Fernando
Santos – Jornal de Notícias, opinião
Calma!
As exigências de mais e mais austeridade para combater os danos provocados pela
sucessiva queda do rendimento nacional vs. multiplicação da dívida pública
parecem ter os dias contados. Há o espetro de maiores feridas a caminho
provocadas pelo cutelo de exigências do Tratado Orçamental subscrito e que
obriga ao recuo do défice das contas públicas para um máximo de 0,5%, mas está
escancarada uma via original para escapulirmos a mais angústia e sofrimento.
Falta pouco para o clamar de um "estamos safos!"....
A
criatividade contabilística ajuda qualquer pelintra a disfarçar-se de rico.
Ora, é interessante a via em congeminação para a União Europeia parecer mais
forte do que verdadeiramente é: pega-se nas economias paralelas e integram-se
nas contas do Produto Interno Bruto!
O
"Wall Street Journal" de ontem abriu o debate e enunciou casos de
estratégias em
movimento. O Reino Unido, a Itália e a Irlanda preparam-se
para incluir na estatística os balúrdios gerados a partir do tráfico de droga
ou da prostituição, para só citar dois casos. O resultado de um tal exercício
tem um natural efeito de perlimpimpim. Soma-se a não passagem de recibos das
prostitutas à massa faturada sem impostos da cocaína e da heroína, do ecstasy e
canábis e, zás!, num efeito de harmónio, o PIB cresce, cresce, cresce e a
dívida desce, desce, desce. De repente, os balancetes deixam de estar tão
marcados a vermelho e fica-se mais perto do cumprimento do Pacto Orçamental.
Em
Portugal, quer o Governo quer a Oposição têm passado ao lado da contabilidade
criativa salvífica, preferindo entreter-se numa troca de galhardetes sobre o
PIB (magrinho crescimento de 1,3% no primeiro trimestre do ano) e a dívida
pública (agora nos 132,3%). Lá virá o dia em que uns ou outros farão o passe de
mágica de agregar os 44 mil milhões de euros de economia paralela estimada ao
PIB debilitado - cifrado agora à volta de 160 mil milhões. E é bom de ver: de
um dia para o outro, os mais de 215 mil milhões de dívida transformar-se-ão
numa percentagem bem mais baixa do que a atual. Será na mesma um balúrdio, mas,
pelo menos nas folhas de Excel, tornar-se-á mais tolerável aos olhos de todos -
exceto aos dos credores.
Mais
cedo do que tarde é previsível, pois, passar o país a discutir em moldes
diferenciados dos atuais. O garrote do Tratado Orçamental assinado pelos
chamados partidos do arco da (des)governação funcionou como impulsionador de um
novo faz de conta, obviamente tolerado por Bruxelas, e no qual os problemas de
fundo permanecem intocáveis, mas acabam sarapintados de mais cor de rosa.
À
falta de outras vias de entendimento, façamos votos para que Governo e Oposição
ao menos se entendam sobre quanto vale o negócio das prostitutas.
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