partidos alemães foram unânimes em reconhecer que a Alemanha deve pedir desculpa pelo genocídio na antiga colónia alemã no sudoeste africano, onde foram mortos dezenas de milhares de herero e nama, entre 1904 e 1908. No entanto, a Namíbia continua até hoje à espera de um pedido de desculpas oficial.

No atual acordo de coligação governamental não há uma única palavra sobre o genocídio. E quando se questiona o Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre o tema, a resposta de Berlim é quase sempre a mesma: "os documentos sobre as reivindicações detalhadas da Namíbia e a oferta da Alemanha são secretos".

Quando as delegações dos dois países se encontram, também não são claros os resultados das negociações. No final dos encontros, tem sido emitido um curto comunicado de imprensa e pouco mais. Na Alemanha, quase ninguém tem conhecimento das negociações. "O Governo Federal quer adiar a questão", dizem os mais críticos como Helin Evrin Sommer, que fala mesmo numa "tática para tentar colocar o tema em segundo plano".

Críticas à Alemanha

Na Namíbia, as críticas sobem de tom. Há algumas semanas, um colunista do jornal governamental "New Era" acusou o embaixador da Alemanha, Christian Schlaga, de negar a culpa alemã no genocídionum discurso que fez. Acusações que o embaixador rejeitou veementemente. Christian Schlaga diz ter sido alvo de "declarações falsas, mal-intencionadas, depreciativas e ofensivas".

Rumores sobre as negociações e duras críticas ao Governo alemão são frequentes na imprensa namibiana. Os jornais noticiam alegados progressos ou disputas nas negociações - informação cuja veracidade nem sempre é possível verificar.

Representantes dos herero, por exemplo, afirmaram que, depois da independência, terá havido um acordo secreto entre os dois governos, segundo o qual a Namíbia renunciaria a compensações diretas pelo genocídio e a Alemanha, em troca, prometia mais ajuda ao desenvolvimento. Informação que ambos os governos negam.

"Esses rumores são irritantes - por um lado, porque são errados e, por outro lado, porque podem deteriorar o clima", critica em entrevista à DW África Ruprecht Polenz, o principal negociador da Alemanha nas conversações com a Namíbia.

"A população está a perder a paciência", afirma Maximilian Weylandt, do Institute for Public Policy Research (IPPR), um centro de pesquisa independente da Namíbia. "Passados mais de dois anos, ainda não há resultados e algumas pessoas questionam se a Alemanha realmente está a negociar de boa fé e se está disposta a responder às necessidades dos namibianos", disse Weylandt à DW.

De acordo com uma sondagem realizada pelo IPPR, dois terços dos namibianos entrevistados são a favor de compensações da Alemanha - algo que estava fora de questão para o Governo Federal no início das negociações.

Governo da Namíbia sob pressão

Os namibianos também não se mostram muito satisfeitos com seu próprio Governo. Menos da metade dos entrevistados na sondagem do IPPR acredita que o Executivo está a negociar "bem" ou "muito bem" com a Alemanha. Mais da metade dos entrevistados quer que os representantes tradicionais dos povos herero e nama participem nas negociações.

"Graças às intervenções de alguns partidos da oposição no Parlamento e a algumas autoridades tradicionais de vários grupos étnicos, muitos namibianos estão informados sobre as negociações. Talvez eles tenham influenciado também a sua opinião", diz o especialista Maximilian Weylandt.

Alguns líderes tradicionais herero e nama criticam o Governo da Namíbia por ser muito brando com a Alemanha. O seu envolvimento nas negociações está atualmente a ser discutido num tribunal de Nova Iorque, nos Estados Unidos da América (EUA). 

A pressão parece estar a dar resultados: Publicamente, o Governo da Namíbia aumentou a pressão sobre a Alemanha. As autoridades também anunciaram recentemente que o antigo campo de concentração alemão em Shark Island, no sul da Namíbia, deverá ser transformado num memorial.

"O Governo Federal tem grande interesse em concluir as negociações o mais rapidamente possível", assegura o negociador alemão Ruprecht Polenz. Mas é importante que levem o tempo que for necessário, para que os resultados também sejam aprovados pela população, lembra Polenz, que não revela quando será a próxima ronda de negociações.

Daniel Pelz, ms | Deutsche Welle

Imagem: Representação histórica do genocídio na Namíbia

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Marcelo | Um Presidente que não sabe quando parar


Ana Alexandra Gonçalves* | opinião

As comparações, como se sabe, resultam amiúde num desastre. Aparentemente não será essa a opinião do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa que, ébrio daquele espírito de excessos, comparou o trabalho dos irmãos Sobral àquele produzido pelos diplomatas. Segundo o Presidente dos afectos os irmãos Sobral são “embaixadores mais qualificados do que a generalidade da nossa diplomacia.

Em primeiro lugar, a comparação é disparatada – comparar quem produziu uma canção e venceu um festival tem naturalmente o seu mérito, mas não a mesma natureza do que o trabalho dos diplomatas.

Em segundo lugar, qual a necessidade de ofender quem representa o país fora do país, e fora do âmbito da composição musical e da vitória de um festival cuja projecção internacional nem será assim tão significativa? Vale tudo para conquistar votos e simpatias? Aparentemente vale.

Em terceiro lugar, que elogios merecerão as cantoras nacionais que conseguiram um último lugar no referido festival? Existe também a possibilidade de compará-las aos diplomatas?

E finalmente como justifica o seu silêncio, Sr. Presidente?

*Ana Alexandra Gonçalves | Triunfo da Razão

Portugal | PCP diz "basta" às injustiças e defende valorização dos trabalhadores


O secretário-geral do PCP declarou hoje que "basta" de injustiças face ao trabalho e rendimentos dos trabalhadores, numa audição pública sobre os benefícios científicos e tecnológicos para a redução do horário semanal para 35 horas para todos.

No parlamento, Jerónimo de Sousa condenava assim o facto noticiado hoje pelo Diário de Notícias de que a remuneração média dos dirigentes e gestores das principais empresas portuguesas aumentou 40% face há dois anos, ou seja, foi 46 vezes superior à dos outros funcionários.

"Sim, basta de injustiças. É preciso valorizar o trabalho e os trabalhadores", afirmou o líder comunista, numa audição pública, na Assembleia da República, na fase de preparação final para o debate e votação do projeto de lei para generalizar as 35 horas de trabalho semanais, marcados para a sessão plenária de sexta-feira, com iniciativas no mesmo sentido de BE, PEV e PAN.

Para Jerónimo de Sousa, "é possível e necessário ir mais longe" e "é urgente dar combate às injustiças", pois "são os trabalhadores que produzem a riqueza, mas são outros que se apropriam exclusivamente do seu esforço e dos resultados do seu trabalho".

