quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Moçambique. Zimbabué apoia governo e avisa Renamo de que não quer guerra

 

Diogo Vaz Pinto – jornal i
 
Vice-ministro dos Negócios Estrangeiros do Zimbabué garante que o seu país não irá tolerar um retorno à guerra civil em Moçambique
 
"A Renamo está equivocada se julga que pode criar instabilidade e esperar que o Zimbabué se limite a assistir de braços cruzados", afirmou ontem à BBC Christopher Mutsvangwa, vice-ministro dos Negócios Estrangeiros do Zimbabué. Na segunda-feira, o movimento que lidera a oposição ao governo moçambicano - e que, além dos 51 assentos que detém actualmente no parlamento, conta com um pequeno exército de cerca de mil homens - rasgou o tratado de paz assinado em Roma em 1992, que pôs fim à guerra civil que assolou o país nos 16 anos que se seguiram à independência, em 1975.
 
A denúncia do acordo veio em resposta à operação do exército moçambicano, que, no mesmo dia, tomou de assalto a base da Renamo na região montanhosa da Gorongosa, no centro do país, onde o seu líder, Afonso Dhlakama, se encontrava aquartelado há mais de um ano.
 
Na entrevista concedida a um programa de rádio da cadeia britânica, Mutsvangwa dirigiu um aviso claro a Dhlakama, acentuando que "nunca, nunca" lhe passe pela cabeça um retorno à violência. "Os países no Sul de África não vão permiti-lo. É algo que simplesmente a região não pode aguentar neste momento", sublinhou, acrescentando que o dispositivo regional da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral estaria disposto a enviar tropas para ajudar o governo de Moçambique na eventualidade de a segurança no país se deteriorar.
 
A captura pelos militares do principal quartel do antigo movimento de guerrilha, em Sandjunjira, na província de Sofala, levou Afonso Dhlakama e o secretário-geral da Renamo, Manuel Bissopo, a fugirem para local incerto. Entretanto, homens armados retaliaram ao raiar do dia seguinte, abrindo fogo sobre uma esquadra da polícia na vila de Marínguè, a cerca de 35 km daquela base. Na tarde do mesmo dia, uma coluna militar na região de Muxúnguè, na mesma província, foi também atacada pelos rebeldes.
 
Os acontecimentos que estão a alimentar os receios de que Moçambique possa resvalar novamente para um conflito civil coincidiram com o início da "presidência aberta" de Armando Guebuza, actual líder do regime que detém o poder no país desde 1975. A iniciativa presidencial era aguardada há muito como uma oportunidade para um alívio na crescente tensão entre a Renamo e a Frelimo (partido do poder) nos últimos meses.
 
Ontem Guebuza defendeu a necessidade de manter o diálogo com a oposição, sublinhando que o momento "não é apropriado para inimizades, pois o maior perdedor é o povo moçambicano". "Este não é o tempo para perguntar o que está certo e está errado. Se alguém pensa que está certo, então que traga a sua posição para a mesa do diálogo."
 
Já o ministro da Defesa de Moçambique, Filipe Nyusi, justificou ontem o ataque do exército à base da Renamo com a necessidade de "desactivar núcleos do terrorismo" no país, explicando que o acampamento poderá ser transformado em quartel militar. "A perseguição era necessária para desactivar este núcleo do terrorismo e vai continuar para manter a estabilidade no país", disse.
 
Enquanto isso, um conjunto de organizações moçambicanas acusou ontem Armando Guebuza de violar a Constituição, pelo assalto militar conduzido com o pretexto de reposição da ordem pública, uma vez que, dizem, constitucionalmente esta acção cabe à polícia. Falando aos jornalistas, a presidente da Liga dos Direitos Humanos de Moçambique, Alice Mabota, afirmou que para a sociedade civil moçambicana "não está claro" o que aconteceu na Gorongosa nem a razão por que aquele ataque foi perpetrado pelo exército.
 
Durante os anos da guerra civil, a Renamo era apoiada pelo regime da minoria branca que controlava o poder no Zimbabué, mas quando Robert Mugabe chegou ao poder trocou o sentido da aliança, e desde então passou a ajudar o governo da Frelimo. O CanalMoz (publicação diária online moçambicana) adiantou entretanto que o exército moçambicano contou inclusivamente com apoio de tropas do Zimbabué na operação que levou à captura da base da Renamo esta segunda-feira.
 
Com 54% da sua população a viver com menos de um dólar por dia, Moçambique destaca-se como um dos países mais pobres do mundo, mas a descoberta de enormes reservas de gás natural na bacia do Rovuma, no Norte de Moçambique, aliada à exploração das importantes reservas de carvão em terra, têm conduzido o país a um súbito florescimento económico.
 

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