terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

Guiné-Bissau | Sociedade civil preocupada com a segurança do processo eleitoral


A menos de 7 dias para início da campanha eleitoral na Guiné-Bissau, a 16 de fevereiro, guineenses preocupados com a manutenção da ordem pública pedem ao Presidente da República a rápida nomeação do ministro do Interior.

Nesta segunda-feira (11.02.), quando faltam cinco dias para o início da campanha para as eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau, a sociedade civil defende a nomeação urgente do ministro do Interior como condição indispensável para garantir a segurança ao processo eleitoral.

O próprio primeiro-ministro, Aristides Gomes, veio a público pedir ao Presidente da República, José Mário Vaz, par que proceda a rápida nomeação do ministro do Interior por forma evitar situações que possam comprometer as próximas eleições legislativas.

"O Presidente da República deve, em concertação comigo, resolver este problema o mais rapidamente possível. Da minha parte não tenho objeção nenhuma para que haja um ministro do Interior já, para que possamos criar as condições de segurança para que as eleições decorram com tranquilidade. Se o ministro do Interior já estivesse nomeado, penso que os incidentes ocorridos na última sexta-feira não teriam lugar", destacou Aristides Gomes.

Na sexta-feira (08.02.), uma manifestação de estudantes culminou em distúrbios e atos de vandalismos contra viaturas e vários edifícios, que a polícia, o Governo e a sociedade civil consideram terem sido feitos por infiltrados.

Botche Candé novo ministro do Interior?

Várias fontes guineenses indicam que o Presidente da República pretende colocar na tutela do Ministério do Interior o seu homem de confiança, Botche Candé, que num passado recente foi fortemente contestado pelos principais partidos e organizações juvenis. Aristides Gomes informou também que há muito que o seu Governo "entregou ao Presidente guineense a proposta de um nome para o cargo e que espera uma resposta rapidamente".

Recentemente, o presidente da Comissão Nacional de Eleições, José Pedro Sambú, manifestou também a sua inquietação com a segurança do ato eleitoral devido à ausência do titular da pasta do Interior.

Salários em atraso desde 2003

E, enquanto os partidos políticos ultimam os preparativos para o início da campanha eleitoral que decorre entre os dias 16 de fevereiro e oito de março, os três sindicatos de professores entregaram nesta segunda-feira (11.02.) ao Governo, um novo pré-aviso de greve, a começar na quinta-feira, dia 14, com a duração de 16 dias.  Os professores das escolas públicas guineenses exigem o pagamento de salários atrasados desde 2003 a esta data, refere uma nota da classe.

Em reação, o primeiro-ministro afirmou que tudo isso não passa de jogos para provocar o adiamento das eleições legislativas:

"Em relação aos professores efetivos nós temos os pagamentos em dia e mesmo esses atrasados foram pagos. Não vejo razões para um novo pré-aviso de greve. Penso que toda essa situação acontece porque há setores da nossa sociedade, sobretudo da classe política, que não querem ir às eleições e que querem, simultaneamente, perturbar. Daí que as populações devem assumir o destino do país nas suas próprias mãos".

No novo pré-aviso de greve, os três sindicatos incluíram 19 pontos reinvidicativos que não constavam do memorando assinado com o Governo em janeiro último alegando que a partir de agora "todos os pontos devem ser cumpridos para que possam suspender a greve". Por seu turno, os estudantes garantem que não haverá mais manifestações para "evitar qualquer aproveitamento político que só pretende criar o caos e perturbar o processo eleitoral".

Pacto será assinado na quinta-feira

Entretanto, ficou adiada para a próxima quinta-feira (14.02.) a assinatura, que esteve prevista para esta segunda-feira, do Pacto de Estabilidade Política e Social e o Código de Conduta e Ética. O adiamento deve-se às reservas manifestadas por alguns partidos políticos em relação a determinadas cláusulas do documento, disse o presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, Augusto Mário da Silva.

"Os partidos entendem que têm estado a denunciar algumas irregularidades no processo de recenseamento, portanto, seria contraditório neste momento, antes da correção dessas irregularidades assinarem um documento no qual dizem que estão comprometidos com os resultados eleitorais".

O pacto de estabilidade é uma ação conjunta do Movimento Nacional da Sociedade Civil, da Comissão Nacional Caminhos para o Desenvolvimento em articulação com a Assembleia Nacional Popular e a Presidência da República, envolvendo várias entidades inclusive os partidos políticos.

A Guiné-Bissau vive uma crise política há cerca de três anos, que começou com a demissão de Domingos Simões Pereira, presidente do PAIGC, partido que venceu as eleições legislativas em 2014, do cargo de primeiro-ministro. Desde então já foram nomeados sete primeiros-ministros, um dos quais por duas vezes.

As eleições legislativas estiveram inicialmente marcadas para 18 de novembro, mas dificuldades técnicas e financeiras, principalmente ao nível do recenseamento eleitoral, levaram ao adiamento do escrutínio para 10 de março.

Braima Darame (Bissau) | Deutsche Welle

Simões Pereira alerta para riscos de uma visita do PR de Cabo Verde à Guiné-Bissau


O líder do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) alertou para riscos de uma eventual visita do Chefe de Estado de Cabo Verde, na qualidade de Presidente da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), a Bissau poder ser mal enquadrada e interpretada.

“Quero assumir que há riscos de a visita ser mal enquadrada e mal interpretada e, se for mal enquadrada e mal interpretada, provocará relações”, afirmou Domingos Simões Pereira em respostas aos jornalistas na cidade da Praia, Cabo Verde, depois de um encontro com o Presidente Jorge Carlos Fonseca, nesta segunda-feira, 11.