"Hoje mesmo ouvimos, lemos e tomámos conhecimento que os salários dos principais administradores das grandes empresas e grupos económicos cotados em bolsa, aumentaram nos últimos três anos mais de 40% e os lucros dessas empresas acumulados nesse mesmo período subiram ainda mais, cerca de 50%, enquanto os salários médios permaneciam praticamente estagnados, aumentando escandalosamente o fosso entre os rendimentos do capital e de quem o serve e o conjunto dos trabalhadores dessas empresas e grupos", afirmou.

Segundo cálculos do PCP, se se reduzir o horário de trabalho para 35 horas semanais para todos, haverá mais 440 mil empregos e a redução de 240 horas de trabalho por ano por cada pessoa.

Lusa | em Notícias ao Minuto

Pós-2020: Portugal entre Estados-membros críticos de "cortes excessivos"


Portugal foi um dos Estados-membros a criticar hoje, em Bruxelas, os "cortes excessivos" contemplados na proposta da Comissão Europeia de orçamento plurianual da União Europeia para 2021-2027, discutida pela primeira vez em sede de Conselho.

Intervindo num debate público no Conselho de Assuntos Gerais - o primeiro desde que o executivo comunitário apresentou, em 2 de março, a sua proposta de orçamento pós-2020 -, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, salientou que Portugal considera a proposta "globalmente insuficiente" e admite a importância de as negociações decorrerem de forma célere, mas salientando que o calendário "não deverá sobrepor-se à qualidade do resultado a obter".

"A Comissão apresentou uma proposta que é inovadora, acrescenta flexibilidade, transparência e simplificação de procedimentos. No entanto, entendemos que, face aos desafios e à ambição política que temos, esta proposta nos parece globalmente insuficiente", começou por dizer a secretária de Estado, que representou Portugal na reunião.

Reforçando a tese do Governo português desde a apresentação formal da proposta, de que "o ponto de partida não é bom", Ana Paula Zacarias apontou designadamente os "cortes excessivos" preconizados por Bruxelas na política de coesão e na Política Agrícola Comum.

"Consideramos que os efeitos da profunda crise económica, financeira e social geraram danos diretos e indiretos nas nossas sociedades e isso não foi suficientemente tido em causa", disse.

"Apesar dos avanços que hoje temos, os efeitos da crise financeira ainda perduram e mostram claramente a necessidade de uma política de coesão que continue a apoiar os necessários ajustamentos estruturais e a convergência de forma sustentada. E aqui concordo com outros que disseram que o PIB per capita deve continuar a estar no centro das nossas bases de cálculos", apontou.

Garantindo que "Portugal assumirá sempre uma posição construtiva neste processo negocial, que será seguramente complexo e difícil", a governante admitiu que é aconselhável uma aprovação atempada do próximo quadro financeiro plurianual (antes das eleições europeias de maio de 2019), mas não a qualquer preço.

"Uma transição sem sobressaltos é fundamental. Por isso, o calendário é importante, sim, sem dúvida. Mas ele também não deverá sobrepor-se à qualidade do resultado a obter", disse.

A Comissão Europeia propôs um orçamento plurianual para a União Europeia para o período 2021-2027 de 1,279 biliões de euros, equivalente a 1,11% do rendimento nacional bruto da União Europeia a 27 (já sem o Reino Unido), que prevê cortes de cerca de 7% na Política de Coesão e de 5% na Política Agrícola Comum (PAC), contestados por Portugal, entre outros Estados-membros.

Vários Estados-membros, entre os quais França e Espanha, também se opuseram hoje aos cortes previstos na proposta da Comissão, designadamente aqueles previstos para a PAC, com diversas delegações a darem conta da preocupação de os mesmos ultrapassarem em muito, em termos reais, os 5%.

Lusa | em Notícias ao Minuto

Tomar partido pela paz


Manuel Carvalho da Silva | Jornal de Notícias | opinião

Num passado recente, na construção da versão "ocidental" sobre o caso do espião Skripal e das medidas que a propósito dele foram desencadeadas, bem como na justificação e execução dos bombardeamentos sobre a Síria, Trump surgiu, em particular pela mão de Theresa May e de Emmanuel Macron, como o credível parceiro e chefe do "Ocidente". Entretanto, esta semana, as principais potências europeias da NATO (a Grã-Bretanha e a França) e por extensão a própria União Europeia (UE), abandonaram a condição de parceiros de Trump face à vergonhosa posição norte-americana sobre os acordos nucleares com o Irão. No imediato, colocaram-se ao lado do Irão fazendo críticas suaves ao inqualificável Trump. Estes desacordos transatlânticos são raros, mas já aconteceram no passado. Mas o que o passado nos ensina é que a posição norte-americana, em regra, acaba por prevalecer. Desta vez será diferente? Provavelmente não.

A posição dos Estados Unidos da América (EUA) transmitida por Trump, os episódios que a antecederam e as alianças em que se suporta mostram que: i) Trump não é de forma alguma um acaso esquisito na vida política dos EUA e a sua eleição deve-se muito mais à concretização de uma estratégia urdida pelos belicistas e pelos muito ricos daquele país do que a qualquer influência da geoestratégia de Putin; ii) nestes perigosos jogos de guerra, o sofrimento das pessoas é brutalmente ignorado e a destruição dos países até é vista como oportunidade de negócios futuros; iii) os EUA fazem, sem rebuço, alianças com grupos terroristas, com bandidos ou regimes políticos que em relação a direitos humanos estão ainda na idade medieval, como é o caso da Arábia Saudita; iv) Israel está numa das fases mais agressivas de desenvolvimento de terrorismo de Estado em que ciclicamente se coloca; v) Macron não trouxe nada de novo e positivo à política europeia e mundial; vi) a unidade da UE é cada vez mais uma miragem e o rumo que este importante projeto coletivo prossegue, em vez de ajudar a travar decadências e retrocessos que vêm do outro lado do Atlântico, atrela-se a eles; vii) as verdades a que temos direito nos grandes meios de informação no nosso país, como na UE, são cada vez mais parciais.

Perante estes factos e num contexto mundial muito delicado, o que se pode perspetivar quanto aos envolvimentos em que os países e cidadãos europeus se vão ver enredados? Se a "Europa" mantiver a sua posição contra a decisão de Trump, as sanções norte-americanas contra o Irão tornar-se-ão sanções contra todas as empresas europeias com interesses nesse país. Uma análise custo-benefício, que ponha na balança o que as empresas ganham no Irão contra o que perderiam nos EUA, pode levá-las a encorajar os seus governos a arrepiarem caminho e a balancear para o lado de Trump. O caminho para este reacerto de posição perceciona-se nas entrelinhas do discurso de dirigentes europeus e alguns já encetaram a tarefa de procurar convencer o Irão a rever (ou "alargar") o acordo nuclear, em termos que o Irão não quer ou não pode aceitar. A recusa da revisão por parte do Irão - país que também tem os seus setores radicais e defensores do belicismo - poderá então servir de pretexto para as potências "europeias" acompanharem Trump no abandono do acordo.

