terça-feira, 17 de setembro de 2019

Portugal | Para que servem os programas eleitorais?


Anselmo Crespo | TSF | opinião

A pergunta pode parecer retórica, mas não é. A resposta pode parecer óbvia, mas é tudo menos linear. Que utilidade têm os programas eleitorais dos partidos políticos? Que substância têm e o que dizem sobre a linha política e ideológica de cada um deles? O que os distingue? Quem cobra nas urnas, quatro anos depois, o que foi prometido quatro anos antes? Quem compara os programas? Quem os lê? E quem os leva a sério?

Confesso que esta é uma reflexão que só faço de quatro em quatro anos - sempre que, em véspera de eleições e por dever profissional, tenho de descarregar em PDF (antes era bem pior, tinha que imprimir) centenas de páginas que vou lendo nas horas vagas, para me preparar para a campanha que se avizinha. E esta é a primeira resposta a uma das perguntas anteriores: estou absolutamente convencido de que os programas eleitorais são lidos, sobretudo, por jornalistas - e nem todos -, pelos políticos - provavelmente, nem todos -, por algumas corporações e empresas que precisam de perceber o que aí vem e pouco mais. Admito que alguns eleitores com um sentimento de dever cívico mais apurado passem os olhos na diagonal pelos programas dos partidos, mas serão poucos.

E há bons motivos para isso. Distinguiria os programas eleitorais em quatro géneros diferentes: os que pretendem ser muito densos, cheios de números e contas para fazer passar a ideia de rigor e de que o partido sabe exatamente o que está a prometer; os meramente ideológicos, que não apresentam qualquer medida concreta e limitam-se a repetir de quatro em quatro anos a mesma coisa, como se o país e o mundo não estivessem em constante mudança; os que, tendo algumas medidas para apresentar, acham que o melhor é acrescentar alguma "palha", só porque pode parecer mal apresentar um programa eleitoral com poucas páginas; e os que prometem tudo, até ao infinito e mais além, apenas porque sabem que não há qualquer risco de terem de cumprir o que estão a prometer.

Circo Portugal apresentou: "DOIS GRANDES PALHAÇOS" - ganhou quem não viu/ouviu


Na tenda nobre do Circo Portugal, ontem à noite, exibiram-se dois grandes palhaços… O mesmo de sempre com atores bem adaptados à pista, decerto que bastante ensaiados nos bastidores. Faltou a canção e a música de fundo “A mim não me enganas tu… nem tu”.

O melhor das campanhas eleitorais é ter oportunidade de presenciar e perscrutar aqueles que têm maiores tendências vocacionais para "palhaços". O circo da noite passada fez jus aos dois "artistas" e mostrou as qualidades incontestáveis de ambos em mestres da palhaçada. Vergonhosos e de objetivos semelhantes demonstrados e/ou dissimulados... mas que vão dar no mesmo. Quem se lixa é o "mexilhão".

MM | Redação PG

Na foto: Este foi o único frente-a-frente televisivo entre Costa e Rio. Os dois líderes voltam a defrontar-se na segunda-feira, mas na rádio / Pedro Nunes / Público

O CAPITALISMO NÃO É VERDE!


Rui Sá | Jornal de Notícias | opinião

Se há coisa que me chateia é ver as organizações políticas a correrem atrás "do que está a dar", naquilo que não se pode considerar sentido de oportunidade política mas mero oportunismo político.

Nos últimos tempos, PAN e BE empurram-se mutuamente para ver quem ganha o pódio das causas ambientais a que, convenhamos, deram pouca importância ao longo da sua relativamente curta vida. Mas, se há manifestações de jovens com elevada mobilização em defesa do ambiente, se a Comunicação Social está rendida à sua cobertura (como não faz de quaisquer outras manifestações com mais mobilização...), então toca a virar as agulhas para o assunto, até porque, dizem, o PAN e o BE disputam o mesmo "segmento" de voto... Confesso que não é esta a forma de fazer política que me seduz, embora reconheça que a mesma pode render votos no curto prazo. Mas, com um bocado de inteligência e de atenção, vemos como o gigante tem pés de barro e as incoerências são evidentes.

