segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Governo de Macau classifica violência doméstica como crime público




Macau, China, 10 nov (Lusa) - O Governo de Macau anunciou hoje que a futura lei contra a violência doméstica, prometida desde 2008, estará pronta ainda este mês e vai classificar todas as agressões como crime público, apesar de não incluir casais do mesmo sexo.

"Segundo uma forte corrente da sociedade, [a violência doméstica] deve ser crime público, e o Governo concorda. Vai ser crime público", afirmou hoje Iong Kong Io, presidente do Instituto de Ação Social.

O responsável explicou que vão estar abrangidas não só relações matrimoniais, mas também familiares, de união de facto e de namorados, ficando de fora, no entanto, os casais do mesmo sexo.

O crime público fazia parte da primeira proposta apresentada pelo Governo em 2011, mas essa classificação acabou por ser retirada, tal como a inclusão dos casais do mesmo sexo. A alteração da proposta - que na prática impedia que se abrisse uma investigação por denúncia de outra pessoa que não a vítima - gerou uma significativa mobilização da sociedade civil.

Foi criada a Coligação Anti-Violência Doméstica, liderada pela académica Cecilia Ho e pela diretora do Centro Bom Pastor, que apoia vítimas, Juliana Devoy. O grupo organizou sessões de esclarecimento, recolheu assinaturas, escreveu e participou em debates perante as Nações Unidas e, por fim, conseguiu estabelecer um contacto direto com o Governo, que acedeu em reunir com a coligação durante o processo de redação da lei.

"O Instituto de Ação Social deu muita importância à opinião pública, especialmente às associações de solidariedade social", disse Iong Kong Io, justificando a mudança de postura do Governo, que desde 2011 vinha a apontar a tipificação de crime semipúblico como a mais adequada.

Leung Pou Lam, diretora substituta dos Serviços de Assuntos de Justiça, salientou que foi abandonada a ideia, avançada pelo Instituto de Ação Social no início do ano, de que a violência doméstica seria crime público apenas em casos de agressões continuadas.

"O ponto essencial é haver uma consequência negativa para a vítima, é preciso analisar a gravidade, independentemente do número de vezes [que decorre a agressão]", explicou.

Ressalvando que o diploma ainda está em redação, a responsável acredita que a moldura penal para as diferentes agressões vai ser semelhante à já existente no Código Penal.

A diretora substituta dos Serviços de Assuntos de Justiça admitiu que os homossexuais "também devem ser protegidos se houver violência", mas afirmou que a questão não pode, para já, ser incluída na lei porque "precisa de mais estudo".

Cecilia Ho mostrou-se satisfeita com a classificação de crime público, mas lembrou que há ainda muito a fazer no campo da formação dos profissionais que lidam com vítimas de violência doméstica e salientou que é preciso "mudar mentalidades".

"Julgo que estamos no caminho certo. No entanto, não se trata apenas de uma questão de lei, mas também da mentalidade dos profissionais, que muitas vezes acham que a violência doméstica é uma coisa da esfera privada", explicou.

A académica do Instituto Politécnico de Macau lamentou que os casais do mesmo sexo não estejam abrangidos, mas lembrou que este é um tipo de legislação suscetível a revisões ao longo dos anos.

Anthony Lam, presidente da Associação Arco-Íris, de promoção dos direitos dos homossexuais, manifestou-se desiludido com a notícia. "Não percebo a posição do Governo. Temos tentado ser positivos, mas esta resposta oficial deixa a comunidade [homossexual] realmente triste", disse à agência Lusa.

O Governo espera concluir a redação do diploma este mês, mas não garante que a lei entre em vigor ainda este ano.

ISG // VM

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