Será que os povos e países europeus estão inevitavelmente condenados à escolha entre os EUA e o Irão, entre os EUA e a Rússia ou outra qualquer potência? Não. Há que dizer bem alto que a escolha que se nos coloca é entre caminhos de guerra e sofrimento, ou caminhos de paz com relações de respeito recíproco entre países e povos.

Nós, portugueses, também não estamos livres de nos vermos arrastados como país membro da NATO e da União Europeia para uma aventura militar provocada por Trump e por Netanyahu. Não seria a primeira vez que seríamos pressionados a tomar partido e a vermo-nos envolvidos numa guerra que não é nossa. Porque devemos fazer tudo para que isso não aconteça, impõe-se a consciencialização e a mobilização dos portugueses e dos cidadãos de todos os países. Em circunstâncias como estas que estamos a viver, o partido certo é o da paz.

*Investigador e professor universitário

Washington expõe estratégia de domínio mundial


A integração de uma guerra contra o Irão no processo cada vez mais evidente de criação de «um novo Médio Oriente» implica uma reactualização do tipo de intervenção imperial na Síria.

José Goulão | AbrilAbril | opinião

Aos cabos de guerra não se pedem metáforas nem se exige diplomacia; falam pouco e, quando o fazem, disparam palavras cruas e directas com alvos escolhidos e objectivos afinados consoante a estratégia mais actual, os quais ultrapassam, em muito, a necessidade canónica de manter despertos os instintos exterminadores das hostes sob o seu comando.

Por isso, quando figuras como o almirante John M. Richardson, chefe de operações navais do Pentágono, e o general norte-americano Curtis Scaparrotti, comandante das forças aliadas na Europa, dizem de sua justiça é aconselhável ouvi-los, obrigatório entendê-los. E estampar as suas sentenças como legendas dos movimentos militares que vierem a desencadear.

Para acolher e divulgar as mais recentes mensagens do almirante Richardson foi escolhida a BBC, um pilar da mundialização anglo-saxónica, fenómeno mais simploriamente conhecido como «globalização». Tecnicamente qualificada como «entrevista», a performance do chefe de operações navais do Pentágono não passou de um discurso que, para ser mais eficaz, foi formatado com a ajuda de um profissional da estação para introduzir as variações temáticas e retirar-lhe os vícios monocórdicos.

De uma penada, o almirante John M. Richardson revelou que os Estados Unidos renovaram a estratégia militar e, em consequência, adoptaram medidas que elevam os patamares de disponibilidade e de presença territorial dos seus corpos expedicionários de âmbito mundial.

«A nossa estratégia de defesa nacional», anunciou o chefe de operações navais do Pentágono, «torna claro que estamos de regresso a uma era de competição entre grandes potências, na qual o ambiente de segurança se torna cada vez mais desafiador e complexo».

Existe pois, segundo o almirante Richardson, «uma reorientação das forças armadas norte-americanas perante um mundo de renovada competição entre grandes potências e distante das campanhas de contra-insurgência que têm sido desencadeadas nas últimas décadas».

Em primeira leitura deduz-se que o Pentágono retoma um dispositivo de tipo «guerra fria», tendencialmente mais «quente» do que esta, tendo em conta a proliferação de conflitos activos, e deixa para segundo plano o sistema de agressões isoladas – embora estrategicamente convergentes – provavelmente por não ter conseguido alcançar uma única vitória nessas guerras que deveriam ter sido resolvidas em meia dúzia de dias, segundo as profecias oficiais.

A maior prioridade, definiu o almirante, «é combater a Rússia». Não sendo novidade, tendo em conta as movimentações no terreno e os objectivos subjacentes a numerosas operações militares e políticas que se sucedem em cadeia, é a primeira vez que um alto responsável norte-americano nomeia a Federação Russa como o inimigo num contexto militar de nova guerra fria.

Em função da prioridade definida, prosseguiu o almirante Richardson, «estamos a reactivar a Segunda Esquadra para responder a esses desafios, principalmente no Atlântico Norte». Teoricamente desactivada em 2011, a ressuscitada esquadra terá jurisdição sobre navios, meios aéreos e forças terrestres numa área entre o Pólo Norte e o Mar das Caraíbas, entre a costa leste dos Estados Unidos e a zona central do Atlântico, uma área cuja dimensão o chefe militar avaliou em 17,5 milhões de quilómetros quadrados.

Conjuguemos agora os anúncios do chefe de operações navais do Pentágono com as considerações político-militares tecidas pelo general norte-americano Curtis Scaparrotti, o qual, como comandante das forças aliadas em território europeu é, de facto, o chefe operacional do mega-exército resultante da unificação de quase todas as tropas da Europa e, por inerência, da União Europeia.

Nessa qualidade, e com a maior naturalidade colonial, Scaparrotti dissertou perante o Congresso dos Estados Unidos sobre as contingências impondo uma renovação da estratégia militar de Washington e aliados, designadamente na Europa.

«A Rússia lançou uma campanha de desestabilização para alterar a ordem internacional, confundir a NATO e minar a liderança dos Estados Unidos no mundo inteiro», proclamou.

Como exemplos deste inadmissível desafio de Moscovo a um status quo segundo o qual o mundo é um território norte-americano, o general citou a «anexação ilegal da Crimeia» e a «desestabilização na Ucrânia Oriental» – por sinal situações que decorrem do golpe fascista dado em Kiev sob direcção operacional de Washington e o patrocínio político da União Europeia.

O general Scaparrotti explicou ainda aos congressistas que a reorientação da estratégia militar deve ser acompanhada por um «combate à desinformação russa», da responsabilidade dos Estados Unidos, em parceria com a NATO, de maneira a assegurar «uma informação verídica e transparente».

Da qual podem ser exemplos – ainda que não citados pelo cabo de guerra – os casos em torno da suposta tentativa de assassínio do espião Skripal e filha, além dos episódios com armas químicas na Síria, tanto as que não foram usadas em Duma como as que não existiam em alvos atingidos pelos mísseis da tripla aliança Trump-Macron-May, no passado dia 14 de Abril.

Acontecimentos relatados com uma veracidade e uma transparência tão inquestionáveis como «a liderança dos Estados Unidos no mundo inteiro».