Sobre de que quadrantes e de que forma tal podia acontecer, ele afirmou não querer especular, mas advertiu para os riscos existentes.

“Esse risco é que pode dar origem a reacções que podem não ajudar e podem não ser uma boa propaganda para o que são os laços de proximidade e fraternidade que existem entre a Guiné Bissau e Cabo Verde”, acrescentou Simões Pereira, esclarecendo, no entanto, que “a visita de qualquer Presidente da República de Cabo Verde à Guiné será sempre uma grande festa e ainda mais Jorge Carlos Fonseca, por tudo o que o liga à Guiné”.


Fonseca e a campanha

O antigo primeiro-ministro e líder do partido mais votado na eleição de 2014 chamou a atenção para “o risco” de Fonseca “ser envolvido numa campanha de que, certamente, ele não quer fazer parte”.

A imprensa cabo-verdiana avançou há semanas que Jorge Carlos Fonseca podia visitar a Guiné-Bissau de 19 a 21 de Fevereiro, tendo o próprio Presidente cabo-verdiano admitido estar a pensar na viagem a Bissau, sem, no entanto, precisar uma data.

Na altura, Fonseca, afirmou que tal visita “só tem sentido se não houver objecções por parte dos principais protagonistas políticos e eleitorais da Guiné-Bissau”.

O Presidente cabo-verdiano refutou a ideia de que a ida dele a Bissau possa significar qualquer apoio ao seu homólogo José Mário Vaz nas eleições presidenciais deste ano.

“Tenho relações normais e boas com os principais protagonistas políticos da Guiné-Bissau”, assegurou Fonseca, admitindo que num contexto de “competição política possam surgir alguns ruídos e preocupações”.


Críticas a José Mário Vaz

Domingos Simões Pereira disse ter transmitido ao Chefe de Estado cabo-verdiano que a alegada data da visita, de terça a quinta-feira, ocorreria dois dias antes do início da campanha.

“Se nesta altura já é evidente e óbvia a dificuldade do Presidente da República da Guiné Bissau em manter alguma equidistância em relação ao jogo político, está mais que claro o risco associado a uma visita nessa altura”, acrescentou o líder do PAIGC, segundo o qual o Presidente guineense, José Mário Vaz, tem “uma dificuldade quase estrutural” em “manter-se distante do jogo político partidário”.

Simões Pereira esclareceu, no entanto que, “logo a seguir [ao processo eleitoral], todo o povo guineense estaria muito satisfeito de ver na Guiné-Bissau uma visita do Presidente da República” de Cabo Verde e aplaudiu essa intenção.

Domingos Simões Pereira encontra-se desde o dia 8 em Cabo Verde, onde tem realizado diversos encontros, desde com o Presidente da República à comunidade guineense radicada no arquipélago, passando pela presidente do PAICV, Janina Hopffer Almada, entre outros.

VOA – Voz da América

Director do Instituto de Estradas de Angola de Cabinda detido


O director do Instituto de Estradas de Angola (INEA) em Cabinda, Igor Pereira, foi detido no Serviço de Investigação Criminal (SIC) acusado dos crimes de peculato, branqueamento de capitais e desvio de fundos dos Estado.

Pereira foi detido na sexta-feira, 8, de acordo com uma fonte da polícia citada nesta segunda-feira pela Angop, sob a acusação de desvio de quase 27 milhões de kwanzas.

A Procuradoria da República diz que o dinheiro alegadamente desviado deveria ser sido usado em obras de construção de pontes e estradas na província.

Igor Pereira está detido com mais três membros de direcção do INEA das áreas de Finanças, Técnica e Projectos.

VOA - Voz da América

Angola no pelotão da frente contra discriminação homossexual


Angola deu um passo importante ao descriminalizar a homossexualidade com a aprovação do novo Código Penal do país, em janeiro. Mas outros países africanos ainda penalizam as relações entre pessoas do mesmo sexo.

Várias organizações de defesa dos direitos humanos saudaram Angola pelo passo importante para dar visibilidade e mudar a atitude social em relação à comunidade Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero (LGBT).

A mudança aconteceu a 23 de janeiro, com a aprovação do novo Código Penal angolano, que deixou de criminalizar os atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo e passou a penalizar a discriminação em função da orientação sexual. O novo Código Penal indica também que quem se recusar a empregar uma pessoa em função da orientação sexual poderá ser condenado a uma pena máxima de dois anos.

Esta mudança acabou com os derradeiros vestígios nos ordenamentos jurídicos dos países lusófonos, especialmente dos africanos, do Código Penal português de 1886, que determinava a detenção para quem se entregasse "habitualmente à prática de vícios contra a natureza".

"Proteção ativa" em Angola

Para a especialista em direitos LGBT da organização Human Rights Watch (HRW), Neela Ghoshal, há um ponto bastante positivo na mudança ocorrida em Angola: "O Governo não só despenalizou a relação entre pessoas do mesmo sexo, mas também proibiu a discriminação. Isso demonstra que não é apenas uma aceitação passiva dos direitos LGBT, mas uma proteção ativa, que não é algo que temos visto em muitos outros países. É bastante incomum."

Apesar de Angola não ter processado homossexuais e lésbicas nas últimas décadas, as relações entre pessoas do mesmo sexo ainda eram amplamente consideradas tabu pelo Governo, devido à grande influência da Igreja Católica. Isso pode ter sido parte da razão pela qual a descriminalização não tenha ocorrido anteriormente.

