Correio
do Brasil, Brasília e Rio de Janeiro
Atual
presidenta da República, Dilma Rousseff (PT) está diante do desafio
mais difícil de sua vida, se quiser permanecer no cargo, mostraram as urnas
neste último domingo. Após uma campanha no primeiro turno em que se dividiu
entre um aceno à esquerda e o abraço ao agronegócio, Dilmachega para a
disputa com o preferido dos conservadores, Aécio Neves (PSDB), que comemoram a
vitória do ex-militar Jair Bolsonaro (PP), como campeão de votos, no Rio, e o
crescimento expressivo da bancada de parlamentares na Câmara Federal, com
expoentes da ultradireita como Luiz Carlos Heinze (PP-RS). Os bilhões de reais
investidos na tentativa da candidata petista em fazer as pazes com a mídia
hegemônica seguiram para o ralo, uma vez que os meios de comunicação ligados à
direita trabalharam para que o segundo escrutínio da opinião brasileira
ocorresse exatamente com o representante tucano, apesar da festa em torno da
candidata Marina Silva (PSB/Rede Sustentabilidade). O estrago causado pela ação
midiática em peso a favor dos candidatos do campo reacionário chegou a causar
atritos na direção da campanha petista e levou a presidenta, pela primeira vez
em seus quatro anos de governo, a convidar blogueiros da esquerda para uma
coletiva.
Na
balança eleitoral, Aécio Neves atrai pesos pesados da indústria, dos bancos e
dos segmentos mais anacrônicos da sociedade brasileira que, nas urnas,
demonstraram um vigor além do previsto nas pesquisas de opinião. Estas, aliás,
ainda estão tentando compreender onde erraram. A diretora executiva do Ibope,
Márcia Cavallari, negou nesta segunda-feira que o instituto de pesquisa tenha
errado tanto assim nos resultados, após o crescimento repentino de Neves
(PSDB), que superou Marina Silva com ampla vantagem e foi para o segundo turno
com a candidata do PT.
–
Essa era uma eleição com mais incertezas. Sabíamos disso desde as manifestações
de junho do ano passado – disse Cavallari, a jornalistas.
Na
última pesquisa Ibope, divulgada no sábado, Aécio aparecia com 27% dos votos
válidos, contra 24% de Marina. Dilma mantinha a liderança com 46%.
Segundo afirmou, a diferença dos resultados de domingo para as últimas
pesquisas em alguns
Estados não foi captada porque o eleitor mudou de ideia até o
último minuto.
–
Nossa última pesquisa havia mostrado um crescimento do Aécio. Esse movimento
continuou após o fim da pesquisa, por isso o resultado oficial foi diferente. O
eleitor teve um interesse tardio por essa eleição – disse.
A
próxima pesquisa deve ser divulgada na quinta-feira, em parceria com o jornal O
Estado de S. Paulo e a Rede Globo. Até o fim do segundo turno, devem ser
divulgadas até quatro pesquisas e, dessa vez, os institutos esperam captar de
forma mais precisa a opinião dos eleitores que, ao mesmo tempo em que elegeram
os representantes da direita reacionária, também souberam valorizar as
bandeiras à esquerda do PSOL, com mais de 1,5 milhão de votos para a candidata
Luciana Genro. Na noite passada, Genro diz que o partido ainda vai decidir se
apoia a presidenta Dilma Rousseff no segundo turno. Genro afirmou que as
bandeiras defendidas por sua campanha, como os direitos civis da população LGBT
e a taxação de grandes fortunas, continuam pendentes e que os candidatos que
foram para o segundo turno não irão resolver os problemas do país. No Rio, o
campeão de votos do PSOL, Marcelo Freixo, já adiantou que fará campanha pela
candidata à reeleição, enquanto Jair Bolsonaro, de ultradireita, já mergulha
nas hostes tucanas, garantindo seu voto a Aécio Neves.
Derrota
no Parlamento
No
total, 28 partidos elegeram deputados federais, mas a base aliada da presidenta
emagreceu, após as eleições deste domingo. O PT continua com a maior bancada
nominal, segudo do PMDB e do PSDB, que saiu vitaminado das urnas. Os resultados
ainda poderão ser alterados, por conta dos processos em andamento na Justiça
eleitoral – como no caso do ‘ficha suja’ Paulo Maluf (PP-SP), entre outros.
Mas, encerrada a apuração, o quadro das candidaturas pendentes não têm como
alterar de maneira significativa a distribuição das cadeiras entre os partidos
com representação na Câmara, que aumenta de 22 para 28.
