sábado, 25 de agosto de 2012

Angola – Eleições: QUANDO “ZÉDU” DESCE À TERRA

 


Henrique Botequilha (texto) e Paulo Novais (fotos) - Lusa
 
Lubango, Angola, 24 ago (Lusa) -- As batidas de kuduru aquecem a audiência, o sol está alto e uma multidão aguarda o líder do MPLA. Muitos vão vê-lo ao vivo pela primeira vez, alguns entrarão em transe e os médicos não terão mãos a medir.
 
A lendária capacidade de mobilização do MPLA manifesta-se de novo no Lubango, capital da província da Huíla, no centro-sul de Angola.
 
Um número indeterminado de pessoas, mas seguramente dezenas de milhares, veste a praça João Paulo II com as cores do partido no poder mais a sua artilharia de 'merchandising' de chapéus, guarda-chuvas, t-shirts de modelos diversos, bate-palmas... tudo para unificar as massas em torno da imagem do partido e sobretudo do seu líder, José Eduardo dos Santos, que não tardará a chegar mais a primeira-dama, Ana Paula dos Santos, o seu novo número dois, Manuel Vicente, e uma delegação ministerial que há muito esta província não via.
 
Um cantor romântico aquece os corações da plateia com os versos "Zédu apareça e tome conta de nós" e Pedro Rodrigues, um empresário de 66 anos, não sente dificuldade em deixar-se convencer: "Ele tomou conta de nós, é um homem de bem. Como cidadão devo tudo ao que ele fez para estarmos onde estamos".
 
De camisola preta e vermelha, boné e cachecol das mesmas cores, Rodrigues garante que pelo Presidente angolano daria a própria vida: "Vi muita guerra, vi muita coisa, por ele dou tudo, até a vida."
 
Estão na praça ex-guerrilheiros, camponeses e mulheres a glorificar o "camarada Presidente", muitas crianças - porque as escolas fecharam há semanas por causa das eleições, marcadas para 31 de agosto -, um grupo de sobas com os seus uniformes caqui e Manuel João Chissone, 56 anos, que destoa dos seus colegas tradicionais por se abrigar literalmente debaixo de um guarda-chuva do partido -- "estou orgulhoso deste Presidente, ele trouxe aquilo que precisávamos no momento que precisávamos".
 
Todos os caminhos na Huíla vão dar à praça João Paulo II, ladeada pelo centro comercial Millennium e encimada pelo palco, erguido no esqueleto de um prédio em construção, com um enorme 'outdoor' e o 'slogan' da campanha "crescer mais, distribuir melhor", escoltado por dois militares de arma automática.
 
Um jovem casal dança de mãos dadas na linha da frente da plateia, com a sigla MPLA marcada no rosto de cada um. Vão ver o líder pela primeira vez, uma semana antes de se estrearem como eleitores.
 
A ideia de que o Presidente garantiu a paz chega para merecer o seu voto, mas, para Flávio, há algo mais inscrito na sigla do partido que toca fundo: Libertação. "O MPLA libertou o país e agora vai desenvolvê-lo." E se 32 anos de poder parece muito tempo, o estudante do ensino médio prefere enquadrar a longevidade de outro modo: "Se está lá este tempo, é porque trabalhou muito."
 
Depressa, José Flávio e Cátia Angelino, ambos de 18 anos, vão descobrir que José Eduardo dos Santos não é apenas o resultado de múltiplas representações no material de campanha e que existe em carne e osso. As aparições do Presidente são raras, mas nesta campanha já fez sete comícios. Depois do hino, os jovens vão descobrir ainda que fala.
 
As palavras de José Eduardo dos Santos são engolidas pela audiência, que se entusiasma perante o rol da obra feita, das dificuldades por que, apesar disso, passam muitas famílias, e de como tratará do assunto nos próximos cinco anos.
 
Zédu não se atrapalha com um duplo corte de energia, quando tinha acabado de falar dos temas água e eletricidade, e reserva o momento final para um ataque aos "mentirosos, demagogos e caluniadores" que terão a sua resposta nas urnas.
 
Ao longo de cerca de 20 minutos, uma multidão ululante vibra com o discurso, algumas pessoas entram em transe e várias são socorridas pelo pessoal clínico no local.
 
"A luta continua, a vitória é certa", despede-se José Eduardo dos Santos antes de despir a camisola vermelha de líder do MPLA e vestir o fato presidencial para a inauguração de uma Mediateca, no centro da cidade.
 
À chegada ao novo equipamento, dá meia volta para se dirigir aos populares que o querem ver, num gesto impensável para o cordão de segurança que o rodeia. Tão impensável que não aconteceu.
 
*Foto em jaimagens
 

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