E assim vemos que o PAN, nas contas da campanha eleitoral para o Parlamento Europeu, na rubrica de transportes, apresenta como maior valor o transporte em carro próprio do seu líder... E Catarina Martins, tão preocupada com o ambiente, mostra que, sobre a matéria, tem ideias coladas com cuspo que a fazem dizer que temos barragens a mais porque elas fazem com que a água se evapore...

40 anos do Serviço Nacional de Saúde


É necessário voltar ao espírito do tempo em que se queria construir um país mais solidário e justo. Precisamos de um SNS universal, geral e gratuito, sem taxas moderadoras e devidamente financiado.

Jorge Seabra | AbrilAbril | opinião

No dia em que se comemoram 40 anos da promulgação da lei que estabeleceu o Serviço Nacional de Saúde (SNS), e juntando-me à homenagem a todos os que contribuíram para a sua construção e lutam pelo reforço do seu espírito original de serviço público universal, de qualidade e gratuito, aqui deixo o texto da minha comunicação ao Grupo de Trabalho da Comissão Parlamentar da Saúde, aquando das audições prévias à discussão e aprovação da nova Lei de Bases da Saúde.

Ela reflecte e traduz alguns aspectos da minha experiência como profissional do SNS e uma visão resumida dos graves problemas com que ele se tem deparado no seu desenvolvimento, para os quais a nova Lei de Bases de Saúde recentemente aprovada, embora com significativas melhorias no seu enunciado, não constitui garante de resolução.

Excelentíssima Coordenadora do Grupo de Trabalho, Senhores deputados e deputadas, restantes convidados:

Ao contrário de muitos dos que foram ou serão aqui ouvidos, nunca ocupei cargos de relevo na administração ou no governo, com responsabilidades na orientação da política de Saúde do país.

Fui e sou apenas um médico, aparentemente competente, a julgar por algumas distinções dadas pelos meus pares, que teve a feliz coincidência temporal – formei-me em 1972 – de ter participado desde o início na construção do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Nele trabalhei durante quarenta anos, trinta dos quais como Responsável ou Director de um Serviço diferenciado, mais de vinte em tempo prolongado e dedicação exclusiva, depois de ter atingido o topo da carreira fazendo todos os concursos.

Álvaro Carvalho, no livro Médicos e Sociedade – Para uma História da Medicina em Portugal no século XX (2017), descreve o que se passava na primeira metade desse século, que se manteve até aos anos 70, quando comecei a minha prática clínica:

«A população rural era votada ao abandono e dependia de gestos de caridade…Algumas zonas dispunham de pequenos hospitais das Misericórdias. (...) Os doentes deslocavam-se à vila a pé ou de burro. Uma visita ao domicílio era um luxo ao alcance de poucos».

Só em Lisboa, Porto e Coimbra havia grandes hospitais ligados ao ensino médico-cirúrgico onde chegavam pontas da medicina moderna. Nas outras cidades e vilas, para além de pequenos e mal equipados hospitais geralmente ligados a Misericórdias, havia as «Caixas de Previdência», «Casas do Povo», pagas pelos beneficiários, e os «médicos de partido» pagos pelos municípios, convivendo com obras de «benfeitores» ligados ao regime, numa filosofia caritativa que não reconhecia a Saúde como um direito dos cidadãos.