Que sucede, entretanto, enquanto ecoam as palavras do almirante Richardson e do general Scaparrotti, por definição homens de poucas falas e muito mais acção?

Iniciou-se a ressurreição da Segunda Esquadra norte-americana, gigantesco corpo da NATO com quartel-general em Norfolk, na Virgínia. Quando foi teoricamente extinta, em 2011, a monumental esquadra era constituída por 120 navios de guerra, 4500 aviões e 90 mil efectivos.

Enquanto isso, nos últimos dias de Abril os ministros dos Negócios Estrangeiros da NATO, entre eles o inefável dr. Azeredo Lopes, declararam-se de acordo em agregar mais quatro países à pacífica aliança: Bósnia-Herzegovina, FYROM (Macedónia), Geórgia e a Ucrânia, onde os grupos de assalto nazis pontificam à cabeça das organizações militares nacionais.

Ao Mediterrâneo, com as miras focadas na Síria mas para «combater a influência russa», chegou o poderosíssimo grupo de combate imperial comandado pelo super porta-aviões Harry S. Truman, nave com mais de 300 metros de comprimento movida por dois reactores nucleares e que pode lançar vagas sucessivas de mais de uma centena de caças e helicópteros militares.

Acompanham-no uma imponente frota pronta a disparar mais de mil mísseis de cruzeiro: o cruzador Normandy, os contratorpedeiros Arleigh, Burke, Bulkeley, Forrest Sherman, Farragut, Jason Dunham, The Sullivans e a fragata alemã Hessen.

O grupo junta-se a quatro contratorpedeiros e a numerosos submarinos de países da NATO já presentes na região. Sobre os objectivos reais, que não os proclamados, desta presença recorda-se que, desde 1991, as forças armadas norte-americanas dispararam 2250 mísseis de cruzeiro durante guerras em vários continentes provocadas pelos Estados Unidos e com envolvimento da NATO: Jugoslávia, Bósnia Herzegovina, Sudão, Iraque, Afeganistão, Líbia e Síria – incluindo já os 103 lançados em 14 de Abril último.

Como sabem os que estão familiarizados com o mantra propagandístico da Aliança Atlântica, a tal informação «verídica e transparente» que tanto motiva senhores da guerra como o almirante Richardson e o general Scaparrotti, os grupos de combate dispondo de incalculável potencial de extermínio movem-se pelo mundo com um arreigado intuito «defensivo» e um tenaz apego à «segurança nacional» não se sabe bem de quem; porém, ameaçada cobardemente pelas populações civis de cidades como Alepo, Damasco, Homs, Bagdade, Mossul, Kirkuk, Tripoli, Beirute, Cabul, Falluja, Hebron, Gaza, Belém e tantas outras de uma lista infindável de antros incapazes de compreender a liberdade, a civilização, a democracia e os direitos humanos levados pacificamente até eles por refinados e cirúrgicos engenhos de morte. 

Para que a segurança destas imensas forças não seja abalada enquanto cumprem as suas missões há que relembrar a situação de apronto em que se encontram as forças navais norte-americanas para a Europa e África, designadamente a Sexta Esquadra, que têm quartéis-generais nas regiões italianas de Nápoles e Gaeta; e a Quinta Esquadra, pronta para o que der e vier a partir da sua base no Bahrein.

E porque o mundo é um só, graças à «ordem internacional» – e também imperial – estabelecida sob «a liderança dos Estados Unidos», renasceu na era de Obama a afamada Quarta Esquadra, velho polícia da América Latina com longa e sangrenta história para garantir a «segurança nacional» de sucessivas ditaduras latino-americanas – restauradas agora em formato «benigno» graças aos golpes no Paraguai, regime que obedece a Trump instalando a sua embaixada em Jerusalém, e no Brasil de Temer.

As reactualizações estratégicas do Pentágono anunciadas por cabos de guerra como Richardson e Scaparrotti, e as significativas movimentações bélicas que lhes sucedem desvendam um novo/velho alvo de guerra que cola ainda mais a Administração Trump ao fascismo sionista de Netanyahu, mesmo que o afaste ligeiramente de aliados europeus, um distanciamento que nunca passa, porém, de simples verbalizações sem quaisquer consequências quando chega a hora de disparar os mísseis.

A revogação, por Donald Trump, do acordo com o Irão e a imediata gratidão que o primeiro-ministro de Israel tornou pública revelam que Washington e Telavive atingiram o ponto de sintonia absoluta no projecto de guerra contra Teerão.

Fica escancarado o caminho para a tentativa de consumação de um outro grande objectivo dos fascismos sionista e saudita e do complexo militar e industrial norte-americano: reduzir a pó a influência do Irão no Médio Oriente, de modo a concretizar o novo mapa regional – mesmo que a versão final deste seja ignorada até pelos próprios «cartógrafos.

A integração de uma guerra contra o Irão no processo cada vez mais evidente de criação de «um novo Médio Oriente» implica uma reactualização do tipo de intervenção imperial na Síria, uma vez que o conflito conduzido por Washington, Londres e Paris através de interpostos grupos terroristas não fez o pleno dos objectivos prioritários: desmantelar o país e derrubar o regime em Damasco.

Ao contrário da informação «verídica e transparente» difundida por ocasião dos bombardeamentos terroristas de 14 de Abril, o palácio presidencial foi um dos alvos dessa operação. As forças militares sírias tinham concentrado, porém, muitas das suas capacidades antimíssil na defesa das estruturas do regime, pelo que abateram todos os engenhos com esses destinos.

O esforço, porém, obrigou a desproteger outras instalações e, por isso, os agressores conseguiram destruir o centro de investigação de Barzeh, onde era fabricada a maior parte dos medicamentos genéricos utilizados no país.

A Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ) inspeccionara por cinco vezes as instalações desde 2014 e nunca ali detectou um único indício capaz de conduzir à produção de engenhos com essas características.

Os sinais de alteração do tipo de guerra contra a Síria têm-se acumulado nos últimos dias através de bombardeamentos sucessivos contra instalações do exército nacional, provocações protagonizadas por Israel alegadamente para atingir as estruturas iranianas que ajudam a defender a independência síria.

De certa forma pode dizer-se que a guerra contra o Irão já começou em território sírio, podendo a colaboração militar entre os dois países servir de pretexto à ampliação da área regional da agressão estrangeira.

Como se o Império, agraciado dogmaticamente com a «verdade» e arrastando a Europa como apêndice, ainda necessitasse de pretextos quando se trata de garantir a manutenção da ordem internacional «sob a liderança dos Estados Unidos no mundo inteiro».