O
PT foi a legenda que mais se desidratou, com 18 deputados a menos, enquanto o
PSDB elevou sua bancada de 44 para 55 integrantes. A redução no tamanho da bancada
petista, porém, é insignificante perto do número de candidatos conservadores
nas bancadas eleitas, mesmo naquelas que, supostamente, representam a esquerda.
Segundo o jornalista Sérgio Duran escreveu em sua página, em uma rede social,
“o PT precisa restaurar a capacidade de diálogo com a população. Dilma não
disse ainda o que pretende no segundo mandato. (…) Tem de descer do salto como
Lula sempre desceu”.
Eleição
polarizada
Para
o cientista político Antonio Lassance, em artigo publicado nesta segunda-feira,
“um balanço das eleições revela uma disputa acirrada, palmo a palmo, e muito
polarizada, em termos políticos, programáticos e sociais”.
“No
primeiro turno, houve dois grandes perdedores: Marina Silva e os institutos de
pesquisa. Marina perdeu a disputa com Aécio por muito. Todos os institutos
mostravam a candidata do PSB à frente, quando ela, de fato, esta muito, mas
muito atrás mesmo.
Ibope,
Datafolha, Vox Populi e tantos outros, segundo o professor Lassance, “mostraram
que andam menos confiáveis que o tarô. Suas margens de erro reais são absurdas.
Na quinta-feira, quando sair uma nova rodada de pesquisas, a melhor precaução
que se pode ter é deixá-las de lado, para mais e para menos”.
Para
o segundo turno, afirma, haverá uma “disputa dura e polarizada em termos
programáticos e sociais entre PT e PSDB. Em grande medida, o mapa da disputa
reforça a explicação sobre o lulismo, do cientista político André Singer. A
hipótese é a de que, com o governo Lula, o PT sofreu um realinhamento político
e também social. Principalmente a partir das eleições de 2006, deixou de ser um
partido principalmente de classe média e passou a ser um partido cujos votos
dependem, sobretudo, dos mais pobres”.
“Por
isso, as votações no Nordeste e Norte do país, nas cidades mais pobres do
interior e na periferia das grandes cidades garantiram a grande votação de
Dilma. Se, em 2010, quando Singer formulou a tese, a principal crítica que
poderia ser feita era a de que ainda era cedo para se afirmar tal coisa, as
eleições de 2014 insistem em uma tendência que não parece ser mero acaso. O que
era uma hipótese, em 2006, virou uma tese difícil de ser desmentida, depois de
2014. Esse realinhamento era tudo o que o PT sempre quis: ser um partido do
povão. A contradição das contradições é que, com a transformação do Brasil em
um país majoritariamente de classe média, a sorte do PT tende a ficar cada vez
mais difícil nas eleições”, afirma.
A
única saída se o PT quiser evitar esse movimento de gangorra, segundo o
cientista político, em que a aproximação dos mais pobres gera quase que
automaticamente um afastamento da classe média, “é evitar essa política de soma
zero, em que os pobres ganham e a classe média se considera a grande perdedora
– podemos acrescentar a ela os aposentados, uma legião cada vez maior de
eleitores. No segundo turno, além de manter o discurso para os pobres, será
necessário não só Dilma falar mais para a classe média, como, acima de tudo,
sinalizar mudanças efetivas que atendam às suas expectativas”.
“A
classe média quer pagar menos impostos, menos juros bancários e de cartões;
quer menores mensalidades de escolas e planos de saúde e, a propósito, quer
intensificar as políticas regulatórias que incidem sobre a qualidade dos
serviços privados (bancos, telefonia e internet, planos de saúde, transportes e
mobilidade urbana e aeroviária). Ambos, classe média e o povão, querem mais
combate à corrupção e menos denúncias. Dilma segurou sua votação e ajudou a
desidratar a candidatura Marina quando a qualificou como uma candidatura dos bancos
e feita sob medida para o ‘mercado’. Marina se foi, mas Aécio é quem melhor
cabe nesse modelito”.
A
presidenta Dilma reforçou seu apelo político quando abraçou o discurso da
defesa dos direitos sociais e do emprego, das conquistas dos trabalhadores mais
pobres, “como o salário mínimo, da participação e do combate à corrupção”,
sublinha. “Aécio está e estará atrelado à defesa do mercado, da redução da
inflação a 3% – sem qualquer preocupação com o que isso acarreta na elevação da
taxa de desemprego; na obsessão por dizer que vai entregar a Fazenda ao
ex-funcionário de George Soros, Armínio Fraga”, acrescenta.
“É
disso que se trata. É essa a disputa do segundo turno”, conclui.
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