sábado, 12 de abril de 2014

DUAS DÉCADAS PERDIDAS POR CAUSA DE NAZI-FASCISTAS!!!



Martinho Júnior, Luanda

1 – Há vinte anos ocorreu o genocídio no Ruanda e de então para cá a imensa região dos Grandes Lagos jamais conheceu o calar das armas.

Coloco as coisas nestes termos, pois em África a doença crónica do encadeado de conflitos, de que Angola conseguiu sair há doze anos, não teve fim e a factura arrasta-se muito para além das largas dezenas de milhões de vítimas directas e indirectas, entre mortos, feridos, deslocados, doentes e pobres em estado de desnutrição e sem abrigo!

Nestas condições não há forma de dar luta ao subdesenvolvimento histórico e crónico, apesar do escândalo geológico, um pote de riquezas naturais que tanta cobiça atraem.

É também impossível encontrarem-se soluções humanas em profundidade, perante o espectro de desigualdades que se foram acentuando nas sociedades-alvo, desigualdades essas que premeiam os senhores da guerra e penalizam a ondulante multidão traumatizada, que se move entorpecida, andrajosa e esquálida de labirinto em labirinto, quantas vezes à completa mercê duma “ajuda externa” que é parte dos grandes negócios sobre as riquezas naturais que a cerca!...

…Saqueiam-se as riquezas naturais, da pior maneira possível, para depois surgirem com a proverbial caridadezinha ocidental, a distribuir migalhas para os infelizes!...

Milhões de pessoas que sobrevivem na agricultura de subsistência, apesar da abundância de água e de terra arável no coração físico-geográfico de África, um coração matriz de Grandes Lagos e de rios fabulosos como o Congo e o Nilo, ao ficarem à mercê dos senhores da guerra tornam-se párias que nem se conseguem fixar, muito menos sobreviver em função das suas escassas possibilidades e limitações de carácter antropológico, económico, social e psicológico!

Os estados dessa região tornam-se vulneráveis, falidos, impotentes de domarem o pântano e as elites sócio-políticas alimentam rivalidades em relação ao poder e ao contra-poder, num eterno círculo vicioso que as potências atiçam, encantadas pelos frutíferos lucros que obtêm!... lucram muito mais com a alimentação desse encadeado de conflitos em África, que aqueles que se dedicam à especulação como George Soros!

As fronteiras desfazem-se, novas entidades surgem e há sempre explicações que se usam e explicações que se escondem, no emaranhado das divisões étnicas e religiosas, que promovem becos dos quais se torna muito difícil encontrar saída.

Se não fosse por mais nada, a aristocracia financeira mundial e aquilo que ela projecta por via de suas oligarquias e elites agenciadas, milhões de vezes teria de ser condenada, tantas vezes quanto o escandaloso número de vítimas que têm provocado e não pára de crescer, numa região que poderia ser um dos paraísos da Terra, de Angola ao Sudão!

2 – Este quadro é sombrio para África e os angolanos têm a possibilidade de avaliar isso a partir de sua própria experiência histórica: há doze anos que se calaram as armas em Angola, num país que, tal como seus vizinhos, sofria o encadeado de conflitos, de tensões e de guerras (Iª Guerra Mundial Africana”), que sofria do mesmo pântano que ressurgiu após o final do que foi considerado de “Guerra Fria” por via do capitalismo neo liberal…

Às guerras justas da luta de libertação nacional e africana, o capitalismo neo liberal impôs a Angola a guerra injusta da usura sobre as riquezas naturais, a fim de melhor instalar e adequar os seus próprios interesses!...

… E os angolanos têm toda a legitimidade histórica para contribuírem no sentido de se superar esse pântano que o encadeado de guerras, que começaram há mais de vinte anos, faz prevalecer no fulcro físico-geográfico decisivo dos Grandes Lagos, adiando o futuro de todo o continente!