O NEGOCIO DOS COMBUSTÍVEIS ASSENTA NUM SISTEMA CORPORATIVO


Octavio Serrano*

Sistema Corporativo, era o sistema económico escolhido pelo regime do Salazar, para organizar economicamente o país; existiam os órgãos corporativos; de que dou exemplo, os grémios da lavoura; e também grupos produtivos monopolistas, como por exemplo a CUF; e ambos tinham uma caracteristica que os assemelhava: tinham a capacidade política de determinar os preços do que compravam, e do que vendiam. Os Grémios da Lavoura, por exemplo, podiam definir o preço dos produtos que adquiriam aos agricultores; e o preço, do que vendiam ao mercado retalhista; os monopólios, de que dou o exemplo a CUF, tinham o mesmo privilégio; isso garantia, que independentemente das vicissitudes da economia, estas entidades tivessem lucros garantidos. E para que nada pudesse ser posto em causa, os salários também eram tabelados, as greves proibidas, e a miséria instituída, garantindo-se, ano após ano, mais-valias, aos monopólios, margens aceitáveis aos comerciantes, e orçamentos positivos aos grémios; um sistema de paz económica podre, que atrofiou durante decénios o progresso do país.

Das peripécias, da última greve dos motoristas dos camiões de transporte de matérias perigosas, extrai alguma similitude, com o anteriormente descrito; apesar de vivermos num regime político, cheio de liberdades, há sectores económicos deste país, muito similares aos da “Outra Senhora”!

Snowden: “Estamos nus diante do poder” - com vídeo


Livro do homem que revelou o estado de vigilância global sai nesta terça-feira. Ele segue em Moscou; teme que a Inteligência Artificial multiplique o controle; mas crê na resistência cidadã. Vale ler sua entrevista ao “Guardian”

Antonio Martins | Outras Palavras

Há seis anos e meio, Edward Snowden, então um funcionário subcontratado da CIA, entrou num avião em Honolulu, Havaí, e desceu horas depois em Hong Kong. Lá, num quarto de hotel, encontrou-se com os jornalistas Glenn Greenwald, Laura Poitras e Ewen MacAskill – e levantou o véu que encobria o gigantesco aparato de vigilância global montado pelos Estados Unidos. A história de sua vida (apenas 36 anos) está agora contada em livro – Permanent Record, que será lançado em 20 países, na próxima terça-feira (e ainda não tem tradução em português. Na sexta-feira, ele concedeu ao Guardian uma entrevista de duas horas, em que antecipa algumas das revelações.

“Estamos nus diante do poder”, diz Snowden, que vive desde 2014 em Moscovo – onde casou-se com Lindsay Mills, sua namorada desde os 22 anos. Tem visto de residência permanente. Viaja bastante, embora não possa sair do país, para não ser agarrado por agentes norte-americanos. Perdeu o medo e o hábito de usar sempre casacos e chapéus. Mas, por temperamento, passa a maior parte do tempo em casa, de onde faz teleconferências que são hoje seu meio de vida. Diz que está preparado para viver longos anos no país e considera natural que Moscovo, tão atacada pelo Ocidente, use (discretamente) o fato de lhe ter dado abrigo como propaganda política.

Snowden está preocupado com o avanço da Inteligência Artificial, também no que diz respeito à vigilância. Os dispositivos de reconhecimento facial e de reconhecimento de padrões de comportamento, diz ele, ameaça transformar cada câmera (são dezenas de milhões, pelo mundo), num “policial automático”. Ainda assim, ele não está pessimista. Crê que a consciência da vigilância terminará levando à revolta. “Quem deseja mudar algo precisa por-se de pé”, diz ele. Vê a publicação do livro como algo que pode ajudar esta luta.

Escritas por Glenn Greenwald e Ewen MacAskill, as primeiras matérias sobre a rede global de espionagem dos EUA foram publicadas pelo Guardian e pelo Washignton Post em 6 de Junho de 2013. Estão aqui: 1 2. Dezenas de outras se seguiram e podem ser pesquisadas aquiCitizen Four, o documentário de Laura Poitras que conta a história das revelações, ganhou, em 2015, o Oscar de melhor documentário. Jamais foi exibido comercialmente no Brasil. Outras Palavras orgulha-se de tê-lo apresentado, em cinedebate. Uma vasta entrevista de Laura pode ser lida, em português, aqui.


