terça-feira, 4 de março de 2014

Portugal: AR paga cerca de 50 telemóveis a mais e gasta 180 mil euros em segurança



Carlos Diogo Santos – jornal i

Parlamento suporta ainda os telefones de casa a alguns dirigentes - AR diz que são só três casos - que também têm telemóveis

A Assembleia da República (AR) tem vindo a reduzir a sua despesa nos últimos anos, mas o i descobriu que ainda há espaço para gastos não justificados. O pagamento de contas de casa a dirigentes, atribuição de subsídio de representação a elementos que não têm direito a esse benefício ou gastos elevados com segurança para enfrentar as manifestações são alguns desses casos. Outra situação prende-se com o pagamento das contas de 87 telemóveis quando só 37 elementos têm direito a usá-los. E cada um dos aparelhos gasta em média mais de 160 euros por mês. Contactado pelo i, o gabinete do secretário-geral da Assembleia da República, Albino Azevedo Soares, justificou algumas destas despesas como sendo "práticas que vêm de trás", garantindo, contudo, que serão "objecto de revisão".

No campo da adjudicação de serviços, a AR contratou a empresa de um ex-funcionário seu que se reformou por limite de idade. Na prática, o profissional em causa continua a desempenhar as funções que sempre teve a seu cargo e a ocupar o mesmo gabinete, só que agora na reforma e enquanto contratado. O secretário-geral assegura que passará a haver "um processo de recrutamento directo de pessoas e não de empresas para obviar situações como esta."

Em 2013, a calçada do parque à superfície foi também levantada para fazer as marcas de estacionamento com pedras escuras ao invés de se recorrer a tinta. Uma opção internamente criticada, mas que não merece justificação por parte da parlamento. "Esta foi a solução", disse fonte oficial, sem dar mais explicações. Numa casa onde uma parte das contas está desorganizada, foram gastos mais de cinco mil euros para que, ao menos, os carros ficassem bem arrumados.

Segurança

Desde a manifestação de 15 de Setembro de 2012, a Assembleia da República (AR) tomou várias decisões de modo a garantir a segurança nas instalações. Só em obras nos espaços destinados aos serviços de segurança, na instalação de barreiras e em sistemas de gestão interna foram gastos mais de 180 mil euros. Assim que acabou aquela que foi considerada uma das maiores manifestações desde do 25 de Abril, a AR decidiu instalar o Sistema de Gestão da Sala de Segurança. O ajuste directo foi feito em Outubro de 2012 por 89 964 euros, mas a instalação aconteceu em 2013. Deveria ter custado cerca de 18 mil euros, mas com os trabalhos a mais a factura subiu para 24 794 euros. O mesmo se passou com as barreiras dissuasoras que foram colocadas nas entradas principais para impedir a entrada de veículos. Foram compradas em Outubro de 2012 (10 832 euros), e colocadas em 2013 por 9 996 euros. Nesse ano foram ainda instaladas 29 grades no Palácio de São Bento e 7 num edifício anexo, o que custou 37 mil euros. Além destes equipamentos foi requalificada da Casa da GNR e o gabinete de segurança, remodelado o acesso ao local onde está a PSP e construída uma arrecadação para a segurança. Estas obras custaram perto de 13 mil euros. A AResclareceu que não torna públicos os estudos de segurança que fez, adiantando que foram as entidades de segurança que se decidiram por estas obras. Sobre a duplicação de publicitações de ajustes directos, fonte oficial diz que se trataram de “lapsos”, e assegurou que tal não significou a repetição dos pagamentos. A AR conclui que “é anualmente auditada pelo Tribunal de Contas”.

Contratação de reformado

Há alguns anos que António Dias Flor era engenheiro da Assembleia da República (AR) quando em 2011 foi obrigado a reformar-se. Em documentos a que o i teve acesso, este ex-funcionário foi contratado logo de seguida pelo parlamento para as mesmas funções, tendo até ocupado a mesma secretária. Mas desta vez através da sua empresa: a Terminacálculo. A AR fez um ajuste directo a esta sociedade para prestação de serviços de consultoria na área da Engenharia Civil em vez de ocupar o cargo deixado livre. O custo da prestação de serviço foi superior a 24 mil euros (cerca de 30.000€ com IVA), sendo pago em mensalidades de 2 013 euros (sem IVA). O contrato foi celebrado por um ano e renovado por períodos iguais, caso não exista denúncia. Ao i, a AR disse estar agora a “desenvolver um processo de recrutamento directo de pessoas e não de empresas para obviar situações como estas, em que se optou, numa interpretação de emergência, pelo universo de um funcionário [...] conhecedor das características topográficas da AR”.