Se antes havia sido legítimo o movimento de libertação em África, bem como a luta contra o colonialismo, contra o “apartheid” e contra as suas sequelas, é também legítima a luta que dá sequência a essa vocação de liberdade na luta contra o subdesenvolvimento crónico, assumindo a paz, o aprofundamento da democracia e a lógica com sentido de vida… secando o pântano a que África parece estar condenada, à mercê dos poderosos que tutelam a globalização e de seus agentes locais!...

O pântano foi gerado pelas disputas geo-estratégicas entre as potências ocidentais: os Estados Unidos, ciosos de sua hegemonia, fazem prevalecer os seus interesses sobre as renitentes e hipócritas potências coloniais, que não têm outra alternativa senão subordinarem-se, tornando-se por seu turno, instrumentos agenciados (e cada vez mais dóceis) dessa hegemonia!

Em relação aos Grandes Lagos, à Bélgica sucedeu-se a França e à França sucederam os Estados Unidos, com seu cortejo de agentes locais que agora polvilham os cenários desde Angola ao Sudão: foi assim que, sucessivamente, se foi incrementando o poder de entidades de carácter nazi-fascista, capazes até de usarem eleições para melhor se mascararem e esconderem!

3 – A criação do AFRICOM, um instrumento de ingerência, de manipulação, de guerra psicológica, de formatação antropológica, sociológica e psicológica, tão poderoso que subalterniza a própria NATO, é o corolário da geo-estratégia do império, aglutinando os agenciados europeus e locais: potências ocidentais e regimes africanos surgidos de rebeliões cujo carácter é contra-reolucionário, dada a natureza étnica e religiosa de seus argumentos ideológicos e sócio-políticos, “normalmente” insensíveis até ao sofrimento humano que desencadearam, em relação ao qual monta os cenários de sua conveniência e de seu interesse.

Da realidade terrível para os povos, esses regimes montam o surrealismo imaginário de feição, para continuarem a justificar a morte!

O poder em países como o Uganda e o Ruanda, é um poder de carisma nazi-fascista que eclodiu muito antes dos actuais fenómenos por que passa a Europa, tão evidentes agora no caso da Ucrânia, como no caso das políticas da ditadura financeira por via do Euro, sob o rótulo depressivo de “austeridade”!

Os nazi-fascistas constituem a fauna dilecta que alimenta o poder putrefacto no pântano africano, por que surgiram de rebeliões contra-revolucionárias e sob a directa tutela do império.

É circunstância agravante para aqueles que abusam da manipulação (pseudo)-democrática com que se vestem, uma fórmula cínica que se tem alimentado da guerra e do sangue de dezenas de milhões de seres humanos!...

… É circunstância atenuante para aqueles mais lúcidos, que face ao infortúnio crónico de África, procuram secar o pântano assumindo as mais justas aspirações de liberdade, de aprofundamento de democracia e de justiça social, preocupando-se em dar sequência às lutas do movimento de libertação em África!

Neste momento, marcando os vinte anos após o genocídio do Ruanda, o Presidente Paul Kagame acusa a França de ter participado nesse genocídio, em pé de igualdade com as FAR e as milícia dos hútus, para esconder suas próprias responsabilidades, mas sobretudo para esconder as responsabilidades daqueles que, ao serviço do protagonismo hegemónico do império, deram oportunidade à sua ascensão ao poder no seu país e o instrumentalizam nas invasões dos países vizinhos, uma instrumentalização que parece não ter fim!

A paz pan-africana tem de fazer o diagnóstico correcto, sob os pontos de vista antropológico, sócio-político e psicológico, desses seres nazi-fascistas tão desprezíveis quão comprovadamente criminosos, ao nível dos mais asquerosos rebeldes do Uganda, dos Kivus, ou do Ruanda, para que alguma vez seja assumida, ainda que como uma fugaz esperança num futuro melhor!... e não se deixar intoxicar ou confundir por declarações que são produto de ingerências, manipulações e mentiras sem fim, contra os interesses essenciais de África em prol dum tão possível quão legítimo renascimento!

Uma das “armas” preferidas pelos instrumentos do império em África e noutras partes do mundo, é a visão etno-centrista dos acontecimentos, a base para estabelecerem os critérios maniqueístas que desembocam nas ideologias nazi-fascistas e isso continua a acontecer no Ruanda sob a direcção de Paul Kagame!

