quinta-feira, 22 de agosto de 2013

IRÁ EDUARDO DOS SANTOS ADOTAR AS TESES DO SEU AMIGO MUGABE?

 


Folha 8 – edição 1155 – 17 agosto 2013
 
O presidente do Zimbabwe, Robert M u g a b e, aconselhou os opositores que estão a contestar a vitória de Robert Mugabe, nas eleições de 31 de Julho, a “enforcarem-se”. Se calhar alguns dos seus homólogos têm outras estratégias mas, ao fim e ao cabo, a finalidade é a mesma.
 
“Os que estão chocados com a derrota, podem enforcar-se, se quiserem. Nunca desistiremos da nossa vitória”, declarou o chefe de Estado zimbabueano, de 89 anos de idade, no poder há mais de 33, e agora reconduzido no mandato, por cinco anos. De nada e para nada conta o facto de tanto a oposição como os observadores locais, terem verificado várias fraudes no escrutínio. É, aliás, caso para dizer que, como noutros países, as fraudes são a alma de algumas “democracias” africanas.
 
O adversário derrotado, o primeiro-ministro cessante, Morgan Tsvangirai, do Movimento para a Mudança Democrática (MDC, oposição), apresentou um recurso aos tribunais para tentar invalidar o escrutínio, por considerar que as listas eleitorais tinham sido manipuladas de forma a favorecer a vitória de Robert Mugabe e do partido União Nacional Africana do Zimbabué - Frente Patriótica (ZANU-PF). A oposição, tal como os observadores, deveriam estar felizes com a crescente modéstia do presidente já que, numa clara prova da vitalidade democrática do pais, Mugabe só foi reeleito na primeira volta, com 61% dos votos, contra 34% de Tsvangirai.
 
“Apresentamos a democracia numa bandeja. É pegar ou largar, mas o povo esteve num acto democrático”, acrescentou Mugabe. Aliás, já em Junho de 2008, afirmara que o “Povo do Zimbabwe deu uma lição de democracia”. As afirmações de Robert Mugabe (ou Frankenstein, segundo Desmond Tutu) têm levado o arcebispo sul-africano e prémio Nobel da Paz, tal como já fizera Nelson Mandela, a fazer críticas ferozes ao presidente do Zimbabwe. Certo é que estas críticas de altos dignitários mundiais e vizinhos, Angola é uma excepção dado os laços de amizade entre os presidentes, não alteraram a estratégia de Robert Mugabe que, aliás, as comentou dizendo que “nem Mandela nem Tutu sabem o que dizem quando falam do Zimbabwe”. E não sabem porque são falsas as alarmantes notícias sobre a intimidação levada a cabo pelas forças do Governo para que o povo fosse votar em quem devia. Tão falsas que, diz Robert Mugabe, “a democracia funcionou e a esmagadora maioria do povo votou em mim”. Todo o mundo, com a excepção oficial de Angola, sabe o que se passa mas, mais uma vez, nada faz.
 
Em tempos, num devaneio para africano ver, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, defendeu a demissão pela força de Robert Mugabe. Mas tudo ficou por aí. Desmond Tutu, para quem, “entre outros crimes”, o presidente do Zimbabué “destruiu um país lindo que até foi um celeiro da região”, advoga até o afastamento de Robert Mugabe pela via militar.
 
Também o bispo anglicano de Pretória, Joe Seoka, considerava já em 2008 que o Presidente do Zimbabué, “deve ser visto como um Hitler do século XXI, uma pessoa sem consciência, nem remorsos e um assassino”. É claro que, do ponto de vista do regime angolano, não é correcto chamar Hitler a Robert Mugabe. Essa designação, segundo a tese oficial, tem mais cabimento quando dirigida a esse inimigo público mundial que dava pelo nome de Jonas Savimbi. Qual Robert Mugabe, qual Idi Amin, qual Jean-Bédel Bokassa, qual quê!?
 
O bispo Seoka acusou Robert Mugabe de ter provocado, durante a sua eterna governação no Zimbabwe, “estragos e mortes sem conta” e exortou África e a comunidade internacional a afastarem Mugabe do poder pela força a bem do país e do povo. “Estragos e mortes sem conta”? Se este for o barómetro, Joe Seoka tem de acrescentar muitos, mas muitos, outros nomes à listagem dos potenciais Hitleres. O responsável religioso sul-africano não poupou críticas aos dirigentes políticos da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), acusando-os de protegerem há longos anos o “camarada de ditadura” do Zimbabwe. Será caso para dizer que tanto são Hitleres os que protegem Hitler, como o Hitler propriamente dito?
 
“A liderança da SADC e as suas estruturas têm protegido o seu camarada de ditadura enquanto os líderes internacionais apelam, em número crescente, ao seu afastamento. Membros da SADC como o Botswana têm, no entanto, levantado a voz em protesto contra as violações dos direitos humanos no Zimbabwe, expressando preocupações que continuam a ser ignoradas pelos outros”, afirmou o bispo anglicano da capital sul-africana. Para o prelado, que em Luanda ninguém sabe quem é (como não sabe quem é Desmond Tutu ou Nelson Mandela) “chegou a hora de todos os líderes religiosos seguirem o exemplo de Desmond Tutu e do arcebispo de York, John Sentamu, no seu apelo a Deus para que Mugabe seja afastado da Presidência do Zimbabwe”.
 
“Ele tem de ser afastado à força para que acabe o sofrimento dos filhos de Deus no seu país”, referiu Seoka, salientando que “pedir o afastamento não adianta”. E não adiantou. Aliás, recorde-se que em Novembro de 2008, o Governo do Zimbabwe, aquele próspero e democrático país do sul de África que é na actualidade o maior exportador mundial de... refugiados, vetou a entrada no país do ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan. Aliás, Robert Mugabe impediu a visita de Kofi Annan, do antigo Presidente norte-americano, Jimmy Carter, e da activista dos Direitos Humanos, Graça Machel, que pretendiam avaliar a situação humanitária no país em nome do “Grupo dos Anciãos”, ao qual pertencem.
 
Sejamos francos. O que eles queriam era (e é por essa e por outras que a amizade entre Eduardo dos Santos e Robert Mugabe é indestrutível) atazanar a paciência do presidente. E ele, como bom democrata que é, não está com paciência para aturar gente preocupada com uma coisa que não existe no Zimbabwe: direitos humanos. E se não existe... Harare acusou o “Grupo dos Anciãos” (criado em 2007 por Graça Machel e pelo seu marido, Nelson Mandela) de apoiar o Movimento para a Mudança Democrática (MDC), o principal partido da oposição. Seja como for, Robert Mugabe parece ter razão quando afirma que só Deus o poderá demitir. Não é o único a pensar assim.
 

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