Foto: Al Drago/Pool / EPA

EUA ameaçam UE com sanções por comércio com Irã


Autoridades americanas afirmam que empresas europeias com negócios no Irã poderão ser alvo de punições. Teerã estabelece prazo de 60 dias para que Europa forneça garantias de modo a salvaguardar interesses iranianos.

O governo dos Estados Unidos elevou a pressão sobre a União Europeia (UE) após Washington decidir abandonar o acordo nuclear com o Irã. Autoridades americanas sugerem que empresas europeias que realizarem operações com o país poderão ser alvo de sanções. 

O assessor de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton, alertou neste domingo (13/05) que é possível que sejam aplicadas sanções contra empresas europeias que realizem negócios no Irã, após a saída de seu país do acordo nuclear. Ele disse que os signatários europeus deveriam seguir o exemplo americano.

"Acredito que os europeus verão que está dentro de seus interesses finalmente se somar a isso", afirmou Bolton em entrevista à CNN. Sobre as possíveis sanções às empresas europeias, Bolton disse que isso vai depender da "conduta dos outros governos".

Ele disse que a Europa ainda está assimilando a decisão anunciada pelo presidente na última terça-feira. "Acho que eles estão realmente surpresos que saímos [do acordo], realmente surpresos com a reimposição de sanções rígidas. Mas vão se acostumar com a ideia, veremos o que acontece então", observou. 

O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, afirmou que a decisão de Washington de se retirar do acordo – assinado em 2015 juntamente com a China, França, Reino Unido, Alemanha e Rússia – "não teve como objetivo pressionar os europeus".

Em entrevista á emissora americana Fox News neste domingo, o secretário disse que a intenção do governo americano junto aos parceiros europeus é chegar a um novo acordo que "de fato funcione, que proteja o mundo do mau comportamento do Irã, não apenas em relação a seu programa nuclear, mas também a seus mísseis e a seu comportamento maléfico".

O Departamento do Tesouro dos EUA deu prazo de entre 90 e 180 dias para que as empresas estrangeiras com operações no Irã encerrem suas atividades em setores-chave, como o de energia, de modo a evitar sanções econômicas.

Os países da UE signatários do pacto nuclear criticaram a saída de Washington do acordo e refirmaram suas intenções de manter vivo o tratado arduamente negociado com Teerã.

Um comunicado do gabinete da primeira-ministra britânica, Theresa May, afirma que o Reino Unido e o Irã expressaram seu compromisso em se manterem no pacto. O ministro francês do Exterior, Jean-Yves Le Drian, disse que seu país permanecerá como umas das "partes interessadas".

A Alemanha afirmou que tentará convencer Washington a repensar sua decisão durante os 90 dias do prazo para que as as empresas europeias encerrem seus negócios com Teerã. O ministro alemão do Exterior, Heiko Maas, porém, reconheceu que será difícil protegê-las de futuras sanções americanas.  

Ministro iraniano na Rússia

O ministro iraniano do Exterior, Javad Zarif, viajou a Moscou em busca de garantias do governo da Rússia e dos demais signatários de que ainda apoiam o acordo de 2015.

"O objetivo final dessas negociações é assegurar que os interesses da nação iraniana sejam defendidos", disse Zarif ao lado de seu colega russo, Serguei Lavrov, nesta segunda-feira.

O ministro russo, por sua vez, disse que seu país e a Europa têm o dever de "defender em conjunto seus interesses legais" em relação ao pacto.

Analistas sugerem que a Rússia poderia se beneficiar da decisão americana de deixar o acordo, por estar menos exposta do que a Europa às consequências de futuras sanções americanas ao Irã.

Irã dá ultimato para europeus

Segundo informação divulgada no portal Icana, do Parlamento iraniano, os países europeus têm até 60 dias de prazo para salvaguardarem interesses iranianos. A medida é atribuída ao vice-ministro do Exterior, Abbas Araghchi, citado pela Comissão de Assuntos Estrangeiros do Parlamento.

"Os europeus têm entre 45 e 60 dias para fornecer as garantias necessárias para salvaguardar interesses iranianos e compensar os danos causados pela saída dos EUA [do acordo nuclear]", afirma o portal.

RC/afp/rtr/efe | Deutsche Welle

Torra eleito presidente do governo regional da Catalunha | Puigdemont é o presidente "legítimo"


Quando o candidato eleito formar o governo regional, terminará a tutela política imposta por Madrid na Catalunha

O parlamento da Catalunha elegeu esta segunda-feira Quim Torra como presidente do governo regional desta região espanhola, que poderá assim recuperar o estatuto de autonomia perdido em outubro de 2017 com a tentativa de independência liderada por Carles Puigdemont.

Quando o candidato eleito formar o governo regional (Generalitat), terminará a tutela política imposta por Madrid na Catalunha na sequência da proclamação da independência da região em 27 de outubro de 2017.

A eleição põe também fim a um impasse político de quase cinco meses depois das eleições regionais de 21 de dezembro em que os partidos independentistas voltaram a ter uma maioria no parlamento da Catalunha.

Quim Torra foi indicado pelo ex-presidente catalão Carles Puigdemont refugiado na Alemanha e a aguardar uma decisão sobre o mandato europeu de detenção emitido pela justiça espanhola que aguarda pela sua extradição para o julgar.

Quim Torra foi hoje eleito em segunda votação por 66 votos dos dois grandes partidos independentistas, 'Juntos Pela Catalunha' (direita) e Esquerda Republicana da Catalunha (ERC, socialista), tendo votado contra 65 deputados regionais dos Cidadãos (liberais), Partido Socialista da Catalunha (associado ao PSOE), Partido Popular (PP, direita), 'En Comú-Podem' (extrema-esquerda).

A abstenção dos quatro deputados do pequeno partido independentista de extrema-esquerda 'Candidatrura de Unidade Popular' (CUP) foi essencial na eleição de Quim Torra, que assim conseguiu ganhar por maioria relativa, depois de ter falhado a primeira votação no sábado em que precisava da maioria absoluta dos 135 deputados regionais.

Puigdemont é o presidente "legítimo"

No discurso que fez esta manhã, Quim Torra voltou a sublinhar que Carles Puigdemont é o presidente "legítimo" do governo regional da Catalunha e prometeu ser "leal ao mandato" para "construir um Estado independente em forma de República".

"Todos irão ganhar direitos com a República", disse Torra durante a apresentação do seu programa perante os parlamentares regionais, defendendo uma "nação plena" catalã e sublinhando que "ninguém irá perder direitos. A República é para todos e não interessa em quem se vote".

Quim Torra anunciou que irá criar um "conselho de Estado no exílio" com o ex-presidente regional Carles Puigdemont, que considera ser "o presidente legítimo" da Catalunha.

O candidato também defendeu a criação de uma assembleia constituinte para escrever uma Constituição para a futura República catalã.