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A desinformação dos media dominantes acerca da vida internacional


– Mentiras, manipulações, silêncios

por Investig'action

Os media dominantes, sem complexos e muito para além da questão europeia, mentem, deformam, dissimulam com mais ou menos subtileza, alinham (quando não são dominados pelo recrutamento selectivo de seus editorialistas) com os interesses dos grupos que os financiam. O resultado é um desconhecimento grosseiro da opinião pública sobre a realidade das relações internacionais e um confinamento mental dos cidadãos no pré-estabelecido. Como pode alguém surpreender-se com o periódico reavivar do chauvinismo estreito e do nacionalismo arrogante, frequentemente acompanhado de racismo, pelas grandes potências? Os poderes "ensinam" de facto o desprezo pelos outros e um desejo de poder muito maior que a solidariedade internacional [1]

O paradoxo é profundo num tempo de globalização desejada pelo mundo dos negócios e seus auxiliares estatais, o que significa que nenhuma economia nacional e nenhuma pessoa podem escapar à interferência estrangeira e ao impacto dos interesses transnacionais sempre presentes em todos os lugares: qualquer regime, qualquer que seja, passa por uma espécie de "mestiçagem". O Estado mais apegado à soberania nacional e o povo mais patriótico são vítimas de um ambiente internacional desfavorável e, apesar de tudo, são transformados pela penetração de interesses que não são os seus. Este é particularmente o caso dos poucos bastiões que se reivindicam do socialismo, muitas vezes degradado por sanções de todos os tipos (embargos, bloqueio de activos financeiros, discriminações comerciais, pressões políticas e ideológicas etc.), que podem chegar até à sabotagem e intervenção militar.

Os grandes media ocidentais ocultam o que pode constituir suas culpas ou seus vexames, por causa dos equilíbrios de poder com os regimes de que não gostam: a forma como apresentam a Coreia do Norte desde há mais de meio século torna-se a caricatura mais básica. O mesmo acontece com o chavismo na Venezuela, com o Vietname e com Cuba! A desinformação é a regra: um simplismo doentio domina a luta que opõe um "campo" a outro, num nevoeiro mantido por uma conversa incessante sobre "valores" e "ideias"! A adesão à ideologia dos gestores capitalistas, associada a uma "cultura descuidada, atrevida, faladora e narcisística", como escreve A. Accardo, [2] caracteriza certos espécimes das escolas de jornalismo, produtoras mais de habilidade do que de saber. Esse não é o caso de todo os jornalistas, mas, na precariedade, quase todos concordam em sofrer a trela mantida pelos "patrões"! [3]
(...)

Para todas as questões internacionais é feita quase que sistematicamente uma avaliação binária baseada nas noções (primárias e quase religiosas) do Bem e do Mal, regularmente confirmadas pelas correntes doutrinárias dos EUA. A transposição para a ordem interna é evidente: os media dominantes servem o Bem e aqueles que discordam situam-se no campo do Mal!

Enfim, todas as informações macroeconómicas situam-se dentro do quadro exclusivo do capitalismo e da sua gestão: os problemas peculiares ao socialismo, considerado "contra-natura", são sempre objecto de uma rejeição global. As controvérsias admitidas nos media dominantes situam-se apenas dentro do único sistema permitido, ou seja, na economia de mercado e na sua lógica à qual ninguém pode escapar sob pena de desastre social. Não existe nenhuma alternativa e a história económica não tem lugar: está concluída. A prova deste fim da evolução foi trazida pelo fracasso das outras experiências que seria absurdo querer reproduzir "em casa": está fora de questão ter em conta as múltiplas agressões económicas e financeiras sofridas pela URSS, Cuba, Chile, Coreia do Norte, Venezuela, etc.

Denunciar a penúria "noutros lugares" (ou, em alguns casos, o sucesso de tal ou tal medida que seria necessário tomar "em casa") é o caminho para descartar as propostas das oposições na própria economia do país! Inclusive se os contextos estrangeiros são muito diferentes e racionalmente não transponíveis. Assim, favorece-se nos espíritos o conceito de "modelo" e "modelo-a-rejeitar". Todos os "especialistas" (seleccionados) convocados pelos editores principais obviamente confirmam-no em todas as ocasiões!

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