No ano passado, Angola já tinha dado sinais de mudança. A Associação Íris Angola, organização fundada em 2013 para defender os direitos LGBT no país, foi regulamentada em 2018. A associação saúda o novo Código Penal angolano, mas lembra que são necessárias mais medidas para proteger os membros da comunidade LGBT. Nos últimos três anos, segundo a Associação Íris, pelo menos quatro homossexuais foram assassinados em Angola.

Despenalização em breve noutros países?

De acordo com a HRW, há sinais de que outros países africanos se preparam para descriminalizar a homossexualidade. Moçambique já descriminalizou a homossexualidade em 2015. Mas, ao contrário de Angola, ainda não reconheceu legalmente a Lambda, a única organização LGBT do país.

Organizações de direitos humanos noutros países africanos, como o Quénia e o Botswana, estão a lutar contra a discriminação legal de homossexuais nos tribunais. No Zimbabué, a tensão diminuiu após a queda do Presidente Robert Mugabe. Segundo a HRW, o novo Governo zimbabuenao tem dialogado com grupos LGBT.

No Uganda, a comunidade LGBT ainda enfrenta uma forte discriminação e frequentemente os homossexuais são perseguidos e até julgados pela Justiça.

Na Namíbia, apesar de o país ainda punir a homossexualidade, a comunidade LGBT está a crescer. A primeira parada do orgulho LGBT foi realizada há três anos.

Para o diretor da organização Out-Right, Friedel Dausab, há sinais de mudança. "Até o chefe da Polícia quer treinar o seu pessoal para fazê-los entender que eles estão lá para todos os cidadãos, sem importar a orientação sexual", conta.

Na África do Sul, a abordagem em relação à homossexualidade é muito mais liberal. Após o Apartheid, o país foi a primeira nação no mundo a mudar a sua Constituição para banir a discriminação contra a orientação sexual.

Em 2006, a África do Sul tornou-se o primeiro país africano - e o quinto país do mundo - a permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo. No entanto, membros da comunidade LGBT sul-africana ainda sofrem violência e alguns até são mortos, de acordo com informações da HRW.

Martina Schwikowski, tms, Agência Lusa | Deutsche Welle

Desafio a cinco séculos de eurocentrismo


China e Rússia veem o Ocidente em crise civilizatória – e apostam numa saída. Implica integrar a Eurásia, lançar imensos projetos de infra-estrutura, desafiar o poder do dólar e a hegemonia militar dos EUA.

Pepe Escobar no Consortium News | Outras Palavras | Tradução: Felipe Calabrez

A esta altura, todos deveríamos saber que o coração do Grande Jogo do século 21 é a miríade de vertentes da batalha entre os Estados Unidos e a parceria entre a Rússia e a China.

Até mesmo a Estratégia Nacional de Defesa dos EUA o reconhece: “O desafio central para a prosperidade e segurança dos EUA está no ressurgimento da competição estratégica de longo prazo promovida por… poderes revisionistas.” O recente parecer sobre as implicações da expansão global da China sobre a defesa dos EUA também o diz.

O confronto moldará o surgimento de uma possível ordem mundial estratégica pós-ideológica, em meio a uma imprevisibilidade extremamente volátil, na qual a paz é guerra e um acidente pode desencadear um confronto nuclear.

O cenário EUA versus Rússia e China continuará desafiando a obsessão do Ocidente em ridicularizar o “anti-liberalismo”, um exercício retórico e medonho que iguala a democracia russa ao governo de um só partido da China, à demo-teocracia iraniana e ao renascimento neo-otomano da Turquia.

É irrelevante que a economia da Rússia seja um décimo da economia chinesa. Desde o impulso ao comércio sem o uso do dólar americano até o aumento de exercícios militares conjuntos, a simbiose Rússia-China está pronta para avançar além das afinidades políticas e ideológicas.

A China precisa muito de know-how russo em sua indústria militar. Pequim transformará esse conhecimento em uma abundância de inovações civis e militares de duplo uso. O longo jogo indica que a Rússia e a China irão derrubar barreiras culturais e de idioma para liderar a integração euro-asiática contra a hegemonia económica americana apoiada pelo poderio militar.

Pode-se dizer que o século eurasiano já está diante de nós. A era do Ocidente moldando o mundo à vontade (um mero lapso de história) acabou. Isto apesar das negações e fulminações da elite ocidental contra as chamadas “forças moralmente repreensíveis”, “forças de instabilidade” e “ameaças existenciais”.

A Standard Chartered, empresa britânica de serviços financeiros, usando uma combinação de taxas de câmbio, poder de compra e crescimento do PIB, projetou que as cinco principais economias em 2030 serão a China, os EUA, a Índia, o Japão e a Rússia. Serão seguidos pela Alemanha, Indonésia, Brasil, Turquia e Reino Unido. A Ásia ampliará sua classe média no exato momento em que esta está sendo destruída no Ocidente.

Embarque no Expresso Trans-Eurásia

Pode-se argumentar que as elites de Pequim estão fascinadas em como a Rússia retornou, em menos de duas décadas, ao status de semi-superpotência após a devastação dos anos de Yeltsin.

Isso aconteceu em grande parte devido à ciência e tecnologia. O exemplo mais ilustrativo é o incomparável e avançado de armamento revelado pelo presidente Vladimir Putin em seu discurso de 1º de março de 2018.

Na prática, Rússia e China estarão avançando no alinhamento das Novas Rotas da Seda da China, ou a Iniciativa do Cinturão e da Estrada [Belt and Road Initiative (BRI), em inglês] com a União Económica Rússia-Eurásia.

Há um amplo potencial para que uma rede expressa Trans-Eurásia de transporte terrestre e marítimo esteja pronta e funcionando em meados da próxima década, incluindo, por exemplo, pontes rodoviárias e ferroviárias ligando a China à Rússia em todo o rio Heilongjiang.

