Cenários de guerra,
caracterizados por perseguição a populares, intimidação, detenções arbitrárias
e supostas execuções sumárias de cidadãos indefesos, sobretudo jovens e adultos
do sexo masculino, fizeram com que perto de 4.000 residentes das regiões de
Nhambondo, Tazaronda, Mucodza, Nhataka, Tambarara, Nhankuco, Kanda, Tazonda,
Egipto, Barnota, e Vunduzi, no distrito de Gorongosa, na província de Sofala,
abandonassem, há alguns dias, as suas residências, refugiando-se na vila sede,
como forma de escaparem das atrocidades perpetradas pelos homens armados da
Renamo e pelas Forças de Defesa e Segurança.
Segundo relatos de
cidadãos entrevistados pelo @Verdade, alguns dos quais foram forçosamente
separados dos seus parentes – dados como desaparecidos em virtude de terem sido
capturados por militares – os guerrilheiros da Renamo e as forças
governamentais protagonizam assassinatos de cidadãos desde Outubro passado.
Entretanto, os nossos interlocutores não sabem dizer por que motivos os
militares estão a protagonizar tal “carnificina” e não apresentam provas
concretas de pessoas que tenham sido vítimas da referida situação.
Manuel da Costa
Simão, Pastor da Igreja Nazareno de Moçambique, e residente na sede do posto
administrativo de Vunduzi, disse-nos que o que se vive naquela região é triste
pelo facto de haver pessoas que estão a ser executadas sumariamente, além de
sofrerem várias ameaças por parte dos homens armados da Renamo; por isso, ele
refugiou-se na vila de Gorongosa, em casa de familiares.
Num outro
desenvolvimento, o pároco afirmou que Vunduzi está deserto devido à situação
político-militar que caracteriza a zona. Os “chapas” que transportavam pessoas
e bens no troço vila de Gorongosa- -Vunduzi e vice-versa suspenderam as
actividades por intimidação dos guerrilheiros do partido de Afonso Dhlakama.
Segundo o nosso
interlocutor, algumas famílias foram escorraçadas das suas comunidades pelas
forcas governamentais, alegadamente por ser difícil identificar os elementos da
Renamo no meio da população. Ele antevê que nas regiões afectadas pelo problema
pode haver fome em virtude de as pessoas terem abandonado as suas machambas,
das quais dependem para sobreviver, principalmente porque se está numa época em
que algumas culturas alimentares precisam de ser sachadas.
Manuel Simão
assegurou-nos ter presenciado a execução sumária de duas pessoas por
guerrilheiros de Afonso Dhlakama. As vítimas respondiam pelos nomes de Zacarias
e Mabote. Ao primeiro arrancaram alguns bens e o segundo era perseguido pelos
mesmos militares antes de ter sido morto.
Mulher dá à luz
sozinha
No último domingo,
05 de Janeiro em curso, durante a fuga de Vunduzi para a vila municipal de
Gorongosa, com os seus filhos menores de idade, Azeria Alficha deu à luz sem
ajuda de ninguém. A dada altura do percurso, ela começou a queixar-se de dores
de parto e, corajosamente, não fez mais nada senão interromper a caminhada e
assumir o serviço de parteira. Em contacto com o nosso Jornal, a senhora
confessou que foi difícil e quase perdia o seu bebé. “Mas porque Deus estava
comigo, nenhum mal aconteceu”.
Gente que tenta
procurar comida nas zonas de origem
Elias Albino, outro
cidadão entrevistado pela nossa reportagem, residente em Nhanhadzi, também, no
posto administrativo de Vunduzi, contou que todos os seus bens ficaram na
comunidade assolada pela tensão político-militar. Neste momento, ele e os
parentes, acomodados na Escola Primária Completa de Mapombwe, estão a passar
fome. Nalgumas vezes, sob o risco de serem interceptadas por militares e serem
mortas, as pessoas tentam procurar formas de chegar a Vunduzi para irem buscar
a comida que deixaram nas suas arrecadações.
E há famílias que,
quando chegaram à vila de Gorongosa, optaram por arrendar casas mas já não têm
condições para o efeito. Eugénio Almeida, régulo da região de Kanda, considerou
que perante esta situação existem pessoas que se apoderam dos bens das outras que
estão no meio do sofrimento. Ele também foi vítima, tendo os malfeitores
roubado os seus cabritos.
O apoio é
insuficiente
O governo do
distrito de Gorongosa assegurou-nos que oferece diariamente à população, que
abandonou as zonas de “conflito”, feijão, óleo alimentar, arroz, repolho e
farinha de milho. Todavia, os refugiados consideram que os produtos alocados
não chegam, uma vez que as famílias são numerosas. As pessoas queixam-se
igualmente das condições de alojamento que não são das melhores. Os dormitórios,
por exemplo, são comuns o que impede que haja privacidade.
Criado centro para
refugiados
O governo da
província de Sofala criou um centro de acomodação para as populações refugiadas
na vila de Gorongosa à procura de abrigo e segurança. O lugar vai albergar 180
famílias, o que corresponde a 3.845 pessoas, que, neste momento, se encontram
nas escolas. Numa primeira fase, os indivíduos em causa serão alojados em 100
tendas, que não são suficientes, de acordo com o governo local. Porém, a medida
visa descongestionar os estabelecimentos de ensino, uma vez que as aulas vão
arrancar brevemente.
Gerónimo Langa,
porta-voz do governo distrital de Gorongosa, explicou que o Instituto Nacional
de Gestão de Calamidades (INGC) disponibilizou seis toneladas de arroz,14 sacos
de farinha de milho, duas toneladas de açúcar, 2.000 litros de óleo e duas
toneladas e meia de feijão, para garantir a alimentação da população, durante
15 dias. Os produtos beneficiam, também, as famílias que vivem em casas
arrendadas.
Perguntámos ao
porta-voz sobre a solução que se prevê para as crianças que se encontram
refugiadas na vila de Gorongosa com os seus pais, uma vez que correm o risco de
perder o ano escolar, por causa do ambiente de guerra que se vive nas suas
zonas de origem, e a resposta foi a de que todas elas estão a ser inscritas
para continuarem a estudar nas escolas da vila sede.
De acordo Gerónimo
Langa, devido à situação político- -militar que se vive em Gorongosa, a unidade
sanitária da vila municipal atende, por dia, 350 a 500 doentes e, como forma de
descongestionar os serviços, foram criados, em todos os locais onde se
encontram os refugiados, postos para a prestação dos primeiros socorros.
Verdade (mz), em
Tema de Fundo
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