João D' Espiney –
Jornal i
Presidência da
República, municípios, freguesias, institutos e empresas públicas, hospitais,
inspecções-gerais e fundações "escondem" compras
Há milhares de
organismos e entidades públicas que não publicam qualquer procedimento de
aquisição de bens e serviços no portal Base dos contratos públicos (http://www.base.gov.pt/base2/).
A publicitação dos
procedimentos contratuais no portal é obrigatória e o Código dos Contratos
Públicos (CPC) determina até que a não publicitação tem como consequência a sua
"ineficácia", nomeadamente em termos de pagamentos.
A pesquisa
efectuada pelo i aos contratos publicados no primeiro trimestre deste
ano permitiu constatar que a lista de organismos que não publicou qualquer
contrato é muito vasta. E o número de procedimentos divulgados por muitas das
entidades que o fizeram é irrisório, tendo em conta que estamos a falar de todo
o tipo de compras para o seu funcionamento corrente.
Entre os 22 170
contratos publicados neste período, o i constatou que há centenas de
empresas públicas e entidades do Sector Empresarial do Estado (Central, Local e
Regional) e instituições particulares de solidariedade social (IPSS) que não
publicaram qualquer contrato. O i contabilizou ainda apenas contratos
de 87 das cerca de três mil freguesias, de 293 das 308 câmaras e de 23 das
várias centenas de fundações com estatuto de utilidade pública e que receberam
subsídios.
O MAU EXEMPLO DE
BELÉM
O mau exemplo começa desde logo em alguns órgãos de soberania como a
Presidência da República e o parlamento. A AR até divulga os contratos na sua
página oficial, e já publicou seis contratos de 2008 mas desde então mais nada.
O i confrontou a secretária-geral da AR com esta informação mas não
obteve resposta. O i questionou também o porta-voz de Cavaco Silva
sobre o facto da Presidência da República nunca ter publicado qualquer contrato
mas também não obteve resposta.
No relatório da
"Contratação Pública em Portugal de 2012", divulgado em Março, o
Instituto da Construção e do Imobiliário - organismo que gere o portal Base -
admitia que ainda se está longe de uma "efectiva generalização das
obrigações" decorrentes do CPC. "O número de entidades que reportaram
contratos públicos parece ser, em termos absolutos, menor do que o número
expectável atendendo à estrutura da administração pública". Apesar do
número de entidades adjudicantes que reportaram contratos em 2012 (3383) ter
aumentado 11,7% face de 2011 "continua, todavia, num nível que suscita
dúvidas sobre se todas as entidades adjudicantes estarão realmente a proceder
aos reportes obrigatórios, nomeadamente no caso dos ajustes directos",
lê-se no documento.
MINISTÉRIOS NÃO
REAGEM
Entre a lista dos organismos que não publicaram qualquer contrato
encontram-se centenas de empresas públicas e entidades do SEE. O i tentou
obter um comentário dos Ministérios das Finanças e da Economia mas sem sucesso.
Uma dessas
entidades é o grupo Caixa Geral de Depósitos(CGD). Questionada sobre o facto de
nenhuma empresa do grupo e a Fundação Culturgest publicar os seus contratos,
fonte oficial respondeu: "a CGD tem natureza de sociedade comercial,
embora de capitais públicos. Tendo em consideração esta natureza, e ainda o
facto de não praticar actos materialmente administrativos, não é considerada
contraente público para efeitos do Sistema Nacional de Compras Públicas".
Entre as quinze
câmaras que não publicaram nenhum contrato, só a de Fornos de Algodres
respondeu à solicitação do i e para dizer apenas que "o
município não publicitou nenhum procedimento de aquisição de bens e serviços no
primeiro trimestre, porque não realizou nenhum contrato com esse âmbito".
TDC REFORÇA A
OBRIGATORIEDADE
Solicitado a comentar toda esta informação, a posição do
Tribunal de Contas(TdC) não deixa margem para dúvidas. "O Código dos
Contratos Públicos prevê no seu art.o 465.o a obrigação de publicitação no
portal da internet dos elementos referentes à formação e à execução dos
contratos públicos, cabendo à entidade contratante o cumprimento dessa
obrigação", começou por dizer a porta-voz do TdC, lembrando que "o
art.o 127 do CPC prevê que a não publicitação gera a ineficácia dos contratos,
nomeadamente em termos de pagamentos".
"O TdC e o
Conselho de Prevenção da Corrupção têm recomendado o cumprimentos das regras
respeitantes à transparência" e "têm insistido nestes pontos,
verificando-se que o legislador tem seguido estas preocupações", afirmou
ainda a mesma fonte. Em relação às falhas dos órgãos de soberania referidos, o
TdC limitou-se a referir que "tem procedido à sistemática análise e
acompanhamento das suas contas".
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