Ana
Sá Lopes – jornal i, editorial
Se
Costa tivesse arriscado perder há ano e meio teria hoje legitimidade acrescida
O
resultado das europeias é terrivelmente frágil para um PS na oposição, três
anos depois do choque em cadeia que tem sido a gestão do país pela troika e por
um governo PSD/CDS empenhado em “ir além da troika”. António José Seguro não
conseguiu, ao contrário do que seria minimamente expectável, transformar o PS
numa alternativa credível. A vitória à justa nas europeias conseguiu pôr os
derrotados da noite, no meio daquele caos, a mostrar ânimo com o vislumbre de
que nem tudo pode estar perdido nas legislativas, o que seria um fenómeno a ser
obrigatoriamente estudado pelos especialistas em ciência política. Pior do que
as alucinadas declarações de Passos e Portas – os responsáveis nacionais pela
redução do país a estilhaços – foram as sondagens divulgadas no dia
seguinte que deram um sinal inequívoco de que este PS não é uma
alternativa consistente à presente governação do país. Evidentemente, isto é um
susto.
Seguro
percorreu um terrível caminho de pedras, herdando um partido devastado pela
derrota de Sócrates, um partido que esperou pacientemente que lhe caísse no
colo – raramente divergindo do ex-líder e remetendo-se ao silêncio durante
longos anos. Quando chegou a vez de ser entronizado no Largo do Rato, optou
pela estratégia do assim-assim, convencido de que bastaria esperar pelo
apodrecimento de um governo em desagregação para se tornar primeiro-ministro.
Crispou-se, fechou-se, refugiou-se numa trincheira. Abrir-se à sociedade não é
só fazer uma convenção num hotel com Joana Amaral Dias.
Dito
isto, António Costa é co-responsável pela fraca vitória do PS. Foi ele que
achou que estava tudo bem e recuou numa famosa noite no Largo do Rato depois de
ter tudo preparado para ser candidato à liderança do partido. Aquele era o
momento certo para começar a construir a alternativa interna: aliás, nada se
passou entretanto de novo, a não ser uma vitória nas autárquicas e uma vitória
pouco expressiva nas legislativas. Mas foi Costa que nos disse que tinha
chegado a um acordo com Seguro sobre não sei o quê (nunca ninguém soube muito
bem em redor do que era o acordo). Era o tempo certo para discutir a liderança
e foi marcado um congresso onde o candidato Costa não compareceu. Se tivesse
arriscado perder teria hoje uma legitimidade acrescida. Ao recusar, tornou-se
co-responsável pelos resultados de domingo. Agora, há uns estatutos blindados
que toda a gente já sabia que existiam. Vai ser um calvário doloroso e era
escusado. Se é verdade que António Costa é um dos quadros mais inteligentes do
PS, também é verdade que junta à sua volta uma amálgama de gente totalmente
contraditória entre si, que vai desde os que defendem alianças à esquerda aos
que as abjuram e estão prontos para o bloco central. Costa já mostrou que é
capaz de aglutinar – mas não se lhe pode exigir menos do que a maioria
absoluta. Quer dizer, se houver congresso e ele ganhar.
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