Após importantes conversas trilaterais envolvendo Rússia, Índia e Irão em novembro passado, mais atenção está sendo dada ao Corredor Internacional de Transporte Norte-Sul (INSTC), uma pista de 7.200 km misturando rotas marítimas e ferroviárias essencialmente ligando o Oceano Índico ao Golfo Pérsico através do Irã e da Rússia, e mais adiante à Europa.

Imagine que a carga transite de toda a Índia para o porto iraniano de Bandar Abbas; depois siga para Bandar Anzali, um porto iraniano no Mar Cáspio; para o porto russo de Astrakhan; e, de trem, para a Europa. Do ponto de vista de Nova Delhi, isso significa que os custos de transporte foram reduzidos em até 40%, e a rota Mumbai-Moscou pode ser transposta em apenas 20 dias.

Abaixo da linha, o INSTC vai se fundir com o BRI — como nos corredores ligados à rota Índia-Irã-Rússia, em uma rede de transporte global liderada pela China.

Isso está acontecendo exatamente quando o Japão está olhando para a Ferrovia Transiberiana — que será atualizada ao longo da próxima década — para melhorar suas conexões com a Rússia, a China e as Coreias. O Japão é hoje um dos principais investidores na Rússia e, ao mesmo tempo, muito interessado em um acordo de paz entre as Coreias. Isso libertaria Tóquio dos enormes gastos com defesa condicionados pelas regras de Washington. Os acordos de livre comércio da Unão Económica da Eurásia (EAEU) com a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) podem ser adicionados a isso.

Especialmente nos últimos quatro anos, a Rússia também aprendeu a atrair investimentos e riqueza chineses, ciente de que o sistema de Pequim produz praticamente tudo e sabe como comercializar globalmente, enquanto Moscovo precisa combater todos os bloqueios sonhados por Washington.

Os “Eixos do Mal” Huawei-Venezuela

Enquanto Washington continua sendo um prisioneiro bipartidário da caverna platónica russofóbica — onde as sombras da Guerra Fria na parede são tomadas como realidade — o slogan de Trump, MAGA (Make America Great Again) está perdendo o trem para a Eurásia.

Uma hidra de muitas cabeças, a MAGA, se despojada até os ossos, poderia ser lida como um antídoto não ideológico ao aventureirismo global do Império. Trump, a seu modo não-estratégica e caótico propunha, pelo menos em teoria, o retorno a um contrato social para reerguer seu país — o que se traduziria em empregos, oportunidades para pequenas empresas, impostos baixos e não mais guerras estrangeiras.

É uma nostalgia dos anos 1950 e 60, antes do atoleiro do Vietnã e antes de a produção “Made in the USA” ser lenta e deliberadamente desmantelada. O que resta são dezenas de trilhões de dívidas nacionais; um quatrilião de derivativos; o Estado Profundo correndo solto; e muito medo de russos perversos, chineses tortuosos, mulás persas, a troika da tirania, o cinturão e a estrada, a Huawei e os estrangeiros ilegais.

Mais do que uma “guerra de todos contra todos” Hobbesiana, ou do que as queixas de que o “sistema baseado em regras ocidentais” está sendo atacado, o medo é, na verdade, do desafio estratégico representado pela Rússia e pela China, que buscam um retorno ao império do direito internacional.

O MAGA prosperaria se pegasse boleia no comboio de integração da Eurásia: mais empregos e mais oportunidades de negócios, em vez de mais guerras no exterior. No entanto, o MAGA não vai acontecer — em grande parte porque o que realmente faz o Trump exultar é sua tentativa de dominar as fontes de energia, para interferir decisivamente na Rússia e no desenvolvimento da China.

O Pentágono e a comunidade das agências de espionagem [Intel Community] levaram o governo Trump a perseguir a Huawei, tratada como um ninho de espiões, enquanto pressionava os aliados-chave (Alemanha, Japão e Itália) a fazer o mesmo. A Alemanha e o Japão permitem que os EUA controlem os nós principais nas extremidades da Eurásia. A Itália é essencialmente uma grande base da OTAN.

O Departamento de Justiça norte-americano requereu a extradição da executiva financeira-chefe da Huawei, Meng Wanzhou, do Canadá na última terça-feira, acrescentando um ponto à tática geopolítica do governo Trump.

Acrescente-se a isso que a Huawei — baseada em Shenzhen e de propriedade de seus trabalhadores — está matando a Apple em toda a Ásia e na maioria das latitudes em todo o Sul Global. A batalha real está em torno da tecnologia 5G, na qual a China pretende superar os EUA, enquanto melhora a capacidade e a qualidade da produção.

A economia digital na China já é maior do que o PIB da França ou do Reino Unido. É baseado nas empresas BATX (Baidu, Alibaba, Tencent, Xiaomi); na Didi (a Uber chinesa); na gigante de e-commerce JD.com e na Huawei. Essas Big Seven são um estado dentro de uma civilização — um ecossistema que eles mesmos construíram, investindo fortunas em big data, inteligência artificial (IA) e internet. Os gigantes norte-americanos — Facebook, Instagram, Twitter e Google — estão ausentes deste enorme mercado.

Além disso, o sofisticado sistema de criptografia da Huawei em equipamentos de telecomunicações impede a interceptação pela NSA. Isso ajuda a explicar sua extrema popularidade em todo o Sul Global, em contraste com a rede de espionagem eletrônica Five Eyes (EUA, Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia).

