segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Angola: RIQUEZA PRIVATIZADA, REGIME DO PETRÓLEO QUE (NÃO) É DE TODOS

 

Folha 8, 17 janeiro 2014
 
Angola con­tinua a sua aposta na produção de petróleo. A receita tem dado bons frutos, sobretudo para os donos de um país em que 76% da população vive em 27% do território, em que mais de 80% do Produto Interno Bruto é produzido por estrangei­ros; em que mais de 90% da riqueza nacional priva­da foi subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% da po­pulação, em que o acesso à boa educação, aos con­domínios, ao capital ac­cionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está li­mitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.
 
E quando a economia, mesmo que limitada a um restrito e blindado núcleo­-duro de familiares do Presidente, tem um de­sempenho positivamente assustador, ninguém olha para o país real. Quando os homens do Presiden­te chegam aos principais areópagos políticos inter­nacionais e, solenemente, apresentam um cartão de visitas onde se constata que o país registou, em 2013, a 20ª taxa mais alta de crescimento do mundo, todos se ajoelham.
 
E embora apareçam vozes a dizer que Angola tem de diversificar, para além dos habituais, históricos e empedernidos titulares da economia a das finanças, a sua estratégia económica, a verdade é Angola tem uma visível alergia ao alar­gamento regional, à coo­peração inter-regional, ao surgimento de uma zona de comércio livre e à cria­ção de uma união aduanei­ra.
 
Embora sejamos cada vez mais um potência regional, falta saber se do ponto de vista estratégico Angola não teme dar esse passo, tão imbuída está no refor­ço das defesas do umbi­go que, afinal, é o mesmo desde 1975 e que, com uma eventual abertura tanto in­terna como externamente, poderia pôr em risco a ma­nutenção doa actual status quo do regime.
 
Mau grado a sua pujança económica, os efeitos das sucessivas crises mundiais mostraram que, afinal, não há bem que sempre dure nem azar que nunca acabe. Mesmo assim um crescimento na ordem dos 7% é exequível. E se assim for, não é crível que o país pondere alterar a sua es­tratégia económica. Corre, contudo, o risco de ser a locomotiva regional.
 
Petróleo-dependente (qua­se 100% das exportações e 80% das receitas), embo­ra com elevado potencial noutros sectores, Angola continua refém de uma estratégia política e, por isso, económica anquilosa­da que, como resultado do seu auto-isolamento, teme apostar na capacidade dos seus agentes económicos e nas suas outras autóctones fontes de crescimento.
 
O regime aposta assim em dois únicos pilares: o petróleo como fonte de receita e, em simultâneo, no crescimento das for­ças de segurança, tanto na perspectiva interna como na externa. Será esse o melhor caminho? No ime­diato e na perspectiva da manutenção do poder em Angola parece ser. Se, por um lado, o dinheiro for­necido pelo ouro negro é mais do que suficiente para que as forças de segu­rança estejam, ou aparen­tem estar, do lado de quem manda, por outro esse di­nheiro faz imensa falta no sector social que, embora não tenham força, têm ra­zão para protestar e reivin­dicar alterações ao estado das coisas.
 
No plano externo regional, é evidente que o petróleo é essencial para manter e alargar o poderia mili­tar angolano, de quem é exemplo recente a compra de um porta-aviões. Desta forma o regime garante, ou compra, lealdades como a da República Democrática do Congo e, eventualmen­te, da própria República Centro Africana.
 
Angola, aliás, preside à Conferência Internacional da Região dos Grandes Lagos, onde se inserem estes dois países cujos conflitos estão sempre activos ou latentes.
 
Por alguma os homens do regime, como Belarmino Van-Dúnem, dizem que “alguns países buscam as­sessoria e consultoria na figura do Presidente José Eduardo dos Santos”.
 
Entretanto, o Enviado Es­pecial Norte-Americano para a Região dos Gran­des Lagos e a República Democrática do Congo, o Senador Russell D. Fein­gold, esteve em Luanda onde participou na Quinta Cimeira dos Chefes de Es­tado e de Governo da Con­ferência Internacional da Região dos Grandes Lagos (CIRGL), que teve lugar a 15 em Luanda.
 
De acordo com a embai­xada norte-americana no nosso país, “os EUA estão prontos a apoiar Angola, que assume a liderança do CIRGL para os próximos dois anos, nos seus esfor­ços que visam a consolida­ção da paz e a estabilidade na região”, razão pela qual Feingold abordou “com as autoridades angolanas e outros parceiros multila­terais a implementação do Acordo Quadro para a Paz, Segurança e Cooperação para a região dos Grandes Lagos”.
 
O Senador Russell D. Fein­gold foi nomeado como Enviado Especial dos EUA para a Região dos Grandes Lagos e a RDC em Julho de 2013, tendo servido e lide­rado a Sub-Comissão para a África do Senado Ame­ricano durante 18 anos, trabalhando hoje estreita­mente com o Secretário de Estado John Kerry, a Se­cretária Assistente para os Assuntos Africanos e ou­tros líderes internacionais “no sentido de encontrar um caminho que leve à paz duradoura e a prosperida­de económica na Região dos Grandes Lagos”.
 
SONANGOL ANUNCIA LEILÃO
 
A petrolífera So­nangol anun­ciou em co­municado a abertura de um concurso público para leilão de 10 concessões no “onshore” de Angola. Sete dos blo­cos a leiloar situam-se na bacia do rio Kwanza e os restantes três na do rio Congo.
 
Para reforçar a divul­gação do potencial dos 10 blocos, a Sonangol acrescenta no comuni­cado que procederá a um “road-show” que integra apresentações em Lon­dres (3 de Fevereiro) e Houston, Estados Unidos da América (10 de Feve­reiro).
 
As companhias petrolífe­ras e demais investidores interessados em parti­cipar nas duas apresen­tações deverão efectuar um registo prévio.
 
Angola é actualmente o segundo maior produ­tor de petróleo na Áfri­ca subsaariana, atrás da Nigéria, com cerca de 1,7 milhões de barris/dia e o objectivo confesso é atin­gir a cifra de 2 milhões em 2017, depois de ante­riormente ter sido equa­cionado o ano de 2015.
 
O crude representa 97% das exportações e 80% da receita fiscal, mas a indústria petrolífera em­prega apenas 1% da popu­lação, que já soma mais de 21 milhões, segundo o Banco Mundial, dos quais a maioria vive com me­nos de 2 dólares por dia, de acordo com os dados das Nações Unidas.
 

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