Telefones e telemóveis

A factura de telefones e telemóveis da Assembleia da República (AR) ronda os 470 mil euros. Deste valor, 171 694 euros correspondem ao custo dos 87 telemóveis e 297 996 ao custo dos telefones fixos (internet à parte). Segundo o i apurou, face a 2012 diminuiu o preço pago por telefones fixos (naquele ano a factura foi de 355 mil euros), mas os gastos com os telemóveis subiram de 150 mil euros para mais de 171 mil. Assim, cada um dos 87 telemóveis custa à AR um valor médio mensal de 164 euros – um preço muito acima dos tarifários actuais com chamadas ilimitadas das três operadoras móveis. Mas o corte poderia ser ainda maior, caso a AR apenas atribuísse telemóveis aos cerca de 40 elementos que têm esse direito. Segundo a AR, também foram atribuídos telemóveis a “motoristas, ao chefe de segurança, ao comandante de esquadra, ao chefe da sala de segurança, aos funcionários das relações públicas [e] a coordenadores” da ARTV. A AR prevê gastar em 2014 menos 48,3% em comunicações do que em 2013, na sequência da celebração de um novo contrato. Sem apresentar outros dados, a AR diz que, em vez de uma subida, “os encargos com comunicações de telemóveis” sofreram em 2013 uma redução de 8,6% face a 2012. O i confrontou ainda a AR com o facto de serem pagas as contas do telefone de casa a alguns dirigentes, tendo o gabinete do secretário-geral confirmado esta informação. A mesma fonte garante, contudo, que se tratam apenas de três casos, justificando ser “uma prática que vem de trás” e que estará a ser objecto de revisão: “A racionalização das práticas tradicionais é difícil, mas vem sendo empreendida.” Depois do contacto do i, a AR confirmou – num segundo email – que vai deixar de pagar os três telefones de casa.

Despesas de representação

A Assembleia da República atribuiu despesas de representação a elementos como o oficial de segurança da AR e o seu adjunto. Na prática, estas despesas significam, respectivamente, um valor mensal de 1 399,82 euros (90% das despesas de reapresentação pagas a um secretário de Estado) e 1 189,84 euros. Segundo o i apurou, estes encargos não têm suporte legal, apesar de significarem anualmente uma despesa de mais de 31 mil euros. Sobre este assunto, o gabinete do secretário-geral da Assembleia da República esclareceu que “nesta legislatura não houve intervenção nesta matéria”. Ainda assim adianta que o mesmo pagamento terá por base o n.º3 do art.º 13º do Regulamento de acesso, circulação e permanência nas instalações da AR. Consultado o documento, é referido que o oficial de segurança e o seu adjunto têm direito a “um abono no valor fixado para os mesmos cargos da Presidência da República”. Oque não significa despesas de representação idênticas à de um secretário de Estado.

Carro

Só na compra de um carro, a Assembleia da República gastou no ano passado quase 44 mil euros. Segundo fora justificado na altura, a aquisição do BMW 525 – para a presidente da Assembleia da República (PAR), Assunção Esteves – tinha por base a insuficiência de meios próprios. A AR explicou na semana passada ao i que “em 2013 terminou, irremissivelmente, o contrato de aluguer das viaturas do Parlamento” e que ainda se ensaiou “a hipótese de aluguer de viaturas usadas.” Porém, explicam, que ficou sempre fora desta hipótese “a viatura da PAR, por orientação da segurança e perfil institucional.”

Estacionamento

O ajuste directo para ordenar o estacionamento no parque de superfície da Assembleia da República (AR) teve um custo de 5 350 euros, mas a decisão não foi unânime. Na prática, o valor pago serviu apenas para colocar linhas no chão de modo a sinalizar o espaço do estacionamento. Mas, em vez de tais traços serem feitos com tinta, foi decidido levantar a calçada e colocar pedras escuras. Em resposta ao i, a AR admite que “o tema do estacionamento à volta do Parlamento é recorrente no dia-a-dia dos que [ali] trabalham”, mas não justificam a opção: “Esta foi a solução”.

Sem comentários:

Mais lidas da semana