O Governo espanhol, dirigido por Mariano Rajoy, já avisou que poderia a qualquer momento voltar a intervir na Catalunha se Quim Torra violar a Constituição.

O porta-voz do executivo espanhol, Ínigo Méndez de Vigo, assegurou que Madrid não "terá dúvidas em voltar a atuar com firmeza" se se repetir a situação como aquela que levou à intervenção do Governo central na Catalunha.

Torra é uma das figuras menos conhecidas dos independentistas catalães, mas em 2015 dirigiu durante vários meses a poderosa associação cívica separatista Omnium Cultural.

Este editor, de 55 anos, entrou na política em dezembro passado quando foi eleito deputado regional na lista "Juntos pela Catalunha" formada por Carles Puigdemont e tendo por base deputados que pertencem ao Partido Democrático e Europeu da Catalunha (PDeCAT, direita) e personalidades independentes.

Lusa | em TSF | Foto: Albert Gea/Reuters

MASSACRE ISRAELITA DE HOJE JÁ SOMA 37 MORTOS E CENTENAS DE FERIDOS


37 palestinos mortos por tiros israelitas na Faixa de Gaza

Ao menos 37 palestinos morreram nesta segunda-feira em Gaza por tiros de soldados israelenses na fronteira, onde dezenas de milhares de pessoas protestam contra a transferência a Jerusalém da embaixada americana em Israel, de acordo com um balanço do ministério da Saúde de Gaza.

A Autoridade Palestina acusou Israel de cometer um "massacre horrível" na fronteira da Faixa de Gaza e pediu uma "intervenção internacional".

As vítimas fatais elevam a 91 o número de palestinos mortos na Faixa de Gaza desde o início de um movimento de protesto em 30 de março.

Este é o dia mais violento do conflito israelense-palestino desde a guerra de 2014 no território.

Um dos 37 mortos é um adolescente de 14 anos, informou o ministério da Saúde da Faixa de Gaza, o território palestino governado pelo movimento islamita Hamas.

Yusuf al-Mahmud, porta-voz da Autoridade Palestina, pediu em um comunicado "uma intervenção internacional imediata para frear o massacre horrível em Gaza cometido pelas forças israelenses de ocupação contra nosso heroico povo".

O porta-voz do governo da Turquia, Bekir Bozdag, afirmou que a "administração americana é tão responsável como Israel por esta matança".

Milhares de pessoas protestam desde o início da manhã na fronteira entre a Faixa de Gaza e Israel.

Os soldados israelenses abriram fogo quando os manifestantes se aproximaram da cerca na fronteira.

No domingo e nesta segunda-feira o exército israelense lançou panfletos em Gaza para advertir os palestinos que participam nas manifestações que se expõem ao perigo e que não permitirá que se aproximem da cerca de segurança ou ataquem os soldados.

AFP


Governo palestino acusa Israel de cometer 'massacre horrível' em Gaza

A Autoridade Palestina acusou Israel de cometer um "massacre horrível" na fronteira da Faixa de Gaza com aquele país, onde 37 manifestantes palestinos morreram em confrontos com as forças israelenses antes da inauguração da embaixada dos Estados Unidos em Jerusalém.

Yusuf al-Mahmud, porta-voz da Autoridade Palestina, pediu em um comunicado "uma intervenção internacional imediata para frear o massacre horrível em Gaza cometido pelas forças israelenses de ocupação contra nosso heroico povo".

PSICOTERRORISTA INAUGURA EMBAIXADA DOS EUA EM JERUSALÉM OCUPADA


Hora de almoço e não queremos ter por aperitivo futebol. Muito menos novamente Porto, Benfica, Sporting… e o que por aí se diz e vê a eito. Já sabe a fartum. Ponto final. Para daqui a uns meses há mais futebol. Depois do defeso queremos curtir as saudades da redondinha. Vai saber bem.

Pois é. O Curto que se segue, do Expresso balsemanizado, abre com essa tal coisa do futebol. Não vamos nessa. Preferimos a lavra sobre os EUA abrir hoje, daqui a poucos minutos, a embaixada de Trump, o psicoterrorista, em Jerusalém. Preferimos as lavras imensas sobre a mortandade em que Israel está apostada junto ao muro da vergonha que não tem. Milhares de palestinianos feridos com balas de pseudo-militares do exército terrorista de Israel. Ali estão eles, à espera de disparar como no tiro aos patos e matarem palestinianos que se manifestam contra a saga assassina e ocupante da Pátria Palestiniana. Depois deste Curto tem no PG, vindo do tal Expresso, um artigo com “As Guerreiras de Gaza”, com fotografias espetaculares mas terrificas, tristes por existirem devido ao azo que a situação daquela região permite. E sobre isso vem mais no Expresso. É de ver e chorar por menos ou até por que aquilo não exista. Difícil, com terroristas no governo israelita que contagiam muitos outros terroristas. Israel é um país de terror exportado para os países vizinhos e outros. Foram dizimados por Hitler no holocausto e geneticamente aprenderam a ser nazisionistas, terroristas. Governos que se consideram no direito de ocupar os países vizinhos o que são se não isso mesmo. Adiante. Amanhã há mais. Amanhã morrerão assassinados com balas reais mais palestinianos que atiram pedras aos ocupantes israelitas.

Ficamos por aqui. O terror e a sede de sangue israelita enoja. Quem quiser devore a comunicação social sobre este tema. É abundante. Por aqui paramos.

Boa semana, boa saúde. Boas festas aos animais. (CT | PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

A palavra exacta, que nunca ilude

Pedro dos Santos Guerreiro | Expresso

O FC Porto é o campeão desta época, Sérgio Conceição é o homem do ano, Pinto da Costa é a personalidade de uma era.

A era do presidente do clube não tinha afinal terminado, ao contrário do que se escreveu nos últimos quatro anos: se tivesse terminado, o Benfica era hoje penta e Pinto da Costa estaria a receber prémios-carreira. Quando recebeu este sábado a medalha de honra da cidade do Porto, "o Porto que eu amo", tinha a taça de campeão ao lado. Foi o momento mais bonito da noite nos Aliados, entre os cânticos na avenida e os foguetes no céu, "o céu mais azul". Os dois discursos da noite, ambos curtos e não lidos, de Rui Moreira e Pinto da Costa, foram sobretudo sobre o Porto. Não o clube, mas a cidade. Porque o clube faz maior a cidade que é maior do que o clube. "Tornar maior esta cidade" é o desejo inscrito no poema de Pedro Homem de Mello que Pinto da Costa citou. Não por acaso, o poema chama-se "Aleluia".