A guerra econômica contra a Huawei também está diretamente ligada à expansão do BRI em 70 países asiáticos, europeus e africanos, constituindo uma rede de comércio, investimento e infra-estrutura à escala da Eurásia, capaz de virar as relações geopolíticas e geoeconômicas, como as conhecemos, de cabeça para baixo.

A Grande Eurásia acena

O que quer que a China faça não alterará a obsessão do Estado Profundo norte-americano por “uma agressão contra nossos interesses vitais”, como afirma a Estratégia Nacional de Defesa. A narrativa dominante do Pentágono nos próximos anos será sobre a China “pretendendo impor, no curto prazo, sua hegemonia na região do Indo-Pacífico, e pegar os Estados Unidos de surpresa para alcançar a futura preeminência global”. Isso mistura-se com a crença de que a Rússia quer “esmagar a OTAN” e “sabotar o processo democrático na Criméia e no leste da Ucrânia”.

Durante minhas viagens recentes pela parte norte do Corredor Económico China-Paquistão (CECP), vi mais uma vez como a China está modernizando rodovias, construindo barragens, ferrovias e pontes que são úteis não apenas para sua própria expansão econômica, mas também para o desenvolvimento de seus vizinhos. Compare-o com as guerras dos EUA — como no Iraque e na Líbia — onde as barragens, ferrovias e pontes são destruídas.

A diplomacia russa está vencendo a Nova Guerra Fria — como diagnosticado pelo professor Stephen Cohen em seu último livro, War with Russia: From Putin and Ukraine to Trump e Russiagate.

Moscou mistura graves advertências com diversas estratégias, como ressuscitar o gasoduto South Stream para abastecer a Europa como uma extensão do Turk Stream, depois que o governo Trump também se opôs furiosamente ao gasoduto Nord Stream 2 com sanções à Rússia. Enquanto isso, Moscou eleva as exportações de energia para a China.

O avanço da Iniciativa Belt and Road está ligado às exportações russas de segurança e energia, incluindo a Rota do Mar do Norte, como um futuro corredor de transporte alternativo para a Ásia Central. A Rússia surge, então, como a principal garantia de segurança para o comércio e a integração económica da Eurásia.

No mês passado, em Moscou, discuti a Grande Eurásia — agora estabelecida como o conceito dominante da política externa russa — com os principais analistas russos. Eles me disseram que Putin está a bordo. Ele se referiu à Eurásia recentemente como “não um tabuleiro de xadrez ou um playground geopolítico, mas nosso lar pacífico e próspero”.

Não é preciso dizer que os think tanks dos EUA descartam a ideia como “natimorta”. Eles ignoram o Prof. Sergey Karaganov, que já em meados de 2017 argumentava que a Grande Eurásia poderia servir de plataforma para “um diálogo trilateral sobre problemas globais e estabilidade estratégica internacional entre a Rússia, os Estados Unidos e a China”. Por mais que Washington possa recusar, “o centro de gravidade do comércio global está agora mudando dos altos mares para o vasto interior continental da Eurásia”.

Pequim corta as asas do dólar

Pequim está percebendo que não pode cumprir suas metas geoeconómicas em energia, segurança e comércio sem passar por cima do dólar americano.

De acordo com o FMI, 62% das reservas globais dos bancos centrais ainda eram mantidas em dólares americanos no segundo trimestre de 2018. Cerca de 43% das transações internacionais no sistema SWIFT ainda estão em dólares americanos. Mesmo que a China, em 2018, tenha sido o maior contribuinte para o crescimento do PIB global, com 27,2%, o yuan representa apenas 1% dos pagamentos internacionais e 1,8% de todos os ativos de reserva detidos pelos bancos centrais.

Leva tempo, mas a mudança está a caminho. A rede de pagamentos transfronteiriça da China para transações com o yuan foi lançada há menos de quatro anos. A integração entre o sistema de pagamento russo (Mir) e o chinês (Union Pay) parece inevitável.
Bye Bye, doutores K e Zbig.

A Rússia e a China estão desenvolvendo o pesadelo final para os ex-xamãs da política externa dos EUA, Henry Kissinger e o falecido Zbigniew “Grande Tabuleiro de Xadrez” Brzezinski.

Em 1972, Kissinger foi o mentor — com a ajuda logística do Paquistão — do momento de Nixon na China. Esse foi clássico “Divide and Rule”, separando a China da URSS. Dois anos atrás, antes da posse de Trump, o conselho do Dr. K, oferecido nas reuniões da Trump Tower, consistiu em uma “Divide and Rule” modificada: seduzir a Rússia, para conter a China.

A doutrina de Kissinger estabelece que, geopoliticamente, os EUA são apenas “uma ilha às margens da grande massa de terra da Eurásia”. A dominação, “por uma única potência de qualquer uma das duas principais esferas da Eurásia — a Europa ou a Ásia — continua sendo uma boa definição de perigo estratégico para os Estados Unidos, “com ou sem Guerra Fria”, como disse Kissinger. “Pois tal arranjo teria a capacidade de ultrapassar os EUA economicamente e, ao fim, militarmente.”

A doutrina Zbig seguiu linhas similares. Os objetivos eram evitar conflitos e manter a segurança entre os vassalos da União Europeia-OTAN. Mantenha os vassalos curvados; impeça que os bárbaros (ou seja, os russos e aliados) se unam; acima de tudo, impeça o surgimento de uma coligação hostil (como a atual aliança Rússia-China), capaz de desafiar a hegemonia dos EUA; e submeta a Alemanha, a Rússia, o Japão, o Irão e a China a um permanente “Divida e Reine”.

Daí a preocupação da atual Estratégia de Segurança Nacional, prevendo que a China, desalojando os Estados Unidos, “alcançaria a preeminência global no futuro”, através do alcance supra-continental da BRI.