Outra dificuldade básica para a construção da paz reside no facto de haver muitos que se arvoram hoje em juízes, ou reitores de razão, ou simultaneamente árbitros, quando suas mãos estão tão sujas ao longo de décadas… e por isso são tão susceptíveis de mentira quanto de poder arrogante e discricionário!

É evidente que esta minha interpretação não é uma declaração de guerra, mas sim uma justa declaração de consciência humana, daqueles que se identificam com a lógica com sentido de vida, honrando as dezenas de milhões de vítimas que, cortejo após cortejo, continuam a desfilar e a sucumbir, de forma tão terrível quão dramática, nos imensos ermos africanos, ao sabor dos caprichosos saqueadores dum império que foi criado às custas de genocídio, do racismo, dum egoísmo sem limites e utilizando as regras dum poder unipolar construído desde que foi desencadeada a tão malparada Revolução Industrial!

Mapa:
A Região dos Grandes Lagos e as afectações colaterais, de Angola ao Sudão.

A consultar Martinho Júnior (parte do roteiro africano desde 2010):
. Zip Zip – 06 – RDC – KIVUS – A barbárie continua –
. Zip Zip – 26 – Amani Leo – 50 anos depois –
. Zip Zip – 34 – O AFRICOM no coração de África –
. Zip Zip – 38 – Mercenários, até quando? – I –
. Zip Zip – 39 – Mercenários, até quando? – II –
. Zip Zip – 41 – 50 anos mais de sofrimento e barbárie de sangue – I –
. Zip Zip – 42 – 50 anos mais de sofrimento e barbárie de sangue – II –
. Zip Zip – 43 – Patrice Lumumba e a fragilidade do movimento de libertação no Congo –
. Zip Zip – 44 – O Che no leste do Congo em 1965 –
. Zip Zip – 45 – Os mercenários da administração Johnson no Congo –
. Zip Zip – 46 – A administração republicana de Dwight D. Eisenwor, o “projecto Wizard” e o assassinato de Patrice Lumumba –
. Zip Zip – 47 – As armadilhas da aristocracia financeira mundial no Congo e o interregno do consulado Kennedy –
. Zip Zip – 48 – Os Estados Unidos assumem-se como potência neo colonizadora do Congo –
. Zip Zip – 49 – Um corpo inerte à espera de Maurice – I –
. Zip Zip – 50 – Um corpo inerte à espera de Maurice – II –
. Rapidinhas do Martinho – 16 – OTAN – O crime “mais-que-parfeito” – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/05/rapidinhas-do-martinho-16.html
. Rapidinhas do Martinho – 28 – A “Conferência do Pentágono para África” – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-28.html
. Rapidinhas do Martinho – 34 – Riscos acrescidos para África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-34.html
. Rapidinhas do Martinho – 36 – Salvar a paz em África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-36.html
. Rapidinhas do Martinho – 42 – As novas grilhetas de África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/09/rapidinhas-do-martinho-42.html
. Rapidinhas do Martinho – 45 – SADC pode tornar-se “numa outra África?” – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/09/rapidinhas-do-martinho-45.html
. Rapidinhas do Martinho – 48 (I) – Explorando o êxito – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/10/rapidinhas-do-martinho-48-i.html
. Rapidinhas do Martinho – 48 (II) – Explorando o êxito – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/10/rapidinhas-do-martinho-48-ii.html
. Rapidinhas do Martinho – 48 (III) – Explorando o êxito – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/10/rapidinhas-do-martinho-48-iii.html
. Rapidinhas do Martinho – 49 – Resgatar África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/10/rapidinhas-do-martinho-49.html
. Rapidinhas do Martinho – 60 – Esqueceram-se que a Terra é nossa mãe – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/11/rapidinhas-do-martinho-60.html
. Jogos africanos do neo colonialismo norte americano em África – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/05/jogos-africanos-do-neocolonialismo.html

Sem comentários:

Mais lidas da semana