Pedro
Ivo Carvalho – Jornal de Notícias, opinião
Têm
sido férteis os dias de governação para alguns ministros. Não propriamente na
produção de prova da sua competência, mas na multiplicação de idiotices que, em
circunstâncias normais, os deveriam fazer perceber a necessidade de limpar a
atmosfera política com a dádiva da sua ausência. Mas não. A degradação do que
deveria ser a responsabilidade do decisor atingiu um plano tão rasteiro que
chegamos a um ponto em que os ministros já não se demitem nem são demitidos
porque, muito provavelmente, ninguém no seu perfeito juízo quererá ocupar a
cadeira. Ou, então, porque a vergonha foi guardada numa gaveta ainda mais
inacessível do que aquela em que Mário Soares enfiou o socialismo.
A
governação sobrevive numa espécie de círculo fechado do caos, onde ninguém entra
e de onde ninguém sai. Começo a acreditar que há ministros que foram feitos
reféns por Passos Coelho. Que carregam a cruz por sacrifício e sob chantagem.
Que já foram aparafusados ao soalho dos ministérios, dado o perigo de fuga.
Só
assim se compreende a continuidade dos titulares da Justiça, Educação e
Negócios Estrangeiros. Paula Teixeira da Cruz, Nuno Crato e Rui Machete são o
tríptico indecoroso da maioria. Tudo o que está na esfera da sua atuação e
deveria funcionar não funciona. Seria preciso mais para abalarem? Mas agora é
tarde. Ninguém aceitaria gastar um cêntimo no seu resgate. Continuarão, por
isso, e até ver, enclausurados nesse círculo do caos. Com vista para uma
remodelação governamental.
Ou
não. Talvez neste, como noutros casos, Pedro Passos Coelho dê mostras do que
tem sido uma das suas qualidades/forças - a obstinação com determinadas linhas
de pensamento, com objetivos finais. É deixar a corda esticar, pensará ele.
Mas
a corda já começa a partir. A janela de Portugal devia ter o futuro no horizonte.
Mas não tem. As legislativas estão aí, mas o amanhã político é o ontem. Quem
diria, não é? Num dia, o ministro da Economia, Pires de Lima, exulta com o
desempenho da economia; noutro dia, a sua colega das Finanças, Maria Luís
Albuquerque, agita o demónio de um segundo resgate. Digam lá se não dá para
ficar um pouco baralhado com tanta bipolaridade estratégica. E dá para ficar,
sobretudo, com algum receio, dado que a segunda consegue ser mais convincente
do que o primeiro.
Como
no princípio, no meio e no fim, o problema ainda está por resolver (não há
dinheiro), arriscamo-nos a ficar presos ao passado. Sobretudo se pensarmos que
o maior trunfo da maioria PSD/PP é ter formado um Governo que levou a troika no
regaço e foi além desta, recuperando, é certo, as finanças públicas; sobretudo
se pensarmos que a estratégia de um PS a quem bastaria estar calado no canto
enquanto o desastre governamental ia acontecendo parece ancorar-se na herança
deixada por José Sócrates.
Que
tal como perspetiva? Votar no modelo que abriu a porta à troika ou no modelo
que lhe construiu uma suite presidencial? E será esta equação subsidiária da
Banca? Há um fastasma bom e um fantasma mau? É que a mim metem-me os dois medo.
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