A “política” para neutralizar tais “ameaças” são sanções, sanções e mais sanções unilaterais, juntamente com uma inflação de noções absurdas espalhadas por Washington — como a de que a Rússia está auxiliando e instigando a reconquista do mundo árabe pela Pérsia, bem como a de que Pequim vai abandonar o plano do “tigre de papel”, o “Made in China 2025”, para obter papel de destaque na produção global em alta tecnologia, apenas porque Trump a detesta.

Muito de vez em quando, um relatório dos EUA realmente acerta, como quando se refere a Pequim acelerando uma série de projetos da BRI; como uma tática Sun Tzu modificada, implantada pelo Presidente Xi Jinping.

No Diálogo Shangri-La de junho de 2016, em Cingapura, o professor Xiang Lanxin, diretor do centro de Estudos One Belt and One Road, do Instituto Nacional da China para Intercâmbio e Cooperação Judicial da SCO, definiu o BRI como um caminho para um mundo “pós-Westfaliano”. A jornada está apenas começando; uma nova era geopolítica e econômica está próxima. E os EUA estão sendo deixados para trás na estação.

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Holanda inova mais uma vez em mobilidade urbana


País combina comboios e bicicletas, abre enormes estacionamentos subterrâneos junto às estações demonstra: políticas públicas inteligentes podem vencer ditadura do automóvel

Isabel Ferrer, em El País Brasil | Outras Palavras

Com 17 milhões de habitantes, há na Holanda 23 milhões de bicicletas. As famílias têm três em média, de acordo com o Escritório Central de Estatísticas. A Bicicletas Recreativas, organização que calcula seu uso, diz que é o veículo mais utilizado (84% da população); é o país com mais bicicletas por habitante (1,3), seguido pela Dinamarca (0,8) e o Japão (0,6); 16% usam modelos elétricos, e destes, 6% têm uma de corrida. Existem 88.000 quilómetros de rotas adaptadas, entre estradas e caminhos municipais, e 94% das viagens começam na porta de casa. O governo pretende investir 345 milhões de euros (1,45 bilião de reais) em infraestrutura para que outras 200.000 pessoas as levem ao trabalho. Impressionante, mas onde estacioná-las com uma densidade de população de 412 habitantes por quilómetro quadrado? Em estacionamentos subterrâneos gigantescos.

Na realidade, a bicicleta na Holanda pode ser estacionada em qualquer rua, desde que não exista sinalização que o impeça e não interrompa a passagem dos pedestres. O problema é que não costuma haver lugar e os espaços dispostos em diversas áreas das grandes cidades acabam lotados. Lá, estacioná-las no primeiro dia é gratuito e o segundo custa 0,50 euro (2 reais). A partir do terceiro cobram 2,50 euros (10 reais). A solução é construir garagens maiores, especialmente nas grandes estações de trem, como as de Utrecht e Haia. Muita gente sobe no trem, que possui plataformas adaptadas, com a bicicleta para continuar usando-a em outro local. É muito conveniente deixá-la no subsolo da estação ferroviária.

A Prefeitura de Utrecht já abriu um estacionamento para 12.500 bicicletas, o maior do mundo de sua classe, sob a praça da estação central. De três andares, tem acesso pela rua e é possível percorrê-lo pedalando até encontrar uma vaga. Possui um túnel que conecta com o pátio e as plataformas da estação de trem. Aqui o primeiro dia também é gratuito e é possível pagá-lo com o cartão geral de transporte, válido em todos os serviços públicos: trem, ónibus e bonde. Também tem 700 bicicletas de aluguer e não fecha.

Em Haia está sendo construído um estacionamento parecido, na estação central de trens, com capacidade para 8.500 bicicletas. A abertura está prevista para o final de 2019 e também terá o acesso através da rua. Em Amesterdão, onde hoje a maior parte das bicicletas se estaciona perto da estação, se constrói desde 2018 uma garagem com capacidade para 7.000 no canal localizado em frente. Toda a área exterior será remodelada e, como nas outras duas cidades, a previsão é que a entrada fique na rua. Está previsto para ser inaugurado dentro de cinco anos.

Os três projetos recebem dinheiro do governo central e das respectivas prefeituras e o ministério do Transporte quer que a população utilize muito mais a bicicleta. De acordo com números do departamento, 25% dos trajetos sobre duas rodas têm a ver com o trabalho e podem ser chamados de profissionais. 37% são viagens de lazer. O restante é para compras, ir ao colégio e outras atividades. Levando em consideração que “mais de 50% da população ativa mora a menos de 15 quilómetros de seu trabalho e que mais da metade dos percursos de carro não supera os oito quilómetros”, dizem porta-vozes oficiais, a ideia é promover as bicicletas com uma diminuição dos impostos. Para cada quilómetro coberto nesses deslocamentos diários para ir trabalhar, o usuário recebe diminuição de 19 centavos de euro (80 centavos de real). O Ministério do Transporte espera convencer as empresas dos benefícios de financiar as bicicletas de seus empregados. E colocar chuveiros nos escritórios, que é outro dos pedidos persistentes.

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Portugal | Empresas de trabalho temporário continuam a ganhar milhões


A facturação das empresas de trabalho temporário cresceu 6,1% em 2018, face a 2017, para um total de 1350 milhões de euros. A precariedade e os baixos salários continuam a ser predominantes.

O novo aumento da facturação das empresas de trabalho temporário, para 1350 milhões de euros em 2018, é divulgado hoje pela Informa D&B, empresa que se dedica ao estudo da evolução do tecido empresarial em Portugal, neste caso sobre o sector do «trabalho temporário».

