Cada refugiado que morre no
mar Mediterrâneo é um crime de guerra que deve ser imputado ao alto comando da
NATO e aos governos dos EUA e da União Europeia. É altura de repudiar a
propaganda, as mentiras, as mistificações, a suprema hipocrisia que assaltou o
mundo mediático, sobretudo quando uma repórter fotografou uma criança de borco,
que deu à costa a uma praia da costa da Turquia.
Milhões de seres humanos estão a
viver os horrores da guerra e as acções particularmente destruidoras do
Banditismo Político Violento que se instalou ao nível do poder nos países
ocidentais. Desde o Magrebe ao Afeganistão, os países da NATO lançaram um rasto
de morte e destruição que vitimou milhões de seres humanos. Ninguém sabe quando
os algozes se saciam com o sangue das suas vítimas.
Tudo começou com a Primeira
Guerra do Golfo, em 1990/1991 com a famigerada “Tempestade no Deserto”. O
Iraque, um país próspero e o mais progressista da região, foi simplesmente
destruído. Eu vi bombardear Bagdade. Sofri os efeitos dos rebentamentos dos
mísseis “Cruzeiro” e dos bombardeamentos aéreos contínuos, todas as horas de
intermináveis dias.
Oficialmente morreram 25 mil
soldados iraquianos e 248 da “coligação internacional”. Os feridos foram mais:
75.000 iraquianos e 776 da coligação. Mas ninguém fala dos mortos e feridos
civis. Porque Washington e Londres venderam a balela de que os bombardeamentos
eram “cirúrgicos” e só causavam baixas militares. Mas eu vi os corpos
destroçados de mulheres e crianças nos bairros populosos da periferia de
Bagdade, em Ramadi ou em Rutbah, já perto da fronteira com a Jordânia.
E vi milhares e milhares de
refugiados. O Iraque era o país de destino de emigrantes dos países do Médio
Oriente e sobretudo do Paquistão. Centenas de milhares trabalhavam naquele
país. Quando começaram a rebentar os mísseis “Cruzeiro”, mais de um milhão de
pessoas fugiu para a Turquia, mas sobretudo para a Síria e a Jordânia. Números
oficiais da ONU: mais de dois milhões de refugiados da guerra do Iraque
(iraquianos ou não) estão ainda hoje, em condições desumanas, na Síria e na
Jordânia.
A segunda Guerra do Golfo, em
2003, desencadeada pelos EUA depois da Cimeira das Lajes, com George W. Bush
(Washington), Tony Blair (Londres), Aznar (Madrid) e Durão Barroso (Lisboa),
transformou os campos de refugiados da Síria e da Jordânia em colmeias humanas
permanentes, sem as mínimas condições de vida. Eu vi aquela tragédia.
Com o início da guerra da Síria,
desencadeada por Washington, Paris, Londres e Berlim mais milhões de pessoas
viram as suas vidas ameaçadas e tiveram que fugir. Mesmo aquelas que há mais de
20 anos vegetavam nos campos de refugiados que nasceram com as guerras do
Iraque.
A “rota da energia” está a ser
devastada pela guerra da NATO. A Primavera Árabe foi o truque usado para
destabilizar e derrubar regimes sólidos e estáveis na Tunísia e no Egipto. Na
Líbia, as potências da NATO decidiram desencadear mais uma guerra que culminou
com o assassinato do Presidente Kadhafi. Destruíram um país próspero e que
vivia décadas de paz e estabilidade. Hoje a Líbia não existe. Dezenas de
milícias, armadas, municiadas e financiadas pelos países da NATO, da União
Europeia e dos EUA, disputam o poder de armas na mão. O petróleo líbio é
roubado pelos países que lançaram a guerra.
No Afeganistão a ocupação
estrangeira acabou. A NATO fingia que saía mas não saía, as potências
ocidentais retiravam mas não retiravam. Até que saíram mesmo, à força. Mais
milhares de vítimas civis e milhões de refugiados. Cada um que morre na fuga é
um crime de guerra. Os criminosos são os Governos dos países da União Europeia,
dos EUA e o alto comando do bloco militar que está a semear a guerra, a
destruição e a morte em todos os países da “rota da energia” entre o Magrebe e o
Oriente, mas também na África Ocidental e Oriental. Basta olhar para a Nigéria,
o primeiro produtor de petróleo do continente. E para Moçambique.
Portugal está presente na guerra
do petróleo como membro da NATO e da União Europeia. Todos os países do bloco
militar têm o dever de acolher os refugiados. Todos, sem excepção. São eles os
senhores da guerra, é a eles que compete acolher as vítimas do Banditismo
Político Violento (não gosto da palavra terrorismo). São eles que têm de levar
a paz e a estabilidade aos países onde estão a fazer a guerra. São eles que têm
de reparar os danos causados pelas suas agressões armadas.
Acima de tudo, são os países da
NATO e da União Europeia que têm de desarmar a sua criação mas tenebrosa: o
Estado Islâmico. Essa organização é filha da NATO e das políticas das grandes
potências ocidentais. Acabem com ela.
Por fim, não aceito o argumento
idiota de que os países da NATO e da União Europeia fizeram bem em derrubar Saddam Hussein,
Kadhafi, Bem Ali, Mubarak ou Morsi porque não eram flores que se cheirassem. O
esqueleto ambulante Cavaco Silva, o descabeçado Passos Coelho, o mânfio Paulo
Portas (a loira Catherine Deneuve) ou Marcelo Rebelo de Sousa (o nome basta,
não precisa de cognomes) não são flores que se cheirem mas ninguém fez ou faz
uma guerra contra Portugal para os derrubar. Hollande, Merkel, Cameron (este
chamou aos refugiados de guerra uma praga) ou Rajoy também não eram flores que
se cheirassem mas ninguém despejou bombas sobre os seus países para os
derrubar. Quem muda os regimes e os governos são os povos. Com a arma do voto.
É preciso dizer um rotundo não
aos criminosos de guerra que afogam civis inocentes nas águas do Mediterrâneo.
E essas vítimas são refugiados, não são migrantes. O Direito Internacional
dá-lhes especial protecção. É bom que ninguém ignore essa realidade. E
sobretudo, é bom que todos tenham presente que os nazis da Ucrânia são os
únicos responsáveis pelos milhões de refugiados ucranianos. Dar-lhes dinheiro e
armas, sim, é um crime contra a Humanidade.
*Jornalista