Fernando Santos –
Jornal de Notícias, opinião - foto Alexandrina Guerreiro/TSF
A indignação de
milhares e milhares de cidadãos polvilhou ontem ruas e praças de dezenas de
cidades portuguesas. Palavras de ordem incisivas e cartazes tão originais
quanto críticos das políticas de austeridade em curso deram o colorido a
manifestações de desagrado pelo modo como os credores internacionais estão a
impor um plano inclinado na qualidade de vida nacional, acolitados por um
governo e uma maioria parlamentar agradecidos, obedientes - e ideologicamente
identificados.
O protesto sob o
lema "Que se lixe a troika" fez a retoma da iniciativa de 15 de
setembro do ano passado. Então como agora, a chamada sociedade civil mandou às
malvas o enquadramento político-partidário ou, até, sindical - e deu asas a um
sentimento genuíno de mal-estar e repulsa pela orientação geral do país. Uma
parte substancial do país já percebeu não ter futuro, vive afetada pela pobreza
e a degradação das condições de vida dos seus próprios - ou próximos - núcleos
familiares e tem, pois, razões bastantes para pressionar a reorientação das
políticas em curso.
A virtude da
existência de movimentos genuínos de protesto não é negligenciável e, em certo
ponto, é mesmo um sinal objetivo de desapoio e desconfiança a quem dispõe da
condução política do país, do Parlamento ao Governo, mas sem ignorar também a
Presidência da República. Ontem, como em anteriores manifestações, dispondo os
contestatários de um acrescido valor: foram capazes de expressar o que lhes vai
na alma sem violência gratuita - houve meros arrufos. O protesto civilizado,
dentro de regras democráticas, bem pode mesmo servir de fonte inspiradora a
criadores de "pins" para uso (orgulhoso) na lapela dos portugueses.
Há uma tendência
natural para estabelecer paralelismos entre o protesto de ontem e o de 15 de
setembro, inclusive pela apresentação de números. Uma tal propensão fica
entretanto condicionada por ambientes divergentes - mas de resultado
contestatário igual.
O protesto de 15 de
setembro estava alavancado pela patetice e o desastre de uma tentativa de dias
antes do Governo de anunciar a intenção de colocar os trabalhadores a
substituírem-se ao patronato no pagamento da Taxa Social Única. As consciências
abespinharam-se, incluindo a dos patrões, e o protesto foi marcante no recuo de
Passos Coelho. É certo, vingou-se mais tarde pela apresentação de um enorme
aumento de impostos, mas percebeu então a força da rua.
Se se quiser: o
protesto de ontem - agora com a troika em Lisboa a saber se o Executivo cumpre
o infernizar de vida aos cidadãos como está programado - é uma sequela do saque
fiscal iniciado há dois meses e, por isso, dispôs de menos sangue a ferver. Mas
não é negligenciável e vai - tenhamos todos a certeza - gerar réplicas
próximas.
Só um tolo não
acredita estarem "afinadas" decisões para o famoso corte de quatro
mil milhões de euros, e cujo anúncio ficou congelado pela manifestação de
ontem. Troika e Governo não são parvos, mas estão enganados quando se acham
convencidos de que a parvoíce está alojada nos cidadãos vulgares.
1 comentário:
PORTUGAL precisa urgentemente de Tolerância contra os corruptos e incompetentes.A situação de caos económico em que vivemos, deve-se em grande parte aos negócios ruinosos com PPP (Parcecerias Publico/Privadas)e com a falência do BPN, leia-se roubo no BPN. Enquanto Portugal estiver refém dos grande escritórios de advogados e enquanto a maioria dos deputados da Assembleia da República forem advogados em vez de engenheiros e economistas, PORTUGAL não tem futuro.
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