Segundo a agência Lusa, o estudo em causa afirma que o ritmo de subida da facturação «prolonga a tendência crescente registada nos anos anteriores», com taxas de variação acima de 10% em vários exercícios, o que permitiu «um acréscimo em cerca de 50% entre 2013 e 2018».

Para 2019 e 2020, as previsões apontam para «um prolongamento da tendência crescente do número de trabalhadores e do volume do negócio».

Em oposição, citando dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), a CGTP-IN afirma que a precariedade em Portugal atinge hoje mais de 22% dos trabalhadores de todas as idades, sendo mais abrangente e grave entre os mais jovens. Uma realidade que se expressa não só em baixos salários mas também numa vida repleta de insegurança e em horários desgastantes.

Segundo o INE, em 2018 havia mais de 890 mil trabalhadores por conta de outrem com contratos não permanentes. A CGTP-IN vai mais longe e realça que, «após o cruzamento com outras fontes, o número é de um milhão e 200 mil, ou seja, cerca de 31% dos assalariados».

Patronato fomenta a precariedade

A CGTP-IN reitera que «a precariedade é um dos instrumentos que o patronato usa para aumentar a exploração dos trabalhares, nomeadamente para pagar salários mais baixos». Os trabalhadores com vínculos precários recebem, em média, salários 20% a 40% inferiores aos contratos sem termo.

«Mais de 42% dos jovens com menos de 35 anos têm vínculos precários, sendo as jovens trabalhadoras as principais visadas (mais de 44%), sobretudo as que têm menos de 25 anos (mais de 71% face a 62% entre os jovens trabalhadores da mesma idade)», afirma a Intersindical Nacional.

No final do ano passado, 220 empresas deste sector tinham actividade legal em Portugal, um número ligeiramente inferior ao observado em 2017. A zona de Lisboa, que alberga um total de 106 empresas, e a zona Norte, com 74 operadores, são as que contam com o maior número de empresas.

AbrilAbril | com agência Lusa

Portugal | Há mais 73 mil precários do que no ano da "troika"

O emprego tem recuperado, mas também à custa de contratos instáveis. Serviços e mulheres lideram.

O número de trabalhadores por conta de outrem com contratos de trabalho precários tem crescido ao longo dos últimos sete anos e atingiu, em 2018, o valor mais elevado desde o início da série calculada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2011.

No ano da chegada da "troika", existiam 817,6 mil trabalhadores com vínculos laborais instáveis. Neste número estão incluídos os contratos com termo e outro tipo de contratos, denominados muitas vezes de atípicos.

No ano passado, o número de trabalhadores com este tipo de vínculo laboral atingiu quase os 900 mil, ou seja, uma diferença acima dos 73 mil, face a 2011.

Ao longo de toda a série do INE, verifica-se sempre um aumento em termos absolutos do número de trabalhadores com contratos precários. Em termos relativos, a proporção da população empregada com este tipo de vínculos no total dos trabalhadores por conta de outrem tem-se mantido à volta dos 28% desde 2015.

De 2017 para 2018, subiu 2,2%, passando de 728,7 mil para 745 mil. Já em relação a outros tipos de vínculos, o aumento foi ainda mais expressivo, com uma subida de 4,8%, passando de 139,7 mil, em 2017, para 146,4 mil no ano passado. A boa notícia é que os contratos sem termo também subiram (2,8%).


Serviços lideram

De acordo com o Inquérito ao Emprego do INE, o setor dos serviços lidera, de longe, o número de contratos precários. Neste segmento, incluem-se, por exemplo, as áreas do turismo (hotelaria, alojamento e restauração), mas também a saúde.

Os dados do INE revelam que neste setor de atividade trabalhavam mais de 531 mil pessoas com contrato a termo e mais de 116 mil noutras situações de contratos de trabalho, representando mais de 70% do total de trabalhadores por conta de outrem com vínculos precários.

O setor primário, que inclui a agricultura, a floresta e as pescas, é o que apresenta um menor número de trabalhadores com contratos a termo ou outro tipo de situação.

Crescimento a Termo

Por género, são as mulheres que têm mais contratos precários. Somando os vínculos com termo e os outros tipos de contratos, no ano passado, existiam mais de 458 mulheres nesta situação. Os homens eram 433 mil, ou seja, quase mais 25 mil mulheres do que homens.

Em termos de evolução entre 2017 e 2018, registou-se um crescimento muito superior nos contratos a termo para as mulheres (4,2%) do que para os homens (0,3%). E o mesmo se passa para os outros tipos de contratos, com maior prevalência de vínculos atípicos nas mulheres. Num ano, subiu mais de 6%, enquanto que para os homens o aumento foi de metade, apenas 3,1%.

Os vários tipos de contrato

Sem termo - É o tipo de vínculo laboral mais comum. No ano passado, existiam mais de 3,1 milhões de trabalhadores por conta de outrem com este tipo de contrato, que é de duração indeterminada.

A termo - Pode ser um contrato a termo certo, em que consta expressamente o prazo de duração do contrato e a indicação do seu termo, ou a termo incerto, em que dura o tempo necessário à substituição de um trabalhador ausente ou à conclusão da tarefa ou obra.

Outros tipos - É o tipo de contrato mais precário de todos, como o trabalho temporário.

Paulo Ribeiro Pinto | Jornal de Notícias

Portugal | Ao governador do Banco de Portugal não basta talvez ser idóneo


Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

O relatório de auditoria à Caixa Geral de Depósitos (CGD) revelou várias irregularidades nas decisões de crédito entre 2000 e 2015. Das 186 operações analisadas, 127 foram originadas entre 2000 e 2007. Do total, 44% das perdas de €1646 milhões, estão concentradas nos casos em que o parecer de risco não foi seguido, sem qualquer justificação aparente.

