Difícil compreender
como um boato a respeito do programa Bolsa Família tenha se estendido
simultaneamente, num final de semana, a sete estados do país e gerado tumulto e
até depredações. Não pode ter sido obra do acaso, de uma informação divulgada
em um bairro. Neste caso uma cidade poderia ter sido o foco. Mas não. Foram várias
cidades em várias unidades da Federação. A questão tem várias faces. Como a
informação foi difundida, qual a sua origem que foi ampla, e a situação de
carência que conduziu à exaltação e ao desespero. Um mistério, o fato de,
sábado e domingo, quando se encontram fechadas agências da Caixa Econômica
Federal terem sido invadidas. Com as casas lotéricas poderia ocorrer, no
sábado, quando funcionam. Mas não no domingo.
Presume-se que,
diante da veiculação e da força do boato, apesar de logo desmentido pelo governo,
a CEF tenha mobilizado funcionários para explicar o equívoco e acalmar a
multidão. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, determinou abertura de
inquérito pela Polícia Federal para apurar as responsabilidades e identificar
os responsáveis pela geração do tumulto cujas consequências poderiam ter se
tornado imprevisíveis. A investigação não deve ser difícil em face de a ação
ter sido simultânea. Mas este ângulo não esgota a força potencial que envolve o
problema.
Ele tem origem na
extrema carência de uma parte considerável da população que conduziu a uma
situação de desespero. Que, por seu turno, teve origem no medo da perda
anunciada. O programa Bolsa Família é irreversível. São muito poucos
os casos, como O Globo e a Folha de São Paulo publicaram há
poucas semanas, de famílias terem decidido não mais receber porque pessoas que
as integram terem conseguido emprego. É normal que seja assim.
IRREVERSÍVEL
O Bolsa
Família é o tipo do programa social de injeção direta de renda que, uma
vez iniciado, torna-se irreversível. Não deveria ser. Mas é. Inclusive a
redução do índice de desemprego, atualmente segundo o IBGE, na faixa de 5,7%,
não resolve. Porque é preciso levar em conta que, em inúmeros casos, para uma
pessoa que recupera sua presença no mercado de trabalho, aparece uma outra que
perdeu a colocação.
A estatística não é
afetada, daí porque as análises dos números são indispensáveis, mas a carência
igualmente as mantêm. Pessoas se revezam, os percentuais não. São frios. E
sempre necessário pesquisar mais a fundo o quadro social do país.
Afinal, como o
próprio IBGE já informou, praticamente metade de mão de obra ativa (metade de
toda a população) ganha por mês de 1
a 2 salários mínimos. E é preciso considerar
paralelamente que a composição familiar não se mantém absolutamente estável
como as estatísticas induzem. Nada disso. Elas se formam e se dispersam com
relativa intensidade, o que, nos grupos de renda menor, afeta o salário médio
por família. Não é fácil analisar-se todos os ângulos do panorama social
brasileiro. Ele é bastante múltiplo, acentuado igualmente pela proliferação de
favelas como se observa na cidade do Rio de Janeiro.
A ansiedade
peculiar à carência conduziu ao desespero no sábado e domingo. É fato. Mas a
injeção do boato na comunicação coletiva, sem a televisão e o rádio, não foi
obra do acaso. A verdade deve aparecer. Inclusive para que fenômenos
semelhantes não se repitam.
Artigo publicado no
site Tribuna da Internet
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