Benfiquistas, sportinguistas e outros istas desligam a televisão nestes momentos, porque a euforia dos vencedores contrasta com os seus insucessos. Na noite em que os atletas voltaram 19 anos depois à câmara de onde foram desalojados por Rui Rio, e em que nos Aliados se montou uma festa como não havia memória, o batimento cardíaco depende da cor do coração, mas a forma como uma cidade vive é nítida aos olhos de todas as cores. Não se trata de identificação de uma cidade com o seu maior clube, mas da identidade da própria cidade, que celebra como quem vive em família e faz de uma vitória no futebol uma festa da sua própria existência comunitária e cidadania. O Porto só se conhece por dentro e a sorte dos de fora é que a mesa tem sempre um lugar vago para quem queira entrar com autenticidade. "Porto - palavra exacta, nunca ilude", escreve Pedro Homem de Mello.

Pode ler tudo na Tribuna Expresso, da noite de sábado no Porto à tarde de domingo em Lisboa e aos "cômputos" habituais no final de cada época. O Benfica ganhou na Luz e conquistou o segundo lugar no Funchal, onde o Sporting perdeu o jogo e o acesso à Champions. As consequências na próxima época serão evidentes no orçamento (e portanto na qualidade esperada) do plantel. Luís Filipe Vieira e Bruno de Carvalho (que deu uma longa entrevista no sábado ao Expresso) irão agora atacar os meandros desta época. Pinto da Costa é campeão. O Porto é campeão.

Há frases feitas para pintar nas paredes das ruas, outras sintetizam confrontações sociais. Se uma sociedade se deslaça, revolta-se ou desiste. Na Argentina, as lojas de câmbios parecem postos de turismo, escreve o Estado de São Paulo, com milhares de fotografias não a paisagens mas ao câmbio do dólar, perante uma nova intervenção do FMI no país. Na Grécia, sucessivos programas de intervenção para salvar a economia devastaram a sociedade. Em Espanha, múltiplos escândalos de corrupção partidária e nos bancos, e o fosso aberto entre Madrid e a Catalunha, levam à aceleração da dissolução da estrutura de poder das últimas décadas.

Uma sondagem de hoje do El Pais revela uma queda histórica do PP (19,5%) e do PSOE (19%), com o auge do Ciudadanos (29,1%) e do Unidos Podemos (19,8%). É a primeira vez que estes dois partidos ultrapassam aqueles que governaram Espanha nos últimos 35 anos. Mais: 65% dos eleitores do PP preferem outro candidato a Mariano Rajoy. E quanto aos socialistas, "tudo indica que a sua renovação não consegue convencer, o que empurra o país para uma hegemonia do centro-direita liderada por um Albert Rivera que segue arrebatando votos", escreve o editorial do jornal espanhol.

E em Portugal? Após uma década escândalos na banca e de uma intervenção externa, seguem-se quantos anos de investigação judicial a bancos e políticos? Não é só Salgado, Sócrates, Pinho e Lino, é a estrutura de poder que mandou em Portugal. Ou a resolução de casos como estes resgata a confiança da sociedade nas suas instituições ou a democracia se dissipa através do aumento da abstenção. Mas quando lemos nas edições de hoje do DN e do JN que a diferença dos salários médios dos administradores das empresas cotadas é 46 vezes superior aos dos seus trabalhadores, pensamos de novo em justiça - em justiça social.

Como revelava o Expresso no sábado, três quartos dos quase 530 mil empregos criados em Portugal desde 2013 pagam menos de 900 euros por mês.

"António Costa prefere contratar funcionários públicos a aumentar salários", como titulava ontem a entrevista do primeiro-ministro ao Diário de Notícias. A frase prognostica a entrada de mais funcionários públicos, satisfazendo reivindicações de várias classes profissionais. Mas como ainda este sábado a secretário de Estado da Administração Pública dizia em entrevista ao Expresso que não é aceitável estar nove anos sem aumentos salariais, possivelmente assistiremos às duas coisas: contratações e aumentos no Estado. Em ano de eleições legislativas.

(Em eleições partidárias, António Costa foi reeleito, sem surpresa, secretário-geral do PS. Com 96% dos votos.)

Quem criticou Costa pelas opor contratações a aumentos foi Jerónimo de Sousa.

O secretário-geral do PCP criticou também o processo da EDP, defendendo que a empresa devia ser controlada pelo Estado Português. Só que pode vir a ser controlada pelo Estado chinês, se a OPA anunciada na sexta feira tiver sucesso. O Expresso, que deu a notícia em primeira mão, explicava tudo no sábado e vai continuar a acompanhar a operação, que durará provavelmente meses. Analistas citados pelo Negócios dizem que o preço oferecido é baixo, sendo que as ações dispararam 8% ao início da sessão de segunda feira, logo superando a oferta da CTG.

Está marcada para hoje a abertura oficial da embaixada dos EUA em Jerusalém, decisão de Donald Trump que sinaliza o reconhecimento da cidade como sendo a capital de Israel. A decisão foi amplamente criticada pela comunidade internacional e sobretudo pelos palestinianos.

(Israel venceu o festival da Eurovisão.)

Trump continua a abalar o mundo. "Obcecado em desmantelar o legado de Obama e em mudar o regime de Teerão, o atual presidente dos EUA deixou o Médio Oriente à beira de nova guerra, ao repudiar o acordo nuclear com o Irão", escreve a jornalista Margarida Santos Lopes. Trump "enfraqueceu também a aliança transatlântica, ao abandonar mais um compromisso internacional, ameaçando empresas europeias com sanções".

O autoproclamado Estado Islâmico foi anunciado como tendo sido destruído no Iraque, mas fora continua a matar. Reivindicou três atentados nas últimas horas, em França, Indonésia e no Afeganistão. No total, 23 pessoas morreram.

Xanana Gusmão consolidou a maioria absoluta em Timor-Lestenas eleições deste fim de semana.

Assunção Cristas aterra hoje em Luanda, onde nasceu. A líder do CDS tem uma agenda marcada por palestras e reuniões. Irá cruzar-se com o ministro dos Negócios Estrangeiros, Azeredo Lopes, que está em Angola desde sábado.

Morreu Rosado Fernandes, fundador da CAP.

Em Fátima, o santuário encheu-se para a celebração do 13 de maio. O Papa Francisco enviou uma mensagem, um ano depois de ter estado ele próprio presente em Fátima.

Produzimos muito, importamos algum e bebemos bastante. Conheça aqui o retrato do vinho português.

FRASES

"Maior parte das pessoas que está a abandonar Sócrates não o faz por convicção, faz por calculismo". Marques Mendes, na SIC.

"Há faculdades em condições muito más". António Sousa Pereira, novo reitor da Universidade do Porto, no JN.