É exigido ao Banco de Portugal que atue no sentido de apurar as devidas responsabilidades por estas irregularidades, nomeadamente quanto à idoneidade dos administradores e ex-administradores envolvidos.

Há vários antigos gestores da CGD que se mantêm no setor financeiro, sendo que outros desempenham funções de relevo, por exemplo na Associação Portuguesa de Bancos e no próprio Banco de Portugal. Foi noticiado recentemente que o BCE terá tido em conta o relatório desta auditoria para não dar o seu aval a dois ex-administradores da CGD. Norberto Rosa, que foi administrador da CGD (2004-2013), assumindo depois as funções de consultor do Banco de Portugal (2012-2015), e de administrador da Sociedade Gestora dos Fundos de Pensões do Banco de Portugal (2015-2018), não obteve o parecer de idoneidade para integrar a administração do BCP. Como plano B, transitou para a Associação Portuguesa de Bancos, presidida por Fernando Faria de Oliveira, CEO da CGD (2008-2011), e presidente do Banco Caixa Geral em Espanha (2005-2007). Por sua vez, Pedro Cardoso, administrador da CGD (2008-2011), do Banco Caixa Geral (2005-2008), e CEO do BNU em Macau (2011-2018), também não obteve o parecer de idoneidade a tempo de integrar a administração do Bison Bank.

Há, no entanto, um ex-administrador que o Banco de Portugal já garantiu que não vai avaliar: o governador do Banco de Portugal. Carlos Costa foi administrador da CGD entre 2004 e 2006 e pertenceu ao Conselho de Crédito que aprovou, sem justificação, várias operações que incumpriram as indicações dos pareceres de risco. Entre elas, segundo as atas que vieram a público, encontra-se o empréstimo de €170 milhões ao empreendimento de Vale do Lobo, bem como empréstimos a Manuel Fino e Joe Berardo para a compra de ações. Estas operações terão causado avultadas perdas no banco público.

Como se não bastasse a sua atuação no caso BES, o Banco de Portugal recusa-se agora a avaliador o governador pelo seu papel na CGD. Sem avaliação não há clarificação, só há suspeita. E um governador sob suspeita, que usa o seu estatuto para escapar ao escrutínio, não pode ser governador.

*Deputada do BE

Falsário | Venezuela audita Guaidó por suspeita de falsificação de dados


A Controladoria Geral da Venezuela (CGV) ordenou uma auditoria ao património do autoproclamado Presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, por suspeitas de que terá falsificado dados da sua declaração de património.

A investigação faz parte de uma resolução emitida pelo titular da CGV, Elvis Amoroso, designado em 2017 pela Assembleia Constituinte (composta unicamente por simpatizantes do regime) que acusa Juan Guaidó de ter recebido dinheiro de organismos venezuelanos e internacionais.

"Ordena-se o início de um procedimento de auditoria patrimonial ao cidadão Juan Gerardo António Guaidó Márquez, em conformidade com o previsto na Lei Orgânica da Controladoria Geral da República, do Sistema Nacional de Controlo Fiscal e no decreto com classificação, valor e força de Lei Contra a Corrupção", explica o texto.

Nos considerandos da resolução lê-se que Juan Guaidó terá, supostamente, "ocultado ou falsificado dados" na declaração de património que entregou sob juramento e que "tem recebido dinheiro proveniente de instâncias internacionais e nacionais, sem justificá-lo".

Na decisão da auditoria é justificado que a Constituição da Venezuela prevê que os deputados da Assembleia Nacional, presidida por Guaidó e maioritariamente composta por elementos da oposição, dedicam-se exclusivamente à atividade parlamentar, pelo que não podem receber "nenhum tipo de rendimentos por outro trabalho público ou privado".

"Igualmente não podem ser proprietários, administradores ou diretores de empresas que contratem com entidades jurídicas, nem poderão gerir causas particulares com interesse lucrativo", refere o texto da resolução.

Segundo a Controladoria Geral da Venezuela, "a auditoria patrimonial é o mecanismo usado para comprovar a veracidade da declaração" e "inclui o exame e avaliação da situação patrimonial e das atividades económicas levadas a cabo pela pessoa sujeita a verificação".

A legislação venezuelana prevê sanções de inabilitação para o exercício de funções públicas até 15 anos aos funcionários públicos que cometam irregularidades.

A crise política na Venezuela agravou-se em 23 de janeiro, quando o líder da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, se autoproclamou Presidente da República interino e declarou que assumia os poderes executivos de Nicolás Maduro.

Guaidó, 35 anos, contou de imediato com o apoio dos Estados Unidos e prometeu formar um governo de transição e organizar eleições livres.

Nicolás Maduro, 56 anos, no poder desde 2013, recusou o desafio de Guaidó e denunciou a iniciativa do presidente do parlamento como uma tentativa de golpe de Estado liderada pelos Estados Unidos.

A maioria dos países da União Europeia, entre os quais Portugal, reconheceram Guaidó como Presidente interino encarregado de organizar eleições livres e transparentes.

A repressão dos protestos antigovernamentais desde 23 de janeiro provocou já 40 mortos, de acordo com várias organizações não-governamentais.

Esta crise política soma-se a uma grave crise económica e social que levou 2,3 milhões de pessoas a fugirem do país desde 2015, segundo dados das Nações Unidas.

Na Venezuela, antiga colónia espanhola, residem cerca de 300.000 portugueses ou lusodescendentes.

Jornal de Notícias | Foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters

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