Daniel Vaz de Carvalho
“Na noite mais traiçoeira, Ruim,
medonha, brutal, Descontada a pasmaceira, Do inferno do normal/.../ A julgar
faltas à balda, Num tribunal multimédia/.../Assentado na baixeza, Do programa
da nação/.../ Por favor, peço-te só, Não te demores, vem logo, Traz gasolina,
põe fogo, Meu amor não tenhas dó!”
- De um poema de Júlio Pomar, Fado
do 112 (cantado por Carlos do Carmo)
1 – “O mundo é composto de
mudança, tomando sempre novas qualidades” (Luís de Camões)
Os que foram atrás da idiotice –
esperteza de outros – do “fim da História”, faziam (como Eça de Queiroz os
teria classificado) de ignorantes e atrevidos perante as palavras de Camões,
que já na antiguidade Demócrito e Lucrécio o tinham verificado.
Claro que o mundo não mudou num
dia, é aliás muito discutível escolher um dia para o efeito. Em termos
históricos há o hábito de referenciar datas para definir acontecimentos
historicamente relevantes. Isto pode levar as pessoas, os alunos sobretudo, a
ignorarem que na realidade o que existe é um processo histórico. Para a
compreensão ser o mais correta possível temos de recorrer às leis da dialética
(obviamente!), em que o acumular de transformações quantitativas, dá origem a
transformações qualitativas, que ocorrem “repentina e subitamente, sob a forma
de saltos de um estado a outro, como resultado da acumulação de mudanças
quantitativas graduais, muitas vezes impercetíveis.” É o que nos diz o
marxismo.
Em Alguns meandros de
uma guerra “total” (Andres Piqueras Infante) são elencados “certos
passos decisivos do assédio à Rússia dentro da guerra total” imperialista e
“algumas peças chaves para entender a ofensiva da NATO contra a Rússia”.
Tratou-se, conforme discriminado, de um vasto conjunto de acontecimentos
orientados para um dado fim: a insanidade do domínio global pelos EUA, que
fizeram suas as palavras de uma canção da juventude nazi: “hoje dominamos a
Alemanha, amanhã o mundo inteiro”. Mas esta intenção depara, com uma
dificuldade: tal não seria possível sem dominar um Estado tão vasto e tão rico
em matérias-primas como então a URSS, agora a Rússia.
A Fundação Rand estabeleceu
a estratégia para resolver esse “problema”, sem o qual a China também
não podia ser dominada. Se analisarmos ponto por ponto cada uma das ações
previstas vemos que foram falhando praticamente todas: o mais que conseguiram,
além das sanções suicidas para a UE, foi uma guerra na Ucrânia com a
participação da NATO, apoiando-se em organizações nazis que oprimem e
aterrorizam as populações, refugiando-se nas cidades, incapazes de enfrentar as
forças russas nas estepes ucranianas.
Já aqui dissemos que a Ucrânia não existe como Estado – é
uma colónia dos EUA, sustentada económica, financeira e militarmente pela
NATO/UE, com a promoção de dirigentes que se destacam por uma patológica
russofobia, seguindo padrões do final da 2ª guerra mundial em que criminosos
nazis (como o Stepan Bandera) foram cooptados pelos serviços ocidentais
particularmente dos EUA e RU.
Neste processo de transformações
há um momento que se torna crucial: a decisão da Rússia de apoiar a Síria
contra a agressão (encapotada) dos EUA/NATO aliados aos grupos islamistas com
seu rol de atrocidades, transformados polos media ocidentais em “combatentes da
liberdade” e “moderados”. Na Síria, a Rússia frustrou o plano de dominar o
Médio Oriente, a que se seguiria o Irão, colocando em cheque parte da fronteira
Sul da Rússia. Foi uma forma de fazer compreender aos EUA que tinham atingido
os limites da sua expansão geopolítica.
As revelações de Merkel e de outros políticos sobre a
sabotagem dos acordos de Minsk mostraram que não foi a Rússia a fonte do
conflito na Ucrânia. Desde 2014 que a estratégia estava estabelecida em
Washington, tratava-se apenas de ganhar tempo, com a ajuda de sanções e a
preparação de um forte exército na Ucrânia. A UE/NATO europeia obedecia,
indiferente às consequências.
Nesta estratégia de “fuck
EU” da sra. Nuland, a UE afunda-se em crises económicas e sociais,
enquanto políticos e “comentadores” nos dizem que estamos a apoiar a democracia
na Ucrânia e no resto da Europa… Uma “democracia”, gerida em Kiev por gente
corrupta, que proibiu o uso da língua russa nos territórios que falam russo,
erigiu em "herói nacional" Stepan Bandera: um criminoso de guerra que
colaborou com os nazis, participando na "Cruzada Judeo-Bolchevista",
massacrando até 100 000 polacos, judeus e soviéticos. Estátuas suas foram erigidas
pelo clã de Kiev, tal como a Roman Shukhevych outro ucraniano criminoso de
guerra nazi, enquanto monumentos à libertação da Republica Soviética da Ucrânia
e estátuas de Lenine foram destruídas. Silencia-se a proibição de sindicatos de
esquerda e partidos, começando pelo Partido Comunista, com militantes presos e
torturados pela polícia política de Kiev.
As regiões do Donbass tiveram
toda a razão para não aceitar o regime de Kiev, constituído-se depois como
Repúblicas Populares, um regime que oprimiu minorias, combateu tudo o que era
progressista ou meramente democrata e se aliou ao imperialismo para eliminar as
aquelas populações.