"Não posso ser hipócrita e dar os parabéns a quem me tratou mal". Rui Vitória, sobre o FC Porto.

O QUE EU ANDO A LER

Hoje, quando for meio dia, celebram-se 70 anos da independência de Israel. Naquele 14 de maio de 1948, o novo Estado "fazia-o no meio de uma guerra já iniciada pelos países árabes à sua volta, que rejeitaram o plano de partição proposto pela ONU", escreve a jornalista Luciana Lerderfarb, enviada pelo Expresso a Israel. "O país passaria por várias guerras e várias vitórias, mas isso não o tornou um completo vencedor. 70 anos depois daquele dia inaugural, é um puzzle complexo ao qual ainda faltam peças".

reportagem da Luciana Lerderfarb está publicada na edição desta semana da revista E e a recomendação é mesmo lê-la, para perceber melhor o puzzle. Na edição do semanário, leia ainda a crónica do escritor israelita A.B. Yehoshua, intitulada "A quimera dos dois Estados", onde se reflete sobre o conflito israelo-palestiniano e sobre as dificuldades crescentes na sua resolução. Também este sábado iniciámos a oferta do livro "Jerusalém", de Simon Sebag Montefiore. E hoje, às 18 horas, leia uma edição especial do Expresso Diário sobre Israel, com análises, crónicas e muita informação para compreender melhor os contornos desta realidade tão complexa.

"O dia é curto e a tarefa imensa", diz o ditado judeu, citado na reportagem do Expresso.

Tenha uma excelente segunda-feira.

CONTRA ISRAEL | As guerreiras de Gaza


Estão na “linha da frente” dos protestos contra Israel. Numa sociedade conservadora como é a da Faixa de Gaza, as mulheres desdobram-se em formas de luta para reclamar um direito histórico — o regresso às terras que outrora foram palestinianas e que agora são território de Israel. “Somos todos terra”, diz ao Expresso uma jovem envolvida nos protestos

Voluntariam-se para prestar assistência aos feridos, lançam balões e papagaios de papel com as cores da Palestina, fazem pão para matar a fome a quem esgota o corpo a “dar luta” a um dos exércitos mais poderosos do mundo, aproximam-se corajosamente da fronteira para gritar a sua revolta contra a ocupação israelita que transformou o território onde vivem num gueto de onde é difícil sair.

São as mulheres da Faixa de Gaza que, por estes dias, passam grande parte do tempo “em serviço” junto à fronteira com Israel para lembrar, a Telavive e ao mundo, que há algo em dívida para com os palestinianos — o direito do regresso às terras que já foram suas.

“Se queremos alguma coisa, o melhor é fazermos barulho. E quando aquilo que queremos é a nossa terra? O nosso direito? É por essa razão que participo na Grande Marcha do Regresso”, diz ao Expresso Samah, uma palestiniana de 26 anos. “Tenho conhecimentos na área de primeiros socorros, o que me permite ajudar os feridos. Saio de casa às oito horas da manhã e regresso às sete da tarde.”

Na Faixa de Gaza, a vida está refém da falta de soluções para o conflito israelo-palestiniano. Em entrevista ao Expresso, o historiador israelita Ilan Pappé defendeu que “a guetização de Gaza é uma forma de apartheid” promovida por Israel, que aplica no território “políticas genocidas”.

Ocupada por Israel na Guerra dos Seis Dias (1967) e entregue à Autoridade Palestiniana após a retirada israelita, em 2005, a Faixa de Gaza viu a sua situação complicar-se após o Hamas tomar o poder pela força, em meados de 2006. A 25 de janeiro desse ano, os islamitas venceram as eleições legislativas palestinianas, mas viram o resultado não ser reconhecido nem pela rival Fatah, nem por Israel nem pela comunidade internacional. O golpe do Hamas motivou, então, um bloqueio às fronteiras do território onde, hoje, para se entrar e sair está-se dependente da boa vontade das autoridades israelitas e egípcias.

“As mulheres veem os seus filhos sem trabalho e ficam desesperadas. Então, participam muito nos protestos, talvez não a pensar nelas próprias mas na terra e nos filhos”, diz Samah. “As mulheres mais jovens também participam. Aqui, na Palestina, quando o assunto é a terra ninguém fica indiferente, seja-se homem ou mulher. Somos todos terra.”

PRESSÃO PSICOLÓGICA DE ISRAEL SOBRE AS MULHERES

A 5 de abril passado, já com a Grande Marcha do Regresso nas ruas — começou a 30 de março e terminará esta terça-feira, 15 de maio —, Avichay Adraee, o porta-voz do Exército israelita, tentou falar ao coração dos setores mais conservadores de Gaza. Ao estilo de um fanático talibã, escreveu na sua conta em língua árabe no Twitter: “Uma boa mulher é a mulher honrada que se importa com o interesse da sua casa e dos seus filhos, sendo um bom exemplo para que eles a sigam. Quanto à mulher má e sem honra, essa não se importa com nada disso, age como uma selvagem que não tem nada a ver com a feminilidade e não se preocupa com o olhar de desprezo com que a sociedade a olha”.

Nesta como noutras guerras, a psicologia é uma arma e, com este “post”, o militar israelita, ironica e propositadamente, adotou o discurso do mais fundamentalista dos militantes do Hamas para tentar fechar as mulheres de Gaza em suas casas.

“Ser uma sociedade conservadora nunca foi um problema. Gaza pode continuar a ser uma sociedade conservadora mesmo que homens e mulheres, juntamente com os seus filhos, saiam de casa para participarem na Marcha”, diz Samah. “Ser ‘conservador’ não quer dizer ficar em casa e não participar em eventos. Nunca poderá significar que as mulheres não possam gritar pela verdade e que tenham de ficar de lado. Significa apenas saber comportar-se e respeitar a sua fé quando se está fora.”

Samah estudou Literatura na Universidade Islâmica de Gaza e fez formação na área da segurança e proteção. Hoje trabalha como tradutora e coloca os seus conhecimentos de socorrista ao serviço do seu ativismo pelo futuro da Palestina.

Entre as cerca de 50 pessoas mortas desde o início dos protestos — a maioria atingida a tiro por “snipers” israelitas posicionados do outro lado da fronteira — não consta nenhuma mulher. Mas muitas estão entre os milhares de feridos. “Houve apenas ferimentos ligeiros, nada de grave”, diz Samah. “Quando as mulheres participam, os homens estão sempre lá para as proteger.”

Margarida Mota | Expresso

Imagem: Com uma pedra numa mão, o telemóvel na outra e carteira a tiracolo, esta palestiniana mostra que a revolta contra Israel faz parte do quotidiano da população de Gaza | MOHAMMED SALEM / REUTERS

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